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FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS – FMU CENTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO – CPPG ÀREA: EDUCAÇÃO CURSO: DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR JULIO CESAR GALVES GOMES MANGINI A FORMAÇÃO DO PSICÓLOGO E A MASSIFICAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR São Paulo, SP. 2014 FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS – FMU CENTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO - CPPG ÀREA: EDUCAÇÃO CURSO: DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR JULIO CESAR GALVES GOMES MANGINI A FORMAÇÃO DO PSICÓLOGO E A MASSIFICAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR Professora Orientadora: Maria Cecilia Carrara Modenesi Ribeiro São Paulo, SP. 2014 Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Docência do Ensino Superior da FMU – Faculdades Metropolitanas Unidas, como parte dos requisitos para a conclusão do curso e obtenção do título de especialista. DEDICATÓRIA Dedico este Trabalho de Conclusão de Curso a todos os psicólogos que se dedicam a essa ciência profissão. AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer primeiramente a Fabia, que me deu irrestrito apoio, aos meus filhos que me dão forças e aos meus mestres que ao mostrarem o caminho, tornaram esse trabalho possível. “É no problema da educação que assenta o grande segredo do aperfeiçoamento da humanidade.” Immanuel Kant 7 RESUMO O bom exercício profissional depende, fundamentalmente, da formação do profissional em questão. Considerando a importância social da profissão, especificamente no caso dos psicólogos, pode se avaliar o quanto é destrutiva uma má atuação desses profissionais que atuam na mais variadas demandas que lhe são impostas. Há mais de um século a Psicologia busca seu espaço entre as ciências, ainda que apresentando um rigor diferente do proposto pelo positivismos radical. Hoje vive se um viés nessa busca, pois no senso comum imagina se que a Psicologia seja capaz de dar respostas que não lhe confere dar. Mas o maior problema é quando o psicólogo não tem ciência de miserabilidade da Psicologia e aceita ocupar um espaço que não lhe cabe como profissional e nem a psicologia como ciência-profissão. Ter consciência de si e da profissão que escolheu é um desafio ao psicólogo, desafio esse que deveria ser lhe outorgado e incentivado a nutri lo ainda na cadeira acadêmica, mas infelizmente é negligenciado e esquecido, sendo que muitos graduam se e partem para a prática profissional sem sequer tomar conhecimento desse desafio. Buscando isso, esse trabalho revisou a literatura com o fim de fomentar o debate acerca da formação do psicólogo, levando em consideração os fenômenos acerca do ensino superior e suas vicissitudes, bem como de uma análise referencial teórica sobre a massificação do ensino superior. São levantadas algumas questões propostas por autores dedicados ao assunto para fomento e aprimoramento da prática profissional do psicólogo, assunto de grande relevância social. Palavras-chave: Psicólogo; Massificação do ensino superior; Psicologia. ABSTRACT Good professional practice depends fundamentally on the training of the professional in question. Given the social importance of the profession, specifically in the case of psychologists can assess how much destructive bad these professionals that work in the most varied demands are imposed. For more than a century psychology seeks its place among the sciences, although showing a different rigor proposed by radical positivism. Today he lives is a bias in this quest, as in common sense realize that psychology is able to provide answers that give not give you. But the biggest problem is when the psychologist is unaware of the misery Psychology and accepts occupy a space that does not fit you as a professional and not as science-psychology profession. Aware of himself and of their chosen profession is a challenge to the psychologist, this challenge should be granted to him and encouraged him to further nurture the academic chair, but unfortunately is neglected and forgotten, and many graduate and leave for professional practice not even be aware of this challenge. Seeking it, this work reviewed the literature in order to stimulate debate about the training of psychologists, taking into account the phenomena about higher education and its vicissitudes as well as a theoretical framework for analyzing the massification of higher education. Some questions posed by writers dedicated to the subject for promotion and enhancement of the psychologist, the subject of great social relevance are raised. Keywords: Psychologist; Massification of higher education; Psychology. 8 Introdução Esse artigo pretende fomentar o debate sobre a formação do psicólogo com o fim de subsidiar o aprimoramento da atuação desse profissional e, consequentemente, valorizando a Psicologia como ciência-profissão. A partir da revisão bibliográfica acerca do assunto pode se analisar os fenômenos acerca da formação do psicólogo e sua correlação com a massificação do ensino superior. Considerando se as criticas na literatura científica acerca da Psicologia e de suas limitações, bem como da mercantilização do ensino superior, pode se avançar na busca da melhoria do processo educacional na graduação assim como, consequentemente, da melhoria na atuação do psicólogo. Ao trazer a luz dos debates acadêmicos questões sobre esses fenômenos espera se contribuir para esse desafio primordial à nossa sociedade. O artigo está dividido em cinco sessões, sendo a introdução, Capítulo I – Psicologia, psicodiagnóstico e papel social; Capitulo II – Formação do Psicólogo; Capítulo III – O caminho; e as considerações finais. 9 Capítulo I – Psicologia, psicodiagnóstico e papel social A Psicologia ocupa inicialmente importante espaço social ao se colocar como pilar cientifico à busca da saúde mental, sendo também requerida por vários setores da sociedade que imputam à ela a única forma de se indicar à a verdade ou, em outros momentos, a melhor decisão a ser tomada por aqueles que requerem sua manifestação. Ainda que o solicitante não esteja adstrito à opinião do psicólogo, este vem sendo de maneira substancial utilizado como determinante nas decisões. Segundo Shine (2003) são raríssimas as exceções em que as decisões são contra senso da indicação do psicólogo, portanto há que se dispensar a importância devida a manifestação, seja ela a forma que for, do psicólogo, já que ela é tida como indicador da verdade, tornando extremamente nocivo se a postura desse profissional não atender aos princípios éticos, científicos e técnicos. Primeiramente deve se entender que o diagnóstico, por exemplo, é o resultado de um processo de avaliação psicológica e a ela deve estar articulado (GUZZO & PASQUALIi 2001), portanto para que haja um diagnóstico fidedigno é mister que se atenha a validade teórica na avaliação psicológica. Nessa linha de pensamento Villemor-Amaral (2008 p.99) defende que “Um grande desafio atualmente, na área da avaliação psicológica, é comprovar a validade de certos procedimentos diagnósticos face ao imperativo ético de se chegar a conclusões confiáveis, fidedignas e, sobretudo, úteis, apoiadas emmetodologias científicas atuais”. Para se superar esse desafio é fundamental que se tenha profissionais formados adequadamente para o desempenho da profissão, o que não vem ocorrendo no Brasil, segundo Paula, Pereira & Nascimento (2007 p.33) que defenderam que: A Psicologia é cercada de diversos desafios que podem ser relacionados, principalmente, com a formação, com a sua construção como ciência, com as suas técnicas de avaliação e de intervenção e com os aspectos éticos relacionados à pesquisa e à atuação profissional. Refletir sobre a formação dos psicólogos é relevante, uma vez que ela afeta a qualidade dos serviços prestados pelos profissionais. Dada a importância Social da Psicologia nos dias atuais, podemos considerar o poderio destrutivo da atuação de um psicólogo mal formado, como muito bem conceitua Mello e Patto (2012 p. 20): Estamos diante de um quadro gravíssimo e inaceitável, não só porque há psicólogos vitimando pessoas, mas também porque a credibilidade de um saber e de uma profissão que contam com excelentes pesquisadores e profissionais, capazes de 10 contribuir para a construção da cidadania, está ameaçada. Está mais do que na hora de o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Psicologia tomarem três medidas: cobrar das autoridades educacionais uma avaliação rigorosa dos cursos de Psicologia que proliferam no país; instaurar e coordenar uma profunda e duradoura discussão nacional sobre a formação de psicólogos; e discutir formas de impedir o exercício da profissão por quem não está preparado para isso. Portanto deve se considerar que o problema da atuação do psicólogo e, consequentemente, da intervenção do profissional da psicologia em diversas áreas, inicia se na má formação do psicólogo se encerrando nos limites e procedimentos não reconhecidos da profissão-ciência. Em relação ao alcance da Psicologia quanto a determinação da verdade ou do certo ou errado, pode se entender que a crítica que Foucault (1961) fez quanto ao totalitarismo do saber sobre a loucura em relação a psicanálise poderia ser a pedra angular para reflexões sobre a falsa ideia do suposto saber do psicólogo quanto as demandas colocadas à ele, tornando se um viés periculoso socialmente se esse saber não se respaldar na teoria e técnica, consequentemente, reconhecendo suas limitações e a relativa miserabilidade na sua atuação. 11 Capitulo II – Formação do Psicólogo Segundo Esteves (2008 P.102) as três concepções de Universidade, sendo elas a liberal, a de investigação e a de serviços, foram afrontadas pelos novos moldes em que se fez potencializar os conflitos e contradições antes superados. Com a massificação do ensino superior fenômenos se chocam e se contradizem, como a mercantilização da educação versus a “contribuição essencial para humanização dos seres humanos”. Esteves emerge questões trazidas por Hannah (1957 P.499) sobre o conflito educacional entre o ser e saber fazer. Esteves diz: Contudo, é forçoso reconhecer que a sociedade parece reclamar dois tipos de produtos bem diferenciados: a formação de quadros meramente executivos que actuam de acordo com conhecimentos consagrados (e que inexoravelmente se desactualizarão em prazos cada vez mais curtos) e a formação de quadros criativos, capazes de inventar soluções novas para problemas existentes ou que venham a existir. A massificação do ensino superior que se verificou já num certo número de sociedades fez avultar a primeira destas tendências, ao mesmo tempo que sistemas cada vez mais sofisticados e pressionantes de avaliação vão identificando como centros de excelência, aqueles que respondem à segunda das exigências acima mencionadas. Portanto há que se preservar o ensino com o desenvolvimento de conhecimentos específicos da profissão, articulados ao desenvolvimento concomitante do senso crítico, capaz de proporcionar ao profissional, condições de exercer plenamente a profissão, atualizando se e tendo condições de aplicar a teoria e técnica aos casos concretos e específicos que sua atuação exige. Especificamente sobre a catástrofe que é a contemporânea formação inadequada do psicólogo no Brasil Patto (2012 p.19) afirma que: O que certamente encanta muitos desses profissionais mal formados intelectual e profissionalmente é o poder de dizer sobre o íntimo das pessoas que lhes é socialmente outorgado e considerado o único discurso competente para esse fim. Inebriados por essa autorização, muitos deles sentem-se livres para dizer o que entendem, certos da impunidade. Essa suposta competência indiscutível advém da crença de que as ciências humanas produzem conhecimentos acima de qualquer suspeita, garantidos por métodos de pesquisa que se dizem objetivos e neutros. Poder que, para não ser questionado, não pode ouvir crítica filosófica quanto ao conceito hegemônico de cientificidade e não pode admitir que, em uma sociedade 12 dividida, há concepções geradas pela Psicologia, que têm em seu cerne compromissos políticos conservadores – ou seja, que participam das relações de poder ao justificarem a exploração e a desigualdade inerentes ao modo de produção em vigor. Ao consenso da afirmação anterior e contrariando a alínea b do artigo 1.º do Código de Ética Profissional do Psicólogo, muito desses profissionais aceitam, de forma leviana, antiética e inconsequente, participar de demandas sem estarem preparadas a elas, tendo uma atuação muito aquém do que a Psicologia pode oferecer, demonstrando sequer ter consciência da importância social que seu trabalho produz, decidindo sobre vidas e, na maioria das vezes, ignorando o item 2.1 da resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP) N.º 007/2003, ensejando e perpetuando a segregação, a violação dos direitos humanos e a manutenção de estruturas de dominação e violência através da chancela de um pseudoconhecimento fundamentado pela condição em ser psicólogo. Impreterivelmente isso leva a se questionar sobre fenômenos como a atuação do psicólogo no sistema jurisdicional; avaliações psicológicas e laudos psicológicos, levando-nos ao cerne da questão, que é a formação desse profissional, Mello & Patto (2012 p.19/20) afirmam que, apesar de antiga, a crítica filosófica de teorias da Psicologia tidas como puramente ideológica, que visam fundamentar e perpetuar uma sociedade injusta, não são contempladas na maioria dos cursos superiores de formação de psicólogos que: Cada vez mais, limitam-se ao fornecimento de algumas receitas técnicas de avaliação psicológica e de psicoterapia, sem qualquer atenção para uma formação intelectual dos psicólogos que lhes permita pensar o próprio pensamento da Psicologia que lhes é ensinada. Um profissional cujo trabalho é realizado no âmbito de uma instituição que o coloca no âmago de sentimentos tumultuados inerentes aos dramas familiares não pode, em momento algum, deixar de ter presentes os dilemas maiores da profissão. Trabalhar com juízes, peritos, crianças e famílias às voltas com a justiça exige não só uma formação teórica à altura dos desafios que o psicólogo vai enfrentar, mas também reflexão, sensibilidade ética e atenção redobrada às pessoas envolvidas a às propostas oficiais para a solução de seus problemas. Diante disso, é urgente que se repense a democratização do ensino superior em detrimento a massificação que já demonstrou seu fracasso e seu perigo social. 13 Capítulo III – O caminho Diante do exposto no capítulo anterior há que se fomentar o debate sobre a formação do psicólogo,com o intuito de avançar nas questões acerca da prática profissional de um modo geral e principalmente, ao que nos propomos discutir, nas intervenções que subsidiam a demanda jurisdicional e, consequentemente, decidem sobre as vidas das pessoas envolvidas. Para tanto é mister que se amplie o debate sobre os fenômenos da massificação e da mercantilização do ensino superior, que priorizam o “saber fazer” em detrimento a formação crítica necessária as diversas profissões humanistas que ensejam o “ser” (ARENDT, 1957). Nesse sentido destaca se os quatro pilares, apresentados por Jacques Delors (1998) no Relatório da Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI, que deveriam ser norteadores da política educacional, sendo eles: Aprender a ser; a fazer; a viver juntos e a conhecer. Apesar de ter entusiasmado a comunidade educacional brasileira quando da sua apresentação, esses quatro eixos estão distantes de serem predominantes em nosso sistema educacional. Além desses quatros eixos norteadores, devia se introduzir como elementos essenciais para toda politica educacional em nosso país, os sete saberes fundamentais apresentados por Morin (1999 p.13): “Há sete saberes fundamentais que a educação do futuro deveria tratar em toda sociedade e em toda cultura, sem exclusividade nem rejeição, segundo modelos e regras próprias a cada sociedade e a cada cultura”. Sendo esses saberes: I – As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão. Todo conhecimento comporta o risco do erro e da ilusão (p. 19). Esse primeiro saber, proposto por Morin, vem totalmente ao encontro do cerne das questões nesse artigo levantadas, pois o primeiro saber trata da miserabilidade do saber, ou seja, que o saber, para considerar se como tal, necessita da permissão de limitar se a profundidade; espaço; e tempo. Sendo assim, já na sua formação, o psicólogo deve se apropriar das limitações impostas à psicologia, como ciência humana, sem entretanto diminuir seu valor epistemológico. II- Os princípios do conhecimento pertinente. O conhecimento dos problemas chaves, das informações-chave relativas ao mundo, por mais aleatório e difícil que seja, deve ser tentado sob pena de imperfeição cognitiva, mais ainda quando o contexto atual de qualquer conhecimento político, 14 econômico, antropológico, ecológico... é o próprio mundo. A era planetária necessita situar tudo no contexto planetário. (p.35) Articular os conhecimentos inerentes à profissão que se pretende atuar com os demais conhecimentos é fundamental à boa pratica humana. É necessário que o profissional tenha uma visão sistêmica de mundo, mesmo que, naturalmente, sua atuação seja respaldada por uma abordagem específica, esse enfoque deve se considerar o saber que o cerca, muitas vezes concordando ou refutando aquilo em que se defende. Pois o saber psicológico não pode ignorar o saber advindo da filosofia, sociologia, antropologia, como muitos outros saberes. III- Ensinar a condição Humana. “A educação do futuro deverá ser o ensino primeiro e universal, centrado na condição humana”. (p.47). É fundamental na formação do ser humano que esse se reconheça como ser humano, bem como aqueles que o cercam, pois é a partir do reconhecimento de sua própria humanidade que se acessa a sociedade, considerando seu contexto e diversidade cultural, entretanto não se esquecendo que a condição humana é única e o saber deve situar o ser em seu universo e não separá-lo dele. IV- Ensinar a identidade terrena. “É preciso que compreendam tanto a condição humana no mundo como a condição do mundo humano, que, ao longo da história moderna, se tornou condição da era planetária”. (p.63) Bem como é fundamental o conhecimento sobre a condição humana, ter consciência da condição do mundo é imprescindível a formação do ser, pois a condição humana é inerente a condição do mundo e somente a partir do conhecimento dessas premissas que se poderá ter uma consciência de ser-no-mundo e, por consequência, ser um cidadão-profissional consciente de si e do mundo, tendo responsabilidade em suas ações. V- Enfrentar as incertezas. “Ainda não incorporamos a mensagem de Eurípedes, que é a de estarmos prontos para o inesperado. O fim do século XX foi propício, entretanto, para compreender a incerteza irremediável da história humana”. (p.79). As mudanças são inerentes à história da humanidade, estar consciente dessa dinâmica, portanto é fundamental que em sua formação o ser perceba a imperenidade do saber, bem como do ser. VII- A ética do gênero humano. Os indivíduos são mais do que produtos do processo reprodutor da espécie humana, mas ao mesmo processo é produzido por indivíduos a cada geração. As interações entre indivíduos produzem a sociedade e esta retroage sobre destas interações, reúne-as, pois, em sentido pleno: apoiam-se, nutrem-se e reúnem-se. 15 Não há que se falar em um saber sustentável se esse não se pautar em um saber ético. Compreender a ética do gênero humano, sua dinâmica e vicissitude é fundamental na construção do “ser” se sobrepondo a formação do “saber fazer”. Partindo dessas premissas educacionais, bem como as demais propostas apresentadas, pode se avançar em questões tidas como complexas, mas possíveis de serem superadas no que tange ao ensino superior e a verdadeira formação profissional. 16 Considerações finais O fenômeno da instrumentalização do ensino superior para que se atenda a lógica capitalista e mercantilista não é recente. Segundo Schwartzman (1992), há muito que a única exigência ao que sai da universidade é que se desempenhe sua profissão de modo a atender o que o mercado exige. Como muito bem disse Arendt (1957), o “saber fazer” se sobrepõe a formação ética e consciente do ser humano e profissional. É preciso que a academia retorne ao seu lugar de construção do saber e, consequentemente, de seres capazes de realmente dar sua contribuição para a elaboração de uma sociedade mais justa (DELORS 1998). Diante dessas premissas que esse artigo se propõe a fomentar essa dinâmica, que não tem outro caminho se não o de reconhecer as falhas e interesses envolvidos no ensino superior. Há interesses para quem lucra com esse mercado, bem como para quem lucra com o desempenho da mão de obra oriunda dele. Somente a partir de um amplo debate e com uma luta incessante contra esses interesses é que poderemos avançar nessa questão tão fundamental a qualquer tipo de desenvolvimento que se possa imaginar para nossa sociedade. Para tanto é necessário que os profissionais envolvidos com a prática psicológica assim como a sociedade como um todo, se mobilizem em torno do que poderia ser chamado de marco inicial dessa luta ou, ainda, como três compromissos com a Psicologia e com a própria sociedade, propostos por Sylvia Leser de Mello e Maria Helena Sousa Patto (2012 p. 20), já citados aqui. Esses três compromissos em que sociedade e profissionais cobram das autoridades na área do ensino superior, do Conselho Federal de Psicologia e dos Conselhos Regionais de Psicologia: 1º: Que se faça uma avaliação rigorosa dos cursos de Psicologia, com o intuito de se pensar na democratização do ensino superior e não na massificação mercantilista nociva à toda profissão; 2º Que o Conselho Federal de Psicologia fomente uma discussão nacional, ampla e contínua sobre a formação de psicólogos. Deve se evitar o risco que tal discussão siga o caminho do controle e patrulhamento ideológico, que muitas vezes mais atende o apelo da reservade mercado do que da evolução da ciência profissão em si, como ocorre com outras áreas do 17 saber, entretanto é extremamente necessário que esse fórum permanente seja instituído, para que a Psicologia seja pensada e repensada desde as cadeiras acadêmicas, podendo assim contribuir para a produção do conhecimento científico em torno dela. Para tanto é conveniente o debate sobre o currículo e avaliação no ensino superior, tornando os conveniente ao contexto que eles servem; 3º A impunidade já percebida e declarada por Patto (A Formação de Psicólogos e relações de poder: Sobre a miséria da Psicologia. 2012) e por Shine (A espada de Salomão: a disputa de guarda dos filhos, 2003 e Andando no fio da navalha: riscos e armadilhas na confecção de laudos psicológicos para a justiça, 2009) colabora e alimenta à má atuação de muitos psicólogos, muito bem conceituado por Mello e Patto (2012): O que certamente encanta muitos desses profissionais mal formados intelectual e profissionalmente é o poder de dizer sobre o íntimo das pessoas que lhes é socialmente outorgado e considerado o único discurso competente para esse fim. Inebriados por essa autorização, muitos deles sentem-se livres para dizer o que entendem, certos da impunidade. P. 19... Estamos diante de um quadro gravíssimo e inaceitável, não só porque há psicólogos vitimando pessoas, mas também porque a credibilidade de um saber e de uma profissão que contam com excelentes pesquisadores e profissionais, capazes de contribuir para a construção da cidadania, está ameaçada p. 20 Além dessa importante análise feita por Mello e Patto, deve se considerar também as estatísticas trazidas por Shine (2005) que foi pesquisado um grupo de processos disciplinares no Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-06) contra psicólogos em que se foi constatada apenas 3,2%, dentro da amostragem, de punições com suspensão de exercício da profissão por 30 dias (in PATTO 2012, pag. 44), ou seja, relativamente uma punição branda perto do universo de casos e potencial ofensivo dos atos praticados. Por isso é extremamente urgente e necessário que o Conselho Federal de Psicologia e seus Conselhos Regionais busquem mecanismos eficazes que possibilitem apurações isentas sobre a má conduta profissional, respeitados os Direitos Constitucionais do contraditório e ampla defesa, evitando assim a caça as bruxas, mas também o corporativismo, imputando a restrição ao exercício da profissão de psicólogo por quem não está preparado para isso. Ao se assumir esses três compromissos, automaticamente se inicia uma nova dinâmica de recuperação do ensino superior em Psicologia e, automaticamente, o resgate dessa importante 18 Ciência e Profissão, possibilitando o retorno ao seu lugar de fomento da cidadania e paz social. 19 REFERÊNCIAS AMARAL, A. & MAGALHÃES, A. (2000). O conceito de Stakeholder e o novo paradigma do ensino superior. Rev. Portuguesa de Educação, v 13, n. 002, p. 7-28. ANASTASI, A. (1968). Testes psicológicos. (D. M. LEITE, trad.) (2ª. ed.). São Paulo: EPU. (1977). 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