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PARCERIA RURAL

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CONTRATO DE PARCERIA RURAL
1.CONCEITO 
O contrato de parceria rural é o instrumento por meio do qual uma pessoa -chamada parceiro outorgante - se obriga a ceder à outra - chamada parceiro outorgado - imóvel rural, animais ou máquinas e implementos agrícolas, com o objetivo de empreenderem, juntos, determinada atividade rural. É uma espécie de contrato agrário, regido pela Lei n.º 4.504/64 do Estatuto da Terra, com base no artigo 96 e incisos, e seu respectivo Regulamento - Decreto n.º 59.566/66.
A definição da parceria rural é trazida pelo artigo 96 do Estatuto da Terra e artigo 4° e 5° do Regulamento citado, como:
[ ... ] o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso específico de imóvel rural, de parte ou partes dele, incluindo, ou não, benfeitorias, outros bens e/ou facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa vegetal ou mista; e/ou lhe entrega animais para cria, recria, invernagem, engorda ou extração de matérias-primas de origem animal, mediante partilha, isolada ou cumulativamente, dos seguintes riscos: I- caso fortuito e de força maior do empreendimento rural; II - dos frutos, produtos ou lucros havidos nas proporções que estipularem, observados os limites percentuais estabelecidos no inciso VI do caput deste artigo e; III – variações de preço dos frutos obtidos na exploração do empreendimento rural.
Embora tal enunciado prescritivo afirme que o contrato de parceria pode ser firmado por tempo indeterminado, sua interpretação não pode ser conflitante com a lei que está sendo regulamentada - Estatuto da Terra - que prevê em seu artigo que "o prazo dos contratos de parceria, desde que não convencionados pelas partes, será no mínimo de três anos (...)". Portanto, a interpretação coerente com este dispositivo legal é a seguinte, não se estabelecendo o prazo no contrato o dizer que o mesmo é indeterminado, equivale a estipulá-lo em três anos.
O parágrafo único do art. 4º do decreto n.º 59.566/66, por sua vez, define as partes contratantes nos seguintes termos:
Parágrafo único: Para os fins deste Regulamento denomina-se parceiro-outorgante, o cedente, proprietário ou não, que entrega os bens; e parceiro-outorgado, a pessoa ou o conjunto familiar, representado pelo chefe, que os recebe para os fins próprios das modalidades de parceria definidas no art. 5º .
Quanto ao parágrafo único do artigo 4º do referente decreto mencionado acima, podemos analisar que, o parceiro-outorgante não precisa ser o efetivo proprietário do imóvel ou dos produtos cedidos, podendo ser, em consequência, mero possuidor, enfiteuta ou usufrutuário. Em relação ao parceiro-outorgado, revela-se importante a menção do conjunto familiar em sua representação, conferindo à família do agricultor ou pecuarista que contrata com o parceiro outorgante as mesmas atribuições constantes no contrato de parceria. A jurisprudência do STJ tem admitido a transmissão da obrigação aos herdeiros, em caso de falecimento do parceiro, figurando aqueles no polo passivo de ação de prestação de contas que tenha como objeto contrato de parceria rural.
2. NATUREZA CONTRATUAL:
a.  Bilateral, por decorrer do acordo de duas ou mais vontades, criando obrigações recíprocas; 
 b.  Oneroso, porque um dos contratantes permite que o outro se ocupe de imóvel rural ou utilize animais por certo tempo, mediante distribuição convencional dos frutos, produtos e lucros produzidos.
 c. Consensual, por não exigir forma especial para a sua celebração, podendo ser provado por qualquer meio admitido em direito. Mas para valer contra terceiro, terá que ser transcrito no Registro de Imóveis; "No Registro de Títulos e Documentos será feita a transcrição do contrato de parceria agrícola ou pecuária";
 d.   Aleatório, já que a prestação dependerá de risco futuro e incerto, não se podendo antecipar o montante;
 e.  "intuitu personae", porque estabelece um vínculo de natureza personalíssima; 
3. TIPOS DE PARCERIA RURAL
São espécies de contrato de parceria (art. 5º do Decreto n.º 59.566/66): 
Art. 5º - Dá-se a parceria:
I – agrícola, quando o objeto da cessão for o uso de imóvel rural, de parte ou partes do mesmo, com o objetivo de nele ser exercida a atividade de produção vegetal;
II – pecuária, quando o objetivo da cessão forem animais para cria, recria, invernagem ou engorda;
III – agroindustrial, quando o objeto da cessão for o uso do imóvel rural, de parte ou de partes do mesmo, e/ou maquinaria e implementos com o objetivo de ser exercida atividade de transformação de produto agrícola, pecuário ou florestal;
IV – extrativa, quando o objeto da cessão for o uso de imóvel rural, de parte ou partes do mesmo, e/ou animais de qualquer espécie com o objetivo de ser exercida atividade extrativa de produto agrícola, animal ou florestal;
V – mista, quando o objeto da cessão abranger mais de uma das modalidades de parceria definidas nos incisos anteriores.
A parceria agrícola se dá quando o parceiro outorgante cede o imóvel rural para que o parceiro outorgado nele exerça a atividade de produção vegetal (milho, soja, etc.).
A parceria pecuária, por sua vez, é quando o parceiro outorgante cede os animais para cria, recria, invernagem ou engorda, podendo também incluir o uso de certo imóvel rural. Ressalta-se que, apesar de se chamar parceria pecuária, essa modalidade não abrange apenas a cultura pecuária (bois, porcos, cabras, etc), mas também outras culturas de animais, como aves (parceria aviária) e até mesmo abelhas (parceria apiária).
A parceria agroindustrial é quando o parceiro outorgante cede o imóvel rural ou máquinas e implementos agrícolas para o desenvolvimento de atividade de transformação de produto agrícola, pecuário ou florestal (produção de poupas de frutas, produção de couros e produção de óleos vegetais, por exemplo).
A parceria extrativa é quando o parceiro outorgante cede o imóvel rural ou animais para extrair produto agrícola, animal ou florestal (atividade seringueira ou corte de árvores, por exemplo).
Por fim, a parceria mista, quando o objeto da cessão abranger mais de uma das modalidades citadas.
4. PARTICIPAÇÃO DO PARCEIRO OUTORGANTE NOS FRUTOS DA PARCERIA
A legislação agrária limita a participação do parceiro outorgante nos frutos da parceria. Isso porque ela tem por objetivo proteger o pequeno e médio produtor rural (no caso, o parceiro outorgado), que é a pessoa que desenvolve a atividade rural. Atualmente, se encontram em vigor os seguintes limites de participação , conforme reza o inciso VI do art. 96 do Estatuto da Terra:
VI - na participação dos frutos da parceria, a quota do proprietário não poderá ser superior a:
a) 20% (vinte por cento), quando concorrer apenas com a terra nua; 
b) 25% (vinte e cinco por cento), quando concorrer com a terra preparada;
 c) 30% (trinta por cento), quando concorrer com a terra preparada e moradia;
 d) 40% (quarenta por cento), caso concorra com o conjunto básico de benfeitorias, constituído especialmente de casa de moradia, galpões, banheiro para gado, cercas, valas ou currais, conforme o caso; 
e) 50% (cinquenta por cento), caso concorra com a terra preparada e o conjunto básico de benfeitorias enumeradas na alínea d deste inciso e mais o fornecimento de máquinas e implementos agrícolas, para atender aos tratos culturais, bem como as sementes e animais de tração, e, no caso de parceria pecuária, com animais de cria em proporção superior a 50% (cinquenta por cento) do número total de cabeças objeto de parceria; 
f) 75% (setenta e cinco por cento), nas zonas de pecuária ultra-extensiva em que forem os animais de cria em proporção superior a 25% (vinte e cinco por cento) do rebanho e onde se adotarem a meação do leite e a comissão mínima de 5% (cinco por cento) por animal vendido;
 g) nos casos não previstos nas alíneas anteriores, a quota adicional do proprietário será fixada com base em percentagem máxima de dez por cento do valor das benfeitoriasou dos bens postos à disposição do parceiro;
Artigo. 35, § 3º do Decreto 59.566/66 é claro ao dispor também que:
“não valerão as avenças de participação que contrariarem os percentuais fixados neste artigo, podendo o parceiro prejudicado reclamar em Juízo contra isso e efetuar a consignação judicial da cota que, ajustada aos limites permitidos neste artigo, for devida ao outro parceiro, correndo por conta deste todos os riscos, despesas, custas e honorários advocatícios”.
Verificamos, portanto, que a progressão do percentual devido ao parceiro-outorgante, a título de participação na divisão dos frutos, decorre de sua maior ou menor contribuição no sentido de proporcionar melhores condições de trabalho para o parceiro-outorgado, seja pelo fornecimento de benfeitorias ou de animais, seja pela disponibilização de máquinas etc.
Excepcionalmente, nos casos em que não houver culpa das partes contratantes, como no caso fortuito e na força maior, havendo perda parcial, repartir-se-ão os prejuízos havidos, na proporção estabelecida para cada contratante. Ambos os contratantes sofrerão o risco do empreendimento, pois os frutos, produtos e lucros são repartidos de acordo com a participação, estabelecida a porcentagem em lei, atentando-se para a boa-fé e para o equilíbrio obrigacional entre as partes.
5. DAS CLÁUSULAS OBRIGATÓRIAS DOS CONTRATOS DE PARCERIA
O inciso V do art. 96 do Estatuto da Terra, traz consigo as cláusulas que constarão, obrigatoriamente, em todas as espécies de contrato de parceria, in verbis:
V - no Regulamento desta Lei, serão complementadas, conforme o caso, as seguintes condições, que constarão, obrigatoriamente, dos contratos de parceria agrícola, pecuária, agroindustrial ou extrativa:
a) quota-limite do proprietário na participação dos frutos, segundo a natureza de atividade agropecuária e facilidades oferecidas ao parceiro;
b) prazos mínimos de duração e os limites de vigência segundo os vários tipos de atividade agrícola;
c) bases para as renovações convencionadas;
d) formas de extinção ou rescisão;
e) direitos e obrigações quanto às indenizações por benfeitorias levantadas com consentimento do proprietário e aos danos substanciais causados pelo parceiro, por práticas predatórias na área de exploração ou nas benfeitorias, nos equipamentos, ferramentas e implementos agrícolas a ele cedidos;
f) direito e oportunidade de dispor sobre os frutos repartidos.
6. DA CONFIGURAÇÃO DE RELAÇÃO EMPREGATÍCIA NO CONTRATO DE PARCERIA
O parágrafo único do art. 96 do Estatuto da Terra traz importante disposição acerca da possibilidade de o contrato de parceria ser desconfigurado para uma relação de cunho empregatício, se restarem caracterizados os requisitos essenciais do contrato laboral.
Assim dispõe o citado dispositivo legal:
"Parágrafo único - Os contratos que prevejam o pagamento do trabalhador, parte em dinheiro e parte percentual na lavoura cultivada, ou gado tratado, são considerados simples locação de serviço, regulada pela legislação trabalhista, sempre que a direção dos trabalhos seja de inteira e exclusiva responsabilidade do proprietário, locatário do serviço a quem cabe todo o risco, assegurando-se ao locador, pelo menos, a percepção do salário-mínimo no cômputo das duas parcelas".
Portanto, observamos que o primeiro fator que colabora para a desconfiguração do contrato de parceria vem a ser o pagamento parcial em dinheiro ao parceiro-outorgado. A direção dos trabalhos, mediante inteira e exclusiva responsabilidade do parceiro-outorgante traz consigo outros requisitos da relação empregatícia, a saber:
a) subordinação, caracterizada pela direção e inteira responsabilidade dos trabalhos pelo parceiro-outorgante;
b) pessoalidade, que é a estrita relação do parceiro-outorgado com o parceiro-outorgante, caracterizada pela exclusividade que este tem na direção dos trabalhos.
Ocorrendo, concomitantemente, estas hipóteses, a relação de parceria cederá lugar à relação empregatícia, razão pela qual as regras aplicáveis serão as constantes na legislação trabalhista.
7. NORMAS GERAIS
7.1 DO DIREITO À CONCLUSÃO DA COLHEITA PENDENTE:
Já tivemos a oportunidade de mencionar alhures a primeira parte do inciso I do art. 96 do E.T., no que toca ao prazo mínimo do contrato de parceria, que será de três anos. Agora, cumpre-nos verificar a segunda parte do referido dispositivo legal, a qual reza que é assegurado ao parceiro a conclusão da colheita pendente, mesmo com a expiração do prazo avençado.
Trata-se, na verdade, de uma regra que é decorrência lógica do consagrado princípio geral do direito que veda o enriquecimento ilícito.
7.2 DO DIREITO DE "PREFERÊNCIA" DO PARCEIRO-OUTORGADO:
Reza o inciso II do art. 96 do E.T. que "expirado o prazo, se o proprietário não quiser explorar diretamente a terra por conta própria, o parceiro, em igualdade de condições com estranhos, terá preferência para firmar novo contrato".
7.3 DAS DESPESAS COM O TRATAMENTO E CRIAÇÃO DOS ANIMAIS:
O E.T. prescreve, no inciso III do art. 96, que "as despesas com o tratamento e criação dos animais, não havendo acordo em contrário, correrão por conta do parceiro tratador e criador". Nada mais coerente, posto que é o parceiro-outorgado (tratador e criador) a pessoa que cultiva e explora diretamente o empreendimento, seja este de que natureza for.
7.4 DO DIREITO À MORADIA HIGIÊNICA E À ÁREA PARA PLANTIO E CRIAÇÃO DE ANIMAIS
Dispõe o inciso IV do art. 96 do E.T. que "o proprietário assegurará ao parceiro que residir no imóvel rural, e para atender ao uso exclusivo da família deste, casa de moradia higiênica e área suficiente para horta e criação de animais de pequeno porte".
Esse preceito legal deixa entrever a preocupação do legislador de 64 em conferir uma maior proteção à família do parceiro-outorgado, partindo da presunção de que este é a parte economicamente hipossuficiente na relação contratual, o que não deixa de ser razoável, haja vista integrarem esta posição, em geral, pessoas do campo que não possuem uma renda satisfatória para suprir, com dignidade, as necessidades vitais de sua família, que é, quase sempre, bastante numerosa.
7.5 DA APLICABILIDADE SUBSIDIÁRIA DAS NORMAS PERTINENTES AO ARRENDAMENTO RURAL E DAS REGRAS DO CONTRATO DE SOCIEDADE:
Isso é o que prescreve o inciso VII do art. 96 do E.T., a seguir transcrito:
"VII - aplicam-se à parceria agrícola, pecuária, agropecuária, agroindustrial ou extrativa as normas pertinentes ao arrendamento rural, no que couber, bem como as regras do contrato de sociedade, no que não estiver regulado pela presente Lei".
8. DAS FORMAS DE EXTINÇÃO E RESCISÃO NOS CONTRATOS DE PARCERIA
No que diz respeito as causas de extinção dos contratos agrários, estas estão elencadas no art. 26 do Decreto n.º 59.566/66, in verbis:
Art 26. O arrendamento se extingue:
I - pelo término do prazo do contrato e do de sua renovação;
II - pela retomada;
III - pela aquisição da gleba arrendada, pelo arrendatário;
IV - pelo distrato ou rescisão do contrato;
V - pela resolução ou extinção do direito do arrendador;
VI - por motivo de fôr maior, que impossibilite a execução do contrato;
VII - por sentença judicial irrecorrível;
VIII - pela perda do imóvel rural;
IX - pela desapropriação, parcial ou total, do imóvel rural;
X - por qualquer outra causa prevista em lei.
Embora haja a referência ao "arrendatário" e ao "arrendador", tais causas também são aplicáveis aos contratos de parceria pelo que dispõe o inciso VII do art. 96 do E.T.
9. DIFERENÇAS ENTRE A PARCERIA E O ARRENDAMENTO RURAL
Ao contrário do que ocorre no contrato de parceria, no arrendamento, o produtor se compromete a pagar um aluguel periódico. Assim, ainda que a atividade rural desenvolvida no imóvel arrendado não dê lucro, o produtor deverá entregar ao proprietário este valor.
Situação contrária ocorre na parceria, em que o pagamento está condicionado aos frutos percebidos pelo produtor no desenvolvimento da atividade. Nesse contrato, o produtor rural entrega ao proprietário parte daquiloque foi produzido. O valor varia, portanto, de acordo com os resultados da atividade. Isso ocorre, pois, na parceria - como o próprio nome diz - as partes são parceiras no negócio, respondendo conjuntamente não só pelos lucros obtidos, mas também pelos prejuízos. Os prejuízos apenas serão arcados com exclusividade por uma das partes se tiverem ocorrido por sua culpa.

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