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INICIAL REVISIONAL - ARRENDAMENTO MERCANTIL

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Arrendamento mercantil - inicial - pedido de liminar - ação ordinária
EXMO. SR. DR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE ........................
OBJETO: AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE LIMINAR.
FULANO DE TAL, brasileiro, divorciado, contador, residente e domiciliado na Av. ............, nº ........, apt. ........., ................., inscrito no CPF sob o nº ..................., neste ato representado por seu procurador firmatário, ut instrumento de mandato anexo, com escritório na Rua .................., nº ............, onde recebe intimações, vem, respeitosamente, a Vossa Excelência, propor AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA contra CIA............. DE ARRENDAMENTO MERCANTIL, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CGC/MF sob  nº ..................., com sede na Avenida .............., nº ........., cidade de ........., e filial em ........., na Rua ............., nº ........., pelos seguintes fatos e fundamentos:
 1. OS FATOS.
Em ................, o requerente adquiriu um automóvel .................., ano ........, modelo ..........., diesel, azul escuro mica metálico, chassi nº ...................,  mediante firmatura de contrato  de  leasing vinculado a variação cambial, identificado sob o nº ........., entabulado com a requerida.
A contratação foi  realizada da seguinte maneira: o autor, a título de antecipação do Valor Residual Garantido = VRG, adiantou o montante de R$ 36.792,95, sendo o restante parcelado em 24 (vinte e quatro) parcelas  de R$ 846,29 (oitocentos e quarenta e seis reais e vinte e nove centavos), corrigidas pela variação cambial do dólar norte-americano - cláusula 1.13 do contrato; adiantamento do VRG que ao fim e ao  cabo empresta ao leasing tinturas de verdadeira compra e venda com financiamento.
O autor efetuou onze pagamentos à financeira, faltando para a quitação do contrato treze parcelas.
Entretanto, com advento da atual crise econômica que assola o país  e que desestabilizou a paridade da equação fundamental do contrato,  tornou-se impossível para o demandante conseguir adimplir as parcelas modo tempestivo, por isso que as mesmas sofreram aumento descomunal.
É evidente que o declínio da atividade econômica nacional, omitida da população brasileira ao longo do ano eleitoral de 1.998, teve considerável parcela de responsabilidade na crise imposta a praticamente todas as empresas nacionais e particulares; importante considerar, nesse ideário, que as partes aqui assinaram contrato de leasing atrelado a variação cambial, na esteira das diretrizes preconizadas pela grande imprensa, e especialmente pelo governo, que acenavam para a conjuntura econômica estabilizada e ancorada ao dólar.  E, no quanto a realidade revelou-se diversa, não é razoável o prejuízo desmesurado de uma das partes em prol do enriquecimento sem causa da outra.
Assim, pela pena do Sr. Presidente do Banco Central do Brasil, que introduziu a política governamental de liberação do câmbio, no dia 15 de janeiro do corrente ano, veio, também,  a duplicação do débito em reais para o autor, sem que o mesmo tenha contribuído para tanto e tampouco houve ou há movimento inflacionário a justificar o aumento nominal da dívida, da forma verificada.
Como já referido, o requerente pagou a título de entrada do Valor Residual Garantido (VRG) o valor de R$ 36.792,95, representativos de 70,517% do preço do bem arrendado, restando o saldo parcelado em 24 prestações de R$ 846,29 (a prestação na firmatura do contrato equivalia  a cerca de US$ 770,00), corrigidos pela variação cambial.  A camionete adquirida possuía na época da aquisição o valor de R$ 52.176,00, o autor adiantou R$ 36.792,95 e a financeira alcançou apenas e tão-somente R$ 15.383,05.
Ocorre que a prestação na presente data alcança a inimaginável soma de R$ 1.537,00, que multiplicados pelo nº de prestações (13)  restantes atinge o astronômico valor de R$ 19.991,00. Isto sem  se falar nas onze já adimplidas.
A prestação que teve mínima variação no primeiro ano da contratação, aumentou no último mês cerca de 80% (cotação do dólar em cerca de R$ 2,00).
 Por tal razão, a manutenção do presente contrato nos moldes em que firmado  trará, sem sombra de dúvidas, um enriquecimento injustificado para o requerido, pois o aumento do valor da parcela do leasing é fruto de  especulação financeira que não condiz com os índices de inflação experimentados pelo mercado de consumo brasileiro.
A desvalorização da moeda nacional frente ao dólar norte americano não significa inflação e, consequentemente, o contrato não pode mais vigorar atrelado a variação cambial, sob pena de possibilitar ao réu um enriquecimento sem causa.
E nem se fale que a financeira necessitou captar recursos no exterior, pois o veículo foi pago à vista, não necessitando o demandado de buscar  recursos no exterior, o que justificaria, por amor a dialética, o aumento da prestação em dólares.
O suporte fático, por essas linhas delimitado, autoriza o pedido de tutela jurisdicional, aos efeitos de adaptar o negócio jurídico à realidade econômica, que nele subjaz, e de escoimá-lo da deformação provocada pela mudança de rumos na política econômica e cambial do País.
Impõe-se, destarte, a revisão do negócio jurídico por diversos fundamentos que serão a seguir alinhavados.
2. DO DIREITO.
2.a) O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ E A TEORIA DA BASE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
O autor persegue com esta demanda a revisão judicial do contrato, para através de prestação jurisdicional acertar o negócio jurídico relativamente ao preço das prestações do contrato de leasing,  projetadas, hoje em dia, em valor despregado e muito acima do razoável.
O contrato de leasing, à semelhança de todo e qualquer contrato oneroso, assenta-se sobre uma determinada base econômica, que deve ser mantida e preservada ao longo de toda a vida do negócio jurídico.
Luis Díez-Picazo, tem razão quando pondera que a "ordem econômica consiste num sistema articulado de produção de bens econômicos e de distribuição dos mesmos. Não custa dizer que ao falarmos de bens econômicos, incluímos bens em sentido estrito e serviços. Se a produção juridicamente considerada se abandona às decisões das empresas, privadas ou públicas, tem que se estabelecer relações jurídicas de direito privado para determinar o intercâmbio de bens, que é a transferência de bens de uma mão à outra e a prestação dos serviços (...). Se partimos destas idéias essenciais, não é difícil chegar à conclusão de que nossa ordem econômica se apóia sobre a regra de que toda a transferência de bens e serviços entre as pessoas deve estar fundada no postulado da comutatividade" ("Fundamentos del Derecho Civil Patrimonial", vol. 1, 2ª ed., TECNOS, p. 48).
Entretanto, se a equação assentada nesse postulado de comutatividade se desvirtua, seja no momento genético da contratação, seja na fase de adimplemento das prestações ou, mesmo, "pos pactum finitum", assiste, por certo, ao contratante lesado pelo desvirtuamento da eqüiponderância das prestações o direito de remodelar o contrato, em nome dos valores da ética e da moral, que em direito obrigacional estão sintetizados no princípio da boa fé.
"O princípio da boa fé endereça-se sobretudo ao juiz e o instiga a formar instituições para responder aos novos fatos, exercendo um controle corretivo no Direito estrito, ou enriquecedor do conteúdo da relação obrigacional, ou mesmo negativo em face do Direito postulado pela outra parte. A principal função é a individualizadora, em que o juiz exerce atividade similar à do pretor romano, criando o 'Direito do caso'. O aspecto capital para a criação judicial é o fato de a boa fé possuir um valor autônomo, não relacionado com a vontade. Por ser independente da vontade, a extensão do conteúdo da relação obrigacional já não se mede com base somente nela, e, sim, pelas circunstâncias ou fatos referentes ao contrato, permitindo-se 'construir' objetivamente o regramento do negócio jurídico, com a admissão de um dinamismo que escapa, por vezes,até mesmo ao controle das partes. Essa concepção objetiva da relação obrigacional assemelha-se, muito embora a diversidade conceitual, à interpretação objetiva da lei. Também quanto a esta última, vigorou, em princípio, a interpretação da 'vontade' do legislador e, somente mais tarde, chegou-se à própria hermenêutica objetiva da lei, que prevalece, hoje, na maioria dos países" (Clóvis do Couto e Silva, artigo denominado 'O Princípio da Boa Fé no Direito Brasileiro e Português', 'in' "Estudos de Direito Civil Brasileiro e Português", vários autores, editora Revista dos Tribunais, 1.980, p. 54).
Ainda anteriormente ao advento do Código de Defesa do Consumidor, época em que foi elaborado o artigo doutrinário acima mencionado, o saudoso professor Clóvis do Couto e Silva teve oportunidade de sustentar que, mesmo no silêncio da legislação objetiva, o princípio da boa fé teria aplicação em nosso sistema jurídico obrigacional. Comentou, alhures, o eminente civilista que no "Direito brasileiro poder-se-ia afirmar que, se não existe dispositivo legislativo que o consagre, não vigora o princípio da boa fé no Direito das Obrigações. Observe-se contudo ser o aludido princípio considerado fundamental, ou essencial, cuja presença independe de sua recepção legislativa.(.....). Quando num código não se abre espaço para um princípio fundamental, como se fez com o da boa fé, para que seja enunciado com a extensão que se pretende, ocorre ainda assim a sua aplicação por ser o resultado de necessidades éticas essenciais, que se impõem ainda quando falte disposição legislativa expressa." (autor, artigo e obra citados, p. 61/62).
A dificuldade aparente e pelo mesmo pelo eminente professor superada, hoje em dia, diante do texto do Código de Defesa do Consumidor, encontraria na lei mais um argumento de defesa da aplicação do princípio da boa fé, que pelo veio do artigo 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, foi recebido em nosso conglomerado jurídico objetivo. Testemunha a favor da afirmação a cultura, nunca contestada, do ilustre Desembargador Antonio Janyr Dall'Agnol Júnior: "Alguns dados devem ser levados em conta, quando do exame do conteúdo do Código de Defesa do Consumidor (CDC, Lei n. 8.078, de 11.09.90), a fim de que o intérprete não se limite ao que nele consta, ignorando o que já se encontrava no sistema  de direito positivo do País e/ou as conseqüências de sua inserção nesse.
"Antes de mais, conveniente realçar a circunstância mesma do nascimento integrado a determinado sistema, o que implica ser influenciado, o que compreensível, mas, também, influenciar, realizando o fenômeno que, não raro, se denomina 'força expansionista'.
 
"(......)". "Da 'força expansionista' das regras que emergiram com o CDC dá bem idéia, mais de um lustro passado, a leitura que hoje se faz, com maior ou menor timidez, nos tribunais, de normas jurídicas que se encontram em outros corpos legislativos sobretudo os de Direito Privado. Caso modelar é o do princípio da boa fé. Não obstante emergente das regras jurídicas abrigadas pelo Código Civil, conforme sempre o reconheceu a melhor doutrina, pois se trata de proposição jurídica, com significado de regra de conduta, jamais encontrara, antecedentemente ao CDC, na jurisprudência, a consideração de que, a partir da vigência dele, veio a ter, expressa a cláusula no art. 51, IV.
"Entretanto, o dado de maior relevo, talvez, para a interpretação a mais correta possível, vem a ser a consideração para com duas técnicas de que se utilizou o Código: a da conceituação e a da equiparação.
"Mas é sobretudo com a técnica da equiparação que logrou o CDC alcance para além do eventualmente querido pelo próprio legislador. (.....).
"O jogo das técnicas adotadas permite a conclusão de que, ao lado de uma aplicação ampla, irrestrita do CDC, às operações estritamente de consumo, impõe-se o reconhecimento de aplicação menos ampla, restrita a algumas relações jurídicas, que se desenvolvem, porém, para além do que se denomina de relação de consumo" (autor citado, artigo denominado "Direito do Consumidor e Atividades Bancárias", AJURIS n. 72:247/248).
Portanto, o princípio da boa fé, enquanto instrumento de pulverização à relação contratual dos valores éticos essenciais, que justificam o dirigismo contratual do Estado, através do Poder Judiciário, com poderes, inclusive, de edificar ou modificar regras de conduta imanentes da declaração de vontade, sem dúvida alguma, pertence à nossa cultura jurídica e vige dentre nós, agora, após o Código de Defesa do Consumidor, com respaldo, também, em preceito legislativo expresso.
Como desdobramento do princípio da boa fé foi concebido pela doutrina, com referendo da jurisprudência, inclusive, brasileira, a denominada "teoria da base do negócio jurídico"; em Itália, também, chamada como teoria da "excessiva onerosidade" - "eccessiva onerosità" (verificar a respeito o artigo de responsabilidade do professor Clóvis do Couto e Silva - "O Princípio da Boa Fé no Direito Brasileiro e Português" - obra citada, p. 70); nome com o qual foi recebida, ainda, pelo Código de Defesa do Consumidor (artigo 6, V; artigo 51, IV, § 1º., III).
A teoria da base do negócio jurídico foi concebida por Oertemann no período do pós-guerra, para fazer frente ao grave influxo inflacionário que assolou a Europa e que ocasionou profundo desajuste nas relações contratuais.
Karl Larenz, o conceituado civilista tedesco, em obra memorável - "Base del Negocio Juridico y Cumplimiento de los Contratos" - desenvolveu a referida teoria, a partir das premissas seguintes: "No contrato bilateral, cada parte se obriga frente a outra a uma prestação, e o faz precisamente para obter a contraprestação fixada no contrato. A contraprestação é, a juízo de cada parte, o exato equivalente de sua própria prestação. (....). Um contrato 'bilateral' pressupõe sempre que cada um obtenha por sua prestação un equivalente (....). Se isso pertence à 'essencia' do contrato bilateral em si, constituindo sua peculiaridade específica e, por tanto, sua natureza jurídica, um contrato celebrado como bilateral perde seu sentido e caráter originários quando, em conseqüência de uma transformação das circunstâncias, a relação de equivalência se modifica tanto, que já não se pode falar de 'contraprestação', de um equivalente que possa considerar-se como tal. Em semelhante situação há de afirmar-se que 'a base' de todo o contrato desapareceu" (obra cit., ed. Revista de Derecho Privado, 1.956, p. 131; traduzido pelos signatários).
Na literatura portuguesa, Mário Júlio da Almeida Costa sintonizou a base do negócio com as "representações dos interessados, ao tempo da conclusão do contrato, sobre a existência de certas circunstâncias fundamentais, para a sua decisão, no caso de essas representações não terem sido meramente conhecidas, mas constituídas, por ambas as partes, em base do negócio, como, por exemplo, a igualdade de valor, em princípio, da prestação e da contraprestação nos contratos bilaterais (equivalência), a manutenção aproximada do preço convencionado, a possibilidade de repor a provisão de mercadorias e outras circunstâncias semelhantes" (autor citado, "Direito das Obrigações", Almedina, Coimbra, 3ª. Edição, 1.979, p. 243).
Adiante, o civilista com fincas no artigo 437, n. I, do Código Civil Português, concluiu que "se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afete gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato" (autor e obra citados, p. 247).
No direito brasileiro, o eminente Ministro Ruy Rosado Aguiar Jr., também, preocupou-se com a teoria em comentário, a qual definiu com apoio em lição de Menezes Cordeiro, como o "conjunto de circunstâncias, sem cuja existência, manutenção ou verificação futura, o escopo perseguido pelo negócioe determinado de acordo com o seu conteúdo, não pode ser obtido através do negócio, apesar dele ter sido devidamente concluído, e ainda que se realize o sacrifício exigível às partes, segundo o conteúdo negocial" ("Extinção dos Contratos por Incumprimento do Devedor (Resolução)", ed. AIDE, p. 145).
Clóvis do Couto e Silva pensou a questão do mesmo modo, ao alertar que se configura "a base do negócio jurídico, como conceito jurídico dos mais importantes, impondo-se o direito de resolução e o de modificação do contrato, quando as circunstâncias que serviram de base ao contrato se houverem modificado substancialmente. A disposição mais importante é a da revalorização das prestações, quando com a ampliação da equidade se estabelece novamente o equilíbrio perdido. Essa solução é mais consentânea com o negócio jurídico, que se reestrutura materialmente, do que a atribuição do direito de resolução, a outra faculdade titulada pela parte prejudicada" (autor e obra citados, p. 70).
A teoria da base do negócio teve o referendo do nosso Tribunal de Justiça, no julgamento do mandado de segurança n. 587.050.220, relatado pelo Ministro Ruy Rosado, quando Desembargador, e assim ementado: "CONTRATO. REVISÃO. ALTERAÇÃO DA BASE DO NEGÓCIO. Direito de o contratante pedir a revisão da cláusula contratual face à modificação das bases do negócio. Contrato de financiamento realizado ao tempo do Plano Cruzado, cujas prestações hoje se tornam excessivamente onerosas para o devedor" (RJTJRGS, 128:306).
O egrégio Superior Tribunal de Justiça, de igual modo, chancelou a aplicabilidade da teoria da base do negócio jurídico, ao julgar o Resp. 73.370 - AM, que resultou dotado da ementa seguinte: "PROMESSA DE COMPRA E VENDA. Resolução. Fatos supervenientes. Inflação. Restituição. A modificação superveniente da base do negócio, com aplicação de índices diversos para a atualização da renda do devedor e para a elevação do preço contratado, inviabilizando a continuidade do pagamento, pode justificar a revisão ou a resolução judicial contrato, sem ofensa ao artigo 6º. da  LICC".
A teoria da base do negócio mereceu consagração legislativa, no Brasil, com o nome de excessiva onerosidade, através do Código de Defesa do Consumidor (artigo 6, V; artigo 51, IV, § 1º., III), que deve ser lido, no contexto da lide, com a 'força expansionista' de que trata o eminente Desembargador Antonio Janyr Dall'Agnol Júnior.
E como observou o eminente professor Clóvis do Couto e Silva, a "teoria da base objetiva do negócio jurídico decorre de uma 'tensão' ou 'polaridade' entre os aspectos voluntaristas do contrato - aspecto subjetivo - e o seu meio econômico - aspecto institucional - o que relativisa, nas situações mais dramáticas, a aludida vontade, para permitir  a adaptação do contrato à realidade subjacente" ("A Teoria da Base do Negócio Jurídico no Direito Brasileiro", em "O Direito Privado brasileiro na visão de Clóvis do Couto e Silva", organizado pela professora Vera Maria Jacob Fradera, Livraria do Advogado, 1.997, 93/94; artigo publicado, também, na Revista dos Tribunais, p. 07).
Adiante, constatou o civilista, como se estivesse a proferir parecer destinado ao caso concreto, que o abuso na "fixação dos preços modifica o conteúdo do contrato em seu ponto mais sensível, na relação de equivalência entre a mercadoria e o preço" (idem, p. 95), fator de desajuste do equilíbrio contratual, eqüivale dizer rompimento da base do negócio, que autoriza o juiz adaptá-lo à realidade subjacente, inclusive, para impor a "reparação ou complementação do preço, quando não se tratando de relação duradoura, o contrato já houver sido, integralmente, cumprido" (idem, p. 94).
 Portanto, em face da teoria da base do negócio jurídico, derivativa do princípio da boa fé, ambos conhecidos e reconhecidos pelo sistema jurídico brasileiro, detém o autor ação para rever o negócio jurídico implementado com o réu, o qual contém desproporção entre o preço e o bem - automóvel x contra-prestação.
O desequilíbrio contratual, destarte,  serve como suporte fático para a incidência da denominada teoria da base, também, chamada teoria da excessiva onerosidade. Pois, como doutrina o erudito Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior, ao tempo de adimplemento "devem existir as circunstâncias que garantam a conservação do princípio da igualdade, expresso na equivalência entre as obrigações reciprocamente prometidas e a obtenção do fim natural do contrato" (obra citada, p. 150).
Equivalência entre preço e valor real do bem alienado, assim como fim natural do contrato de compra e venda, sempre presente em operações de leasing, com exercício de opção de compra que encerra conceito de troca e que não serão obtidos com a preservação do "status quo". 
À propósito, vale conferir excerto da decisão proferida recentemente pelo eminente magistrado mineiro Paulo Roberto Pereira da Silva,  que decidiu a controvérsia criada pelo atrelamento dos contratos de leasing com a variação cambial:
"Tudo muito bem visto e joeirado, DECIDO: Registra-se, de início, que a Entidade/Autora está legitimada para postular a tutela juridicial protetora dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores (art. 82, inciso IV, CDC), sendo própria a via eleita.
É que a ação civil pública pode ser utilizada para proteção tanto de interesses difusos como coletivos, e mesmo os denominados individuais homogêneos. Importante ressaltar que, no regime do CDC, são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada e efetiva tutela.
Busca-se, através desta ação judicial coletiva, a revisão contratual, para revisão de todos os contratos firmados pelos consumidores, com correção cambial ou monetária vinculada ao dólar americano. Isto ocorre em face a maxi-desvalorização da moeda nacional ("REAL"), o que teria acarretado onerosidade excessiva dos referidos pactos, ensejando, então, o pedido revisional, com fundamento no art. 6º, inciso V, do CDC.
Tenho como legítima a postulação estampada na peça vestibular, pelo menos neste enfoque superficial, visando o exame da liminar pleiteada, por entender que a liberação do câmbio, da forma como foi promovida pelo governo Brasileiro, de maneira abrupta, caracteriza a situação de "fato superveniente", constante da letra da lei.
Diante da maciça propaganda do Governo, afirmando que o REAL não seria desvalorizado em relação ao DÓLAR, os consumidores foram induzidos a erro, assumindo compromissos tendo a moeda norte-americana como indexador. É evidente que todos os brasileiros, em face do que alardeava o Governo Federal, acreditavam na estabilidade da moeda nacional.
A propaganda governamental alardeava a "estabilidade da moeda nacional" informando sobre a "erradicação completa da inflação". A população passou a acreditar num verdadeiro "milagre brasileiro", passando, então, a assumir suas obrigações indexadas em dólar. Entretanto, com a liberação do câmbio, as obrigações assumidas assumiram proporções descomunais, abalando o orçamento de milhões de brasileiros.
Ninguém, em sã consciência, poderia prever, da noite para o dia, a desvalorização de 40% do real, acarretando, então, verdadeira disparada na cotação do dólar. Assim, todos aqueles que haviam firmado contratos atrelados ao dólar americano viram, como num passe de mágica, todas as suas obrigações excessivamente oneradas.
Não se deve perder de vista, em absoluto, que as cláusulas de correção, em qualquer contrato, são criadas para restabelecer o valor de compra da moeda - e não para favorecer o enriquecimento exagerado de um das partes, justamente a mais forte, que são as Entidades Financeiras.
É óbvio que a prestação contratual, em havendo expressão econômica, deve manter-se durante toda a avença. Caso contrário, estaremos diante de enriquecimento ilícito para um das partes, o que o Direito repugna. Entendo, pois, que os consumidores têm direito à revisão dos contratos em face do fato superveniente descrito, acarretando o desequilíbrio contratual e viade conseqüência, agravando a sua situação.
Neste ponto a Justiça, quando convocada, deve interferir, valendo assinalar que o Pacta Sunt Servanda deve, sempre, ser compatibilizado com a cláusula Rebus Sic Stantibus, conforme já decidiu o Colendo Superior Tribunal de Justiça (Resp 128.307/MG). Vale lembrar que IMPREVISÃO é todo fato que possa vir inesperadamente, de improviso sem ser esperado (cf. Vocabulário Jurídico, De Plácido e Silva, 15ª ed.).
FACE O EXPOSTO
e tudo mais que dos autos consta, invocando aqui, ainda, os princípios gerais de Direito, estou acolhendo o primeiro pedido de antecipação de tutela formulado na inicial, para determinar que as Entidades Financeiras indicadas no pólo passivo façam emitir, no prazo máximo de 10 dias, novos boletas bancárias, para quitação dos débitos dos consumidores  que tenham celebrado contrato com correção cambial, corrigindo-se as parcelas vencíveis a partir do corrente mês de janeiro, pela variação do INPC, índice que reflete a inflação máxima registrada em relação à moeda nacional. Fica estabelecida a multa diária de R$ 500,00, para o caso de descumprimento da presente determinação judicial. Deixo de acolher os demais pedidos de antecipação de tutela (ítens 4, 5 e 6), por entender que o 'periculum in mora', relativamente às questões ali enfocadas, não restou caracterizado. Podem às questões ali suscitadas serem tratadas, oportunamente, quando do julgamento de mérito, impondo-se às Financeiras/Rés, se for o caso, a devolução de eventuais valores pagos a maior, com aplicação das sanções legais cabíveis".
 (Despacho exarado pelo Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 20ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte. Dr. Paulo Roberto Pereira da Silva em ação civil pública) .
Argumentos que apontam para a procedência desta ação de cunho revisional, aos efeitos de ser examinado o conteúdo negocial para rever o preço pactuado, que deverá ser modificado e ajustado à realidade econômica do país, respeitados os valores do bem e da respectiva contra-prestação de cunho a evitar o locupletamento de uma das partes em detrimento da outra.
2.b) A INDEXAÇÃO DO CONTRATO AO DÓLAR.
As considerações anteriores acerca do princípio da boa fé e da teoria da base do negócio jurídico servem, de igual modo, como fundamentos à pretensão do autor de ver afastada da avença a previsão clausular de correção monetária das obrigações pelo dólar norte-americano.
É que a indexação à moeda estrangeira, máxime, após a violenta desvalorização do real diante do dólar, contribuiu decisivamente para o definitivo e cabal desalinhamento da compra e venda, com a conseqüente elevação às nuvens do preço atribuído às prestações  envolvidas no negócio. E no presente caso, ao menos pelo que se extrai do contrato, não houve captação de dinheiro no exterior à justificar a indexação ao dólar.
Novamente carreia luzes ao tema o magistério de Clóvis do Couto e Silva: "Considera-se como um dos aspectos mais importantes para a aplicação do conceito de base objetiva do contrato a influência dos atos do Estado no controle da economia. Essas modificações são, no geral, imprevisíveis, porquanto as autoridades governamentais nunca afirmam que se vai adotar um plano de congelamento. O Estado utiliza-se de todos os meios para criar a expectativa de que tal não sucederá, para evitar o aumento antecipado dos preços. Por esse motivo, é impossível prever os efeitos resultantes da adoção dos malsinados planos, e como se comportarão os preços após o seu término. Pois todos esses aspectos justificam a aplicação da teoria da base do negócio jurídico, para restabelecer o equilíbrio das prestações em face de um eventual rompimento" ("A teoria da base no negócio jurídico no Direito brasileiro", obra cit., p. 95).
  De qualquer sorte, a despeito da teoria da base, que possibilita a revisão do negócio e o afastamento da referida indexação, a providência se impõe, também, pelo fato de haver proibição em texto legal a que se vincule, dentro do território nacional, obrigações pecuniárias à variação de moeda estrangeira.
Com efeito, o artigo 1º do Decreto-Lei n. 857, de 11.09.69, dispõe:
"São nulos de pleno direito os contratos, títulos e quaisquer documentos, bem como obrigações que, exeqüíveis no Brasil, estipulem o pagamento em ouro, em moeda estrangeira, ou, por alguma forma, restrinjam ou recusem, nos seus efeitos, o curso legal do cruzeiro".
Ademais, a Medida Provisória que instituiu o Plano Real, que vem sendo reeditada sistematicamente, em seu artigo 6º, cominou:
"É nula de pleno direito a contratação de reajuste vinculado à variação cambial, exceto quando expressamente autorizado por lei federal".
Portanto, de nulidade padece a cláusula contratual, relativamente, à iniciativa de indexar o valor das obrigações em dinheiro ao dólar norte-americano, nulidade que deve ser decretada na presente demanda, com a conseqüente substituição do indexador contratualmente eleito por um outro dotado de licitude e validade. Para esse fim, sinaliza o demandante com o Índice Geral de Preços Médios, da Fundação Getúlio Vargas, que possui referendo inclusive do Poder Judiciário, que ao mesmo atrela a correção das obrigações em Juízo.
A posição da jurisprudência pátria se coaduna com a tese aqui sustentada, que redunda na nulidade da contratação no Brasil, vinculada a variação cambial, consoante se infere das seguintes decisões:
"ARRENDAMENTO MERCANTIL. Leasing de veículo automotor, fabricado no Brasil.
Cláusula contratual conferindo ao credor mandato para emissão de título cambial contra o próprio devedor-mandante. Cláusula de reajuste do débito pela paridade com o dólar norte-americano. Juros e encargos - Súmula 596 do Supremo Tribunal Federal.
Invalidade de cláusula, em contrato de adesão, outorgando amplo mandato ao credor, ou a empresa do mesmo grupo financeiro, para emitir  título cambiário contra o próprio devedor e mandante. Ofensa ao artigo 115 do Código Civil.
Cláusula, em contrato de arrendamento mercantil, de reajustamento da dívida pela paridade com moeda estrangeira. O artigo 38 da Resolução nº 980/84 do Banco Central extravasa o permissivo do inciso V do artigo 2º Decreto-lei nº 857/69, contrariando, assim, o disposto no artigo 1º do aludido Decreto-lei, que veda a estipulação, em contratos exeqüíveis no Brasil, de pagamento em moeda estrangeira, a tanto equivalendo calcular a dívida com indexação ao dólar, e não ao índice oficial previsto na Lei nº 6.423/77.
Juros e encargos. Incidência da Súmula 596 do Pretório Excelso.
Recurso Especial conhecido em parte, e nesta parte provido". (Recurso Especial nº 1.641, 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, Rel. Ministro Athos Carneiro - grifamos).
"CONTRATO DE COMPRA E VENDA, COM PREÇO FIXADO E INDEXADO EM DÓLARES, PARA PAGAMENTO EM CRUZEIROS. NULIDADE DA CLÁUSULA. DECRETO-LEI 857/69.
É taxativamente vedada a estipulação, em contratos exeqüíveis no Brasil, de pagamento em moeda estrangeira, a tanto equivalendo calcular a dívida com indexação ao dólar norte-americano, e não a índice oficial ou oficioso de correção monetária, lícito segundo as leis nacionais.
Ação de cobrança da variação cambial, proposta pela vendedora. Nulidade de pleno direito da cláusula ofensiva a norma imperativa e de ordem pública.
Recurso especial conhecido e provido". (Recurso Especial nº 23.707, 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, Rel. Ministro Athos Carneiro - os grifos não constam do original).
  Nula, pois, a cláusula de indexação do contrato ao dólar norte-americano.
3 - O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
O Código de Defesa do Consumidor também se aplica ao presente caso, pois houve modificação substancial nas bases do negócio e que clamam interferência do judiciário para determinar o reequilíbrio da relação contratual, de modo a tutelar o pólo hipossuficiente (o autor), tudo no desiderato de recompor a comutatividade contratual.
 A Lei 8.078/90 assegura em seu art. 6º, inciso V, como direito básico do Consumidor:
V-amodificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.
VII- a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência.
 
Este dispositivo legal tem o condão de  amparar o consumidor frente aos contratos, mais especificadamente frente aos "contratos de adesão", da mesma forma, tal dispositivo consagra a cláusula rebus sic stantibus, implícita em qualquer contrato, que imponha ao consumidor obrigação iníqua ou excessivamente onerosa.
Ocontrato firmado entre a partes enquadra-se na hipótese de incidência do artigo 54 do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, ou seja, faz parte do rol dos ditos contratos de adesão, in verbis:
" Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que  o  consumidor  possa  discutir  ou  modificar substancialmente seu conteúdo".
 
No presente contrato, não houve possibilidade de discutir cláusulas, taxas, indexadores, enfim, ele foi confeccionado em papel pré-impresso, com todas as  cláusulas pré-estabelecidas, configurando-se em verdadeiro contrato de adesão.
Esta espécie de  contrato se presta a abusos, pois podem nele ser incluídas obrigações jurídicas nulas, cláusulas potestativas, ou seja, aquelas que estão subordinadas à vontade de apenas uma das partes.
Com o aparecimento desmedido de tais situações, buscou o legislador, através do Código de Defesa do Consumidor, equilibrar relações jurídicas deste calibre, impondo limites e restabelecendo regras norteadoras e limitadoras às atividades, principalmente das financeiras, protegendo o pólo hipossuficiente da relação.
 Estes limites estão insculpidos no art. 51 do CDC, que comina de nulidade cláusulas abusivas:
Art.51- São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;
X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;
§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
II- restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar o seu objeto ou equilíbrio contratual
III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e o conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstãncias peculiares ao caso.
Verificada a nulidade da cláusula que prevê o aumento desmesurado das prestações, impõe-se a incidência da concreção da norma prevista no art. 51 do CDC para restabelecer a comutatividade contratual.
4 - A BOA-FÉ DO AUTOR E O PEDIDO DE DEPÓSITO EM JUÍZO DAS PARCELAS VINCENDAS.
A argumentação doutrinária e jurisprudencial acima desenvolvida, demonstra inequívoca a pretensão veiculada pelo autor: os posicionamentos dos tribunais pátrios e os ensinamentos doutrinários amparam o direito do suplicante quanto à correção do contrato de arrendamento convolado entre as partes, pelo índice de correção monetária adotado pelo Foro de Porto Alegre, ou seja, o IGP-M, acrescido de juros lineares de 1% ao mês.
Nessa linha de raciocínio, como demonstrado alhures e sobretudo para demonstrar sua boa-fé, pretende o autor depositar por mês as parcelas restantes do saldo devedor encontrado entre os pagamentos efetuados e a importância financiada, sobre o qual incidirá, ainda, juros lineares de 1% a.m.
     Como referencial provisório (até a decisão final quando serão fixados os critérios para o presente contrato), utiliza-se o autor do valor do financiamento realizado - R$ 15.383,05, que corrigido até a presente data, pela variação do IGP-M, acrescidos de juros de 1% ao mês importa  em R$ 19.430,78. Os pagamentos realizados pelo autor e corrigidos na mesma forma alcançam o montante de R$ 10.811,71. Portanto resta em favor da financeira um crédito de R$ 8.619,06 e que divididos pelo número de prestações restantes ao término do contrato (13), apresenta como valor de cada parcela a importância de R$ 663,00.
Assim para que não remanesça qualquer dúvida quanto a lealdade processual do autor, pretende, pois, efetuar mensalmente  o depósito da quantia R$ 663,00, conforme suso demonstrado e corrigida pela variação do IGP-M, acrescidas de juros lineares de 1% ao mês.
Para demonstrar a boa-fé - entendida a conduta processual como meio de prova (Ney da Gama Ahrends - AJURIS nº 6) - e elidir eventual alegação de mora, o autor pretende a expedição de guias para efetuar o depósito da quantia de R$ 663,00, a título de adimplemento de uma das parcelas do contrato de arrendamento (nº 12) e com isso evitar a quebra da comutatividade contratual.
Desse modo, demonstra coerência o autor com os argumentos expendidos, teses doutrinárias e precedentes pretorianos em que se ancora e, acima de tudo, a seriedade e lealdade com a qual postula em juízo.
Trata-se, ademais, de situação paradigma para a nova redação do art. 273, do CPC, introduzida pela Lei 8.952/94, qual seja, de que "O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; (...).
Com efeito, em primeiro lugar, dúvida alguma existirá quanto aos fatos, sua verossimilhança, porquanto refere-se a lide a contrato de arrendamento mercantil com inserção correção pela variação cambial, nula pleno iure.
                                 Carlos Furno, festejado tratadista espanhol, fala em "noção da verdade suficiente"1: o autor, ao requerer, na petição inicial, a tutela antecipatória, pode se valer de prova documental, de prova testemunhal ou pericial antecipadamente realizada e de laudos ou pareceres de especialistas, que poderão substituir, em situação de urgência, a prova pericial".
                                              No caso em exame é o que se faz com a sistemática de cálculo adotada pelo contador do foro de Porto Alegre.
Segundo, antecipação parcial da tutela - v.g., pagamento das parcelas que o autor entende devidas - beneficia por igual e diretamente ao credor, porquanto a este será dada disponibilidade do numerário ao iniciar a lide. E, prejuízo para o réu  não haverá, pois mesmo na sentença desfavorável - o que se admite apenas para argumentar -, possível a qualquer tempo a revogação da tutela antecipada - art. 273, parágrafo quarto - e restará simples complementação do pagamento.
Terceiro, mas outrotanto, não elidida a mora pelo depósito agora requerido, indiscutível o risco de prejuízo irreparável para o autor, pois presente a possibilidade de reintegração liminar de posse do bem arrendado; é o caso, conforme Proto Pisani, de "direito patrimonial com função não patrimonial, enquanto destinado a garantir a satisfação de uma necessidade primária ou uma 'situação de liberdade', deve ser tutelável através da tutela sumária urgente"2 . E, restar privado do veículo que utiliza em sua atividade laboral para discutir em juizo, sem dúvida configura a demasia do ônus econômico que caracteriza o cerceamento de defesa, episódio da vida que admite a incidência do inciso I , do art. 273, citado.
Quarto, e finalmente, aqui não se veiculam meras alegações, mas a tese do autor vem respaldada por doutrina de escol e precedentes pretorianos de qualidade indiscutível.
E a pretensão aqui deduzida, referente ao procedimento de depósito em juízo dos valores que o autor entende devidos, se coaduna perfeitamente coma posição defendida no eg. Tribunal de Justiça do Estado, mantendo-se a posse do bem com a arrendatária até a fixação do "quantum" da dívida.
Confira-se, por especial obséquio, o posicionamento da moderna jurisprudência, acerca do tema:
'TUTELA ANTECIPADA - SUA CONCESSÃO EM AÇÃO ORDINÁRIA DE REVISÃO CONTRATUAL - POSSIBILIDADE DE DEMONSTRADO DE PLANO A EXISTÊNCIA NO, CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL DE CLÁUSULA CONTENDO ANATOCISMO, CONTABILIZAÇÃO DE JUROS ACIMA DE 12% AO ANO E CORREÇÃO PELA TR.
LIMINAR DE MANUTENÇÃO DO OBJETO CONTRATO EM PODER DO CONSUMIDOR BEM CONCEDIDA.
Se o entendimento que a Câmara adota é no sentido de que a inserção e cobrança de juros acima de 12% ao ano, sua capitalização mensal e correção pela TR são ilegais, a pretensão do devedor de se manter no bem é legítima, pois se o contrato ainda não foi rescindido produz plenos efeitos.
Agravo improvido.'
(Agravo de Instrumento nº 196029615, 9ª Câmara Cível do TARGS, Porto Alegre, Rel. Wellington Pacheco Barros. Agravante: Meridional Leasing S/A Arrendamento Mercantil. Agravado: Brasnave Navegação Extração e Pavimentação Ltda.. j. 18.06.96, un.).
'AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. LEASING. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. DEPÓSITO POR CONSIGNAÇÃO INCIDENTE. POSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DO VEÍCULO NA POSSE DO DEVEDOR. MORA.
Expungida a mora pelo depósito incidente, possibilidade de obstar-se a inscrição do nome do devedor em banco de dados de consumo (SPC, SERASA). Direito de ação. Não pode ser limitado, a título de antecipação de tutela. Recurso parcialmente provido.
É possível, em sede de ação revisional de contrato, promover o devedor o depósito por consignação incidente, desprezado o rito especial da ação de consignação em pagamento, verificada a unidade de competência e observado o procedimento ordinário. Inteligência do art. 292, do CPC.
O pedido de depósito incidente tem caráter acessório e secundário. Será pelo julgamento do pedido principal, cumulado ao de depósito, que se definirá a sorte e a eficácia da consignação. Rejeitado o primeiro, não tem condições de subsistir o depósito por si só.
Expungida a mora por depósito incidente de valor razoável, consideradas as peculiaridades do caso concreto, é possível obstar-se a inscrição do nome do devedor em banco de dados de consumo (SPC, SERASA), assim como mantê-lo na posse do bem objeto do arrendamento mercantil, ainda que aforado interdito de reintegração, até o julgamento da ação revisional do contrato.
"A decisão que susta o protesto de título, enquanto pendente a lide que objetiva rever cláusula contratual, não se revelado prejudicial ao titular do crédito, nem se tratando de protesto necessário, nem obstativo do direito de acesso ao Judiciário, não se mostra ilegal ou inconstitucional" (Agravo de Instrumento nº 96.006996-8, da Capital, Rel. Des. Alcides Aguiar).
DECISÃO: por votação unânime, dar provimento parcial ao recurso.'
(Agravo de Instrumento nº 96.004176-1, da Capital. Relator: Des. Pedro Manoel Abreu. Agravante: Cia. Itauleasing de Arrendamento Mercantil - Grupo Itaú. Agravado: Cristal Turismo e Transportes Ltda.. 4ª Câmara Civil do TJSC, publicado no DJ nº 9.700 de 08.04.97).
 Por todos os fundamentos, destarte, aplicável o dispositivo legal invocado, mérito da processualística moderna, de modo a assegurar as partes que litigam seriamente, o acesso à justiça, sem a interferência ou prevalecimento do poder econômico de uma sobre a outra: o autor, certamente menos favorecido frente à poderosa instituição financeira, vem a juízo defender seu direito, séria e fundamentadamente; enquanto litiga, paga o quanto entende devido e não sofre a pressão econômica de ver-se privado de veículo; o réu que nada receberia por enquanto, não houvesse o pedido de tutela antecipada, recebe desde logo o que o autor reputa o certo, e remanesce o demais para a sentença final, quiçá.
                       Dúvida alguma, portanto, quanto à celeridade e justiça processual almejada pelo legislador, "uma vez que para efetiva tutela jurisdicional dos direitos é imprescindível o correto manejo das técnicas da cognição, da antecipação e da atuação dos direitos"3.
5 - CONCLUSÃO.
Pretende, pois, o autor através desta demanda obter a revisão judicial do contrato celebrado com a ré, a fim de ser declarado que inexiste relação jurídica de crédito/débito no valor de R$ 19.981,00, como pretende a suplicada.
Postula, ainda, o autor seja fixado como valor do débito a quantia inicialmente mutuada, atualizada pelo IGP-M (ou outro indexador que venha a ser adotado pelo Poder Judiciário riograndense) e acrescida de juros constitucionais e lineares de 1% a.m.,  abatidas as amortizações realizadas ao longo do tempo e corrigidas sob o mesmo critério do crédito da ré.
ISTO POSTO, o autor requer a VOSSA EXCELÊNCIA que se digne de julgar procedente a demanda, para:
(a) declarar que inexiste, entre autor e réu, relação jurídica de crédito/débito no valor de R$ 19.991,00.
(b) cumulativamente, determinar que seja constituído o débito pela quantia inicialmente mutuada, atualizada pelo IGP-M - ou por outro indexador que porventura venha a sucedê-lo - e acrescida de juros constitucionais  e lineares de 12% ao ano, deduzidas as amortizações realizadas ao longo do tempo que também deverão sofrer a mesma indexação;
(c) condenar a ré ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios.
REQUER, ainda:
(d)  a título de tutela antecipada - art. 273, I, CPC -, seja determinada a expedição de guias para que a autora possa efetuar o depósito judicial da importância de R$ 663,00, como pagamento da parcela de nº 12 e assim sucessivamente, até o total adimplemento do contrato;
(e) a citação da ré, por carta com aviso de recebimento, no endereço constante no prólogo, para vir contestar a presente, querendo, pena de revelia;
(f) a realização de perícia contábil, para comprovar o alegado, e pela produção dos demais meios de prova em direito permitidos.
Valor da Causa: R$ 8.619,00 (13 x  valor da parcela = R$ 663,00)
P. deferimento.
................., ... de .......... de .............
Advogado

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