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1Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 2 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 3Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Jomar Carvalho Filho Biólogo e Editor Editorial aquicultura brasileira chega ao final de 2017, muito movimentada e já um tanto direcionada por grupos organizados do setor, que aos poucos vão se tornando protagonistas de conquistas e realizações, num cenário onde os atores que deveriam fazer o papel do governo, há tempos não pisam no palco. O ano vai ficar marcado pela ação desastrosa do MAPA, que liberou a importação do camarão equatoriano. Diante disso, uma parte organizada do setor, descontente com essa medida, conseguiu varrer a aquicultura para fora desse ministério, encaixando-a, algemada com a pesca, no MDIC. Por terem ficado desconfortáveis neste ministério, tal qual um sapato apertado, ambos os setores foram mandados para outro canto do governo, na forma de uma recém-criada secretaria da Presidência da República, um local teoricamente até mais nobre que o MDIC. Mexe pra lá e pra cá, o ano acabou assistindo seus poucos funcionários timidamente acuados em salas emprestadas do INCRA, totalmente destituídos do glamour de um suposto status ministerial. E, em ano eleitoral, é pouco provável que esse quadro mude. Enquanto isso, piscicultores organizados quebraram antigos paradigmas e conseguiram a inédita autorização para introduzir a criação de tilápia nas águas dos reservatórios do rio Tocantins. Espera-se para breve, a liberação das primeiras licenças ambientais pelas mãos da outrora carrancuda e irredutível Naturatins, órgão ambiental do estado. No mesmo embalo, nos primeiros dias de 2018, produtores organizados também conseguiram o direito legal de criar peixes exóticos no Mato Grosso, “desde que os tanques-rede sejam construídos com materiais resistentes a tração, corrosão e ação dos predadores”. Essas conquistas setoriais, no entanto, não demoraram para acordar velhos desafetos ambientalistas, e nas redes sociais já se pode acompanhar um confronto de ideias em notas e pareceres técnicos, numa disputa retórica para um árbitro até agora desconhecido. O empenho do setor produtivo organizado também surtiu efeito no Estado do Paraná, onde uma mobilização intensa que contou com a ajuda de parlamentares, resultou na conquista do direito de pagar menos impostos nas vendas do pescado enviado para o Estado de São Paulo, o principal mercado fora do Paraná. O esforço resultou na redução do ICMS de 12% para 7%, aumentando de forma significativa a margem do produtor paranaense. Já no Estado de São Paulo, depois da conquista da legislação que permite um caminho pavimentado para o licenciamento da atividade - também resultado do esforço do setor organizado - os produtores já podem ter acesso a linhas de crédito do Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista (FAEP), com juros de 3% ao ano, um sonho há muito desejado. Apesar das conquistas, no apagar de 2017, o setor aquícola foi pego de surpresa com a suspenção das licenças de exportação de pescado, tanto da pesca como da aquicultura, para a União Europeia. Ainda que sejam tímidas as remessas, a proibição se mostrou injusta, pois as irregularidades detectadas pelos fiscais da UE estavam apenas relacionadas com a pesca extrativista. Mas ficou confirmada a máxima que diz que passarinho que anda com morcego, acorda de cabeça para baixo. E segue o baile, com mais esse tema para ser resolvido pelas instituições que representam o setor aquícola. Ainda há muito a ser dito sobre a atuação dos grupos que atuam de forma organizada e representam os interesses da aquicultura brasileira, mas eu preciso acabar esse editorial para apresentar a edição que está em suas mãos e que reúne temas da maior importância. Assim, quero recomendar, em especial, a leitura do artigo do nosso querido Fernando Kubitza, uma revisão sobre os reflexos dos compostos nitrogenados na saúde dos peixes e camarões. Um presente raro para quem não abre mão de praticar uma aquicultura consciente. Você vai ler também muitos outros temas de qualidade técnica valiosa que ajudam a projetar os rumos que a atividade se encaminha. Meu desejo é de que em 2018 o setor aquícola se una cada vez mais, para que juntos tracemos metas que tenham o propósito de agregar e melhorar a vida de todos os envolvidos com o setor, e em harmonia com o meio ambiente. A todos uma boa leitura, A 4 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 5Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Assentamento remoto de sementes de mexilhão em Santa Catarina O Estado de Santa Catarina é o maior produtor nacional de mexilhões, com um volume de 12.500 toneladas em 2016. A maricultura catarinense já se configura como uma importante atividade econômica na região costeira do estado e a produção de sementes é, atualmente, a maior prioridade do setor. Apesar da técnica de produção de sementes há muitos anos já estar dominada pelo laboratório de Moluscos Marinhos – LMM/UFSC, as técnicas de assentamento remoto das larvas e de manutenção das sementes no mar ainda necessitam de aprimoramentos, antes que estejam prontas para serem repassadas para os produtores. O artigo de Felipe M. Suplicy apresenta aos leitores os resultados de assentamento remoto utilizando técnicas empregadas com sucesso por produtores australianos, neozelandeses e canadenses. Editor Chefe: Biólogo Jomar Carvalho Filho jomar@panoramadaaquicultura.com.br Jornalista Responsável: Solange Fonseca - MT23.828 Direção Comercial: Solange Fonseca publicidade@panoramadaaquicultura.com.br Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores. Colaboradores desta edição: Carlos A. G. Leal, Dariano Krummenauer, Edu Holanda, Eduardo A. Ono, Felipe Matarazzo Suplicy, Fernando Kubitza, Geraldo Fóes, Gilberto Caetano Manzoni, Guilherme Campos Tavares, Henrique C. P. Figueiredo, Julio Zemor, Luis Poersch, Robson Cardoso da Costa, Wilson Wasielesky Jr. A única publicação brasileira dedicada exclusivamente aos cultivos de organismos aquáticos Uma publicação Bimestral da: Panorama da AQÜICULTURA Ltda. Rua Alegrete, 32 22240-130 - Laranjeiras - RJ Fone/fax: (21) 3547-9979 VIVO: (015) 21 97252-5595 / TIM: (041) 21 97991-3577 CLARO: (021) 21 99123-3411 / OI: (031) 21 98697-8571 www.panoramadaaquicultura.com.br revista@panoramadaaquicultura.com.br Skype: panoramadaaquicultura ISSN 1519-1141 Assinatura: Daniela Dell’Armi Fernanda Araújo assinatura@panoramadaaquicultura.com.br Para assinatura use a ficha na página 65, visite www.panoramadaaquicultura.com.br ou envie e-mail. Assistente: Ricardo Carvalho ricardo@panoramadaaquicultura.com.br ASSINANTE - Você pode controlar, a cada edição, quantos exemplares ainda fazem parte da sua assinatura. Basta conferir o número de créditos descrito entre parênteses na etiqueta que endereça a sua revista. Números atrasados custam R$ 22,00 cada. Para adquiri-los entre em contato com a redação. Edições esgotadas: 01, 05, 09, 10, 11, 12, 14, 17, 18, 20, 21, 22, 24, 25, 26, 27, 29, 30,33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 44, 45, 59, 61, 62, 63, 65, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 87, 88, 107, 111, 112, 113, 114, 147, 148 Projeto Gráfico: Leandro Aguiar leandro@panoramadaaquicultura.com.br Design & Editoração Eletrônica: Panorama da AQÜICULTURA Ltda. Impresso na Grafitto Gráfica & Editora Ltda. Os editores não respondem quanto a qualidade dos serviços e produtos anunciados. Í N D I C E Capa: Assentamento de sementes de mexilhão em Santa Catarina Foto: Felipe Matarazzo Suplicy Arte: Panorama da AQÜICULTURA Edição 164 - Novembro/Dezembro de 2017 Editorial... Pág. 03 Notícias & Negócios... Pág. 06 Cooperação com Dinamarca, decreto paulista de licenciamento ambiental e acessoao crédito; tilápia no Tocantins; Nota Técnica de ambientalistas e resposta do setor produtivo; Legislação Municipal; Suspenção das exportações e muito mais. Notícias & Negócios Online... Pág. 10 Entre os temas abordados na Lista de Discussão Panorama-L, se destacaram a presença de Streptococcus agalactiae nos cultivos e os benefícios do uso de alimentadores automáticos. A água na aquicultura – Parte 3: O impacto da amônia, do nitrito e do nitrato sobre o desempenho e a saúde dos peixes e camarões... Pág. 14 O artigo de Fernando Kubitza é uma das melhores e mais completas revisões sobre os efeitos da amônia, nitrito e nitrato no desempenho e saúde dos peixes e camarões, e sugere boas práticas para minimizar problemas. Cultivo do camarão em sistema BFT... Pág. 28 Pesquisa da FURG confirma que o uso de clarificadores em viveiros reduz drasticamente o consumo da água e a emissão de efluentes além de reforçar a biossegurança do sistema de bioflocos. Streptococcus agalactiae e o controle pela vacinação: Parte 3... Pág. 36 Como a vacina funciona? Como é a diversidade genética dessa bactéria no Brasil. O artigo discute também a emergência de novas linhagens que conseguem escapar da proteção vacinal. Workshop Nacional de Licenciamento Ambiental na Aquicultura... Pág. 42 Associações de aquicultores, analistas ambientais, governo e instituições de importância reconhecida para atividade, se reuniram em torno do propósito de construir um processo de licenciamento ambiental com maior segurança jurídica e competitividade, mantendo a harmonia com o meio ambiente. Conheça os resultados desse encontro. Aprimoramento da técnica de assentamento remoto de sementes de mexilhão... Pág. 46 A disponibilidade de sementes pode ser considerado o elo mais sensível da cadeia do mexilhão, e a tecnologia de assentamento remoto é a única capaz de dar segurança ao produtor. Saiba como funciona. FENACAM... Pág. 61 O maior evento técnico-científico e empresarial da Aquicultura brasileira volta com toda força ao Centro de Convenções de Natal, no Rio Grande do Norte. Ficha de Assinatura da Panorama da AQÜICULTURA... Pág. 65 Calendário Aquícola... Pág. 66 6 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 20176 Pequenas notícias institucionais e/ou fotos de divulgação de produtos e empresas podem ser enviadas para publicação nessa seção, através do e-mail: solange@panoramadaaquicultura.com.br Notícias & Negócios COOPERAÇÃO COM A DINAMARCA - Os resultados de um projeto de pesquisa que estuda a melhora da qualidade de peixes de cultivo para o consumo humano foram apresentados durante o workshop inter- nacional “Quality of cultured fish for hu- man consumption”, realizado no campus da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Jaboticabal, entre os dias 8 e 9 de no- vembro de 2017. O projeto é desenvol- vido entre pesquisadores brasileiros em parceria com dinamarqueses e conta com a apoio do corpo técnico do Instituto de Pesca (IP-Apta), do Instituto de Botânica e do Polo de Jaú da Apta. Na oportunida- de, os pesquisadores do IP Cacilda Thaís Janson Mercante e Clóvis Ferreira do Car- mo, juntamente com o pesquisador da Apta Gianmarco David, apresentaram os resultados dos estudos sobre a qualida- de da água para a criação de tilápia em tanques-rede nos reservatórios da região do Paranapanema, Ilha Solteira e Médio Tietê, com foco na qualidade dos peixes cultivados para o consumo humano. Já a pesquisadora do Centro do Pescado Conti- nental do IP Fabiana Garcia Scallopi falou sobre o potencial zoonótico de bactérias patogênicas em tilápia-do-Nilo no Estado de São Paulo. As pesquisas foram realiza- das no âmbito do projeto “IMPCON - Im- proved Quality of cultured fish for human consumption”, coordenado pelo professor Reinaldo José da Silva, do Instituto de Biociências da Unesp de Botucatu, com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Innovation Fund Denmark. Também participam dos estudos pesquisadores da Universidade de Copenhagen. O projeto prevê que os resultados sejam disponi- bilizados para transferência de tecnolo- gia para o setor produtivo, podendo se destacar o uso de ferramentas de biotec- nologia para diagnose precoce de pato- logias que afetam a tilapicultura e para o monitoramento de microrganismos aquáticos que afetam o sabor dos pei- xes. Os próximos passos da cooperação buscam minimizar o uso de antibióticos nos cultivos e soluções práticas para problemas com off flavor. AQUICULTURA PAULISTA I - Em cum- primento ao decreto nº 62.243 que re- gulamentou o licenciamento ambiental da aquicultura no Estado de São Paulo, terminou em 31 de outubro passado o prazo para que os aquicultores paulis- tas entregassem a Declaração de Con- formidade da Atividade de Aquicultura (DCAA), nos casos onde isso é previsto, ou protocolassem o pedido de Licença de Operação junto a CETESB. Os empreendi- mentos que cumpriram o prazo não po- derão ser autuados em razão de ausência de licenciamento, até que análise final do pedido de adequação seja deferida. Até a primeira quinzena de janeiro de 2018 o CATI recebeu 1.473 Declarações de Conformidade, enquanto a CETESB contabilizava apenas 60 solicitações de Licenciamento Ambiental (do tipo Sim- plificado e Ordinário). Os demais empre- endimentos que não cumpriram o prazo devem fazê-lo o quanto antes, sob pena de serem enquadrados nas fiscalizações já prometidas pelo governo paulista. 7Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 7 Notícias & Negócios AQUICULTURA PAULISTA II - Com o licenciamento, os aquicultores pau- listas passam a contar com as linhas de crédito oferecidas pelo Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista (FEAP) da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. As novas regras do FEAP foram anunciadas pelo Secretário de Agri- cultura Arnaldo Jardim em junho pas- sado, durante o AquiShow, e foram adequadas aos aquicultores após a as- sinatura do decreto nº 62.243/2016. Dentre as mudanças estão o aumento do prazo de financiamento de cinco para seis anos e o período de carên- cia para o início dos pagamentos, que saltou de 18 para 24 meses. Além disso, o financiamento que antes era oferecido para piscicultura de até 108 m³ de lâmina d´água para tanques-re- de, agora foi ampliado para empreen- dimentos de até 1.000 m³ de lâmi- na d’água, acompanhando as regras do novo licenciamento ambiental. Atualmente, o FEAP oferece juros de 3% ao ano para produtores rurais, pescadores artesanais, cooperativas e associações de todo o Estado. Ao anunciar as mudanças do FEAP, Ar- naldo Jardim lembrou que, após a resolução do entrave relacionado ao licenciamento ambiental, o próximo obstáculo a ser superado será o da estrutura de comercialização, cuja tributação sobre o pescado tem sido um problema sério para os empreen- dedores do setor em São Paulo. “E o setor deve enfrentar esse problema e construir uma solução em conjunto, assim como aconteceu no caso do li- cenciamento”, lembrou Jardim. AQUICULTURA MUNICIPAL I - Leis municipais para regulamentar a ati- vidade aquícola parecem ser uma tendência de norte a sul do país. Em dezembro último, foi promulgada a le- gislação municipal para a prática da aquicultura no município de Laranjal do Jarí, no Amapá. A nova legislação foi baseada na Legislação Federal para que o município possa, a partir de ago- ra, realizar o Licenciamento Ambiental para a piscicultura. Essa conquista foi o resultado de um trabalho iniciado em 2011 pelo técnico em aquicultura Emanuel Brito, que sempre acreditou no potencial aquícola da região. Na solenidade de apresentação da legis- lação, que contou com a presença de autoridades municipais e produtores, foi lançado o Programa Municipal deAquicultura, ocasião em que foram en- tregues as primeiras licenças ambien- tais do município, assinadas pelo Se- cretário Municipal de Meio Ambiente, Marcelo Sarraf dos Santos. AQUICULTURA MUNICIPAL II - Na primeira semana de 2018 foi publica- do no Diário Oficial do Município de Uberlândia a legislação que regula- menta a atividade de aquicultura. Se- gundo a secretária municipal de Agro- pecuária, Abastecimento e Distritos, Walkíria Naves, esse é o primeiro pas- so do recém-lançado Programa Novo Agro que vai contemplar, além da pis- cicultura, a agroindústria, agroecolo- gia, turismo rural e gastronomia. “A lei da aquicultura é importante para classificar os piscicultores pelo porte e possibilitar o cadastro. Os produto- res que tiverem tanques-rede ou lâmi- na d’água em sua propriedade podem nos procurar para que possam receber a visita dos nossos técnicos”, expli- cou, acrescentando que os piscicul- tores cadastrados na prefeitura rece- berão todo apoio técnico necessário para atender à legislação ambiental e tornar o negócio profissional. O Pro- grama Novo Agro prevê a disponibili- zação de recursos subsidiados para a aquisição de insumos, com pagamen- to parcelado em até dez vezes, bem como a criação de um entreposto de processamento de pescados. Walkí- ria Naves destacou que o município tem potencial aquático para se tornar um grande produtor de peixe e a in- tenção é aproveitar isso para atrair ainda mais turistas para a área rural. “Quando o turista vem, ele quer ter a experiência daquele local. Então por que não inserir o peixe nos bons restaurantes como um produto nosso, com atrativo ao turismo assim como o queijo, doces e outros alimentos ar- tesanais?”, observou a secretária. TILÁPIA TOCANTINENSE - Tudo indica que neste início de 2018 a Naturatins (Instituto Natureza do Tocantins) vá iniciar o licenciamento ambiental de empreendimentos de cultivo de tilápia nos reservatórios do Rio Tocantins, em especial no Lago da Usina do Lajea- do. Em junho passado o Conselho do Meio Ambiente do Estado do Tocantins (COEMA), votou favoravelmente pela introdução de peixes exóticos, contra- riando a Resolução COEMA no 27, que proíbe (ainda não foi revogada) a cria- ção de espécies exóticas em tanque- -rede no estado. A permissão para o cultivo votada pelo COEMA só foi pos- sível graças a um acordo que prevê a criação de condicionantes ambientais para, entre outras coisas, minimizar o impacto da presença da tilápia. Tais condicionantes tinham um prazo até o final de novembro para serem ela- boradas, mas tudo indica que somente no final de janeiro isso será feito. O interesse de criar tilápia no Tocantins não é de hoje. Já em 2016, empresá- rios de outros estados, com o apoio da Peixe BR, se reuniram com o gover- nador Marcelo Miranda, para mostrar as oportunidades da criação da tilápia no estado que, sem sombra de dúvidas possui as melhores condições climáti- cas e ambientais para o cultivo deste peixe no país. O pleito dos empresá- rios encontrou eco na academia e nas próprias instituições do estado, que, favoravelmente, atestaram a presença, há muitos anos, desse peixe nos rios Araguaia e Tocantins. ENQUANTO ISSO... - Velhos fantasmas despertaram para colocar a criação de tilápia novamente no foco dos debates ambientalistas. No final de dezembro 8 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Notícias & Negócios a Sociedade Brasileira de Ictiologia, em resposta às demandas oriundas do pro- cesso que discute a introdução da tilápia no Tocantins, Mato Grosso e Amazonas, divulgou uma Nota Técnica (link curto) elaborada por Angelo Antonio Agosti- nho, professor aposentado da UEM, Os- car Barroso Vitorino, Analista no Insti- tuto Natureza do Tocantins e Fernando Mayer Pelicice, da Universidade Federal do Tocantins, onde avaliam os riscos am- bientais do cultivo de tilápia nilótica em tanques-rede, tendo como base os resul- tados obtidos em estudos realizados em diversas bacias hidrográficas, trazendo, “evidências que demonstram, de forma inequívoca, a universalidade dos esca- pes dessa espécie dos tanques-rede, a sua elevada capacidade de se estabelecer em novos ambientes, e os impactos so- cioambientais relevantes tanto da forma de cultivo como da espécie sobre a biota nativa e atividade pesqueira”. EM REPOSTA... - No início de janeiro deste ano, o professor da UEM, Ricar- do Pereira Ribeiro, elaborou extenso “Parecer Técnico” (link curto) também com inúmeras referências bibliográficas, mostrando que é uma falsa afirmação que as espécies exóticas, principalmente a tilápia do Nilo, tenha sido a causadora da redução ou aumento da diversidade específica das espécies selvagens, como afirma Agostinho e colaboradores em sua Nota Técnica. Para Ricardo, o grande número de variáveis bióticas e abióticas associadas à falta de informações sobre o comportamento da tilápia, em am- biente similar aos lagos de Hidrelétricas de todo o país, gera a necessidade de avaliar e monitorar as interações desta natureza. Portanto, toda informação é imprescindível para nortear qualquer de- liberação acerca da O. niloticus nos lagos de Hidrelétricas, em especial nas regiões Centro-Oeste e Norte do Brasil, inclusive considerando que os aspectos socioeco- nômicos são também fundamentais para uma análise integrada, pois os reserva- tórios de hidrelétricas apresentam-se como um dos mais importantes em re- lação ao potencial de produtividade pes- queira no país, tornando-se necessário a busca de novas atividades econômicas sustentáveis e viáveis, capazes de con- tribuir para o aumento de renda da po- pulação do entorno e consequentemente qualidade de vida. O professor Ricardo Pereira afirma ainda que a realização de estudos técnicos sobre o cultivo da espécie nos reservatórios pode e deve ter um caráter de inovação, para pro- por técnicas de engenharia que envolva o uso de tanques-rede com sistemas de controle de escapes, avaliação de den- sidades que permitam um desempenho e higidez dos animais, o monitoramento espacial e temporal da assembleia íctica do entorno das áreas aquícolas, o desen- 9Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Notícias & Negócios volvimento de dietas de baixo impacto ambiental, por meio do uso de rações de alta digestibilidade, entre outras medidas mitigadoras capazes de con- tribuir para geração de parâmetros técnicos, que por sua vez, possam ser utilizados como referência nacional e replicados a outras regiões do país, a exemplo de outros estudos. Por fim, Ricardo afirma que os rios impacta- dos por barragens não são mais rios e sim reservatórios, ou seja, ambientes muito diferentes, e que, sob qualquer ponto de vista, o grande impacto nas comunidades ecológicas destes ambientes já foi causado, e o reuso destas águas para atividades nobres como a aquicultura com espécies que apresentam índices zootécnicos compatíveis para viabilizar a ativi- dade de produção é a forma mais nobre de beneficiar estas áreas e as populações impactadas. EXPORTAÇÕES SUSPENSAS - Uma mis- são veterinária da União Europeia ava- liou, em setembro, o sistema de controle da produção de pescado no Brasil. As auditorias se concentraram no Estado de Santa Catarina, por ser o principal estado exportador de pescado. Nas 10 visitas realizadas, os fiscais se depara- ram com inconformidades em seis es- tabelecimentos, com problemas relacio- nados à estrutura física, manuseio de pescado e irregularidades de captura. A recomendação da UE foi a imediata sus- penção das exportações de pescado, o que foi anunciado pelo MAPA, que sus- pendeu as licenças a partir do dia 3 de janeiro de 2018. Curiosamente não foram vistoriados estabelecimentos de aquicul- tura, mas ainda assim,o pescado cultiva- do também está proibido de ser exportado. A crise fez com que a Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR), usualmente moderada e cuidadosa nas suas mani- festações quando o tema é governança da piscicultura, mudasse o seu tom, ao exigir que o governo federal tome as me- didas cabíveis com urgência, para evitar que essa decisão afete mercados com os quais a piscicultura brasileira tem negó- cios, e acabe prejudicando conquistas de novos parceiros comerciais. A associação lembrou que a pouca atenção dada à ati- vidade está demonstrada nas muitas mu- danças, como o fim do MPA, seu repasse ao MAPA, depois levado ao MDIC e agora de volta à Presidência da República. Para a Peixe BR nesse jogo de forças políticas, “esqueceram o básico: cuidar das neces- sidades elementares da piscicultura brasi- leira; dos inúmeros projetos sobre águas da União que estão em análise há mais de uma década; da legislação ambiental que cerceia o avanço da atividade em vá- rios estados e, da questão sanitária, que tem sido pouco considerada na entrada de peixes importados”. 10 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Participe da Lista de Discussão Panorama-L Inscreva-se no site www.panoramadaaquicultura.com.br Notícias & Negócios On-line De: Guilherme Campos gcamposvet@hotmail.com Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: S. agalactiae em peixes Estudo recentemente publicado no periódico Scientific Reports demons- trou que no Brasil há três diferentes grupos genéticos de Streptococcus agalactiae acometendo tanto a tila- picultura como a produção de pinta- do-da-amazônia no país. Essa diver- sidade é geograficamente distribuída, sendo dois grupos identificados prin- cipalmente na região Nordeste, en- quanto que o outro grupo é predomi- nante na região Centro-Sul do país, sendo que este último também diver- ge de qualquer outro padrão genéti- co identificado em outros países do mundo. Além disso, o estudo também revelou a transmissão desses grupos genéticos entre as Regiões (Nordeste e Centro-Sul), associado com a co- mercialização de peixes. De: Luiz Claudio de Paula Costa luiz.da.aop@gmail.com Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: Re: S. agalactiae em peixes Quando começamos, usávamos pas- ta de alho com a ração para trata- mento de infecções bacterianas nas tilápias, mas com o crescimento da piscicultura tornou se mais econô- mico e eficaz o tratamento com oxi- tetraciclina do que com o alho. De: Paulo Rocha pjcrtech@hotmail.com Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: Re: S. agalactiae em peixes Já está mais do que comprovado que o uso de extratos naturais (óleos essenciais) associado a ácidos or- gânicos, potencializa a ação contra Streptococcus. Usar antibiótico antes e depois da vacinação, a meu ver, só debilita mais o animal. Usar de forma preventiva e constante óleos essen- ciais mais ácidos orgânicos de forma correta pode mudar completamente o perfil de uma propriedade. A pasta de alho não pode ser comparada a óleo essencial associado a ácido orgânico. De: Arthur Fernandes tucofernandes@hotmail.com Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: Re: S. agalactiae em peixes Uma pergunta de validade para os produtores seria sobre o quão di- ferente são esses três grupos de S. agalactiae. Por mais que o estudo tenha identificado grupos genetica- mente diferentes, algo importante que não é abordado seria sobre di- ferenças funcionais. Ou seja, as di- ferenças se encontram em genes que estão relacionados à patogenicida- de das cepas classificadas em cada grupo? Ou estariam relacionadas à resistência das mesmas cepas a es- pecíficos antibióticos ou vacinas? Ou são simplesmente diferenças que surgiram devido a separação geográ- fica e ao acaso, sendo de importân- cia biológica, mas sem importância comercial? Essas perguntas práticas de interesse dos produtores podem ser respondidas por estudos que deem sequência aos seus resultados Guilherme. E eu imagino que o Car- los (Leal) e o restante do grupo (da UFMG) estejam realizando esse estu- do ou pelo menos planejando. De: Guilherme Campos gcamposvet@hotmail.com Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: Re: S. agalactiae em peixes Eu tenho lido artigos sobre estrep- tococose em peixes há pelo menos seis anos e claro, li artigos demons- trando a eficiência de óleos essen- ciais de plantas, ácidos orgânicos e probióticos que aumentam a resis- tência da tilápia ou outros organis- mos aquáticos à infecção por Strep- tococcus agalactiae. Dentre estes, li artigos bons e outros infelizmente com falhas, pois usam isolados obti- dos de outros hospedeiros, como S. agalactiae obtido de ser humano ou bovino, por exemplo, que geralmen- te (dentro de tudo que já foi publi- cado até a presente data) não cau- sam doença em peixes. Ou, quando testam um isolado obtido de peixe, não é uma cepa bem caracterizada, com uma dose letal média definida, que poderia sim evidenciar uma di- ferença entre um grupo controle e um testado. Mas mesmo assim, com o uso de fitoterápicos, antibióticos e vacinas, será que nossos peixes estarão protegidos de uma popula- ção de S. agalactiae tão diversa? O trabalho que eu citei, que inclusive sou co-autor, e que realmente acre- dito que deve ser divulgado para todos os produtores e profissionais da área, devido a importância que este patógeno tem na produção na- cional de tilápia, demonstrou uma ampla diversidade do patógeno, e olha que esses são dados de apenas um laboratório, dentre os muitos presentes no Brasil. A realização do ensaio de MLST, também conhecido como sequenciamento de Multilo- cus, poderia permitir a comparação dos genótipos entre os laboratórios, e realmente demonstrar o quão di- versa é a população de S. agalactiae no Brasil. Mas é uma metodologia infelizmente cara, o que dificulta tal comparação. Eu também já li que no final do ano passado, outro gru- po de pesquisa do Estado do Para- ná isolou esta bactéria de tilápias cultivadas no Estado do Piauí, com um perfil genético diferente aos já 11Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Notícias & Negócios identificados no Brasil (sorotipo III, e no país era predominante o sorotipo Ib em peixes) e que é mul- tirresistente aos antibióticos, entre- tanto nesse trabalho (https://www. sciencedirect.com/science/article/ pii/S0044848617304982) os auto- res não realizaram o MLST, o que seria importante, pois isolados so- rotipo III pertencente ao genótipo ST283 tem sido considerado zoonó- tico em Singapura. Respondendo ao Arthur Fernandes, você está certo, estudos já estão sendo realizados para encontrar as principais diferen- ças, tanto genotípicas (presença e/ ou ausência de genes relacionados com virulência, adaptação e meta- bolismo), como fenotípicas (resis- tência aos antibióticos, se causam hemólise ou não) destes 3 grupos, além de avaliar a eficácia de uma vacina frente a eles. Até então, o interessante que achamos foram ge- nes/proteínas presentes em todos estes grupos que viabilizam a sobre- vivência da bactéria em ambiente aquático, o que poderia potenciali- zar o número de animais infectados em um determinado lote, já que esta bactéria pode ser transmitida indi- retamente via água. E em ensaios in vivo (testamos até então dois isola- dos) uma cepa obtida de um peixe doente na Região Nordeste foi mais virulenta (causa maior mortalida- de em tilápias) quando comparada com a cepa do Centro-Sul. Estamos tentando responder todas essas per- guntas, inclusive avaliar a diferença entre cepas obtidas de tilápia e de pintado da Amazônia. De: Ricardo Y. Tsukamoto bioconsu@uol.com.br Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: Re: S. agalactiae em peixes Adicionando uma questão às formula- das pelo Arthur:o S. agalactiae já impacta e causa mortalidade a pei- xes de ordens tão distintas como Perciformes (tilápia) e Siluriformes (pintado da Amazônia). Significa que este patógeno tão mutável (=adap- tável) representa grande risco para uma grande variedade dos peixes existentes no país, incluindo as es- pécies nativas? Situação equivalente à de índios isolados da civilização, ao serem expostos às enfermidades comuns da sociedade humana. De: Guilherme Campos gcamposvet@hotmail.com Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: Re: S. agalactiae em peixes Essa bactéria também foi isolada em curimba e cará em sistema de poli- cultivo com tilápias no sul de Minas Gerais, demonstrando a sua capaci- dade de colonizar diferentes espé- cies de peixes. Entretanto ainda não se sabe se S. agalactiae causa do- ença nestes hospedeiros, pois ain- da não foram realizados ensaios de virulência. Cabe ressaltar também que ainda não se tem relato dessa bactéria causando doença em peixes redondos, como pacu e tambaqui. De: Marcos Domingues de Oliveira marcos.oliveira@spinvestimen- tos.com.br Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: Automatização Gostaria que compartilhassem a opinião ou experiência com relação aos tratadores automatizados. Mi- nha principal atividade hoje é rela- cionada com a agricultura que tem um emprego de tecnologia bastan- te grande e percebo na piscicultura (que tenho como atividade secun- dária) bastante resistência ainda de muitos produtores. O tema que gostaria de discutir especificamen- te hoje é com relação à automati- zação do arraçoamento. Por favor, compartilhem suas experiências ou opiniões. 12 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Notícias & Negócios On-line De: Ricardo Y. Tsukamoto bioconsu@uol.com.br Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: Re: Automatização A minha opinião é de que o uso de alimentadores auto- matizados ainda tem baixa aplicação no Brasil. Por ser uma atividade recente no país a aquicultura ainda está se desenvolvendo, tateando o seu caminho, e contrasta com atividades da agricultura e pecuária que têm gran- de tradição e porte (massa crítica para investir, planejar e obter seguro). E como o porte da grande maioria de empreendimentos de aquicultura é pequeno, com mane- jo artesanal, o produtor individual ainda não tem certe- za dos procedimentos “corretos” do setor e nem capital disponível para investir com confiança em aporte de tecnologia. Ou seja, falta convencer que efetivamente vale a pena investir neste ponto. A água do tanque de cultivo esconde o que acontece lá submerso, em con- traste a uma cultura de soja ou ao gado no pasto, os animais aquáticos permanecem invisíveis ao seu criador e não produzem nenhum som. Podem estar doentes ou inclusive terem morrido no fundo do tanque, por ex- cesso de nitrito, sem que se possa perceber ao olhar a bela superfície refletora da água. Por isso, a prática padrão (SOP) do aquicultor é observar atentamente os seus animais no momento em que ministra o alimento, para verificar se o comportamento está normal, se há sinal de lesões no corpo, e se a quantidade ingerida nos primeiros minutos está normal. Qualquer coisa estra- nha neste momento é um alarme para ação. O ato de alimentar os peixes e camarões é como se fosse uma consulta diária do psicanalista ao paciente, para “sen- tir” o espírito do vivente naquele momento e antecipar “imprevistos” previsíveis. Outro fator muito distinto entre agricultura/pecuária da aquicultura está na mera existência do oxigênio para aquele ser continuar vivo. Isto nem passa pelo pensamento de um agricultor/pe- cuarista, pois o oxigênio está sempre disponível - 21% do ar. Já em água, o oxigênio pode ser considerado praticamente insolúvel, alcançando a concentração má- xima de 7 a 8 mg O2 por litro sob as nossas condições climáticas (mas na prática, está geralmente bem abaixo disto no tanque). E as toneladas de peixe ou camarão dentro do tanque dependem daqueles poucos mg de oxi- gênio para sobreviver - a cada minuto, de cada hora, de cada dia do ano. Se faltar durante uma hora que seja, pode morrer, de repente, todo o esforço e investimento de meses. Mas o que tem isso a ver com a pauta inicial de distribuição do alimento? É que a disponibilidade versus falta de oxigênio na criação é controlada pelo alimento ministrado. A ração faz com que o metabolis- mo dos animais consuma oxigênio, e os restos de ração não ingeridos e o resíduo do processamento do alimento no animal (fezes) constituem alimento para toneladas de bactérias crescerem e consumirem muito mais oxigê- nio da água. Nada disso é sequer imaginado na criação de animais domésticos tradicionais, mas faz a diferença entre sobreviver ou falir na aquicultura - no transcorrer de cada noite de verão. Além disso, o sonho maior do setor produtivo - intensificar o cultivo pelo aumento de densidade dos animais - tem seu gargalo exatamente neste ponto de manejo do alimento versus a consequen- te disponibilidade de oxigênio dissolvido. Aumentar ar- tificialmente o oxigênio dissolvido em sistemas intensi- vos, como recirculação, raceways e bioflocos, depende de elevar bastante o consumo de energia elétrica com- prada da rede pública, versus o preço de venda possível do produto gerado. Em resumo, a atividade prosaica de um aquicultor ministrar ração aos seus animais aquáti- cos define o futuro daquele ciclo de cultivo - sucesso ou fracasso. Ministrar a ração constitui o momento de tomar o pulso de seus animais. Curiosamente, o uso de sensores e automação da alimentação poderão ajudar 13Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Notícias & NgóciosOn-line muito neste sentido. Mas além do capital necessário, num desenvolvimento ainda de fronteira de conhecimen- to neste setor, tais equipamentos não cobrem ainda os vários fatores que estão sendo avaliados in loco ao se fazer a alimentação dos tanques por gente. Isto lembra o ensinamento recebido do diretor operacional de um grande empreendimento urbano. Tal empreendimento é destaque mundial em tecnologia de ponta e estratégias ambientais na área de saneamento. O esgoto coletado em um bairro escorre por gravidade até onde é possível pelo nível do terreno, e neste ponto existe uma torre de carga com bombas para bombear o esgoto para adiante, até o local do tratamento. Com isso, a área urbana tem várias torres de carga dispostas nos locais adequados para coletar e levar o esgoto no trajeto desejado. Como o esgoto transporta detritos e objetos [impensáveis], podem ocorrer problemas, como entupimento e trava- mento das bombas - o que requer monitoramento. Este diretor era indagado porque não automatizava o moni- toramento, e ainda mantinha motoboys que percorriam as torres, registrando em cada uma, a checagem feita. Ele respondia que, ao automatizar, se passa toda a res- ponsabilidade ao “sistema”, e isto leva a deixar frouxo o monitoramento real de ocorrências; com gente de verda- de indo ao local, ele conseguia até detectar vazamento de esgoto na rua, que não seria detectável por automa- ção tradicional. Assim, talvez o ato de ministrar a ração tenha um significado bem mais profundo na aquicultura do que em outros setores agropecuários, e por isso, uma resistência maior à automatização. De: Wagner Camis wagcamis@gmail.com Para: lista@panorama-l.com.br Assunto: Re: Automatização A presença humana no tratar é imprescindível. Estamos em fase final de testes de um equipo que “orienta o tratador na quantia a ser fornecida, mas não dispensa a sua presença”. Visitei várias pisciculturas automati- zadas, mas que tinham a supervisão de um profissional para cortar ou continuar o fornecimento de ração. Com este procedimento de orientar o trato estamos com uma economia na ordem de 20 % na ração sem prejudi- caro seu crescimento. 14 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 A água na aquicultura | Parte 3 Por: Fernando Kubitza, Ph.D. Acqua Imagem Serviços em Aquicultura fernando@acquaimagem.com.br A origem da amônia, do nitrito e do nitrato As fontes de amônia (e, consequentemente, de nitrito e de nitrato) nos cultivos de organismos aquáticos são: a) o metabolismo dos aminoácidos dos próprios peixes e camarões; b) a decomposição dos resíduos orgânicos (microalgas e bactérias mortas, fezes, sobras de ração, carapaças, muco e adubos orgânicos) por bactérias no solo e na água; c) os fertilizantes nitrogenados que contêm amônia, ureia e nitrato (Figura 1). Nos cultivos intensivos, os peixes e camarões são alimentados com rações ricas em proteínas. As proteínas são formadas por aminoá- cidos, que têm esse nome por possuírem um grupo amino (NH2). Uma parte dos aminoácidos da ração é assimilada (60 a 85%), enquanto outra é excretada nas fezes (15 a 40%). O quanto de aminoácidos é assimi- lado pelos animais ou excretado nas fezes depende da qualidade dos ingredientes usados, do equilíbrio (balanço) entre os aminoácidos e da quantidade de proteína (aminoácidos) na ração. Também é influenciado pela qualidade do processamento ao qual a ração foi submetida. Dos aminoácidos assimilados na digestão, uma parte é usada na síntese de proteínas e tecidos corporais. O excedente é metabolizado para gerar energia. A amônia (gerada a partir do grupo amino dos aminoácidos) é um resíduo resultante do uso dos aminoácidos como fonte de energia. A amônia produzida tem que ser rapidamente excretada do sangue para a água. Isso ocorre em grande parte por difusão através das brânquias. Uma pequena fração da amônia é excretada via urina. Os aminoácidos excretados nas fezes dos animais (não digeridos e ou não assimilados) e presentes em outros resíduos orgânicos (microalgas mortas, muco, adubos orgânicos, animais mortos, carapaças, sobras de ração, etc.) são usados como alimento por bactérias, que também excre- tam amônia como um resíduo final do metabolismo dos aminoácidos. Na água, a amônia pode seguir dois caminhos: a absorção por microalgas (ou fitoplâncton) ou a oxidação a nitrito e nitrato, um processo realizado por algumas bactérias, autotróficas ou nitrificadoras (entre elas as bactérias dos gêneros Nitrosomonas, Nitrobacter e Nitrospira). O impacto da amônia, do nitrito e do nitrato sobre o desempenho e a saúde dos peixes e camarões. mônia (NH3), nitrito (NO2-) e nitrato (NO3-) são compostos nitrogenados que se acumulam na água e podem colocar em ris- co o desempenho, a saúde e a sobrevivência dos peixes e camarões. Problemas com amô- nia e nitrito geralmente ocorrem em cultivos intensivos com altas taxas de alimentação, seja em viveiros, em sistemas com recircu- lação de água (SRA’s) ou em sistemas com a tecnologia de bioflocos (BFT). Problemas com excesso de nitrato são raros nos cultivos em viveiros, mas podem ocorrer em SRA’s e BFT’s. A amônia tem origem na excreção dos peixes e camarões e na decomposição do material orgânico nos ambientes de cultivo. O nitrito e o nitrato são produtos da oxidação da amônia por bactérias nitrificadoras. O uso excessivo de fertilizantes nitrogenados também pode causar aumento na concen- tração de amônia, nitrito e nitrato na água. A susceptibilidade dos peixes e camarões à intoxicação por esses compostos varia em função da espécie, das condições de quali- dade de água e de saúde dos animais, entre outros fatores. Esse artigo reúne os efeitos da amônia, nitrito e nitrato no desempenho e saúde dos peixes e camarões, e sugere boas práticas de manejo para minimizar problemas relacionados a esses compostos. 15Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Figura 1 - Principais fontes de amônia, e consequentemente de nitrito e nitrato, nos tanques de cultivo de peixes e camarões Espécies m arinhas na Galícia A água na aquicultura - Parte 3 As diferentes formas de amônia, nitrito e nitrato na água A amônia pode estar presente na água como um íon NH4 + (forma pouco tóxica) ou como um gás NH3 (forma muito tóxica). Com os kits de análise de água mensuramos a concentração total de amônia (amônia total), ou seja, NH4 + e NH3 juntos. O pH da água determina o percentual da amônia total que está na forma de NH3 ou de NH4 + (ver a Tabela 1). A forma não ionizada NH3 é uma molécula de menor tamanho e sem carga. Assim, consegue atravessar membranas celulares mais facilmente (por simples difusão). Por esse motivo o NH3 é tido como mais tóxico que o NH4 + quando presentes na água. Mas, no sangue e tecidos dos peixes e camarões, onde o pH é de 7,4 a 8,0, a maior parte do gás amônia (NH3) gerado no metabolismo ou absorvido da água, se converte em NH4 +. Em excesso no sangue e nos tecidos, o íon NH4 + ocupa o lugar do íon K+ e assim interfere na transmissão dos impulsos nervosos (entre os neurônios) e na contração dos músculos. Distúrbios nervosos e espasmos musculares são alguns dos principais sintomas da intoxicação por amônia nos peixes e camarões. Mais informações sobre o risco de toxidez por amônia em peixe e camarões podem ser encontradas em artigo publicado nessa revista (Panorama da AQÜICULTURA, 160, 2017). De acordo com o pH da água, o nitrito pode estar presente em duas formas: HNO2 (ácido nitroso) e NO2 - (íon nitrito). Sob valores de pH acima de 5,5 praticamente não existe a forma de HNO2 na água. Portanto, em ambientes de cultivo de peixes e camarões, onde o pH da água geralmente está entre 6,0 e 10,0, a toxidez por nitrito, se ocorrer, será provocada exclusivamente pelo íon NO2 -. Em relação ao nitrato, esse composto somente está presente na água na forma de íon NO3 -. Tabela 1 - Porcentagem de amônia na forma tóxica (NH3) em relação à amônia total de acordo com o pH na água doce (0 ppt) e na água do mar (36 ppt) a 28ºC pH da água Porcentagem de (NH3) sobre a amônia total (a 28oC)1 Água doce 0 ppt Água mar 36 ppt 6,5 0,22% 0,18% 7,0 0,71% 0,58% 7,5 2,2% 1,8% 8,0 6,6% 5,5% 8,5 18,4% 15,6% 9,0 41,7% 36,8% 9,5 69,2% 64,8% 10,0 87, 7% 85,4% 1Ambient Water Quality Criteria for Ammonia in Saltwater - 1989, EPA 440/5-88-004. Análises de amônia, nitrito e nitrato No mercado há kits de análises de amônia, de nitrito e de nitrato que se baseiam em métodos colorimétricos (Figura 2) com boa precisão para as necessidades dos cultivos aquícolas. Ao utilizar esses testes de campo, muitas vezes a cor da amostra testada se iguala ou excede a cor de maior concentração na escala 16 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 A ág ua n a aq ui cu lt ur a - Pa rt e 3 de cores. Quando isso acontece é recomendável di- luir a amostra com água limpa (água deionizada, por exemplo, ou mesmo água de chuva) e refazer o teste novamente, até que a cor obtida se aproxime a uma das cores mais centrais da escala. Quando a amostra foi diluída, é necessário multiplicar o resultado pelo fator de diluição. Veja exemplos na Tabela 2. Para diluir uma amostra pela metade ou 50%, colete 10 ml da água a ser analisada e misture com 10 ml de água limpa. Dessa amostra diluída, retire o volume que precisa para fazer o teste. O fator para a multi- plicação do resultado do teste com a amostra diluída nesse caso será 2. Formas de expressão da concentração de amônia, nitrito e nitrato – é preciso atenção à forma como as concentrações são apresentadas nos testes colorimétricos. Geralmente a concentração é expressa em ppm (“parte por milhão”), ou em mg/l (miligrama por litro). Um ”ppm” é igual a um “mg/l”. Porém, os resultados podem em ser ppm de equivalentes de nitrogênio (N-NH3, ou N-NO2 - ou N-NO3 -) ou em ppm da substânciamedida (NH3, NO2 - ou NO3 -). Por Figura 2 - Tabelas de cores de alguns testes colorimétricos para amônia total, nitrito e nitrato exemplo, a amônia (NH3) tem aproximadamente 82% de N. Dessa forma 1 mg de NH3/l equivale a 0,82 mg de N-NH3/l (fator 0,82). O nitrito (NO2 -) tem 30% de nitrogênio em sua composição. Portanto, 1 mg de NO2 -/l equivale a 0,30 mg de N-NO2 -/l (fator 0,30). E o nitrato (NO3 -) tem 23% de N em sua composição, assim 1 mg de NO3 -/l equivale a 0,23 mg de N-NO3 -/litro (fator 0,23), conforme resumido na Tabela 3. Note que para o nitrito e o nitrato, que possuem percentuais menores de nitrogênio em sua composição, as concentrações quando expressas em equivalentes de N são muito menores do que quando expressas para as substâncias nitrito ou nitrato. Tabela 2 - Preparo de 20 ml de amostras diluídas e seus respectivos fatores de multiplicação Tabela 3 - Fator de equivalência entre as formas de expressão das concentrações de amônia, nitrito e nitrato Diluição Fator de multiplicação Vol. água do tanque (ml) Vol. água deionizada (ml) 50% 2,0 10 10 25% 4,0 5 15 20% 5,0 4 16 10% 10,0 2 18 5% 20,0 1 19 Amônia mg/l Nitrito mg/l Nitrato mg/l NH3 1,00 NO2 - 1,00 NO3 - 1,00 N-NH3 0,82 N-NO2 - 0,30 N-NO3 - 0,23 Fator x 0,82 Fator x 0,30 Fator x 0,23 Concentrações seguras e tóxicas de amônia, nitrito e nitrato para os peixes e camarões Concentrações de amônia, nitrito e nitrato que matam 50% dos animais em 96 horas de exposição contínua (sigla LC50-96h) foram determinadas para diversas espécies de pei- xes e camarões de interesse para aquicultura (Tabela 4). Essas concentrações podem apresentar consideráveis variações entre um estudo e outro, refletindo a influência de diversos fatores relacionados à qualidade da água (salinidade, dureza total, concentração de cloretos, temperatura, entre outros) e à condição geral dos animais no momento das pesquisas. Embora haja algumas discordâncias, em geral os especialistas consideram como seguras as concentrações de até 10% dos valores de LC50-96h. Desse modo, para peixes tropicais como a tilápia e o bagre do canal (catfish americano), os seguintes níveis seguros ou de atenção podem ser considerados: amô- nia 0,14 mg/l de N-NH3 (ou 0,17 mg/l NH3); nitrito 0,7 mg/l N-NO2 - (2,2 mg/l NO2 -) e nitrato 140 mg/l N-NO3 - (ou 620 mg/l NO3 -). Para o camarão marinho L. vannamei: amônia 0,06 mg/l de N-NH3 (ou 0,07 mg/l NH3); nitrito 0,6 a 7,6 mg/l N-NO2 - (2 a 23 mg/l NO2 -) e nitrato 220 mg/l N-NO3 - (620 mg/l NO3 -). 17Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Espécies m arinhas na Galícia A água na aquicultura - Parte 3 Efeito da amônia no desempenho e saúde dos peixes A amônia interfere com a transmissão de impulsos nervosos e com a contração muscular nos peixes. Peixes intoxicados por amônia apresentam distúrbios nervosos, espasmos musculares, natação errática e descoordenada. As brânquias ficam inflamadas e os peixes têm dificuldade de respirar, mesmo com adequados níveis de oxigênio na água. Para a maioria dos peixes de águas quentes culti- vados no Brasil, podemos considerar como um valor de atenção uma concentração de NH3 entre 0,1 e 0,2 mg/l (10% do valor de LC50-96h). Concentrações acima desses limites podem resultar em irritação e danos às brânquias, dificuldades respiratórias e, consequentemente, prejuízos ao crescimento. Juvenis de tilápia-do-Nilo expostos a concentrações de amônia tóxica de 0,1 mg/l apresentaram redução de 28% no ganho de peso (Tabela 5). Embora a tilápia possa suportar concentrações relativamente elevadas de amônia, os dados apresentados na Tabela 5 indicam ser necessário evitar que a concentração de amônia tóxica na água de cultivo supere 0,05 mg de NH3/l de modo a não prejudicar demasiadamente o crescimento. Com uma temperatura de 28oC na água, o valor de 0,05 mg NH3/l é atingido a uma concentração de amônia total próxima de 7 mg NH3/l a pH 7,0; ou 0,76 mg NH3/l a pH 8,0; ou 0,12 mg NH3/l a pH 9,0 (ver Tabela 1 para os percentuais de NH3 na amônia total em função do pH da água). Não foi observado aumento na mortalidade em juvenis de catfish americano (bagre-do-canal) expostos a níveis subletais de amônia (0,43 mg N-NH3/l) e em segui- da desafiados com a bactéria Flavobacterium columnare (Farmer et al 2011). Da mesma forma, também não se observou aumento na mortalidade de juvenis de tilápias que foram expostos a 0,37 mg N-NH3/l antes do desafio com a bactéria Streptococcus agalactiae, em comparação com peixes desafiados e que não foram previamente ex- Tabela 4 - Concentrações letais (LC50-96h) de amônia (N-NH3), nitrito (N-NO2 -) e nitrato (N-NO3 -) para algumas espécies de peixes e camarões cultivadas no Brasil (1). Entre parênteses os limites máximos considerados como seguros para a espécie. Esses valores devem servir como valores de atenção e equivalem a 10% do valor LC50-96h mg/l N-NH3 mg/l N-NO2- mg/l N-NO3- Tilápia do Nilo 1,4 a 2,6 (0,14) (2) 8 a 338 (0,8) ND (500) (5) Tambacu 1,34 (0,13) ND ND Pacu 0,7 (0,07) ND ND Bagre do canal 1,4 a 3,1 (0,14) 7,1 (0,7) 1.400 (140) Lambari 0,54 (0,05) ND ND Carpa comum 1,13 a 1,30 (0,11) 20,0 (2,0) 1.075 (107) Truta arco-íris 0,08 a 0,9 (0,008) (2) 0,24 a 11 (0,024) ND (< 30 a 80) (5) Camarão L. vannamei 0,6 a 2,8 (0,06) (3) 5,7 a 15,0 (0,57) (4) 76,0 a 321,0 (7,6) ND (220) (5) Camarão P. monodon 0,96 a 1,08 (0,10) 38 - 171 (3,8) 1.450 - 2.320 (145) (1) Valores obtidos nos estudos de Rice e Stokes, 1974; Colt e Tchobanoglous 1976; Colt e Tchobanoglous 1978; Tomasso et al 1980; Reinbold e Pescitelli 1982; Palachek and Tomasso 1984; Chen e Lei 1990; Abdala e McNabb 1998; Atwood et al 2001; Tsai and Chen (2002); Lin and Chen 2003; Avilez et al 2004; Costa et al. 2004; Gross et al 2004; Sowers et al 2004; Abbas, 2006; Máchová et al 2006; Matinez et al 2006; Yanbo et al 2006; Wang et al 2006; Tilak et al 2007; Schuler 2008; Brinkman et al 2009; Silva 2013; Davidson et al 2014; Kuhn et al 2014; Quaresma 2016; Monsees et al 2017; Ramírez-Rochín et al 2017. (2) tolerância ao nitrito aumenta com a elevação nos níveis de cloreto na água. Valores mais baixos em águas com pouco cloreto; (3) salinidades de 0,6 a 2 ppt. A tolerância ao nitrito aumenta com a elevação da salinidade da água; (4) salinidades de 15 a 35 ppt. A tolerância ao nitrito aumenta com a elevação da salinidade da água; (5) ND = valores de LC50-96h ainda não determinados. Os valores de atenção foram sugeridos com base em resultados de experimentos de crescimento com diferentes níveis de nitrato. "Para a maioria dos peixes de águas quentes cultivados no Brasil, podemos considerar como um valor de atenção uma concentração de NH3 entre 0,1 e 0,2 mg/l. Concentrações acima desses limites podem resultar em irritação e danos às brânquias, dificuldades respiratórias e, consequentemente, prejuízos ao crescimento dos peixes." 18 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 A ág ua n a aq ui cu lt ur a - Pa rt e 3 postos à amônia (Evans et al 2006). Apesar disso, é razoável acreditar que peixes expostos à concentrações subletais de amônia sejam menos tolerantes a enfermidades, diante da diversidade de espécies de peixes e patógenos presentes nos empreendimentos aquícolas. Efeitos da amônia sobre o desempenho, saúde e sobrevivência dos camarões Concentrações de amônia que matam 50% dos camarões marinhos são apresentadas nas Tabelas 6 e 7. Em geral, os camarões são mais sensíveis à amônia nos estágios mais jovens e em águas de baixa salinidade. Concentrações subletais são aquelas que, embora não provoquem diretamente a morte, acabam prejudi- candoo desempenho e a saúde dos animais. Camarões expostos a concentrações subletais de amônia geralmente apresentam baixo consumo de alimento, crescimento re- duzido e podem apresentar menor sobrevivência durante o cultivo. A intoxicação por amônia reduz a capacidade de transporte de oxigênio na hemolinfa dos camarões e causa inflamação nas brânquias. Isso faz com que os animais apresentem dificuldade respiratória e de osmor- regulação. Há relatos de que a intoxicação por amônia também aumenta a frequência de mudas nos camarões. Da mesma forma como nos peixes, a amônia apresenta efeitos neurotóxicos nos camarões, levando a natação errática e espasmos musculares. Na Tabela 8 são resumidos os resultados de um experimento realizado por Yang (1990) e relatado por Chien (1992). A partir de 0,1 mg/l de amônia na forma tóxica (NH3) o crescimento de Penaeus chinensis foi de 60% em relação aos animais mantidos em águas pratica- mente sem amônia tóxica (controle). Com 0,6 a 0,8 mg NH3/l os camarões cresceram apenas 46% comparados ao grupo controle. Animais expostos a 1,5 mg NH3/l tiveram crescimento de apenas 22% em relação ao grupo controle. Portanto, no cultivo de camarões marinhos deve ser respeitado um nível de atenção de amônia tóxica (NH3) de 0,1 mg NH3/l. Nos cultivos intensivos de camarões em viveiros com baixa renovação de água e elevadas taxas de alimentação (acima de 150 a 200 kg de ração/ ha/dia) a concentração de amônia total pode chegar a 4 a 6 mg/l, resultando em amônia tóxica entre 0,24 e 0,36 mg/l em águas de pH 8,0. Caso o pH se eleve para 8,5 em função da fotossíntese, 6 mg/litro de amônia total Tabela 5 - Efeito da exposição contínua a diferentes concentrações de amônia tóxica (em mg/l de NH3) sobre o peso final e ganho de peso (GDP) da Tilápia-do-Nilo. Peixes com peso médio inicial de 19 g. (Adaptado de El-Sherif e El-Feky, 2008) NH3 (mg/l) P final (g) GDP (g) GDP Relativo 0,004 37,7 18,7 100% 0,01 37,2 18,2 97% 0,05 36,4 17,4 93% 0,10 32,5 13,5 72% 0,15 26,9 7,9 42% Tabela 6 - Concentrações letais (LC50-24 h) de amônia (NH3) para diferentes estágios de vida do camarão Litopenaeus vannamei, a uma temperatura de 26oC e salinidade de 34 ppt na água (Adaptado de Cobo et al 2012) *Lin e Chen (2001), água com salinidade de 35 ppt e 23oC Estágio de desenvolvimento NH3 (mg/l) Zoea 1 0,73 Zoea 2 1,82 Zoea 3 2,92 Mysis 1 3,40 Mysis 2 3,04 Mysis 3 3,16 PL-1d 2,31 PL-22 mm* 1,94 Tabela 7 - Concentrações letais (LC50-96h) de amônia não ionizada (NH3) em mg de N-NH3/l para camarões Litopenaeus vannamei com 22 mm de comprimento (Lin e Chen, 2001) e Litopenaeus schmitti com 15 mm (Barbieri, 2010) sob diferentes salinidades Salinidade 15 ppt 25 ppt 35 ppt L. vannamei (23oC; 22 mm) 1,20 1,57 1,60 Salinidade 5 ppt 20 ppt 35 ppt L. schmitti (20oC; 15 mm) 0,69 0,86 1,20 Nível de atenção (10% LC50) 0,12 0,16 0,16 Tabela 8 - Crescimento de Penaeus chinensis com 4 cm, mantidos 10 dias sob diferentes concentrações de amônia não ionizada – NH3 em água de pH 8,4 (Adaptado de Chien, 1992) Amônia total NH3 (pH 8,4) Crescimento em 10 dias Controle Praticamente zero 1,15 cm 0,6 a 2 mg/l 0,07 a 0,2 mg/l 0,70 cm 5,0 a 7 mg/l 0,6 a 0,8 mg/l 0,54 cm 14,0 mg/l 1,5 mg/l 0,26 cm 19Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Espécies m arinhas na Galícia A água na aquicultura - Parte 3 equivaleriam a 0,9 mg de NH3/l. Níveis elevados assim de NH3 prejudicam o crescimento e ainda podem reduzir a resistência dos camarões aos patógenos. Jia et al 2017 observaram redução na contagem de hemócitos e na atividade das enzimas PO (fenoloxidase) e SOD (superóxido dismutase) em camarões marinhos Litopenaeus vannamei de 8,7 g expostos por 48 horas a concentrações subletais de amônia tóxica de 0,1 ou 0,5 mg N-NH3/l, comparados a um grupo controle de camarões mantidos em água com 0,001 mg de N-NH3/l (Tabela 9). Os hemócitos e as enzimas PO e SOD têm ação importante nos mecanismos de defesa e na resistência dos camarões contra os patógenos. Liu e Chen (2004) observaram menor intensidade de respostas imunológicas e maior mortalidade após infecção experimental por Vibrio alginolyticus em gru- pos de camarões marinhos Litopenaeus vannamei que foram mantidos em águas com amônia total acima de 5 mg/l (Tabela 10). Efeitos do nitrito no desempenho, saúde e sobrevivência dos peixes Uma vez presente no sangue dos peixes, o nitrito sse liga a hemoglobina. A hemoglobina é a proteína responsável pelo transporte de oxigênio para as células, tecidos e órgãos do corpo. O nitrito oxida o íon ferro (do estado Fe2+ para Fe3+) presente na hemoglobina, e assim ela perde a capacidade de transportar o oxigênio. A hemoglobina combinada ao nitrito e com o seu íon ferro oxidado é chamada “ferrihemoglobina” ou “metehemoglobina”. Tabela 9 - Contagem total de hemócitos (THC), atividade das enzimas fenoloxidase (PO) e superóxido dismutase (SOD) na hemolinfa e no hepatopâncreas, e sobrevivência do camarão marinho Litopenaeus vannamei após 48 horas de exposição a diferentes concentrações de amônia tóxica (Adaptado de Jia et al 2017) Hemolinfa (U/mg de proteína) Hepatopâncreas (U/mg de proteína) Sobrevivência (%) N-NH3 THC PO SOD PO SOD 5 ppt 30 ppt 0,001 mg/l 78 0,68 1,45 17,80 7,10 100% 100% 0,1 mg/l 43 0,46 0,95 10,40 4,70 100% 100% 0,5 mg/l 32 0,44 0,70 7,20 4,00 86% 95% O grau de toxidez por nitrito pode ser deter- minado pela abundância de metehemoglobina no sangue dos peixes. Boyd (1990) relata o resultado de diversos estudos sobre a toxidez do nitrito com o bagre-do-canal. Em um destes experimentos foi registrado que 21% da hemoglobina estava na forma de metehemoglobina após os peixes serem submetidos a 1 mg/l de N-NO2 - por 24 horas. Esse percentual foi de 60% em peixes mantidos por 24 horas em água com 2,5 mg N-NO2 -/l. Quando a porcentagem de metehe- moglobina ultrapassa a 5% da hemoglobina, os peixes podem sofrer déficits de oxigênio, mesmo com adequados níveis de oxigênio na água. Por esse motivo, a mortalidade de peixes intoxicados por nitrito tende a ser maior sob baixas concentrações de oxigênio. Tabela 10 - Mortalidade acumulada de camarões marinhos Litopenaeus vannamei desafiados com uma injeção contendo a bactéria Vibrio alginolyticus e em seguida mantidos em água com diferentes concentrações de amônia (Adaptado de Liu e Chen (2004)) Amônia Total (mg/l) N-NH3 (mg/l) Mort. acumulada 7 dias após o desafio 0,01 0,00 23,3% 1,10 0,06 20,0% 5,24 0,28 40,0% 11,10 0,85 43,3% 21,60 1,14 50,0% 21,60 (não injetados) 1,14 0,0% "Concentrações subletais embora não provoquem diretamente a morte, acabam prejudicando o desempenho e a saúde dos animais. Camarões expostos a concentrações subletais de amônia geralmente apresentam baixo consumo de alimento, crescimento reduzido e menor sobrevivência durante o cultivo." 20 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 A metehemoglobina confere ao sangue uma colo- ração marrom. No bagre-do-canal, níveis de metehemo- globina entre 25 a 30% já resultam em uma coloração ligeiramente marrom do sangue. Com 50% ou mais de metehemoglobina, o sangue desse peixe apresenta uma coloração marrom escuro, como chocolate. Esta coloração marrom pode ser observada examinando as brânquias ou a cor do sangue que sai de um corte do pedúnculo caudal do peixe. Em água doce (salinidade zero), a exposição contínua a concentrações subletais de nitrito (0,3 a 0,5 mg/l) pode causar redução no crescimento e na resistência dos peixes às doenças. A presença de íons cloreto na água reduz o risco de toxidez por nitrito. Por isso a tolerância dos peixes ao nitrito aumenta com o aumento da salinidade da água.Na Tabela 11 são resumidas informações sobre a toxidez de nitrito para algumas espécies de peixes cultivadas no Brasil. Na Tabela 11 podemos observar que a tilápia- -do-Nilo é uma das espécies mais tolerantes ao nitrito. Para alevinos ao redor de 4 g a LC50-96 h se elevou de 81 para 338 mg/l de N-NO2 - com a elevação da concentração de íons cloretos de 6 para 375 mg/l. Interessante observar que tilápias menores parecem tolerar concentrações mais elevadas de nitrito do que tilápias de maior tamanho, contrariando o padrão de que peixes menores (formas mais jovens) geralmente são mais sensíveis a substâncias tóxicas. Peixes nativos como a matrinxã e o tambaqui parecem ser bem menos Figura 3 - Pilha de sal ao lado de um viveiro em fazenda de cultivo de catfish no Alabama, USA. Aplicações de sal são usadas como medida preventiva para minimizar o risco de toxidez por nitrito tolerantes ao nitrito do que as tilápias. Assim, no cultivo dessas espécies em viveiros com altas taxas de alimentação e baixa renovação de água (condições que podem favorecer o aumento na concentração de nitrito) é importante elevar a concentração de cloreto na água, reduzindo o risco de toxidez por nitrito. Os íons cloreto competem com o nitrito pelos mesmos re- ceptores presentes nas membranas das células branquiais, reduzindo assim a absorção de nitrito pelos peixes. Nos cultivos de peixes podemos elevar as concentrações de íons A ág ua n a aq ui cu lt ur a - Pa rt e 3 Considerar como concentração segura, o valor de 10% dos valores de LC50-96h. Por exemplo, para a Tilápia-do-Nilo, 0,3 a 112 mg/l de NO2 -, dependendo da salinidade da água. Para o tambaqui, 0,6 mg/l de NO2 -. Tabela 11 - Concentrações letais (LC50-96h) de nitrito (em mg/l deNO2 - ou mg/l de N-NO2 -) para diferentes espécies de peixes cultivadas no Brasil. Concentrações de cloreto na água (Cl- em mg/l) LC50-96h (mg/l) Espécie Peso (g) NO2 - N-NO2- Cl- (mg/l) Referências Jundiá cinza 8 21,0 6,3 3,9 Lima et al 2011 Tilápia-do-Nilo 0,09 544,7 163,4 ND Silva 2013 Tilápia-do-Nilo 4,4 270,0 81,0 6,0 Atwood et al 2001 Tilápia-do-Nilo 90,7 26,7 8,0 ND Atwood et al 2001 Tilápia-do-Nilo 4,4 1.126,7 338,0 375,0 Atwood et al 2001 Tilápia-do-Nilo 1,8 93,9 28,2 35,0 Yanbo et al 2006 Tilápia-do-Nilo 1,8 148,9 44,7 70,0 Yanbo et al 2006 Matrinxã 45 2,9 0,9 ND Avilez et al 2004 Tambaqui 6,1 1,8 ND COSTA et al., 2004 Bagre-do-canal 23,7 7,1 ND Palachek and Tomasso 1984 Black bass 467,3 140,2 ND Palachek and Tomasso 1984 Cl- com a aplicação de sal marinho (cloreto de sódio) nos viveiros. A quantidade de sal aplicada deve ser suficiente para manter uma proporção entre 6 a 10 unidades de cloreto (Cl-) para cada unidade de NO2 -. Por segurança, alguns especia- listas sugerem uma proporção de 20:1, conside- rando o baixo custo do sal e seus benefícios na aquicultura (ver matéria Panorama da AQÜI- CULTURA, 103 (17): p 14 a 23). A concentração de íons Cl- já existente na água e a expectativa de possíveis níveis de nitrito devem ser consideradas nesse cálculo. Alguns kits de análises oferecem opções para a análise da concentração de clo- reto na água. Assim é possível calcular a dose de sal necessária para prevenir ou amenizar a toxidez por nitrito, conforme a equação a seguir: Sal (g/m3) = [(6 a 10) x (NO2 - mg/l) - (Cl- mg/l)] / 0,6 Por exemplo, consideremos que a concentra- ção de nitrito possa chegar a valores próximo de 5 mg de NO2 -/l (que equivale a 1,5 mg de N-NO2 -/l) durante um cultivo intensivo de peixes em viveiros com alta taxa de alimentação e baixa renovação de água. E que a água não contém cloreto (água doce). 21Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Espécies m arinhas na Galícia A água na aquicultura - Parte 3 Com esses números na equação [(10 x 5 – 0)/0,6] deter- minamos a necessidade de aplicar 83 g de sal/m3 de água. Em um viveiro de 1.000 m2 com 1,5 m de profundidade média, ou seja, para 1.500 m3, são necessários 125 kg de sal. Essa aplicação de sal causa uma elevação praticamente imperceptível (apenas 0,08 ppt) na salinidade da água. Mas isso é suficiente para minimizar o risco de toxidez sob níveis de nitrito de até 5 mg de NO2 -/l (Figura 3). Efeitos do nitrito no desempenho, saúde e sobrevivência dos camarões Na Tabela 12 são resumidos alguns valores de LC50-96h de nitrito para o Litopenaeus vannamei, prin- cipal espécie de camarão cultivada no Brasil. Observe que para camarões com peso ao redor de 4 g os valores de LC50-96h são menores do que 12 mg de N-NO2 -/l a uma salinidade de 2 ppt, comparado a valores acima de 75 mg de N-NO2 -/l em salinidades maiores que 15 ppt. Considerando como seguras as concentrações de nitrito equivalente a 10% da LC50-96h, os limites de atenção de nitrito para camarões marinhos variam desde 0,6 mg de N-NO2 -/l em salinidades de até 1 ppt a 32 mg de N-NO2 -/l em salinidade de 35 ppt. Portanto, a presença de íons cloretos na água também parece reduzir a absorção de nitrito através das brânquias dos camarões marinhos. A hemocianina é a proteína que transporta oxigênio na hemolinfa dos camarões. Diferente da hemoglobina que tem o ferro como metal em sua composição, a he- mocianina possui o cobre. Acredita-se que, a exemplo da oxidação do íon Fe+2 na hemoglobina dos peixes, o nitrito unido à hemocianina no sangue dos camarões possa oxidar os íons cobres presentes na hemocianina e assim prejudicar a capacidade de transporte de oxigênio das brânquias aos demais tecidos e órgãos do corpo dos crustáceos. Problemas com a intoxicação de camarões por nitrito são raros nos cultivos em águas salgadas, visto que a tolerância do camarão ao nitrito é muito alta em salinidades acima de 20 ppt (alta concentração de íons cloreto). Mas podem ocorrer em condições de baixa salinidade, especial- mente em viveiros mais fundos (onde o lodo geralmente é anaeróbico) e com pouca circulação de água. Perdas de camarões por intoxicação de nitrito são frequentes em sis- temas de recirculação de água ou em cultivos com bioflocos sob baixas salinidades (entre 2 a 10 ppt). Tabela 12 - Concentrações letais (LC50-96h) e concentrações seguras de nitrito (aqui estimadas ao redor de 10% da LC50-96h) para o camarão marinho Litopenaeus vannamei de diferentes pesos e a diferentes salinidades (Sal – em ppt ou g/litro) na água Sal (ppt) Peso (g) LC50-96hmg N-NO2-/l Conc. segura mg N-NO2-/l Referências 0,6 4,4 5,7 0,6 Ramírez-Rochín et al 20171 4,4 7,0 0,7 2 4,4 12,4 1,2 2 0,2 8,9 0,9 Gross et al 2004 3 0,6 15,2 1,5 Wang et al 2006 10 0,7 8,4 0,8 Sowers et al 2004 15 3,9 76,5 7,6 Lin and Chen (2003)25 3,9 178,0 17,8 35 3,9 321,0 32,1 Camarões mar inhos submetidos a concentrações subletais de nitrito apresen- taram reduzido crescimento e sobrevivência (Tabelas13 e 14). Camarões Litopenaeus vannamei, mantidos em con- centrações de N-NO2 - de 5 mg /l ou superior, apresentaram menor contagem de hemó- citos (células sanguíneas de defesa) e menor atividade da enzima fenoloxidase (enzima que desencadeia uma cascata de reações imunológicas im- portantes para a defesa dos camarões), comparados a ca- marões que foram expostos a "Tilápias menores parecem tolerar concentrações mais elevadas de nitrito do que tilápias de maior tamanho, contrariando o padrão de que peixes menores geralmente são mais sensíveis a substâncias tóxicas. Peixes nativos como a matrinxã e o tambaqui parecem ser bem menos tolerantes ao nitrito do que as tilápias." 22 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 A ág ua n a aq ui cu lt ur a - Pa rt e 3 no máximo 1 mg N-NO2 -/l (Tseng e Chen 2004).Nesse mesmo estudo, os camarões que foram desafiados com uma injeção de Vibrio alginoliticus e em seguida transferidos para tanques com 5 mg N-NO2 -/l ou mais apresentaram maior mortalidade acumulada 7 dias após a infecção, comparados aos camarões transferi- dos para águas com até no máximo 1 mg/l de N-NO2 -. Efeitos do nitrato sobre o desempenho, saúde e sobrevivência dos peixes e camarões O nitrato é o produto final da oxidação da amônia pelas bactérias nitrificadoras. O nitrato é relativamente pouco tóxico comparado ao nitrito e à amônia. Porém, em concentrações muito elevadas, acima de 100 mg/l, pode prejudicar o desempenho dos peixes e camarões. Concentrações de nitrato acima de 400 mg/l pode ser letal para algumas espécies de peixes. Problemas com excessiva concentração de nitrato dificilmente ocorrem nos cultivos de peixes e camarões em viveiros, devido ao uso contínuo do nitrato como fonte de nitrogênio pelas microalgas. No entanto, em sistemas de recir- culação (SRA) e em sistemas com bioflocos (BFT) o nitrato pode atingir concentrações bastante elevadas na água (acima de 400 mg N-NO3 -/l) e por isso precisa ser monitorado com atenção. Concentrações letais e seguras de nitrato para alguns peixes e camarões são apresentadas na Tabela 4. Níveis até 25 mg/l de N-NO3/litro são considerados adequados para o cultivo da maioria das espécies de peixes e crustáceos. Acima de 100 mg/l de N-NO3 requer atenção. Tro- cas de água são usadas para diluir o nitrato. Plantas também removem o nitrato da água. A denitrificação, um processo anaeróbico em que bactérias transformam o nitrato em gás nitrogênio, pode ser empregada para reduzir a concentração de nitrato na água dos SRA’s e nos sistemas BFT. Tilápia-do-Nilo e nitrato - Monsees et al 2017 observa- ram redução de 29% no ganho de peso e uma conversão 56% pior em juvenis de tilápia criados em água contendo 1.000 mg/l N-NO3 - comparado com juvenis mantidos em água com 500 mg/l N-NO3 - ou menor concentração de nitratos. Peixes expostos a 1.000 mg/l N-NO3 - apresenta- ram níveis elevados de nitrito e de metehemoglobina no sangue. Os autores concluíram que as concentrações de nitrato devem ser mantidas abaixo de 500 mg/l N-NO3 - em sistemas de recirculação com a tilápia-do-Nilo. Truta arco-íris e nitrato - Davidson et al 2014 sugerem que trutas arco-íris criadas em sistemas de recirculação com água contendo entre 80 e 100 mg/l N-NO3 - não tiveram prejuízo no crescimento, mas apresentaram natação anormal (nado de lado e geralmente maior velocidade de natação), comparado a peixes criados em águas contendo 30 mg/l N-NO3 -. Tabela 13 - Efeito da concentração de nitrito sobre o ganho de peso e sobrevivência do camarão Litopenaeus vannamei em água com salinidade de 26 ppt e temperatura de 28oC (Adaptado de Melo et al 2016) N-NO2- (mg/l) P. inicial (g) P. final (g) GDP (g) GDP relativo Sob (%) 0 1,55 2,97 1,42 100,0% 96,3 10 1,59 2,87 1,28 90,1% 96,3 20 1,56 2,31 0,75 52,8% 85,2 40 1,63 1,71 0,08 5,6% 40,7 Tabela 14 - Efeito da concentração de nitrito na água sobre a sobrevivência, o peso final e a biomassa do camarão rosa Farfantepenaeus paulensis mantidos em água com salinidade de 15 ppt e temperatura de 25oC (Adaptado de Wasielesky et al 2017) Nitrito (mg/l N-NO2-) PF (mg) PF relativo Sobrev. (%) Biomassa final (g) Controle 431 100,0% 88,9% 11,5 2,55 438 101,6% 91,0% 11,9 10,2 381 88,4% 39,0% 4,5 20,4 311 72,2% 15,7% 1,5 "Problemas com excessiva concentração de nitrato dificilmente ocorrem em viveiros, devido ao uso contínuo do nitrato como fonte de nitrogênio pelas microalgas. Em sistemas de recirculação e em sistemas com bioflocos o nitrato pode atingir concentrações bastante elevadas na água e por isso precisa ser monitorado com atenção." 23Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro 2017 Espécies m arinhas na Galícia A água na aquicultura - Parte 3 Camarões marinhos e nitrato - Kuhn et al (2010) observaram redução no crescimento e na sobrevivência de camarões marinhos criados em água contendo cerca de 400 a 900 mg/l N-NO3 - (Ta- bela 15). Observaram ainda encurtamento das antenas, lesões no hepatopâncreas e anormalidade nas brânquias de camarões mari- nhos mantidos sob as mais altas concentrações de nitrato. Em um segundo experimento, esses mesmos autores demonstraram que a elevação da salinidade de 2 para 18 ppt contribuiu para minimizar o impacto negativo no crescimento e na sobrevivência dos cama- rões mantidos por 35 dias em águas com 440 mg mg/l N-NO3 -. Furtado et al 2014 também observaram alterações his- topatológicas nas brânquias e no hepatopâncreas, redução no comprimento das antenas, menor sobrevivência e pior cresci- mento e conversão alimentar em camarões marinhos, mantidos em sistema de bioflocos a concentrações de nitrato de 300 e 600 mg/l N-NO3 −. Concentrações de nitrato de até 150 mg/l N-NO3 − foram consideradas seguras (Tabela 16). Monitoramento da qualidade da água e boas práticas para prevenir problemas com amônia, nitrito e nitrato Em viveiros com águas verdes, quase toda a amônia gerada na excreção dos animais e na decomposição da ma- téria orgânica é assimilada pelas microalgas (fitoplâncton) em seus processos de síntese de proteína. Um eventual excedente de amônia na água é oxidado a nitrito e, em seguida a nitrato, pelas bactérias autotróficas (nitrificado- ras). Enquanto a taxa de geração de amônia for menor do que a taxa de assimilação de amônia pelo fitoplâncton e de oxidação pelas bactérias, a concentração de amônia na água dos viveiros permanecerá zerada. No entanto, a intensificação da produção de peixes e camarões em vi- veiros demanda altas taxas de alimentação, que em alguns momentos do cultivo chegam a ultrapassar a casa de 300 a 500 kg/ha. Em tais situações ocorre uma alta geração de amônia, ao mesmo tempo que um excessivo desenvol- vimento do fitoplâncton. As águas ficam muito verdes e com baixa transparência. Os valores de pH na água no período da tarde ficam perigosamente altos (acima de 9,0), aumentando a proporção de NH3 em relação à amônia total presente na água. Com o excesso de fitoplâncton, grande parte das microalgas começa a ficar sombreada, despro- vida de luz. Dessa forma, a remoção de amônia da água fica restrita a ação das microalgas nas águas mais super- ficiais dos viveiros. Sem luz suficiente, muitas microalgas acabam morrendo. Isso aumenta ainda mais a quantidade de matéria orgânica a ser decomposta na coluna d’água e nos sedimentos, resultando em aumento na geração de amônia e maior consumo de oxigênio. Assim, sob altas taxas de alimentação e excesso de fitoplâncton, a geração de amônia pode superar a capacidade de assimilação pelas microalgas e pelas bactérias autotróficas presentes nos viveiros, resultando em elevação nos níveis de amônia Tabela 15 - Sobrevivência, peso médio final e comprimento das antenas de camarões marinhos L. vannamei criados por 42 dias em sistema de bioflocos com salinidade de 11 ppt e sob diferentes concentrações de nitrato (Kuhn et al 2010) mg/l N-NO3- Sob (%) Peso final (g) Comp. antenas (cm) 35 87 9,3 8,5 220 87 8,7 7,2 435 64 7,5 5,1 910 15 5,0 2,0 Tabela 16 - Sobrevivência, peso médio final, conversão alimentar e comprimento das antenas em camarões marinhos L. vannamei criados por 42 dias em águas contendo diferentes concentrações de nitrato. Sistema de bioflocos, salinidade 23 ppt, peso médio inicial 1,3 g. (Furtado et al 2014) N-NO3- Sob (%) PM final (g) Conv. Alim. Comp. antenas 75 100 6,07 1,50 5,68 cm 150 87 5,97 1,60 4,86 cm 300 77 4,89 3,00 2,52 cm 600 71 3,94 4,34 2,03 cm "Em viveiros com águas verdes, quase
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