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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES INSTITUTO DE PSICOLOGIA CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA RESENHA: A MÁSCARA DA MORTE RUBRA João Marcos Queiroz Lopes Rio de Janeiro 2014 A Máscara da Morte Rubra é um conto fictício do autor norte-americano Edgar Allan Poe. Ele narra a história de um príncipe que foge à Morte Rubra se trancafiando num castelo luxuoso com alguns escolhidos. Enquanto a população é dizimada pela Morte Rubra, uma praga similar a peste negra que assombrou a Europa no século XIV, ninguém entra e nem sai dali. Os que se escondem no castelo festejam, brindam e bailam isolados numa realidade alheia a mortandade que se estabelece do lado de fora. Eis que num baile de máscaras promovidos pelo nobre, uma batalha entre a vida e a morte tomará conta do ambiente. É narrado que nenhuma pestilência havia sido tão fatal e apesar disso, o Príncipe Próspero era feliz. Os nobres escolhidos e seu déspota se protegem atrás dos muros de pedra de sua fortaleza e não deixam qualquer meio de entrada ou saída. Tal atitude tão radical leva ao abastecimento abundante da abadia. Eles se trancafiam conscientes de que um impulso de abandonar o castelo poderia acomete-los a uma ação irracional. Pensam adiante, caso esse impulso se manifestasse e selam todas as portas como uma maneira de prevenção. Há nesse primeiro momento, acima de tudo, uma atitude de auto-preservação perante a aniquilação iminente. A festa, a orquestra e toda folia representam todo esforço de se manterem unidos apesar da presença do grotesco e do medo. O príncipe havia promovido todos os recursos pro prazer. Isso ecoa na presença de seis cômodos com cores diversas: azul, roxo, verde, laranja, branco e violeta. Havia um porém: O sétimo quarto. O sétimo quarto era cuidadosamente coberto com tapeçarias negras aveludadas. Apenas nesse cômodo, as janelas não eram de vitrais de acordo com a cor predominante. As vidraças eram de uma cor sangue-vivo: escarlate. Os braseiros de fogo que iluminavam brilhantemente os quartos produziam um efeito bizarro no aposento negro. Nesse quarto ficava o enorme relógio de ébano com seu pêndulo infernal oscilando pra um lado e pro outro. E toda festa parava momentaneamente para ouvir o som emanado que era alto e profundo vindo do badalo do relógio. O relógio volta a bater a mesma sequência de notas e o nervosismo se instaura até os ecos do carrilhão morrerem. E sempre que chega “a hora” o carrilhão exaustivamente repete a mesma melodia. O rumor de uma presença nova incitou murmúrios por toda parte. Esse estranho causa terror, horror e repulsa, indicando desaprovação e surpresa. A figura era alta e emaciada e coberta da cabeça aos pés com os vestuários de túmulo. O mascarado havia chegado ao ponto de assumir a Morte Rubra. Essa atitude de aparente zombaria deixa o príncipe irado. Imediatamente, ordena que tirem a máscara do zombador para que ele seja punido. Mas ninguém ousa chegar perto do mascarado que avançava do cômodo azul para o violeta. Enlouquecido de raiva, o Príncipe se lança correndo atrás dele pelos seis aposentos, trazendo no ar um punhal desembainhado. É no cômodo negro que o Príncipe confronta seu perseguidor. Após um grito agudo, desaba no chão o Príncipe Próspero, estirado e morto. Todos os foliões partem pro quarto do vitral cor de sangue e imobilizam essa figura que passara de todos os limites. Então percebem que a mortalha e a máscara de cadáver eram vazias de qualquer forma palpável. Era a presença da Morte Rubra. Ela chegara como um ladrão à noite, trazendo morte e destruição para todos. A história é cheia de contraste e ambivalência. O conto é um duelo entre a vida e a morte: Eros e Thanatos batalham incessantemente. Freud (1940) admite dois impulsos fundamentais que regem a vida humana: Eros, que representa o impulso pela vida e Thanatos, que representa o impulso de destruição. A meta de Eros é produzir ligações, enquanto de Thanatos é de desfazer conexões. E é da ação conjunta e oposta dos dois impulsos que os variados fenômenos da vida são produzidos. A morte rubra personifica Thanatos: sua meta última parece ser a de levar as coisas vivas ao estado inorgânico. Já o príncipe e seus foliões representam as duas faces de Eros: O príncipe, o amor ao eu e ao objeto, já os foliões, a conservação da espécie. Ainda sobre os fenômenos da alma humana, Freud diz que: “Ao que parece, toda nossa atividade psíquica está voltada para obter o prazer e evitar o desprazer, é automaticamente regulada pelo princípio do prazer.” (Freud, 1917, p.473). No conto, o bater do relógio age em clara oposição ao princípio do prazer, já que interdita todos os recursos prazerosos disponíveis: bobos da corte, improvisadores, dançarinos de balé, músicos, beldades e vinho. Em suas especulações metapsicológicas, Freud (1920) procura a relação entre o princípio do prazer e a compulsão à repetição: “As manifestações de uma compulsão à repetição … exibem em alto grau um caráter impulsivo e, quando se acham em oposição ao princípio do prazer, um caráter demoníaco.” (Freud, 1920, p.146). Por isso, toda vez que o relógio toca, o mesmo embaraço, receio e reflexão tomam conta do ambiente. Todos estavam ligados às peculiaridades do príncipe que desdenhava a decoração que simplesmente seguia a moda e tinha paixão pelo bizarro. Essa prisão a que eles se submetem no castelo era como uma sentença de morte. A Morte Rubra, ao retornar-los ao estado inanimado, cessa com todo o sofrimento causado por todas essas coisas: a música e o relógio, os que consideravam o príncipe louco e os que o seguiam, a realidade e a profusão de sonhos. Referências: Freud, S. (1940). Teoria dos Impulsos - Compêndio de psicanálise —Porto Alegre: L&PM, 2014 Freud, S. (1920). Além do princípio do prazer - História de uma neurose infantil : (“O homem dos lobos”) : além do princípio do prazer e outros textos (1917-1920) — São Paulo: Companhia das Letras, 2010. Freud, S. (1917). Teoria Geral das Neuroses - Obras completas, volume 13: conferências introdutórias à psicanálise (1916-1917) — São Paulo : Companhia das Letras, 2014 Poe, E. (1809-1849). A máscara da morte rubra —Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2007.
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