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RESENHAS CAP. 8 - TEORIA PURA DO DIREITO E CAP. 4 TEORIA DO ORDENAMENTO JURIDICO

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Teoria do ordenamento Jurídico - Norberto Bobbio
Capítulo IV – A completude do ordenamento jurídico
           
            A ideia de que o ordenamento jurídico é completo surgiu num momento histórico muito específico, que foi aquele no qual os jovens Estados modernos buscavam legitimar seu monopólio da produção jurídica, o que já fora mencionado no Teoria da Norma Jurídica (BOBBIO, 2010, p. 23).
            Assim, a ideia de completude tornou-se efetivamente um dogma para a corrente juspositivista, isto é, tornou-se um ponto de partida para o estudo do direito, posto que
 Admitir que o ordenamento jurídico estatal não era completo significava introduzir um direito concorrente, romper com o monopólio da produção jurídica estatal. E é por isso que a afirmação do dogma da completude caminha pari passu com a monopolização do direito por parte do Estado. Para manter o próprio monopólio, o Estado deve servir a todos os usos. (p. 276)
             Em resumo,
 Nos tempos modernos o dogma da completude tornou-se parte integrante da concepção estatista do direito, ou seja, daquela concepção que faz da produção jurídica um monopólio do Estado. À medida que o Estado moderno crescia em potência, esgotavam-se todas as fontes do direito que não fossem a lei, ou seja, o comando do soberano. A onipotência do Estado canalizou-se para o direito de origem estatal, e não foi reconhecido outro direito a não ser aquele que era emanação direta ou indireta do soberano. [...] Uma expressão macroscópica desse desejo de completude foram as grandes codificações; e, observe-se, é justamente no interior de uma dessas grandes codificações que foi pronunciado o veredicto de que o juiz deve julgar permanecendo sempre dentro do sistema já dado. A miragem da codificação é a completude: uma regra para cada caso. (p. 276)
 
            Uma das expressões desse positivismo jurídico pró-codificação foi aquela da Escola da Exegese, que surgiu na França e foi também para a Itália e Alemanha. Bobbio ressalta mais uma vez que “a escola da exegese e a codificação são fenômenos estreitamente vinculados e inseparáveis um do outro” (p. 277).
 
Crítica à completude
            Em direção oposta à da Escola da Exegese, o jurista alemão Eugen Erlich vai criticar o monopólio estatista da produção jurídica e essa falsa crença da completude dos ordenamentos, o que é eventualmente é chamado pejorativamente de fetichismo legislativo. A corrente de Erlich e correlatos é chamada de escola do direito livre.
            A escola do direito livre possuía algumas características:
. Eram mais adeptos às correntes sociológicas do direito (razão pela qual eram considerados como uma nova roupagem do jusnaturalismo);
. Acreditavam no poder criativo do juiz para resolver as lacunas do direito posto, ainda que o juiz decidisse de maneira alheia ao ordenamento.
Com a reação da escola do direito livre a esse juspositivismo hermético “o dogma da completude caía, como inútil e perigosa resistência à adequação do direito às exigências sociais” (p. 282). Assim, “passou a ocupar o seu lugar a convicção de que o direito legislativo era lacunoso, e que as lacunas podiam ser preenchidas não mediante o próprio direito estabelecido” (p. 282).
 O espaço jurídico vazio (final do séc XIX)
            O conceito de espaços jurídicos vazios foi uma espécie de “contrarreforma” do positivismo jurídico após o “golpe” que sofreu o dogma da completude do sistema, o qual, como visto acima, foi abalado irreversivelmente pelas críticas da escola do direito livre.
            Considero este conceito uma “contrarreforma” na medida em que ele tenta reformular a tese da completude sob bases ligeiramente diferentes, uma vez que a tese original fora superada.
            O primeiro esforço nesse sentido se deu com o jurista alemão Karl Bergbohn em 1892. Nos termos propostos por Bobbio, resumidamente, o que Bergbohm afirma é o seguinte:
 
Um caso ou é regulado pelo direito, e então é um caso jurídico ou juridicamente relevante, ou não é regulado pelo direito, e então pertence àquela esfera de livre manifestação da atividade humana, que é a esfera do juridicamente irrelevante. Não existe espaço para as lacunas do direito. [...] Um espaço intermediário entre aquele juridicamente cheio e aquele juridicamente vazio [...] não existe. Ou existe o ordenamento jurídico, e então não se pode falar de lacuna; ou existe a chamada lacuna, e então não existe mais o ordenamento jurídico, e a lacuna deixa de ser lacuna, pois não representa uma deficiência do ordenamento, mas seu limite natural. (p. 284)
 
Obs:
a.      Espaço jurídico cheio = é, para Bergbohm, o âmbito da atividade humana que é regulado por normas jurídicas (também chamada de esfera do juridicamente relevante).
b.     Espaço jurídico vazio = a parte da vida humana não regulada pelo direito, sendo indiferente a ele e, portanto, *PERMITIDA. Ou seja, é a esfera do que é juridicamente irrelevante.
 
*Crítica à teoria de Bergbohm: Esses conceitos de espaço jurídico cheio e vazio são bem problemáticos quando se pense na estrutura lógica das normas e do ordenamento jurídico. “Note bem que a esfera do permitido (em uma pessoa) está sempre ligada a uma esfera do obrigatório (em outra pessoa ou em todas as outras pessoas): isso significa que a esfera do permitido jurídico pode ser considerada do ponto de vista da obrigação (ou seja, da obrigação alheia de não impedir o exercício da ação lícita); e que o direito nunca permite sem, ao mesmo tempo, comandar ou proibir” (BOBBIO, 2010, p. 285). Ou seja, trata-se de um par de conceitos muito mal formulado, que parece tentar escapar da crítica ao dogma da completude de maneira apressada e pouco embasada.
 
 
 
A norma geral exclusiva (início do séc XX)
 
            Trata-se de mais uma teoria juspositivista que se desenvolveu em resposta à escola do direito livre, no afã de dar uma resposta mais satisfatória ao problema da completude/incompletude dos sistema jurídicos. Esta teoria foi inicialmente sustentada pelo alemão Ernst Zitelman em 1903, sendo seguido na Itália por Donato Donati em 1910.
            Ao contrário da primeira teoria juspositivista, que dividia a atividade humana em dois campos distintos – um espaço regulado por normas (espaço jurídico cheio) e outro não regulado (espaço vazio) -, a teoria da norma geral exclusiva irá afirmar exatamente o inverso: não há espaço juridicamente vazio, o direito nunca está ausente da atividade humana, razão pela qual não há como se falar em lacunas.
            Antes de apresentar o arcabouço teórico da norma geral exclusiva, é melhor partir do exemplo fornecido por Bobbio: “Uma norma que proíbe fumar exclui a proibição, ou seja, permite todos os outros comportamentos, exceto fumar” (2010, p. 287).
            Destarte, as normas não existem sozinhas, mas aos pares: toda norma particular é acompanhada da norma geral exclusiva. Neste sentido, “nunca pode existir, para além das normas particulares, um espaço jurídico vazio, mas, para além dessas normas, pode existir toda uma esfera de ações reguladas por normas gerais exclusivas” (p. 287).
            Segundo Zitelman:
 
Na base de toda norma particular, que sanciona uma ação com uma pena ou com a obrigação ao ressarcimento dos danos, ou atribuindo qualquer outra consequência jurídica, está sempre como que subentendida e não expressa uma norma fundamental geral e negativa, segunda a qual, prescindindo desses casos particulares, todas as outras ações permanecem isentas de pena ou de ressarcimento: toda norma positiva, com que se atribua uma pena ou um ressarcimento, é nesse sentido uma exceção daquela norma geral e negativa. Disso resulta que: caso falte uma semelhante exceção positiva não existe lacuna, porque o juiz pode a qualquer tempo, aplicando aquela norma geral e negativa, reconhecer que o efeito jurídico em questão não sobreveio, ou que não surgiu o direito à pena ou à obrigação ao ressarcimento. (apud BOBBIO, 2010, p. 288)
 
            Segundo Donati:
 
Dadoo conjunto dos dispositivos, que, ao prever determinados casos, estabelecem para eles a existência de determinadas obrigações, do conjunto dos mesmos dispositivos deriva, simultaneamente, uma série de normas particulares destinadas a estabelecer, para os casos por elas particularmente considerados, determinadas limitações, e uma norma geral destinada a excluir qualquer limitação para todos os outros casos, não particularmente considerados. Por força dessa norma, todo caso possível encontra no ordenamento jurídico o seu regulamento. Dado um determinado caso, ou existe na legislação um dispositivo que se aplique particularmente a ele, e desse dispositivo derivará para o mesmo caso uma norma particular; ou não existe, e então irá incidir na norma geral mencionada. (apud BOBBIO, 2010, p. 288).
 
            Crítica de Bobbio à teoria da norma geral exclusiva: Para a teoria de Zitelman e Donati manter a aparência de completude, eles se valem de dois expedientes problemáticos: 1) ignoram a existência da norma geral inclusiva, que constitui uma alternativa à aplicação da norma geral exclusiva para resolver controvérsias desse tipo; 2) partem de um conceito estreito de lacuna, segundo o qual ela é apenas a ausência de uma norma;
            Para explicar melhor esses dois expedientes problemáticos, e também para organizar melhor a crítica feita por Bobbio, é melhor partir do ponto 2.
            2) Segundo Bobbio, lacuna não é exatamente a ausência de uma norma expressa, mas “a ausência de um critério (único) para a escolha de qual das duas regras [...] deva ser aplicada” (p. 291). Ou seja, a ideia de lacuna engloba também a hipótese de uma pluralidade de critérios para solucionar a controvérsia, já que a presença de mais de um critério traz dúvida sobre qual aplicar num determinado caso.
            1) Assim, se a lacuna pode se dar pela presença de mais de um critério para decidir sobre a aplicação de uma norma, então a simples existência da norma geral inclusiva – que aponta para uma solução contrária à norma geral exclusiva- já é indicativo de que um sistema jurídico é, sim, incompleto e lacunoso.
--//--
 
As lacunas ideológicas
            Esta teoria foi proposta por Brunetti. Segundo este jurista, existem algumas situações em que se discute sobre a completude:
1)    Considerando o ordenamento em si mesmo, sem compará-lo a nada: neste caso a pergunta sobre completude não faz sentido. Perguntar se um ordenamento jurídico é ontologicamente completo tem a mesma estrutura lógica de perguntar se o céu é completo, se o ouro é completo, se o azul é completo.
}2)    Considerando o ordenamento a) em relação a um tipo ideal de ordenamento ou b) em relação ao conteúdo que ele pretende representar (p. ex. a vontade do Estado ou do povo): Aí temos como falar em completude ou incompletude. Note-se, portanto, que, para Brunetti, as lacunas só podem ser ideológicas, ou seja, só podem referir-se a um certo ideal ainda não alcançado, e não a uma completude ontológica que não tem sentido lógico algum, como demonstrado no “1”.
 
Vários tipos de lacunas
            Nesta seção Bobbio apresenta mais 3 classificações de lacunas. São elas:
 
A)    Próprias x impróprias: Lacunas próprias são aquelas que ocorrem no interior do sistema normativo. Impróprias são as ideológicas, que são aquelas que surgem a partir da comparação do sistema real com um sistema ideal;
B)    Subjetivas x objetivas: Lacunas subjetivas são aquelas que surgem por ‘culpa’ do legislador. Lacunas objetivas são aquelas que não são ‘culpa’ do legislador, e sim decorrência da passagem do tempo (e das novas relações sociais que surgem daí), o que provoca o “envelhecimento” da lei. Ex. de lacuna objetiva: um ordenamento que não verse sobre o uso de células tronco, porque à época da promulgação da lei isso ainda não existia.
C)    Praeter legem x Intra legem: Lacunas praeter legem = leis muito específicas não dão conta de prever todos os casos possíveis; Lacunas intra legem = o oposto, i. e. normas muito gerais que possuem vários pontos cegos.
--//--
 
Heterointegração e autointegração
 
HETEROINTEGRAÇÃO = método de solução de lacunas que consiste basicamente em a) recorrer a outros ordenamentos ou b) recorrer a fontes de direito diferentes da fonte dominante, que em um sistema legal é a lei.
Assim, a heterointegração nos oferece 3 métodos distintos:
à Recorrer a um OUTRO ORDENAMENTO POSITIVO, como p. ex. recorrer à lei italiana para resolver uma lacuna no direito brasileiro.
à Recorrer ao DIREITO NATURAL, entendido aqui como um ordenamento não positivo.
à Recorrer à fonte COSTUME;
à Recorrer à fonte EQUIDADE, que consiste no poder criativo do juiz, eventualmente chamado de DIREITO JUDICIÁRIO. +++
à Recorrer à fonte DOUTRINA, a qual Savigny tomava por DIREITO CIENTÍFICO.
 
 
AUTOINTEGRAÇÃO = solução de lacunas buscada no interior daquele mesmo ordenamento lacunoso, mediante a) ANALOGIA ou b) PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO.
à ANALOGIA:
Conceito: Procedimento pelo qual se atribui a um caso não regulado por lei a mesma disciplina de um caso regulado de maneira semelhante.
A partir daí, é necessário entender a sua estrutura lógica e como se dá o problema da semelhança.
O raciocínio por analogia remonta a Aristóteles, sob o nome de paradigma. A fórmula do raciocínio por analogia pode ser expressa esquematicamente.
Esquema:
 
S         é          P
Z         é          semelhante a S
Z         é          P
 
Exemplos:
1)
Os homens são mortais;
Os cavalos são semelhantes aos homens;
Os cavalos são mortais;
2)
A guerra dos focenses contra os tebanos é ruim;
A guerra dos atenienses contra os tebanos é semelhante à dos f contra os t;
A guerra dos atenienses contra os tebanos é ruim.
 
            Note-se que esta estrutura discursiva apresenta-se aparentemente como um silogismo simples, com apenas 3 termos, como o célebre “os homens são mortais; Sócrates é homem; logo Sócrates é mortal”.
            No entanto, em ambos os casos há 4 termos em jogo, sendo que na 2ª premissa (ou premissa menor) há uma relação de semelhança ao invés de uma relação de identidade.
            Sobre o exemplo 1, pode-se dizer que a conclusão extraída das suas premissas só é Verdadeira se os cavalos são semelhantes aos homens numa qualidade/predicado que seja a razão suficiente pela qual os homens são mortais. Portanto, a semelhança não deve ser uma semelhança qualquer, e sim uma SEMELHANÇA RELEVANTE (2010, p. 304).
 
Classificação das analogias:
x. Analogia legis = é a analogia propriamente dita. Pela analogia ‘clássica’, entende-se que se cria uma nova norma para um caso não regulado, norma esta que é extraída de uma outra norma que se refere a um caso singular.
y. Analogia iuris = semelhante à analogia legis, mas se busca essa nova norma deduzindo-a do sistema como um todo, ou de parte dele (e não de uma norma particular como ocorre na analogia ‘clássica’).
z. Interpretação extensiva = a diferença entre a interpretação extensiva e a analogia ‘clássica’ é que esta última cria uma nova regra, enquanto a interpretação extensiva apenas amplia o alcance de uma norma, i. e. sua extensão.
 
 Obs: Para diferenciar o ‘x’ do ‘z’, é necessário recorrer aos exemplos do livro (p. 307). Ex1: o art. 1577 do CC italiano trata das obrigações do locador em relação às reparações da coisa locada. A partir daí, pergunta-se se este artigo pode ser aplicado ao comodatário. Se a resposta for afirmativa, trata-se do ‘x’, porque com essa analogia cria-se uma regra que não existia para o comodatário (só para o locador).
Ex2: o art. 1754 do CC italiano define como mediador “aquele que põe em contato duas ou mais partes para a conclusão de um negócio”. Aí, pode-se perguntar se esse conceito estende-se a quem “induza à conclusão do negócio depois que as partes tenham iniciado os contatos sozinhas ou por meio de outro mediador”. Se a resposta for afirmativa, estaremos diante de ‘z’, já que o conceito de “mediador” foi apenas estendido/ampliado (e não aplicadopara algo distinto, ao contrário do exemplo 1, no qual não é possível dizer que o conceito de locação foi estendido ao comodato, mas apenas que as disposições sobre locação foram usadas para criar uma nova norma específica para aquele determinado caso).
 
 
-> PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO:
            Curioso que, para Del Vecchio, este termo “princípios gerais do direito” deveria ser interpretado como “princípios gerais de direito natural”, o que o colocaria junto com os métodos de heterointegração (BOBBIO, 2010. p. 300). No entanto, trata-se deles aqui como princípios do direito positivo, razão pela qual estão aqui categorizados como autointegração.
            Sobre esses princípios gerais, ressalte-se primeiro que o termo princípios não é utilizado em sua acepção estrita (de viés axiológico). Não há divisão aqui entre norma positiva e princípios: na verdade, esses princípios gerais nada mais são do que normas generalíssimas do sistema. Alguns doutrinadores consideram que só podem ser consideradas como princípios gerais as normas gerais que estão expressas, como Bobbio; outros, como Crisafulli, acreditam haver princípios gerais expressos e outros não expressos – estes últimos deduzíveis de normas específicas (ou menos gerais).
Teoria Pura do Direito HANS KELSEN
Cáp. VIII - A INTERPRETAÇÃO
1. Introdução:
Neste Capítulo, Kelsen discorre sobre a interpretação das normas jurídicas. Ele criou uma teoria da interpretação que estava, de certo modo, à frente de seu tempo.
2. A essência da interpretação. Interpretação autêntica e não-autêntica
Esse Capítulo descreve o que é interpretação, e sua importância no direito. Quando o Direito é aplicado por um órgão jurídico, este órgão, necessita de fixar o sentido das normas que vai aplicar, ele tem que interpretar estas normas. Kelsen define a interpretação como uma operação mental que acompanha o processo da aplicação do direito no seu progredir de um escalão superior para um escalão inferior”.
Além do órgão jurídico, os indivíduos, têm, não só de aplicar, mas de observar o Direito,
observando ou praticando a conduta que evita a sanção, precisam compreender e, portanto, de determinar o sentido das normas jurídicas, que por eles hão de ser observadas. E também a ciência jurídica, quando descreve um Direito positivo, tem de interpretar as suas normas. Portanto existem duas espécies de interpretação que devem ser distinguidas claramente uma da outra: A interpretação do Direito pelo órgão que o aplica e a interpretação do Direito que não é realizada por um órgão jurídico, mas por uma pessoa privada e, especialmente, pela ciência jurídica.
3. Relativa indeterminação do ato de aplicação do Direito
A relação entre um escalão superior e um escalão inferior da ordem jurídica, como a relação entre Constituição e lei, ou lei e sentença judicial, é uma relação de determinação ou vinculação. A norma do escalão superior regula o ato através do qual é produzida a norma do escalão inferior, ou o ato de execução quando já deste apenas se trata; ela determina não só o processo em que a norma inferior ou o ato de execução são postos, mas também, eventualmente, o conteúdo da norma a estabelecer ou do ato de execução a realizar.
Esta determinação nunca é, porém, completa. A norma do escalão superior não pode vincular em todas as direções (sob todos os aspectos) o ato através do qual é aplicada.
Tem sempre de ficar uma margem, ora maior ora menor, de livre apreciação, de tal forma que a norma do escalão superior tem sempre, em relação ao ato de produção normativa ou de execução que a aplica, o caráter de um quadro ou moldura a preencher por este ato, dentro do qual está a esfera de ação da norma inferior.
Uma ordem, a mais pormenorizada possível tem de deixar àquele que a cumpre ou executa uma pluralidade de determinações a fazer.
4. Indeterminação intencional do ato de aplicação do Direito
Daí resulta que todo o ato jurídico em que o Direito é aplicado, quer seja um ato de criação jurídica, quer seja um ato de pura execução, é, em parte, determinado pelo Direito e, em parte, indeterminado. A indeterminação pode respeitar tanto ao fato, condicionante como à consequência condicionada. A indeterminação pode mesmo ser intencional, quer dizer, estar na intenção do órgão que estabeleceu a norma a aplicar.
Por exemplo: A lei penal prevê, para a hipótese de um determinado delito, uma pena de multa ou uma pena de prisão, e deixa ao juiz a faculdade de, no caso concreto, se decidir por uma ou pela outra e determinar a medida das mesmas.
5. Indeterminação não-intencional do ato de aplicação do Direito
A indeterminação do ato jurídico pode também ser consequência não intencional da própria constituição da norma jurídica a ser aplicada pelo ato em questão. Isso corre quando há uma discrepância entre vontade e expressão. O sentido verbal da norma não é unívoco, o órgão que tem de aplicar a norma encontra-se perante várias significações possíveis. A mesma situação se apresenta quando o que executa a norma crê poder presumir que entre a expressão verbal da norma e a vontade da autoridade legisladora, que se há de exprimir através daquela expressão verbal, existe uma discrepância, podendo em tal caso deixar por completo de lado a resposta à questão de saber por que modos aquela vontade pode ser determinada.
De todo o modo, tem de aceitar-se como possível investigá-la a partir de outras fontes que não a expressão verbal da própria norma, na medida em que possa presumir-se que esta não corresponde à vontade de quem estabeleceu a norma.
A chamada vontade do legislador ou a intenção das partes que estipulam um negócio jurídico possa não corresponder às palavras que são expressas na lei ou no negócio jurídico, é uma possibilidade reconhecida, de modo inteiramente geral, pela jurisprudência tradicional. A discrepância entre vontade e expressão pode ser completa, mas também pode ser apenas parcial. Este último caso apresenta-se quando a vontade do legislador ou a intenção das partes correspondem pelo menos a uma das várias significações que a expressão verbal da norma veicula.
A indeterminação do ato jurídico a pôr pode finalmente ser também a consequência do fato de duas normas, que pretendem valer simultaneamente.
6. O Direito a aplicar como uma moldura dentro da qual há várias possibilidades de aplicação
Em todos estes casos de indeterminação, intencional ou não, do escalão inferior, oferecem-se várias possibilidades à aplicação jurídica. O ato jurídico que efetiva ou executa a norma pode ser conformado por maneira a corresponder a uma ou outra das várias significações verbais da mesma norma, por maneira a corresponder à vontade do legislador, ou, então, à expressão por ele escolhida, por forma a corresponder a uma ou a outra das duas normas que se contradizem ou por forma a decidir como se as duas normas em contradição se anulassem mutuamente.
O Direito a aplicar forma, em todas estas hipóteses, uma moldura dentro da qual existem várias possibilidades de aplicação, pelo que é conforme ao Direito todo ato que se mantenha dentro deste quadro ou moldura, que preencha esta moldura em qualquer sentido possível.
Se por “interpretação” se entende a fixação por via cognoscitiva do sentido do objeto a interpretar, o resultado de uma interpretação jurídica somente pode ser a fixação da moldura que representa o Direito a interpretar e, consequentemente, o conhecimento das várias possibilidades que dentro desta moldura existem. A interpretação de uma lei não deve necessariamente conduzir a uma única solução como sendo a única correta, mas possivelmente a várias soluções que têm igual valor, se bem que apenas uma delas se torne Direito positivo no ato do órgão aplicador do Direito.
Dizer que uma sentença judicial é fundada na lei, não significa, na verdade, senão que ela se contém dentro da moldura ou quadro que a lei representa. Não significa que ela é a norma individual, mas apenas que é uma das normas individuais que podem ser produzidasdentro da moldura da norma geral.
7. Os chamados métodos de interpretação
Não há qualquer critério com base no qual uma das possibilidades inscritas na moldura do Direito a aplicar possa ser preferida à outra. Não há absolutamente qualquer método capaz de
ser classificado como de Direito positivo segundo o qual, das várias significações verbais de uma norma, apenas uma possa ser destacada como “correta” desde que, naturalmente, se trate de várias significações possíveis: possíveis no confronto de todas as outras normas da lei ou da ordem jurídica.
Não se conseguiu até hoje decidir o conflito entre vontade e expressão a favor de uma ou da outra, por uma forma objetivamente válida. Os métodos de interpretação até ao presente elaborados conduzem sempre a um resultado apenas possível, nunca a um resultado que seja o único correto. Se é o caso de duas normas da mesma lei se contradizerem, as possibilidades lógicas de aplicação jurídica já referidas encontram-se, do ponto de vista do Direito positivo, sobre um e o mesmo plano. É um esforço inútil querer fundamentar “juridicamente” uma, com exclusão da outra.
Com efeito, a necessidade de uma interpretação resulta justamente do fato de a norma aplicar ou o sistema das normas deixarem várias possibilidades em aberto, ou seja, não conterem ainda qualquer decisão sobre a questão de saber qual dos interesses em jogo é o de maior valor, mas deixarem antes esta decisão, a determinação da posição relativa dos interesses, a um ato de produção normativa que ainda vai ser posto - à sentença judicial, por exemplo.
8. A interpretação como ato de conhecimento ou como ato de vontade
Há ideia que não está manifesto, mas implícito na teoria tradicional da interpretação, de que a determinação do ato jurídico, não realizada pela norma jurídica aplicada, poderia ser obtida através de qualquer espécie de conhecimento do Direito preexistente, é um auto ilusão contraditória, pois vai contra o pressuposto da possibilidade de uma interpretação.
A questão de saber qual é, de entre as possibilidades que se apresentam nos quadros do Direito a aplicar, a “correta”, não é sequer uma questão de conhecimento dirigido ao Direito positivo, é um problema de política do Direito. A tarefa que consiste em obter, a partir da lei, a única sentença justa (certa) ou o único ato administrativo correto é, no essencial, idêntica à tarefa de quem se proponha, nos quadros da Constituição, criar as únicas leis justas (certas).
Através de interpretação, não podemos extrair as únicas leis corretas, tampouco podemos, a partir da lei, por interpretação, obter as únicas sentenças corretas.
Existe uma diferença entre estes dois casos, mas é uma diferença somente na Quantia determinada, não em que há uma atribuição de valor, e consiste apenas em que a vinculação do legislador sob o aspecto material é uma vinculação muito mais reduzida do que a vinculação do juiz, em que aquele é, relativamente, muito mais livre na criação do Direito do que este. Este último é um criador de Direito e também ele é, nesta função, relativamente livre.
Na aplicação da lei, além da necessária fixação da moldura dentro da qual se tem de manter o ato a pôr, possa ter ainda lugar uma atividade Que possui aptidão para conhecer o órgão aplicador do Direito, não se tratará de um conhecimento do Direito positivo, mas de outras normas que, aqui, no processo da criação jurídica, podem ter o seu encontro: normas de Moral, normas de Justiça, juízos de valor sociais que costumamos designar por expressões correntes como bem comum, interesse do Estado, progresso, etc. Do ponto de vista do Direito positivo, nada se pode dizer sobre a sua validade e verificabilidade. Todas as determinações desta espécie apenas podem ser caracterizadas negativamente: são determinações que não resultam do próprio Direito positivo. A este, a produção do ato jurídico dentro da moldura da norma jurídica aplicada é livre, isto é, realiza-se segundo a livre apreciação do órgão chamado a produzir o ato.
Na aplicação do Direito por um órgão jurídico, a interpretação cognoscitiva, obtida por uma operação de conhecimento do Direito a aplicar combina-se com um ato de vontade em que o órgão aplicador do Direito efetua uma escolha entre as possibilidades reveladas através daquela mesma interpretação cognoscitiva. Com este ato, ou é produzida uma norma de escalão inferior, ou é executado um ato de coerção estatuído na norma jurídica aplicada.
Através deste ato de vontade se distingue a interpretação jurídica feita pelo órgão aplicador do Direito de toda e qualquer outra interpretação, especialmente da interpretação levada a cabo pela ciência jurídica. A interpretação feita pelo órgão aplicador do Direito é sempre autêntica. Ela cria Direito. Na verdade, só se fala de interpretação autêntica quando esta interpretação assume a forma de uma lei ou de um tratado de Direito internacional e tem caráter geral, quer dizer, cria Direito não apenas para um caso concreto, mas para todos os casos iguais, ou seja, quando o ato designado como interpretação autêntica represente a produção de uma norma geral. Isto é, criadora de Direito é a interpretação feita através de um órgão aplicador do Direito ainda quando cria Direito apenas para um caso concreto, quer dizer, quando esse órgão apenas crie uma norma individual ou execute uma sanção. A interpretação de uma norma pelo órgão jurídico que a tem de aplicar, não somente se realiza uma das possibilidades reveladas pela interpretação cognoscitiva da mesma norma, como também se pode produzir uma norma que se situe completamente fora da moldura que a norma a aplicar representa.
Através de uma interpretação autêntica deste tipo pode criar-se Direito, não só no caso em que a interpretação tem caráter geral, portanto, existe interpretação autêntica no sentido usual da palavra, mas também no caso em que é produzida uma norma jurídica individual através de um órgão aplicador do Direito, desde que o ato deste órgão já não possa ser anulado, desde que ele tenha transitado em julgado. E um fato bem conhecido que, pela via de uma interpretação autêntica deste tipo, é muitas vezes criado Direito novo - especialmente pelos tribunais de última instância. Da interpretação através de um órgão aplicador do Direito distingue-se toda e
qualquer outra interpretação pelo fato de não ser autêntica, isto é, pelo fato de não criar
Direito.
9. A interpretação da ciência jurídica
A interpretação científica é pura determinação cognoscitiva do sentido das normas jurídicas. Diferentemente da interpretação feita pelos órgãos jurídicos, ela não é criação jurídica. A ideia de que é possível, através de uma interpretação simplesmente cognoscitiva, obter Direito novo, é o fundamento da chamada jurisprudência dos conceitos, que é repudiada pela Teoria Pura do Direito. A interpretação simplesmente cognoscitiva da ciência jurídica também é, portanto, incapaz de colmatar as pretensas lacunas do Direito, O preenchimento da chamada lacuna do Direito é uma função criadora de Direito que somente pode ser realizada por um órgão aplicador do e esta função não é realizada pela via da interpretação do Direito vigente.
A interpretação jurídico-científica não pode fazer outra coisa senão estabelecer as possíveis significações de uma norma jurídica. A interpretação jurídico-científica tem de evitar, com o máximo cuidado, a ficção de que uma norma jurídica apenas permite, sempre e em todos os casos, uma só interpretação: a interpretação “correta”. Uma interpretação estritamente científica de uma lei estadual ou de um tratado de Direito internacional que, baseada na análise crítica, revele todas as significações possíveis, mesmo aquelas que são politicamente indesejáveis e que, porventura, não foram de forma alguma pretendidas pelo legislador ou pelas partes que celebraram o tratado, mas que estão compreendidas na fórmula verbal por eles escolhida, pode ter um efeito prático que supere de longe a vantagem política da ficção do sentido único: E queuma tal interpretação científica pode mostrar à autoridade legisladora quão longe está a sua obra de satisfazer à exigência técnico-jurídica de uma formulação de normas jurídicas o mais possível inequívocas ou, pelo menos, de uma formulação feita por maneira tal que a inevitável pluralidade de significações seja reduzida a um mínimo e, assim, se obtenha o maior grau possível de segurança jurídica.

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