Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Resumo Texto 4 – A História Não Contada dos Distúrbios de Aprendizagem A palavra “Distúrbio” compõe-se do radical turbare e do prefixo dis. Turbare significa “alteração violenta na ordem natural” e o prefixo dis possui valor negativo por seu significado ser “alteração com sentido anormal, patológico”. Assim a palavra distúrbio pode ser traduzida como “anormalidade patológica por alteração violenta na ordem natural”. E a expressão Distúrbios de Aprendizagem, se refere a uma “anormalidade patológica por alteração violenta na ordem natural de aprendizagem”, obviamente localizada em quem aprende (ou seja, o aluno, de forma individual e orgânica). Porém, ao se dar esse diagnóstico, está excluindo todos os fatores que possam ter interferido negativamente no processo ensino-aprendizagem, uma vez que não se fala em distúrbios de ensino-aprendizagem. A biologização da aprendizagem, isenta a responsabilidade do sistema social vigente e a instituição escolar nele inserida. E os distúrbios de aprendizagem é uma expressão muito usada na atualidade, dessa biologização escolar, e mais especificamente no fracasso escolar. O conceito oficial dos distúrbios de aprendizagem: • 1981 - distúrbios de aprendizagem é considerado um termo genérico que se refere a um grupo heterogêneo de alterações manifestas por dificuldades significativas na aquisição e uso de audição, fala, leitura, etc; e etas alterações são intrínsecas ao indivíduo e presumivelmente devidas à disfunção do sistema nervoso central, de acordo com National Joint Comittee for Learning Disabilities, nos EUA. Relembrando a história real: lembrando que o fio condutor usado para explicar a história é a Dislexia, mas a dislexia especifica de evolução, que decorre do emprego do “raciocínio clinico tradicional” frente a problemas sociais, raciocínio esse como: se A causa B então B só pode ser causado por A, estruturado na própria medicina como ciência, na época onde o objeto de estudo era basicamente doenças infectocontagiosas. Levando esse raciocínio ao limite, então teríamos “se uma doença neurológica pode comprometer o domínio da linguagem escrita, será que a criança que não aprende a ler e escrever não teria uma doença neurológica?”. • 1895 – James Hinshelwood, oftalmologista em Glasglow, postulou a existência da Cegueira Verbal Congênita, distúrbio de leitura pretensamente provocado por um defeito congênito. Foi criticado por não ter comprovado a própria teoria. • 1918 – Strauss, neurologista americano, lança a hipótese de que os distúrbios de comportamento, e com menor ênfase, os de aprendizagem poderiam ser consequentes de uma lesão cerebral mínima. Hipótese sem o raciocínio clinico. • 1925 – Orton, neurologista americano, ressuscita Hinshelwood, e descreve em pouco tempo muitos casos de cegueira verbal. Segundo o neurologista, os dois hemisférios cerebrais “...são reversos em padrão, isto é, o hemisfério esquerdo tem a mesma relação com o hemisfério direito que a mão esquerda tem com a mão direita...” Essa dominância causaria confusão na percepção, na orientação espacial e na direção da leitura, “...impedindo o reconhecimento imediato de diferenças entre pares de palavras...”. • 1957 – Vernon, renomado psicólogo inglês, critica Orton e Hinshelwood, dizendo que “...é improvável que constitua mais que uma pequena parte mesmo dos casos severos de distúrbio de leitura.”. Sobre a dislexia afirma em nota de rodapé que “...não pode ser aceita até o momento, o termo disléxico não será empregado nesse livro.”. Porém no mesmo ano, estrutura-se na medicina o termo de lesão cerebral mínima, ou síndrome hipercinética, ou hiperatividade, como entidade clinica passível de tratamento medicamentoso. • A criação da teoria fisiopatológica: Bradley (1937), fez uma das experiências mais antiéticas da história da medicina, o autor foi testando os efeitos de drogas com ação no sistema nervoso central nas crianças com problemas de diferentes causas e tipo, na instituição aonde trabalhava, sem a autorização da família e tirou conclusões apenas de suas “impressões clinicas”. • O surgimento da Disfunção Cerebral Minima (DCM): Em 1962, no Simpósio Internacional em Oxford, que se baseia na ausência obrigatória de qualquer alteração objetiva, baseia-se na normalidade (todas as manifestações referem- se a comportamento ou à cognição e manifestações clinicas como: distúrbio de linguagem, déficit de concentração, instabilidade de humor e etc.), o oposto do objeto habitual da medicina. • 1968 – a definição de Distúrbio de Aprendizagem fica como sendo “crianças com distúrbios de aprendizagem exibem uma alteração em um ou mais processos psicológicos básicos envolvidos na compreensão ou uso da linguagem falada ou escrita...”, por um grupo multidisciplinar americano (The National Advisory Commitee on Handicapped Children). Trata-se de conceitos vagos e imprecisos, que se baseiam em exclusões e em referências a sinônimos e/ou outros conceitos, que também nasceram da imprecisão. • A biologização da sociedade: Porque em 1960 ainda essas teorias conseguiam ser aceitas? A resposta deve ser buscada no meio social. Pois neste momento muitas coisas estão acontecendo, como a Guerra Fria, Revolução Cubana, Guerra do Vietnã, e todos os valores da sociedade americana estão sendo contestados pelos jovens e pelas minorias, com demanda de reforma das instituições inclusive da escolar. • Nesse contexto Arthur Jensen “prova” que as diferenças de QI entre brancos e negros são geneticamente determinadas. “Prova-se” ainda que os diferentes papéis sociais entre os sexos são devidos as diferenças biológicas e cerebrais (a razão no homem e a emoção na mulher). • A desmistificação do DCM: Gomez (1967) demonstrou absoluta falta de critérios para o diagnóstico de DCM. • Conrad (1977), alertou para o fato de que existem crianças com problemas de comportamento reais, defendeu que com um estudo adequado sempre se consegue identificar os determinantes desse comportamento no meio social e/ou na família, e que o “problema” na verdade é uma reação (quase que normal) a uma situação agressiva. • Até que ponto uma criança é esperta e ativa e a partir de que se torna patologicamente hiperativa? Duas certezas: 1º essas “doenças” caracterizam-se por só se manifestarem quando a criança entra na escola. 2º a “doença” melhora ou cura com o tempo, daí o nome “dislexia específica de evolução”. • DCM se transforma em ADD: em 1980 a Academia Americana de Psiquiatria considerando imprecisos os conceitos de DCM, unificou-se em uma única síndrome, ADM (Attention Défict Disorders - Distúrbios por Déficit de Atenção). • 1975 – Jacoby, em seu livro discute como a sociedade se reprime em rememorar seu próprio passado. • Enfim, não é através do estudo do erro, da doença de um teoricamente distúrbio de aprendizagem que se entenderá o processo de ensino- aprendizagem. O problema da escola brasileira não se resolverá pela transformação do espaço pedagógico, cabe à educação a tarefa de retomar seu próprio campo de conhecimento, seja em nível teórico, seja na atuação ou no cotidiano da sala de aula.
Compartilhar