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CHEQUE BENS DE FAMILIA

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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
11ª Câmara de Direito Privado 
Registro: 2018.0000652965
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Agravo de Instrumento 
nº 2099931-15.2018.8.26.0000, da Comarca de Socorro, em que é agravante MINAS 
LÃ COMÉRCIO DE FIOS LTDA, são agravados A. O. G. SILVA LTDA e VALDECI 
VICENTE DA SILVA.
ACORDAM, em 11ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de 
Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. 
U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores 
GILBERTO DOS SANTOS (Presidente), WALTER FONSECA E GIL COELHO.
São Paulo, 23 de agosto de 2018. 
GILBERTO DOS SANTOS
RELATOR
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO - 11ª CÂMARA
Agravo de Instrumento n.º 2099931-15.2018.8.26.0000 - Socorro – T - Voto nº 40.091
Voto nº 40.091
Agravo de Instrumento n.º 2099931-15.2018.8.26.0000
Comarca: Socorro - 2ª Vara
Agravante: Minas Lã Comércio de Fios Ltda 
Agravados: A. O. G. Silva Ltda. e Valdeci Vicente da Silva
Juiz(a) de 1ª Inst.: Carlos Henrique Scala de Almeida
TÍTULOS DE CRÉDITO. Cheques. Levantamento de penhora. Fraude à execução 
reconhecida. Alegação de impenhorabilidade do bem de família. Não cabimento. 
Precedente do E. Superior Tribunal de Justiça. Recurso provido.
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a r. decisão de fls. 11 
que, em ação de execução de título extrajudicial, determinou o levantamento da penhora 
sobre parte do bem matriculado sob o n.º 4.983 no Cartório de Registro de Imóveis de 
Socorro/SP.
Diz a agravante que tal determinação de levantamento é indevida, uma 
vez que o agravado Valdeci Vicente da Silva simulou a existência de um processo 
trabalhista para alienar os imóveis penhorados em evidente tentativa de fraude à 
execução, caso em que se deve afastar a proteção conferida ao bem pela Lei 8.009/90.
Denegado o efeito suspensivo ao recurso (fls. 130), vieram as 
contrarrazões (fls. 133/143), manifestando-se os agravados pela manutenção da decisão 
proferida.
É o relatório.
Cuidam os autos de execução por quantia certa fundada em quatro 
cheques, no valor total de R$ 150.000,00, emitidos pela executada pessoa jurídica 
A.O.G. Silva Ltda. e avalizados pelo coexecutado Valdeci.
PODER JUDICIÁRIO
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SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO - 11ª CÂMARA
Agravo de Instrumento n.º 2099931-15.2018.8.26.0000 - Socorro – T - Voto nº 40.091
Foram penhoradas nos autos partes ideais pertencentes ao coexecutado 
Valdeci, de dois imóveis, matriculados sob nº 9.051 e nº 4.983, no Registro de Imóveis 
da Comarca de Socorro (fls. 25).
Posteriormente, houve o reconhecimento de fraude à execução, tanto 
nesta justiça comum, quando na Justiça do Trabalho (fls. 97/99), reconhecendo-se que 
os agravados se utilizaram de expediente fraudulento para transferir os bens a terceira 
pessoa, tanto em relação ao imóvel matriculado sob o n.º 4.983 (fls. 26/27), quanto em 
relação ao imóvel matriculado sob o n.º 9.051 (fls. 54/55).
Pois bem.
A jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é reiterada no sentido 
de que o reconhecimento de fraude à execução afasta a proteção legal do bem de 
família:
CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA DE ALUGUÉIS. 
DOAÇÃO DE IMÓVEL EM FRAUDE DE EXECUÇÃO. BEM DE FAMÍLIA. 
AFASTAMENTO DA PROTEÇÃO. POSSIBILIDADE. FRAUDE QUE 
INDICA ABUSO DE DIREITO. ART. ANALISADO: 1º, LEI 8.009/90.
1. Embargos de terceiro distribuídos em 12/04/2010, do qual foi extraído o 
presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 22/04/2013.
2. Discute-se se a doação realizada ao menor impúbere, do único imóvel 
onde reside a família, dias depois de intimados os devedores para pagar quantia 
certa, em cumprimento de sentença, configura fraude de execução e afasta a 
natureza impenhorável do bem transferido.
3. A exegese sistemática da Lei nº 8.009/90 evidencia nítida preocupação do 
legislador no sentido de impedir a deturpação do benefício legal, vindo a ser 
utilizado como artifício para viabilizar a aquisição, melhoramento, uso, gozo 
e/ou disposição do bem de família sem nenhuma contrapartida, à custa de 
terceiros.
4. Sob essa ótica, é preciso considerar que, em regra, o devedor que aliena, 
gratuita ou onerosamente, o único imóvel, onde reside com a família, está, ao 
mesmo tempo, dispondo daquela proteção legal, na medida em que seu 
comportamento evidencia que o bem não lhe serve mais à moradia ou 
subsistência.
5. Na espécie, as circunstâncias em que realizada a doação do imóvel estão a 
revelar que os devedores, a todo custo, tentam ocultar o bem e proteger o seu 
patrimônio, sacrificando o direito do credor, assim, portanto, obrando, não 
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Agravo de Instrumento n.º 2099931-15.2018.8.26.0000 - Socorro – T - Voto nº 40.091
apenas em fraude de execução, mas também - e sobretudo - com fraude aos 
dispositivos da própria Lei 8.009/90.
6. Nessas hipóteses, é possível, com fundamento em abuso de direito, 
reconhecer a fraude de execução e afastar a proteção conferida pela Lei 
8.009/90.
7. Recurso especial conhecido e desprovido.
(REsp 1364509/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA 
TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 17/06/2014)
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. 
IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMÍLIA. FRAUDE À EXECUÇÃO. 
SÚMULA 7/STJ.
1. Afasta-se a proteção conferida pela Lei 8.009/90, quando caracterizada 
fraude à execução.
2. É vedado, nesta instância especial, o reexame do conjunto fático-
probatório. Incidência da Súmula 7/STJ.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no AREsp 334.975/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, 
QUARTA TURMA, julgado em 07/11/2013, DJe 20/11/2013)
RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. VENDA DE 
BENS EM FRAUDE À EXECUÇÃO. BEM DE FAMÍLIA. AFASTAMENTO 
DA PROTEÇÃO. POSSIBILIDADE. FRAUDE QUE INDICA ABUSO DE 
DIREITO.
1. Não há, em nosso sistema jurídico, norma que possa ser interpretada de 
modo apartado aos cânones da boa-fé. Ao alienar todos os seus bens, menos 
um, durante o curso de processo que poderia levá-lo à insolvência, o devedor 
não obrou apenas em fraude à execução: atuou também com fraude aos 
dispositivos da Lei 8.009/90, uma vez que procura utilizar a proteção conferida 
pela Lei com a clara intenção de prejudicar credores.
2. Nessas hipóteses, é possível, com fundamento em abuso de direito, 
afastar a proteção conferida pela Lei 8.009/90.
3. Recurso especial conhecido e não provido.
(REsp 1299580/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA 
TURMA, julgado em 20/03/2012, DJe 25/10/2012)
AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSO CIVIL. FRAUDE À EXECUÇÃO. 
RECONHECIMENTO. BEM DE FAMÍLIA. DESCARACTERIZAÇÃO.
1. O bem que retorna ao patrimônio do devedor, por força de 
reconhecimento de fraude à execução, não goza da proteção da 
impenhorabilidade disposta na Lei nº 8.009/1990, sob pena de prestigiar-se a 
má-fé do executado.
2. Precedentes.
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SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO - 11ª CÂMARA
Agravo de Instrumento n.º 2099931-15.2018.8.26.0000 - Socorro – T - Voto nº 40.091
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1085381/SP, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA 
TURMA, julgado em 10/03/2009, DJe 30/03/2009)
Bem de família. Bem retornado ao patrimônio do devedor, após o 
reconhecimento da fraude de execução. Precedentes da Corte.
1. Precedentes da Corte assentam que aquele que age de má-fé, assim 
considerado o retorno do bem ao patrimônio após o reconhecimento da fraude 
de execução,não pode beneficiar-se da Lei nº 8.009/90.
2. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 329.547/SP, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES 
DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/05/2002, DJ 24/06/2002, p. 
297)
Vale lembrar que: “A Lei 8009/90 foi concebida para garantir a dignidade e 
funcionalidade do lar. Não foi propósito do legislador permitir que o pródigo e o devedor 
contumaz se locuplete, tripudiando sobre seus credores. Na interpretação, não se pode perder de 
vista seu fim social” (STJ-Corte Especial, REsp 109.351-RS, rel. Min. Gomes de Barros, 
j. 1.7.97, negaram provimento, v.u., DJU 25.5.98, p.4 - in nota nº 9 ao art. 1º da Lei nº 
8.009/90, THEOTONIO NEGRÃO atual. por JOSÉ ROBERTO F. GOUVÊA, 38ª ed., 
p. 1247).
Ante todo o exposto, e pelo mais que dos autos consta, dou provimento 
ao recurso para afastar o levantamento sobre parte do bem matriculado sob o n.º 4.983 
no Cartório de Registro de Imóveis de Socorro/SP. 
GILBERTO DOS SANTOS
Desembargador Relator

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