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A Campanha de Canudos

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A CAMPANHA DE CANUDOS
Mesa Di re to ra
Biê nio 2003/2004
Se na dor José Sarney
Pre si den te
Se na dor Pa u lo Paim
1º Vice-Pre si den te
Se na dor Edu ar do Si que i ra Campos
2º Vi ce-Presidente
Se na dor Ro meu Tuma
1º Se cre tá rio
Se na dor Alber to Silva
2º Se cre tá rio
Se na dor He rá cli to Fortes
3º Se cre tá rio
Se na dor Sér gio Zam bi asi
4º Se cre tá rio
Su plen tes de Se cre tá rio
Se na dor João Alber to Souza Se na dora Serys Slhes sa ren ko
Se na dor Ge ral do Mes qui ta Júnior Se na dor Mar ce lo Crivella
Con se lho Edi to ri al
Se na dor José Sarney
Pre si den te
Jo a quim Cam pe lo Mar ques
Vi ce-Presidente
Con se lhe i ros
Car los Hen ri que Car dim Carl yle Cou ti nho Ma dru ga
João Almino Ra i mun do Pon tes Cu nha Neto
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Edi ções do Se na do Fe de ral – Vol. 5
A CAMPANHA DE CANUDOS
Aris ti des A. Mil ton
Bra sí lia – 2003
EDIÇÕES DO
 SENADO FEDERAL
Vol. 5
O Con se lho Edi to ri al do Se na do Fe de ral, cri a do pela Mesa Di re to ra em
 31 de ja ne i ro de 1997, bus ca rá edi tar, sem pre, obras de va lor his tó ri co
 e cul tu ral e de im por tân cia re le van te para a com pre en são da his tó ria po lí ti ca,
 eco nô mi ca e so ci al do Bra sil e re fle xão so bre os des ti nos do país.
Pro je to Grá fi co: Achil les Mi lan Neto
Ó Se na do Fe de ral, 2003
Con gres so Na ci o nal
Pra ça dos Três Po de res s/nº – CEP 70168-970 – Bra sí lia – DF
CEDIT@ce graf.se na do.gov.br 
http://www.se na do.gov.br/web/con se lho/con se lho.htm
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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Mil ton, Aris ti des Au gus to.
A Cam pa nha de Ca nu dos / Aris ti des A. Mil ton -- Bra sí lia :
Se na do Fe de ral, Con se lho Edi to ri al, 2003.
154 p. – (Edi ções do Se na do Federal ; v. 5)
1. Gu er ra de Ca nu dos (1897). 2. Bra sil, his tó ria. I. Tí tu lo. 
II. Sé rie.
CDD 981.0521
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
A CAMPANHA DE CANUDOS, DE ARISTIDES A. MILTON,
RELATO DIRETO, OBJETIVO, DOCUMENTADÍSSIMO DOS
ACONTECIMENTOS OCORRIDOS NO ALTO SERTÃO DA
BAHIA NO FIM DO SÉCULO XIX – JUNTO COM O LIVRO
CANUDOS E OUTROS TEMAS, DE EUCLIDES DA CUNHA – 
MARCA A HOMENAGEM DO CONSELHO EDITORIAL DO
SENADO FEDERAL AOS 100 ANOS DE PUBLICAÇÃO DE 
OS SERTÕES, OBRA-MESTRA DE EUCLIDES DA CUNHA
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Aris ti des Mil ton
Nas ceu Aris ti des Au gus to Mil ton a 29 de maio de
1848, na ci da de da Ca cho e i ra. Seus pri me i ros es tu dos fo ram na ter ra
na tal, sen do os se cun dá ri os no Gi ná sio Ba i a no, onde teve como com pa -
nhe i ros a Cas tro Alves e Rui Bar bo sa. Se guin do, de po is, para Re ci fe, aí 
se for mou, pela Fa cul da de de Di re i to, em 1869. Em 1872, na Ba hia,
tra ba lhou na im pren sa, como re da tor do Cor re io da Ba hia. Em sua
ci da de na tal, fun dou o Jor nal da Ca cho e i ra, onde pug nou pelo de sen -
vol vi men to da ci da de. Foi, tam bém, juiz mu ni ci pal, em Len çóis e em
Ma ra cás, e de Di re i to, no Pi a uí. 
Em 1881, as su miu a pre si dên cia de Ala go as e, mais tar de,
foi che fe de po lí cia de Ser gi pe. Ingres san do na po lí ti ca, fi li ou-se ao Par ti do
Con ser va dor, sen do ele i to de pu ta do pro vin ci al e, de 1886-1889, de pu ta do
ge ral.
Pro cla ma da a Re pú bli ca, foi ele i to de pu ta do à Cons ti tu in te
Fe de ral, sen do re e le i to na se gun da, ter ce i ra, quar ta e quin ta le gis la tu ras.
A sua ação aí foi das mais pro fí cu as, es pe ci al men te na co mis são in cum -
bi da do pro je to do Có di go Pe nal. 
Tam bém es cri tor, apre ci an do os es tu dos his tó ri cos, di vul gou
tra ba lhos de va lor, como A Cam pa nha de Ca nu dos, A Re pú bli ca
e a Fe de ra ção no Bra sil, A Cons ti tu i ção do Bra sil, e, ain da, Efe mé -
ri des Ca cho e i ra nas, onde es tão en fe i xa dos, com um cri té rio e ho nes ti da -
de inex ce dí ve is, os fa tos mais pal pi tan tes ocor ri dos na his tó ri ca ci da de.
Por sua ter ra, a que ti nha pro fun do amor, tra ba lhou mu i to, fun dan do,
ali, o Mon te Pio dos Artis tas Ca cho e i ra nos.
De po is de uma exis tên cia glo ri o sa, le gan do ao país um nome
ima cu la do, fa le ceu Aris ti des Mil ton no Rio de Ja ne i ro, a 26 de ja ne i ro
de 1904.
ANTÔNIO LOUREIRO DE SOUSA
10 Aris ti des A. Milton
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
I 1
Q
U AN DO O PAÍS, de po is de ver ju gu la da a re vol ta de
6 de se tem bro, se re pu ta va li vre do pe sa de lo, que por lon gos me ses o
opri mi ra, e, res ta be le ci das afi nal a tran qüi li da de e a or dem, cria que a
Re pú bli ca es ta va de fi ni ti va men te con so li da da, gra ves e ori gi na is acon te -
ci men tos, ocor ri dos no Esta do da Ba hia, vi e ram so bres sal tar o es pí ri to
pú bli co, abrin do na his tó ria do Bra sil um novo sul co de lá gri mas e san gue.
A mes ma ten dên cia re vo lu ci o ná ria que, des de 1822 até 1848,
trou xe ra pen den te da sor te das ar mas o fu tu ro do Impé rio, e, pre do mi -
nan do ora aqui, ora aco lá, ce le bri za ra esse quar to de sé cu lo por uma agi -
ta ção cons tan te, e lu tas fra tri ci das de pun gi ti va lem bran ça, ha via res sur -
gi do na ple ni tu de de sua fu nes ta ener gia para per tur bar o re gi me, que
em 1889 ti nha sido ina u gu ra do.
E se – den tre os pro ta go nis tas des ses mo vi men tos – des ta ca -
vam-se ca rac te res que, ce den do a suas con vic ções po lí ti cas, eram es ti -
mu la dos pelo de se jo de bem-ser vir à pá tria, ou tros obe de ci am sim ples -
men te às su ges tões do amor-pró prio ofen di do, e ao im pul so de am bi ções
con tra ri a das.
1 Este tra ba lho foi es cri to por in cum bên cia do Insti tu to His tó ri co e Ge o grá fi co
Bra si le i ro, como se vê da ata de sua ses são ce le bra da em 17 de ou tu bro de 1897.
Como quer que fos se, às ins ti tu i ções re cen te men te ado ta das
im pu ta va-se in te i ra a res pon sa bi li da de do pru ri do de de po si ções, que aco -
me te ra os Esta dos da União, bem como dos ex ces sos e vi o lên ci as, que
em qua se to dos eles ao mes mo tem po se pra ti ca vam. Mas, a ver da de é
que sob a mo nar quia tam bém se ti nham tes te mu nha do ce nas de de po si -
ções e re bel dia, que em pa na ram-lhe o pres tí gio, com pro me te ram a paz
pú bli ca e ge ra ram – não raro – o de sa len to e o ter ror.
A con se qüên cia, por tan to, a de du zir daí é que a ne nhum dos
dous sis te mas de go ver no se pode com jus ti ça atri bu ir os er ros de que
são cul pa dos, uni ca men te, al guns es pí ri tos ir re qui e tos e cer tas cons ciên -
ci as em pe der ni das, que apa re cem aliás em to dos os tem pos e si tu a ções.
Opor-se-ia, além dis to, à ra zão e à jus ti ça es ta be le cer con fron -
to en tre uma épo ca qual quer que co me ça a es bo çar-se, atra vés das di fi -
cul da des pró pri as de to das as ino va ções, e ou tra que se acha com ple ta -
men te de se nha da, por já ter atin gi do a seu ter mo.
Em todo caso, for ço so é con fes sar que a cam pa nha de Ca nu -
dos, a des pe i to de não re ve lar fe i ção par ti dá ria bem ca rac te ri za da, as si -
na la con tu do um pe río do de gran des sur pre sas e re a is te mo res para a re -pú bli ca. E – o que mais é – ten do sido ex plo ra da por uma po li ti ca gem
per ver sa, ser viu mu i tas ve zes de pre tex to para agres sões in jus tas ao Go -
ver no, e afron tas in sen sa tas ao povo ba i a no.
Antes de tudo, en tre tan to, é pre ci so re co nhe cer que tão tris te
luta ci vil po de ria ter ir rom pi do du ran te a mo nar quia, vis to como fora
em 1864, ain da, que prin ci pi a ram a se acu mu lar os in fla má ve is, cuja ex -
plo são pro du ziu o in cên dio vo raz de que foi te a tro o ser tão de mi nha
ter ra.
Não há ne gar – que, no iní cio da cam pa nha, pro pa lou-se in -
sis ten te men te – que os ini mi gos da re pú bli ca re me ti am mu ni ções e ar -
mas a Antô nio Con se lhe i ro, em bar can do-as na es tra da de fer ro Cen tral
do Bra sil, com en de re ço à es ta ção das Sete La go as, don de se gui am para
seu des ti no. O Go ver no de Mi nas Ge ra is pro vi den ci ou no sen ti do de
apu rar a exa ti dão des se fato, e a im pren sa deu no tí cia de que um des ta -
ca men to de po lícia ha via ti ro te a do com os tro pe i ros in cum bi dos da que -
le ser vi ço. E por toda par te en tão se es pa lhou que Ca nu dos era o re du to 
da mo nar quia e a guar da avan ça da da res ta u ra ção.
12 Aris ti des A. Milton
É cer to, po rém, não se ter nun ca pro va do que os mo nar quis -
tas es ti ves sem de in te li gên cia com os ha bi tan tes de Ca nu dos; pelo con -
trá rio, se li qui dou que não pas sa va de ba le la o bo a to, que cir cu la ra, de
ha ve rem mu i tos den tre eles en vi a do so mas avul ta das ao Con se lhe i ro,
em cujo acam pa men to al guns até de ve ri am se en con trar.
Não con tes to que os mo nar quis tas ane las sem a vi tó ria dos fa -
ná ti cos, na es pe ran ça de ti rar dela pro ve i to as saz apre ciá vel; mas, na es -
sên cia, a ques tão era ou tra.
Um ho mem alu ci na do pela dou tri na re li gi o sa, que ele pró prio 
cri a ra, al te ran do a seu ta lan te a or to do xia apren di da de seus pais, con se -
guiu fa na ti zar uma po pu la ção nu me ro sa, pela qual era tido em con ta de
após to lo in subs ti tu í vel, e ver da de i ro ins pi ra do de Deus.
É exa to que ele ata cava a re pú bli ca, me nos po rém pela pre -
ten são de res ta u rar a mo nar quia do que pela von ta de de ver ain da es ta -
be le ci dos os ins ti tu tos, como – por exem plo – o do ca sa men to re li gi o so, 
que a Cons ti tu i ção de fe ve re i ro ha via subs ti tu í do, in cor ren do por isto
no de sa gra do dos tra di ci o na lis tas im pe ni ten tes.
O Con se lhe i ro hos ti li za va a re pú bli ca por ter esta de cre ta do a 
se pa ra ção do Esta do e da Igre ja, me di da re pe li da por quan tos não apro -
fun da ram ja ma is os en si na men tos de Cris to, ou não têm for te e en ra i za -
da a sua fé.
Ele se in sur gia con tra a re pú bli ca, por que esta ou sa ra en fren -
tá-lo em Ma ce té, dan do as sim o si nal de que não re co nhe cia aque le es ta -
do no es ta do, cons ti tu í do à som bra de uma to le rân cia im per doá vel, em
me nos ca bo das au to ri da des e da lei.
Cum pre, po rém, re co nhe cer que era pre ci so ser um ho mem
fora do co mum para se im por à mul ti dão por meio da pa la vra e do ges -
to, como Antô nio Con se lhe i ro o fa zia, a des pe i to de fal tar-lhe a elo -
qüên cia dos ora do res de es col, e a ma jes ta de gran di o sa dos pro fe tas bí -
bli cos.
Enver gan do uma tú ni ca de pano co mum e cor azul, com a
bar ba e os ca be los in ton sos, ar ri ma do a um no do so bas tão, mos tran do
nas fa ces a pa li dez dos as ce tas, e nos pés tra zen do as san dá li as de pe re -
gri no, o fa ná ti co de Ca nu dos vi via ro de a do de cen te nas de ad mi ra do res
e pro sé li tos.
A Cam pa nha de Ca nu dos 13
Assim das cer ca ni as des se lu gar, como de pon tos mais afas ta -
dos, até onde che ga va a fama do san to, vi nham tro ços de ho mens e mu -
lhe res, ve lhos e cri an ças, do en tes e sãos, com o fim de ou vir e con sul tar
ao Bom Je sus, nome por que era tra ta do o Con se lhe i ro, o qual não pas sa -
va de um lou co, de um so nha dor das cou sas do Céu. Qu a se to dos, car -
re ga dos de ima gens, acur va dos de ba i xo dos an do res, can tan do – pe las
es tra das – la da i nhas e sal mos; cada um que ren do ha u rir no ver bo de tão
sin gu lar per so na gem a es pe ran ça e o con so lo, como be ber-lhe nos
exem plos a li ção da pre ce e da te na ci da de.
“Algu ma cou sa, mais do que a sim ples lou cu ra de um ho mem, 
era ne ces sá ria para este re sul ta do, e essa al gu ma cou sa é a psi co lo gia da
épo ca e do meio, em que a lou cu ra de Antô nio Con se lhe i ro achou com -
bus tí vel para ate ar o in cên dio de uma ver da de i ra epi de mia ve sâ ni ca.”2
Ao nas cen te ar ra i al, por tan to, vi nham ter qua se to dos os dias
gran des ca ra va nas, com pos tas de pes so as cré du las e sim ples, pro ce den -
tes de Mun do Novo, Entre-Rios, Inham bu pe, Tu ca no, Cum be e ou tros
pon tos, as qua is se cons ti tu íam logo após dis cí pu los e de fen so res da
nova se i ta.
Mu i tas den tre elas ti nham de i xa do, sem o mí ni mo pe sar, o sí -
tio em que ha bi ta vam des de a in fân cia; aban do nan do, sem sa u da des, o
lar e a fa mí lia; e to das as pi ra vam à fe li ci da de de per ten cer às fa lan ges do 
fa ná ti co, por ele edu ca das a prin cí pio na es co la do mis ti cis mo e da reza,
con ver ti das de po is em cen tro de re a ção e aven tu ras.
Re a li za va-se, des tar te, uma das leis que re gem a psi co lo gia das 
mul ti dões; fa zia-se sen tir, as sim, a in fluên cia in dis cu tí vel da imi ta ção.
Os de sor de i ros, que ti nham com ba ti do alhu res às or dens do
fa mi ge ra do Vol ta Gran de, bem como os que ha vi am fu gi do das La vras
Di a man ti nas, acos sa dos por au to ri da des cum pri do ras do seu de ver, for -
ma ram afi nal o gros so das for ças do Con se lhe i ro.
Eram to dos eles, mais ou me nos, do tipo de João Aba de, Ma -
cam bi ra e Pa jeú; de uma va len tia as som bro sa; afe i tos à vida dos ser tões
agres tes; ha bi tu a dos a en ca rar a mor te com afo i te za e des dém. Como é
cor ren te, o ser ta ne jo pos sui uma or ga ni za ção ro bus ta, e uma ca pa ci da de 
14 Aris ti des A. Milton
2 Dr. Nina Ro dri gues – Re vis ta Bra si le i ra, 3º ano, tomo XI.
de re sis tên cia, que pas mam; dis tin gue-se por uma ener gia fran ca men te
in dô mi ta.
Ver da de i ra raça de he róis, dig nos de ou tros ide a is, me re ce do -
res de mais no bre e ale van ta do des ti no!
Atra í dos, no en tan to, por in for ma ções exa ge ra das, e con vi tes
ins tan tes que re ce bi am, pa ren tes e ami gos dos que es ta vam já ins ta la dos
em Ca nu dos, iam se re u nin do a es tes, com en tu si as mo e fer vor. Con tri -
bu ía tam bém para au men tar a po pu la ção do ar ra i al a gran de leva de cri -
mi no sos, que se lhe vi nham in cor po rar, per su a di dos de que por esse
modo evi ta vam a pu ni ção de seus de li tos, por nada po de rem con tra o
Con se lhe i ro a po lí cia e a jus ti ça do país. O po vo a do cres cia a olhos vis -
tos, e se trans for ma ra numa ci da de, con tan do para cima de 5.000 pré di os.
Mas, o in tu i to, que le va va a Ca nu dos a ma i or par te des sa gen -
te, fora o de apren der a pra ti car as cou sas san tas; o prin ci pal mó vel que
a ins pi ra va era, com cer te za, a con quis ta da sal va ção eter na. O Con se -
lhe i ro a to dos aco lhia bon do sa men te, e lhes ace i ta va os do na ti vos e pre -
sen tes, dan do às ve zes por es cam bo sor tes de ter ra, que de ve ri am ser cul -
ti va das em be ne fí cio co mum. Do mi na va ele e su pe rin ten dia tudo, des de
o san tuá rio até à úl ti ma das chou pa nas, e era ser vi do sem pre com obe -
diên cia e pres te za.
Des se con cer to de tan tas von ta des, en tre gues e sub me ti das à
in fluên cia e di re ção de uma só, de corre ram sur pre en den tes efe i tos, cuja
im por tân cia bem se pôde – den tro em pou co – aqui la tar, e que te ri am
pas ma do o mun do in te i ro se hou ves se por aca so ocor ri do em ou tro
país.
Pre ven do even tu a li da des, que a re bel dia de sua ati tu de po si ti -
va men te pro vo ca va, os ha bi tan tes de Ca nu dos tra ta ram de se ga ran tir
con tra qual quer mo vi men to, que vi sas se per se gui-los ou de sa lo já-los. E
daí pro ce deu que eles edi fi ca ram suas ca sas, aten den do a um pla no de
de fe sa, mais ou me nos es tra té gi co; e se pre mu ni ram de mu ni ções e ar -
mas, que nos mo men tos opor tu nos tor na ri am mais efi ca zes a sua ab ne -
ga ção e va len tia.
E foi des se modo que se for mou aque la nova Ven déia, com -
pa rá vel à da Fran ça pe los aci den tes to po grá fi cos, que am bas ofe re ci am,
na tu re za es pe ci al do solo, de vo ta men to cego a uma su pers ti ção e a um
A Cam pa nha de Ca nu dos 15
erro, pre tex to re li gi o so tam bém como jus ti fi ca ti va de uma con du ta an ti -
pa trió ti ca, in sen sa ta e cri mi no sa afi nal.
Para ser mais per fe i ta a se me lhan ça, que as sim fica in di ca da, o 
ja gun ço3 ba i a no usa va de pro ces so igual ao dos in sur re tos da gle ba fran -
ce sa. Ele ca ça va os sol da dos re pu bli ca nos de den tro dos ma ta ga is onde
cos tu mava se ocul tar, como os ou tros ti nham ata ca do o Exér ci to na ci o -
nal, a fu zil, “de cima das es car pas, atra vés das se bes tra i ço e i ras; tendo-o
qua se pri si o ne i ro em ver da de i ros ca la bou ços de pe dra: de um lado e ou -
tro a li nha vi o len ta e es ca bro sa dos des pe nha de i ros, além o ca tin gal es -
pes so, im pe ne trá vel, pre nhe dos mis té ri os hor rí ve is da em bos ca da e da
mor te”.
Urgia, con tu do, fa zer tal gen te en trar na or dem eco nô mi ca e
ju rí di ca; tor na va-se im pres cin dí vel que ces sas se de uma vez essa ame a ça
cons tan te à paz pú bli ca.
Quem era, no en tan to, esse ho mem que aos 60 anos de ida de
con gre ga va em tor no de sua in di vi du a li da de tão gran des ele men tos de
ação e re a ção? Don de ti nha vin do? De que me i os usa va para se fa zer
amar e ser vir? O que pre ten dia, in sur gin do-se con tra os po de res po lí ti -
cos da na ção? Como con se gui ra ser o he rói des sa epo péia, cu jas es tro fes 
o fra gor das tem pes ta des há de re pe tir por mu i tos anos, pe ne tran do até
às frin chas das ser ras que al can ti lam o nor te da Ba hia?
Antô nio Vi cen te Men des Ma ci el, co nhe ci do de po is por Antô nio 
Con se lhe i ro, nas ce ra em Qu i xe ra mo bim, da an ti ga pro vín cia do Ce a rá.
Des cen dia de uma fa mí lia, cu jos mem bros – na ma i or par te – so fri am
de ali e na ção men tal. Seu pai – Vi cen te Men des Ma ci el – fora um dos
cé le bres Ma ciéis, cuja co ra gem tor na ra len dá rio esse nome de cli na do na his tó ria
cri mi nal da que le Esta do; era ne go ci an te, ho mem bo ni to, a tez li ge i ra men te mo re na,
vi go ro so e in te li gen te, mas re tra í do, ta ci tur no, mau, e pe ri go sa men te des con fi a do, bem
que mu i to cor tês, ob se qui a dor e hon ra do. Ti nha mo men tos ter rí ve is de có le ra, prin ci -
pal men te se to ca va em ál co ol. Era de uma va len tia in dô mi ta, e meio sur do.4 A mãe
de Antô nio Con se lhe i ro cha ma va-se Ma ria Ma ci el, mas era ge ral men te
co nhe ci da pelo ape li do de Ma ria Cha na.
16 Aris ti des A. Milton
3 Ja gun ço é o in di ví duo que vive ha bi tu al men te en vol vi do em de sor dem, por con ta
pró pria ou alhe ia.
4 João Brí gi do, Pu bli ca ções di ver sas, págs. 108 a 109.
De po is de ter de i xa do a es co la pri má ria, Antô nio Vi cen te,
que era de ín do le dó cil, in te li gen te e aves so aos pra ze res, ha via ini ci a do
o es tu do da lín gua la ti na, e du vi do so não é que lo gras se apro ve i tar do
en si no de seus pro fes so res, por quan to dis pu nha de cer ta cul tu ra que de
mu i to lhe va leu no de sem penho do pa pel que es co lhe ra para al can çar
no me a da.
Um mé di co ilus tra do es cre via, em 1897:
“Antô nio Con se lhe i ro é se gu ra men te um sim ples lou co. Mas,
essa lou cu ra é da que las, em que a fa ta li da de in cons ci en te da mo lés tia re -
gis tra com pre ci são ins tru men tal o re fle xo, se não de uma épo ca, pelo
me nos do meio em que elas se ge ra ram.” E acres cen ta va: “a cris ta li za -
ção do de lí rio de Antô nio Con se lhe i ro, no ter ce i ro pe río do de psi co se
pro gres si va, re fle te as con di ções so ci o ló gi cas do meio em que se or ga ni -
zou”.5
Antô nio Ma ci el, po rém, se ca sa ra em tem po com uma pa ren ta,
fi lha de Fran cis ca Ma ci el, irmã de seu pai. Não foi, to da via, fe liz em seu
lar. De sa vin do-se com a so gra, li qui dou sua casa co mer ci al, e trans fe -
riu-se em 1859 para So bral, onde ser viu de ca i xe i ro e, de po is, de es cri vão
de paz. Daí, se pas sou para Ipu, sua mu lher foi rap ta da pelo sar gen to
João de Melo, co man dan te do des ta ca men to de li nha, o qual en tre tan to
de i xou-a mor rer es mo lan do em So bral.
 Antô nio Ma ci el, não que ren do ser tes te mu nha de sua pró -
pria ver go nha, se re ti rou com des ti no à ci da de de Cra to. Mas, pas san do
pelo lu gar de no mi na do Paus Bran cos, de mo rou-se em casa de seu
cu nha do, Lou ren ço Cor re ia Lima, a quem – du ran te um aces so de lou -
cu ra – le ve men te fe riu. Do Cra to par tiu para a pro vín cia, hoje Es ta do,
da Ba hia, onde en trou pela pri me i ra vez em 1874.
 Fi ze ra toda a vi a gem por ter ra.
 A pou co e pou co, foi o Con se lhe i ro exe cu tan do o pla no 
que ti nha tra ça do, e gra ças à sua ha bi li da de e boa for tu na, che ga ra a cap -
tar sim pa ti as e ad mi ra ção qua se ge ra is, em uma lar ga fa i xa da zona ser ta -
ne ja. É que ele ob ser va va um re gi me só brio, se não for ti fi can te, o que
sem pre ma ra vi lha, por ser ex ce ção. Só co mia ce re a is, re pou sa va não raro 
A Cam pa nha de Ca nu dos 17
5 Re vis ta Bra si le i ra, tomo XI, “Estu do” pelo Dr. Nina Ro dri gues.
so bre o chão, não re ce bia de es mo la se não a quan tia de que res tri ta men te
pre ci sas se.
Pa dres hou ve, que lhe ce de ram o púl pi to de suas igre jas, para
que daí dou tri nas se ele as mul ti dões ig na ras: fato aliás con de na do por
uma pas to ral do ar ce bis po me tro po li ta no.
E, de 1874 até 1876, Antô nio Con se lhe i ro as sim vi veu.
Nes se úl ti mo ano, po rém, o de le ga do do ter mo de Ita pi cu ru
re qui si tou do che fe de po lí cia da pro vín cia a for ça ne ces sá ria para con ter
Antô nio Con se lhe i ro e seus se qua zes, que es ta vam co me ten do ex ces sos
de toda na tu re za, ten do mes mo al guns den tre eles in sul ta do a pri me i ra
au to ri da de da co mar ca.
Sa tis fe i ta a re qui si ção alu di da, foi efe tu a da a di li gên cia, con -
for me se verá do ofí cio, que pas so a co pi ar:
“De le ga cia da vila de Ita pi cu ru, 28 de ju nho de 1876 – Ilmo. Sr. –
Ao Sr. Alfe res Di o go Antô nio Ba hia, co man dan te da for ça que V. S.
re me teu a esta vila por mi nha re qui si ção, não só para man ter a or dem e o
res pe i to de vi dos à au to ri da de, como para con du zir o pre so Antô nio
Vi cen te Men des Ma ci el, en tre guei não só o mes mo pre so, como ain da o 
ou tro, de nome Pa u lo José da Rosa, que se acha vam aqui de ti dos por
or dem de V. S. para se rem re me ti dos à se cre ta ria, se gun do me or de nou
em ofí cio de 15 de abril úl ti mo.
“Em pre sen ça da for ça, de sis ti ram os fa ná ti cos do pla no en tre 
eles com bi na do da des mo ra li za ção à au to ri da de, pois só essa pro vi dên -
cia os fa ria con ter des se pro pó si to; sen do cer to que ago ra pro pa lam –
que fa rão na vol ta do seu santo Antô nio, como cha mam o pri me i ro dos
pre sos; o que con tampor cer to. 
“À vis ta des se mau pla no que, em face das cir cuns tân ci as,
exe cu ta rão, peço a V. S. para dar pro vi dên ci as, a fim de que não vol te o
dito fa na ti za dor do povo ig no ran te; e cre io que V. S. as sim o fará, por -
que não de i xa rá de sa ber da no tí cia, que há me ses apa re ceu, de ser ele
cri mi no so de mor te na pro vín cia do Ce a rá. 
“Tam bém apro ve i to a oca sião para re me ter a V. S. pelo mes -
mo al fe res os in di ví du os de no mes José Ma nu el e Estê vão; o pri me i ro
re cru tei para o exér ci to, vis to não apre sen tar isen ção al gu ma, não ter pai 
e mãe, e não ter em pre go ne nhum co nhe ci do, se não o de lará pio; pois
18 Aris ti des A. Milton
há pou cos dias fur tou a uma po bre vi ú va 60$, que ela re ser va va de suas
eco no mi as para suas pre ci sões, e os deu qua se todo a mu lhe res per di das. 
E se gun do, por de nún cia que tive de ser ca ti vo de uma vi ú va, re si den te
no Por to da Fo lha, na pro vín cia de Ser gi pe, e an dar aqui cons tan te men -
te em bri a ga do, e in sul tan do as au to ri da des, como há pou co aca ba de
pra ti car com o Dr. Juiz de di re i to des ta co mar ca.
“Esses in di ví du os são fa na ti za dos, e par ti dá ri os do pre so Antô nio
Vi cen te Men des Ma ci el.
“Deus guar de a V. S. Ilmo. Sr. Dr. João Ber nar des de Ma ga -
lhães, m.d. che fe de po lí cia des ta pro vín cia. – O de le ga do em exer cí cio,
Fran cis co Pe re i ra da Assun ção.”
Com o fim de ave ri guar a pro ce dên cia da im pu ta ção que se
fa zia ao Con se lhe i ro, en vi ou-o logo de po is o che fe de po lí cia da Ba hia
ao seu co le ga do Ce a rá, como cons ta do ofí cio a se guir: 
“Se cre ta ria da po lí cia da pro vín cia da Ba hia, em 5 de ju nho de 1876 –
2ª sec ção – Nº 2.182 – Ao dr. Che fe de po lí cia do Ce a rá.
“Faço apre sen tar a V. S. o in di ví duo, que se diz cha mar Antô -
nio Vi cen te Men des Ma ci el, co nhe ci do por Antô nio Con se lhe i ro, que sus -
pe i to ser al gum dos cri mi no sos des sa pro vín cia, que an dam fo ra gi dos. 
“Esse in di ví duo apa re ceu ul ti ma men te no lu gar de no mi na do
Mis são da Sa ú de, em Ita pi curu, e aí, en tre gen te ig no ran te, dis se-se en vi -
a do de Cris to, e co me çou a pre gar, le van do a su pers ti ção de tal gen te ao 
pon to de um fa na tis mo pe ri go so.
“Em suas pré di cas plan ta ra o des res pe i to ao vi gá rio da que la
fre gue sia e, cer ca do de uma mul ti dão de adep tos, co me ça ra a de sas sos se gar 
a tran qüi li da de da po pu la ção.
“Em vir tu de da re cla ma ção, que re ce bi do exm. Sr. Vi gá rio
ca pi tu lar, con tra o abu si vo pro ce di men to des se in di ví duo, que ia, além
de tudo, em bol san do os di nhe i ros com que, cré du los, iam lhe en chen do
as al gi be i ras os seus fiéis, man dei-o bus car à ca pi tal, onde obs ti na da -
men te não quis res pon der ao in ter ro ga tó rio que lhe foi fe i to, como verá
V. S. do auto jun to. Era uma me di da de or dem pú bli ca de que não de via
eu pres cin dir.
“Entre tan to, se porven tu ra não for ele aí cri mi no so peço em
todo o caso a V. S. que não per ca de so bre ele as suas vis tas, para que
A Cam pa nha de Ca nu dos 19
não vol te a esta pro vín cia, ao lu gar re fe ri do, para onde a sua vol ta tra rá
cer ta men te re sul ta dos de sa gra dá ve is, pela exal ta ção em que fi ca ram os
es pí ri tos dos fa ná ti cos com a pri são do seu ído lo. – J. B. de Ma ga lhães.”
O che fe de po lí cia do Ce a rá, de cor ri dos que fo ram al guns
me ses, gas tos em pes qui sas, res pon deu – “que não po de rá con ser var
pre so o Con se lhe i ro, por não se achar este ali pro ces sa do, nem ter co -
me ti do cri me al gum”.
Mas, an tes de ser co nhe ci do esse fato, a ima gi na ção po pu lar
se ex pan diu, com pon do os mais cu ri o sos e sen sa ci o na is ro man ces.
Assim é que nuns con ta va-se – que Antô nio Con se lhe i ro, in -
vo lun ta ri a men te em bo ra, ma ta ra a pró pria mãe, no mo men to em que
esta, dis far ça da de tra jes mas cu li nos, ba tia – por alta no i te – à ja ne la da
al co va da nora, pro cu ran do com se me lhan te ar dil de mons trar ao fi lho –
que a es po sa lhe era in fi el.
Em ou tros ro man ces, re la ta-se – que o fa ná ti co ce a ren se as -
sas si na ra a con sor te, im pe li do por sus pe i tas, que os acon te ci men tos de
ne nhum modo jus ti fi ca ram.
De ma ne i ra que a vida ori gi nal do Con se lhe i ro era to ma da
por mu i ta gen te à con ta de ex pi a ção e pe ni tên cia.
Cer to é que, uma vez res ti tu í do à li ber da de, Antô nio Ma ci el
vol tou para o an ti go te a tro de suas fa ça nhas, a con ti nu ar na mes ma vida
de agi ta ção e pré di ca. Per cor reu ele en tão vá ri as lo ca li da des da Ba hia,
de mo ran do-se mais tem po em Mon te San to, Cum be, Bom-Con se lho e
Maç a ca rá. Por toda par te, en tre tan to, con quis ta va a no me a da es pe ci al de 
be a to, pois con su mia qua se todo o seu tem po na edi fi ca ção de igre jas e
ce mi té ri os. Além dis to, con se gui ra le van tar – na co mar ca de Ita pi curu –
um novo po vo a do a que pusera o nome de Bom Je sus.
Foi por oca sião de achar-se o Con se lhe i ro aí, que o de le ga do
de po lí cia res pec ti vo di ri giu ao che fe de po lí cia da Ba hia este cu ri o so
ofí cio:
“Vila de Ita pi cu ru, 10 de no vem bro de 1876 – De le ga cia de po lí cia.
“Ilmo. sr. – É de meu de ver le var ao co nhe ci men to de V. S.
que, no ar ra i al do Bom Je sus, exis te uma sú cia de fa na ti za dos e mal va -
dos que põem em pe ri go a tran qüi li da de pú bli ca. Há 12 anos, pou co
mais ou me nos, com pe que nas in ter rup ções, fez sua re si dên cia nes te
20 Aris ti des A. Milton
ter mo Antô nio Vi cen te Men des Ma ci el, vul go Antô nio Con se lhe i ro, que,
por suas pré di cas, tem abu sa do da cre du li da de dos ig no ran tes, ar ras tan -
do-os ao fa na tis mo.
“Ha ven do sus pe i tas de que ele fos se cri mi no so no Ce a rá, pro -
vín cia de seu nas ci men to, foi no ano de 1876 pre so por or dem do dr.
Che fe de po lí cia da que la épo ca e para ali re me ti do. Re gres san do pou co
de po is, fez nes te ter mo seu acam pa men to, e pre sen te men te está no re -
fe ri do ar ra i al cons tru in do uma ca pe la a ex pen sas do povo. Con quan to
esta obra seja de al gum me lho ra men to, aliás dis pen sá vel para o lu gar, to -
da via os ex ces sos e sa cri fí ci os não com pen sam este bem, e, pelo modo
por que es tão os âni mos, é mais que jus to e fun da do o re ce io de gran des 
des gra ças.
“Para que V. S. sa i ba quem é Antô nio Con se lhe i ro, bas ta di zer 
que é acom pa nha do por cen te nas e cen te nas de pes so as, que ou vem-no
e cum prem suas or dens de pre fe rên cia às do vi gá rio des ta pa ró quia. O
fa na tis mo não tem mais li mi tes, e as sim é que, sem medo de erro e fir -
ma do em fa tos, pos so afir mar que ado ram-no como se fos se um deus
vivo. Nos dias de ser mões e ter ço, o ajun ta men to sobe a mil pes so as. Na 
cons tru ção des sa ca pe la, cuja fé ria se ma nal é de qua se cem mil-réis, dé -
cu plo do que de via ser pago, es tão em pre ga dos ce a ren ses, aos qua is
Antô nio Con se lhe i ro pres ta a mais cega pro te ção, to le ran do e dis si mu -
lan do os aten ta dos que co me tem, e esse di nhe i ro sai dos cré du los e ig -
no ran tes, que, além de não tra ba lha rem, ven dem o pou co que pos su em
e até fur tam para que não haja a me nor fal ta, sem fa lar nas quan ti as ar -
re ca da das que têm sido re me ti das para ou tras obras do Cho roxó, ter mo
de Ca pim Gros so. É in cal cu lá vel o pre ju í zo que a esta ter ra tem ca u sa do 
Antô nio Con se lhe i ro. Entre os ope rá ri os fi gu ra o ce a ren se Fe i to sa,
como che fe, que com os de ma is fa na ti za dos fi ze ram do re fe ri do ar ra i al
uma pra ça de ar mas, in ti man do a ci da dãos, como one go ci a dor Mi guel
de Agui ar Ma tos, para mu da rem-se do lu gar com sua fa mí lia, em 24 ho -
ras, sob pena de mor te. Ha ven do de sin te li gên cia en tre o gru po de Antô -
nio Con se lhe i ro e o vi gá rio de Inham bu pe, está aque le mu ni ci a do como
se ti ves se de fe rir uma ba ta lha cam pal, e cons ta que es tão à es pe ra que o 
vi gá rio vá ao lu gar de no mi na do Jun co para as sas si ná-lo. Faz medo aos
tran se un tes pas sa rem por ali, ven do aque les mal va dos mu ni dos de ca ce -
A Cam pa nha de Ca nu dos 21
tes, fa cas, fa cões, cla vi no tes, e ai da que le que for sus pe i to de ser in fen so
a Antô nio Con se lhe i ro!
“Ne nhum dos vi gá ri os das fre gue si as li mí tro fes tem con sen ti -
do nos lu ga res de sua ju ris di ção esta hor da de fa ná ti cos, só o da qui a
tem to le ra do, e ago ra é tar dio o ar re pen di men to, por que sua pa la vra não 
será ou vi da. Há pou co, man dan do cha má-lo para pôr a ter mo a este es -
ta do de cou sas, a res pos ta que lhe man dou Antô nio Con se lhe i ro, foi –
que não ti nha ne gó ci os com ele; e não veio. Con sta que os vi gá ri os das
fre gue si as têm lido a pas to ral do exm. sr. Arce bis po, pro i bin do os ser -
mões e mais atos re li gi o sos de Antô nio Con se lhe i ro, e exor tan do o
povo para o ver da de i ro ca mi nho da re li gião: nes ta ain da não foi lida,
sem dú vi da pelo re ce io que tem o vi gá rio de se re vol ta rem con tra ele os
fa na ti za dos.
“O ci da dão Mi guel de Agui ar Ma tos, com ou tros, tem vin do
pe dir pro vi dên ci as, as qua is te nho de i xa do de dar por não con tar com
for ça su fi ci en te para em pre en der esta di li gên cia, que, se for ma lo gra da,
pi o res se rão ain da os re sul ta dos.
“Cum pre di zer que Antô nio Con se lhe i ro, que ves te uma ca -
mi so la de pano azul, com bar bas e ca be los lon gos, é mal cri a do, ca pri -
cho so e so ber bo.
“Não con vin do esta ame a ça cons tan te ao bem pú bli co, e an -
tes cum prin do pre ve nir aten ta dos e des gra ças, so li ci to de V. S. um des ta -
ca men to de li nha para dis per sar o gru po de fa ná ti cos. Re no vo a V. S. os
meus pro tes tos da mais su bi da es ti ma, con si de ra ção e res pe i to. Deus
guar de a V. S. – Ilmo. Sr. Dr. Do min gos Ro dri gues Gu i ma rães, m. d.
che fe de po lí cia des ta pro vín cia. – Luís Gon za ga de Ma ce do.”
Embo ra ne nhum fato po si ti vo hou ves se ain da de nun ci a do,
por par te do Con se lhe i ro, in ten tos ver da de i ra men te cri mi no sos, bem
cer to é – que os fa zen de i ros e pro pri e tá ri os, re si den tes na zona por ele
fre qüen ta da, mos tra vam-se re ce o sos e alar ma dos. Nem era, cer ta men te,
para tran qüi li zar a gran de co mi ti va de Antô nio Con se lhe i ro, for ma da
ex clu si va men te de pes so as fa na ti za das, en tre as qua is ele do mi na va
como mes tre in fa lí vel, e se nhor ab so lu to. 
“Em pe re gri na ções re li gi o sas e ati tu de pa cí fi ca, em co me ço,
es ses gru pos, cres cen do dia a dia pelo con tá gio do fa na tis mo, en tre ga -
vam-se por úl ti mo à prá ti ca de cri mes, per tur ba vam a or dem pú bli ca,
22 Aris ti des A. Milton
im pe di am à mão ar ma da a co bran ça de im pos tos, in va di am e sa que a vam 
vá ri as fa zen das, e ame a ça vam po vo a ções.”6
Re al men te, não tar dou mu i to – que os sec tá ri os do su pos to
prof e ta, aban do nan do a sua pri mi ti va po si ção de sim ples ado ra do res do
Bom Je sus, como ao Con se lhe i ro de no mi na vam, se con ver tes sem to dos
numa le gião de ja gun ços, que fo ram pra ti can do por aque les ar re do res
vá ri os atos in frin gen tes da lei.
Daí pro ce deu que, em 1893, foi man da da ao en con tro de
Antô nio Con se lhe i ro, uma for ça de 35 pra ças de po lí cia, co man da das
pelo te nen te Vir gí lio de Alme i da. Mas essa di li gên cia, bem como ou tra
de mes ma na tu re za que se lhe se guiu, e fi nal men te uma ter ce i ra cons -
tan te de 80 pra ças de li nha, pro du zi ram – to das – re sul ta do ne ga ti vo.7
Cor ria o ano de 1893, quan do Antô nio Con se lhe i ro, após um
en con tro, em Ma ceté, com cer to des ta ca men to po li ci al do que se ori gi -
na ram mor tes de par te à par te, pa rou de fi ni ti va men te em Ca nu dos, en -
tão sim ples fa zen da de gado, ten do ape nas a casa do va que i ro, se bem
que ser vi da por di ver sas es tra das, por onde po di am trans por tar-se re cur -
sos de todo gê ne ro, e si tu a da à mar gem do Vaza-Bar ris, na co mar ca de
Mon te Santo.
É de crer – que o Con se lhe i ro mu i to de in dús tria pre fe ris se
esse lu gar, por quan to ao pri me i ro re lan ce se im pu nha como um pon to
na tu ral e van ta jo sa men te es tra té gi co.
O ban do fa na ti za do, con tu do, se bem que já in cu tis se cer to
te mor, ocu pou-se em Ca nu dos da edi fi ca ção de uma pe que na ca pe la
para cu jas obras o seu che fe pe dia – sem ces sar – o con cur so do povo;
as se gu ran do – que quan tos o co ad ju vas sem no seu em pe nho, com es -
for ço pes so al ou com di nhe i ro, se ri am per do a dos dos seus pe ca dos por
Deus, de quem ele se in cul ca va emis sá rio es pe ci al e re pre sen tan te na
Ter ra. 
Como, em todo o caso, não ti ves sem ces sa do os re ce i os de
aten ta dos, que de uma hora para ou tra aque la gen te aglo me ra da e des te -
mi da po de ria pra ti car, e, do mais, ti ves sem fra cas sa do as di li gên ci as or -
A Cam pa nha de Ca nu dos 23
6 Re la tó rio do che fe de po lí cia da Ba hia, em 1898, pág. 4.
7 Ain da em 1897, um gru po de ja gun ços do Con se lhe i ro pren de ra, em Cho ro xó, Ho rá -
cio Pa che co de Me ne ses, juiz de paz; e, de po is de o ter fe i to an dar 60 qui lô me -
tros, o pôs em li ber da de me di an te 6:200$, por quan to o res ga tou.
ga ni za das para cha má-la ao de ver, o Dr. Jo a quim Ma nuel Ro dri gues
Lima, que era a esse tem po go ver na dor da Ba hia, co gi tou nou tro meio
que se lhe afi gu ra va mais efi caz e ade qua do ao fim que se vi sa va en tão.
E com esse no bi lís si mo pro pó si to se en ten deu com o pre la do 
da ar qui di o ce se, fi can do en tre os dois as sen ta da a ida do ca pu chi nho fr.
João Evan ge lis ta de Mon te Mar ci a no, a quem foi co me ti da a mis são de
fa zer o Con se lhe i ro tor nar com sua gen te para o grê mio da Igre ja, e
obe diên cia às leis e au to ri da des do país.
Des de o dia 13 até 21 de maio de 1895, o dig no re li gi o so per -
ma ne ceu no ar ra i al de Ca nu dos.
Mas, in fe liz men te, não lo grou ele re a li zar seus in tu i tos, e todo 
o tra ba lho, que en tão des pen de ra, se es te ri li zou di an te da te i mo sia e da
ig no rân cia que os fa ná ti cos os ten ta vam.
Mu i to me lhor, po rém, do que eu po de ria fazê-lo, o pró prio fr. 
João vai nar rar o ocor ri do, como se verá do seu re la tó rio, que eu tomo a 
li ber da de de re gis trar aqui:
“Exm. e Rev mo. Sr. – Não ig no ra V. Ex. Rev ma. que o Exm. e
Rev mo. Sr. Arce bis po, nas vés pe ras de sua vi a gem para a vi si ta ad li mi na
apos to lo rum, con fi ou-me a ár dua mis são de ir ao po vo a do de Ca nu dos,
fre gue sia do Cum be, onde se es ta be le ceu o in di ví duo co nhe ci do vul gar -
men te por Antô nio Con se lhe i ro, a fim de pro cu rar pela pre ga ção da
ver da de evan gé li ca, e ape lan do para os sen ti men tos da fé ca tó li ca, que
esse in di ví duo diz pro fes sar, cha má-lo e aos seus in fe li zes as se clas aos
de ve res de ca tó li cos e de ci da dãos, que de todo es que ce ram, e vi o lam
ha bi tu al men te com as prá ti cas as mais ex tra va gan tes e con de ná ve is,
ofen den do a re li gião e per tur ban do a or dem pú bli ca. Com pre en den do
bem as gra ves di fi cul da des da ta re fa, ace i tei-a como fi lho da obe diên cia,
e con fi a do só na mi se ri cór dia e no po der in fi ni to d’Aquele que, para fa zer 
o bem, ser ve-se dosmais fra cos e hu mil des ins tru men tos, e não ces sa de
que rer que os mais in ve te ra dos pe ca do res se con ver tam e se sal vem.
“Mu ni do, en tão, de fa cul da des e po de res es pe ci a is, se gui
acom pa nha do de um ou tro re li gi o so – fr. Ca e ta no de S. Léu; e, hoje, de -
sem pe nhada como nos foi pos sí vel a in cum bên cia re ce bi da, ve nho re la -
tar mi nu ci o sa men te a v. ex. rev ma. o que ob ser va mos, e qual o re sul ta do 
dos nos sos es for ços, em par te frus tra dos, para que te nha V. Ex. Rev ma.
24 Aris ti des A. Milton
ciên cia de tudo, e pro vi den cie como for con ve ni en te, na qua li da de de
go ver na dor do ar ce bis pa do. 
“Prin ci pi a rei por di zer – que par tin do a 26 de abril, só a 13 de 
maio con se gui mos en trar no po vo a do de Ca nu dos, ape sar do nos so em -
pe nho em trans por tar-nos o mais de pres sa pos sí vel. As di fi cul da des em
ob ter con du ção e se en con trar aga sa lho nas es tra das, e gui as co nhe ce do -
res do ca mi nho, re tar da ram a vi a gem, for çan do-nos uma de mo ra de
mu i tos dias no Cum be, que ain da fica a 18 lé guas de Ca nu dos.
“Ain da tão dis tan tes, já de pa rá va mos os pre nún ci os da in su -
bor di na ção e da anar quia de que ía mos ser tes te mu nhas, e que se fa zem
sen tir por mu i tas lé guas em der re dor do re fe ri do po vo a do.
“Três lé guas an tes de che gar ao Cum be, avis ta mos um nu me -
ro so gru po de ho mens, mu lhe res e me ni nos, qua se nus, aglo me ra dos em 
tor no de fo gue i ras, e, acer can do-nos de les, os sa u da mos; per gun tan -
do-lhes eu – se era aque la a es tra da que con du zia ao Cum be.
“Seu pri me i ro mo vi men to foi lan çar mão de es pin gar das e
fa cões, que ti nham de lado, e jun ta rem-se to dos em ati tu de agres si va.
Pen san do acal má-los, dis se-lhes que éra mos dois mis si o ná ri os que se ti nham
per di do na es tra da, e que ri am sa ber se era lon ge a fre gue sia. Res pon de ram:
não sa be mos, per gun tem ali; e apon ta ram uma casa vi zi nha.
“Era uma guar da avan ça da de Antô nio Con se lhe i ro, essa gen te
que ha vía mos en con tra do.
“Anun ci a da, no Cum be, à mis sa con ven tu al do do min go, 5 de 
maio, a mis são que ía mos dar em Ca nu dos, não foi para os ha bi tan tes
des se po vo a do uma sur pre sa a nos sa che ga da, no dia 13 às 10 ho ras da
ma nhã.
“A fa zen da Ca nu dos dis ta duas lé guas do Ri a cho das Pe dras,
no lado opos to à ser ra Ge ral. A uma lé gua de dis tân cia, o ter re no é
in cul to, po rém óti mo para a cri a ção mi ú da, prin ci pal men te nas che i as do 
rio Vaza-Bar ris.
“Um qui lô me tro adi an te des co bre-se uma vas ta pla ní cie mu i to
fér til re ga da pelo rio, na ba i xa de um mon te, de cuja emi nên cia já
se avis tam a casa an ti ga da fa zen da Ca nu dos, a ca pe la edi fi ca da por
Antô nio Con se lhe i ro, e as mi sér ri mas ha bi ta ções dos seus fa na ti za dos
dis cí pu los.
A Cam pa nha de Ca nu dos 25
“Pas sa do o rio, logo se en con tram es sas ca si nho las tos cas,
cons tru í das de bar ro e co ber tas de pa lha, de por ta, sem ja ne la, e não
ar ru a das. O in te ri or é imun do, e os mo ra do res, que – qua se nus – sa íam
fora a olhar-nos, ates ta vam, no as pec to es quá li do e qua se ca da vé ri co, as
pri va ções de toda es pé cie que cur ti am. Vi mos de po is a pra ça, de ex ten são
re gu lar, la de a da de cer ca de 12 ca sas de te lha, e nas ex tre mi da des – em
fren te uma à ou tra – a ca pe la e a casa de re si dên cia de Antô nio Con se -
lhe i ro. À por ta da ca pe la, e em vá ri os pon tos da pra ça, api nha vam-se
per to de 1000 ho mens, ar ma dos de ba ca mar te, gar ru cha, fa cão, etc.,
dan do a Ca nu dos a se me lhan ça de um acam pa men to de be du í nos.
“Eles usam ca mi sa, cal ça e blu sa de azu lão, gor ro azul à ca be ça,
al per ca tas nos pés. O ar in qui e to e o olhar, ao mes mo tem po, in da ga dor
e si nis tro, de nun ci a vam cons ciên ci as per tur ba das e in ten ções hos tis.
“Alo ja mo-nos numa casa de pro pri e da de do Rev mo. vi gá rio
do Cum be, que nos acom pa nha va e ali não ha via vol ta do, des de que –
há cer ca de um ano – so fre ra gran de de sa ca to. Logo após a nos sa che -
ga da, no de cur so ape nas de duas ho ras, pude ver o se guin te, que dá a
me di da do aban do no e des gra ça, em que vive aque la gen te: pas sa ram a
en ter rar oito ca dá ve res, con du zi dos por ho mens ar ma dos, sem o mí ni mo
si nal re li gi o so. Ouvi tam bém – que isso é um es pe tá cu lo de to dos os
dias, e que a mor ta li da de nun ca é in fe ri or, de vi do às mo lés ti as con tra í -
das pela ex tre ma fal ta de as se io e pe nú ria dos me i os de vida, o que dá
lu gar até a mor re rem de fome.
“Re fe i tos um pou co da nos sa pe no sa vi a gem, di ri gi mo-nos
para a ca pe la, onde se acha va en tão Antô nio Con se lhe i ro, as sis tin do aos
tra ba lhos de cons tru ção. Mal nos per ce be ram, os ma go tes de ho mens
ar ma dos cer ra ram fi le i ras jun to à por ta da ca pe la; e, ao pas sar mos, dis -
se ram to dos – lou va do seja Nos so Se nhor Je sus Cris to: sa u da ção fre qüen te e
co mum, que só re cu sam em rom pi men to de hos ti li da des.
“Entran do, acha mo-nos em pre sen ça de Antô nio Con se lhe i ro,
que sa u dou-nos do mes mo modo.
“Ves tia tú ni ca de azu lão, ti nha a ca be ça des co ber ta, e em pu -
nha va um bor dão. Os ca be los cres ci dos, e sem ne nhum tra to, a ca í rem
so bre os om bros; as hi sur tas bar bas gri sa lhas, mais para bran cas, olhos
fun dos, ra ras ve zes le van ta dos para fi tar al guém; o ros to com pri do, e de
uma pa li dez qua se ca da vé ri ca, o por te gra ve e ar pe ni ten te: da vam-lhe
26 Aris ti des A. Milton
ao todo uma apa rên cia que não pou co te ria con tri bu í do para en ga nar e
atra ir o povo sim ples e ig no ran te em nos sos ser tões.
“As pri me i ras pa la vras que tro ca mos fo ram so bre as obras,
que se cons tru íam, e ele con vi dou-nos a exa mi ná-las, gui an do-nos a to -
das as di vi sões do edi fí cio.
“Che ga dos ao coro, apro ve i tei a oca sião de es tar mos qua se
sós, e dis se-lhe – que o fim que eu ia era todo de paz, e que as sim mu i to 
es tra nha va só en xer ga va ali ho mens ar ma dos; e não po dia de i xar de
con de nar que se re u nis sem num lu gar tão po bre tan tas fa mí li as en tre -
gues à oci o si da de, e num aban do no e mi sé ria tais, que di a ri a men te se da -
vam de oito a nove óbi tos.
“Por isso, de or dem e em nome do Sr. Arce bis po, ia abrir uma 
san ta mis são, e acon se lhar o povo a dis per sar-se, e a vol tar aos la res e ao 
tra ba lho, no in te res se de cada um e para o bem ge ral.
“Enquan to di zia isto, a ca pe la e o coro en chi am-se de gen te, e 
ain da não aca ba ra eu de fa lar, já eles a uma voz cla ma vam: Nós que re mos
acom pa nhar o nos so Con se lhe i ro. Este os fez ca lar, e, vol tan do-se para mim,
dis se:
“ ‘É para mi nha de fe sa que te nho co mi go es tes ho mens ar -
ma dos, por que V. Rev ma. há de sa ber – que a po lí cia ata cou-me, e quis
ma tar-me no lu gar cha ma do Ma ce té, onde hou ve mor tes de um lado e
ou tro lado.
“ ‘No tem po da mo nar quia de i xei-me pren der, por que re co -
nhe cia o Go ver no; hoje não, por que não re co nhe ço a re pú bli ca.’ 
‘“Se nhor’”, re pli quei eu, ‘“se é ca tó li co, deve con si de rar que a
Igre ja con de na as re vol tas, e, aca tan do to das as for mas de Go ver no –
en si na que os po de res cons ti tu í dos re gem os po vos em nome de Deus.
“ ‘É as sim por toda par te. A Fran ça, que é uma das prin ci pa is
na ções da Eu ro pa, foi mo nar quia por mu i tos sé cu los; mas há mais de 20 
anos é re pú bli ca: e todo o povo, sem ex ce ção dos mo nar quis tas de lá,
obe de ce às au to ri da des e às leis do go ver no.
‘“Nós mes mos, aqui no Bra sil, a prin ci pi ar dos bispos até ao
úl ti mo ca tó li co, re co nhe ce mos o Go ver no atu al. So men te vós não que -
re is su je i tar? É mau pen sar esse, é uma dou tri na er ra da a vos sa.’
A Cam pa nha de Ca nu dos 27
“Inter rom peu-me um da tur ba, gri tan do com ar ro gân cia: V.
Rev ma. é quem tem uma dou tri na fal sa, e não o nos so Con se lhe i ro. Des ta vez o
ve lho im pôs si lên cio, e por úni ca res pos ta me dis se: Eu não de sar mo a mi -
nha gen te, mas tam bém não es tor vo a san ta mis são.
“Não in sis ti no as sun to, e, acom pa nha dos da mul ti dão, sa í -
mos to dos, indo es co lher o lu gar para a la ta da e pro vi den ci ar para que
no dia se guin te prin ci pi as sem os exer cí ci os.
“Fe i to isso, e quan do me re ti ra va, os fa ná ti cos le van ta ram es -
tron do sos vi vas à San tís si ma Trin da de, ao Bom Je sus, ao Di vi no Espí ri -
to San to, e ao Antô nio Con se lhe i ro.
“Mis si o nan do em vá ri as fre gue si as vi zi nhas, eu ha via já co lhi do
in for ma ções so bre Antô nio Con se lhe i ro e seus prin ci pa is sec tá ri os;
mas es tan do en tre eles, quis – an tes de dar prin cí pio à mi nha pre ga ção – 
ave ri guar o que re al men te eles eram, e o que fa zi am. 
“Do que vi e ouvi apu rei o que pas so a re gis trar, para que se
apre cie me lhor o ocor ri do.
“Antô nio Con se lhe i ro, cujo nome de fa mí lia é Antô nio Vi -
cen te Men des Ma ci el, ce a ren se, de cor bran ca tos ta da ao sol, ma gro, alto 
de es ta tu ra, tem cer ca de 65 anos, e pou co vi gor fí si co, pa re cen do so frer 
al gu ma afec ção or gâ ni ca, por fre qüen tes e vi o len tos aces sos de tos se a
que é su je i to.
“Com uma cer ta re pu ta ção de aus te ri da de de cos tu mes, en -
vol vem-no tam bém, e con cor rem para au men tar a cu ri o si da de de que é
alvo e o pres tí gio que exer ce, umas va gas mas in sis ten tes su po si ções da
ex pi a ção ri go ro sa de um cri me co me ti do, aliás em cir cuns tân ci as ate -
nu an tes.
“Nin guém pode fa lar-lhe a sós, por que seus pre to ri a nos não o
de i xam, ou re ce an do pela vida do che fe, ou para não lhes es ca par ne -
nhum de seus mo vi men tos e re so lu ções. Antô nio Con se lhe i ro, in cul can do 
zelo re li gi o so, dis ci pli na e or to do xia ca tó li ca, não tem nada dis to; pois
con tes ta o en si no, trans gri de as leis, e des co nhe ce as au to ri da des ecle siás -
ti cas, sem pre que de al gum modo lhe con tra ri am as idéi as ou ca pri chos; e, 
ar ras tan do por esse ca mi nho os seus in fe li zes se qua zes, con sen te ain da
que eles lhe pres tem ho me na gens que im por tam em cul to, e pro pa lem em 
seu nome dou tri nas sub ver si vas da or dem, da mo ral e da fé.
28 Aris ti des A. Milton
“Os ali ci a do res da se i ta se ocu pam em per su a dir ao povo de
que todo aque le que qui ser se sal var pre ci sa vir para Ca nu dos, por que
nos ou tros lu ga res tudo está con ta mi na do e per di do pela re pú bli ca; ali,
po rém, nem é pre ci so tra ba lhar: é a ter ra da pro mis são, onde cor re um
rio de le i te, e são de cus cuz de mi lho os bar ran cos.
“Quem ti ver bens dis po nha de les, e en tre gue o pro du to da
ven da ao bom Con se lhe i ro, não re ser van do para si mais do que um vin -
tém em cada 100$. Se pos su ir ima gens tra ga-as para o san tuá rio co mum.
“O que se guir isto à ris ca terá di re i to a ves tuá rio e ra ção, e
con tam-se em tais con di ções para mais de 800 ho mens e 200 mu lhe res
no sé qui to do co nhe ci do fa ná ti co.
“As mu lhe res se ocu pam em pre pa rar a co mi da, co ser, e en fe i -
tar os gor ros de que usam os ho mens; e à no i te vão can tar ben di tos na
la ta da, acen den do fo gue i ras quan do é tem po de frio.
“Os ho mens es tão sem pre ar ma dos, e dia e no i te mon tam
guar da a Antô nio Con se lhe i ro; pa re cem ido la trá-lo e cada vez que ele
trans põe o li mi ar da casa em que mora, é logo re ce bi do com ru i do sas
acla ma ções, e vi vas à Santíssima Trin da de, ao Bom Je sus e ao Di vi no
Espí ri to San to.
“Entre essa tur ba de so ri en ta da há vá ri os cri mi no sos, se gun do 
me afir ma ram, ci tan do-se até os no mes, al guns dos qua is eu re ti ve,
como o de João Aba de, que é ali cha ma do o che fe do povo, na tu ral de Tu -
ca no, réu de dois ho mi cí di os, e o de José Ve nân cio, a quem atri bu em
de zo i to mor tes.
“O san to ho mem fe cha os olhos a es tas tra ves su ras, e aco lhe os
ino cen tes, para que não os ve nha a per der a re pú bli ca!
“Qu an to a de ve res e prá ti cas re li gi o sas, Antô nio Con se lhe i ro
não se ar ro ga ne nhu ma fun ção sa cer do tal, mas tam bém não dá ja ma is o 
exem plo de apro xi mar-se dos sa cra men tos; fa zen do crer com isto que
não ca re ce de les, nem do mi nis té rio dos pa dres: e as ce ri mô ni as do cul to 
a que pre si de, e que se re pe tem mais a mi ú do en tre os seus, são mes cla -
das de si na is de su pers ti ção e ido la tria, como é – por exem plo – o cha -
ma do be i jo das ima gens, a que pro ce dem com pro fun das pros tra ções, e
cul to igual a to das, sem dis tin ção en tre as do Di vi no Cru ci fi ca do e da
San tís si ma Vir gem e qua is quer ou tras.
A Cam pa nha de Ca nu dos 29
“Antô nio Con se lhe i ro cos tu ma re u nir, em cer tos dias, o seu
povo para dar-lhes con se lhos, que se res sen tem sem pre do seu fa na tis mo
em as sun to de re li gião, e da sua for mal opo si ção ao atu al re gi me po lí ti -
co; mas, ou para mos trar di fe ren ça com o mis si o ná rio, ou por ter meio
de dar ins tru ções se cre tas, abs te ve-se de fa lar em pú bli co, en quan to lá
es ti ve.
“Abri a mis são em 14 de maio, e já nes se dia con cor re ram
não me nos de 4.000 pes so as; dos ho mens, to dos os que po di am ma ne -
jar uma arma lá es ta vam, car re gan do ba ca mar tes, gar ru chas, es pin gar -
das, pis to las e fa cões: de car tu che i ra à cin ta e gor ro à ca be ça, na ati tu de
de quem vai à guer ra. O Con se lhe i ro tam bém veio, tra zen do o bor dão;
co lo ca va-se ao lado do al tar, e ou via aten to e im pas sí vel: mas, como
quem fis ca li za, e de i xan do es ca par al gu ma vez ges tos de de sa pro va ção,
que os ma i o res da grei con fir ma vam com in ci si vos pro tes tos.
“Su ce deu isto de um modo mais no tá vel, num dia em que eu
ex pli ca va o que era, e como de via fa zer-se, o je jum; pon de ran do que ele
ti nha por fim a mor ti fi ca ção do cor po, e o re fre a men to das pa i xões pela
so bri e da de e tem pe ran ça, mas não o ani qui la men to das for ças por uma
lon ga e ri go ro sa pri va ção de ali men tos; e que por isso a Igre ja, para
fa ci li tar, dis pen sa va em mu i tos dias de je jum a abs ti nên cia, e nun ca
pro i biu o uso dos lí qui dos, em mo de ra da quan ti da de.
“Ou vin do – que se po dia je ju ar, mu i tas ve zes, co men do car ne 
ao jan tar, e to man do, pela ma nhã, uma chá ve na de café, o Con se lhe i ro
es ten deu o lá bio in fe ri or, e sa cu diu ne ga ti va men te a ca be ça, e os seus
prin ci pa is as se clas rom pe ram logo em apar tes, ex cla man do com ên fa se
um den tre eles: ora, isto não é je jum; é co mer a far tar.
“Fora es sas li ge i ras in ter rup ções, a mis são cor reu em paz até
o quar to dia, em que eu pre guei so bre o de ver de obe diên cia à au to ri da -
de, e fiz ver – que sen do a re pú bli ca o go ver no cons ti tu í do no Bra sil to -
dos os ci da dãos, in clu si ve os que ti ves sem con vic ções con trá ri as, de vi am 
re conhecê-lo e res pe i tá-lo. Obser vei – que nes se sen ti do já se pro nun -
ci a ra o Sumo Pon tí fi ce re co men dan do a con cór dia dos ca tó li cos bra si -
le i ros com o po der ci vil; e con cluí de cla ran do – que se per sis tis sem em 
de so be de cer e hos ti li zar um Go ver no que o povo bra si le i ro qua se na
sua to ta li da de ace i ta ra, não fi zes sem da re li gião pre tex to ou capa deseus ódi os e ca pri chos, por que a Igre ja Ca tó li ca não é, nem será nun ca,
30 Aris ti des A. Milton
so li dá ria com ins tru men tos de pa i xões e in te res ses par ti cu la res, ou com
per tur ba do res da or dem pú bli ca.
“Estas mi nha pa la vras ir ri ta ram o âni mo de mu i tos, e des de
logo co me ça ram a fa zer pro pa gan da con tra a mis são e os mis si o ná ri os,
ar re dan do o povo para vir as sis tir à pre ga ção de um pa dre ma çom, pro tes -
tan te e re pu bli ca no; e di ri gin do-me, quan do pas sa vam, e até ao pé do púl pi to, 
ame a ças de cas ti go e até de mor te.
“Espa lha ram – que eu era emis sá rio do Go ver no, e que, de
in te li gên cia com este, ia abrir ca mi nho à tro pa, que vi ria de sur pre sa
pren der o Con se lhe i ro e ex ter mi nar a to dos eles.
“E, pas san do de pa la vras a fa tos, ocu pa ram com gen te ar ma -
da to das as en tra das do po vo a do, pon do-o em es ta do de sí tio, de modo
a não po der nin guém en trar nem sair, sem ser an tes re co nhe ci do, como
fi ze ram ao pró prio vi gá rio da fre gue sia, de ten do-o à boca da es tra da,
quan do às 7 ho ras da no i te, ten do se au sen ta do por jus to mo ti vo, re -
gres sa va para Ca nu dos.
“Ro guei a Deus que am pa ras se a mi nha fra que za, e sem me
afas tar da cal ma e da mo de ra ção, com que deve fa lar um mis si o ná rio ca -
tó li co, em um dos dias se guin tes ocu pei-me do ho mi cí dio, e, de po is de
con si de rar a ma lí cia enor me e a ir re pa ra bi li da de des se cri me, en trei a
mos trar – que não eram ho mi ci das só os que ser vi am-se do fer ro ou do 
ve ne no para, de em bos ca da ou de fren te, ar ran car a vida a seus se me -
lhan tes; e que tam bém eram, até cer to pon to, aque les que ar ras ta vam
ou tros a acom pa nhá-los em seus er ros e de sa ti nos, de i xan do-os de po is
mor rer, di zi ma dos pe las mo lés ti as, à min gua de re cur sos e até de pão,
como acon te cia ali mes mo: en tão per gun tei-lhes – quem eram os res -
pon sá ve is pela mor te e pelo fim mi se rá vel de ve lhos, mu lhe res e cri an -
ças, que di a ri a men te pere ci am na que le po vo a do em ex tre ma pe nú ria e
aban do no.
“Saiu den tre a mul ti dão uma voz la mu ri o sa, di zen do as sim: É
o bom Je sus, que os man da para o Céu.
“Exas pe ra va-os a fra nque za e a ener gia, com que o mis si o ná -
rio lhes cen su ra va os maus fe i tos, e não per di am oca sião de ru gir con tra
ele, mas não se ani ma vam a pôr-lhe mãos vi o len tas, por que ha via mais
de 6.000 pes so as as sis tin do à mis são, e a mor par te era gen te de fora,
que só a isto vi e ra, e re a gi ria cer ta men te se eles me to cas sem.
A Cam pa nha de Ca nu dos 31
“Li mi ta ram-se a in jú ri as, ace nos, di tos ame a ça do res, até o dia
20 de maio, sé ti mo da mis são, em que já não se con ti ve ram nes sas ma ni -
fes ta ções iso la das, e or ga ni za ram um pro tes to ge ral e es tre pi to so do
gru po ar re gi men ta do.
“Des de às 11 ho ras da ma nhã, João Aba de, cha ma do o Che fe
do Povo, foi vis to a per cor rer a pra ça, api tan do im pa ci en te, como a cha -
mar sol da des ca a pos tos con tra al gu ma agres são ini mi ga, e a gen te foi se 
re u nin do, até que ao meio-dia es ta va a pra ça co a lha da de ho mens ar ma -
dos, mu lhe res e me ni nos, que a que i mar fo gue tes, e com uma al ga zar ra
in fer nal, di ri gi ram-se para a ca pe la, er guen do vi vas ao Bom Je sus, ao
Di vi no Espí ri to San to e ao Antô nio Con se lhe i ro; e de lá vi e ram até nos -
sa casa, dan do fo ras aos re pu bli ca nos, ma çons, e pro tes tan tes, e gri tan do –
que não pre ci sa vam de pa dres para se sal var, por que ti nham o seu con -
se lhe i ro. 
“Nes sa de sa ti na da pas se a ta an da ram aci ma e aba i xo pelo es -
pa ço de duas ho ras, dis per san do-os afi nal, sem irem além.
“À tar de ver be ran do a ce gue i ra e a in sen sa tez dos que as sim
ha vi am pro ce di do, eu mos trei – que ti nha sido aqui lo um de sa ca to sa -
críle go à re li gião e ao sa gra do ca rá ter sa cer do tal; e que, por tan to, pu nha
ter mo à san ta mis são, e como ou tro ra os após to los às por tas das ci da des 
que os re pe li am, eu sa cu dia ali mes mo o pó das san dá li as, e re ti ra va-me,
anun ci an do – que, se a tem po não abris sem os olhos à luz da ver da de,
sen ti ri am um dia o peso es ma ga dor da jus ti ça di vi na, à qual não es ca -
pam os que in sul tam os en vi a dos do Se nhor, e des pre zam os me i os de
sal va ção.
“E os de i xei, não vol tan do mais à la ta da, nem me pres tan do a 
exer cer o meu mi nis té rio em lu gar ou ato pú bli co.
“A sus pen são re pen ti na da san ta mis são pro du ziu nos cir -
cuns tan tes o efe i to de um raio, de i xan do-os atô ni tos e im pres si o na dos,
os que ain da não se ha vi am alis ta do na Com pa nhia do Bom Je sus, que não
re ce bi am do Con se lhe i ro a co mi da e a rou pa, e não de pen di am dele
por tan to, de ram-me ple na ra zão e, re pro van do for mal men te os des va ri os
de tal gen te, co me ça ram a sair do po vo a do, já que i xo sos, e com ple men te
de si lu di dos das vir tu des de Antô nio Con se lhe i ro.
“Os ou tros, co nhe cen do-se em gran de mi no ria, e ava li an do
que essa re ti ra da em mas sa re dun da ria em no tó rio des cré di to de les, en -
32 Aris ti des A. Milton
vi a ram-me às pres sas uma co mis são, em que en tra ram os mais exal ta -
dos, e que veio pe dir-me – em nome do Antô nio Con se lhe i ro – a con ti -
nu a ção da mis são, ale gan do – que não de vi am so frer os ino cen tes pe los
cul pa dos, e que as sim fi ca ria o povo pri va do do sa cra men to do cris ma
e de ou tros be ne fí ci os es pi ri tu a is, que só no fim da mis são se lu cra vam.
“Des co brin do-lhe, ao mes mo tem po, a ma nha e a fra que za,
re sis ti aos pe di dos; e de i xei que o meu ato, mais fe liz do que mi nhas pa -
la vras, aca bas sem de ope rar a dis per são da que las mul ti dões, pre sas imi -
nen tes do fa na tis mo de um in sen sa to, ser vi do por im be cis, ou ex plo ra -
do por per ver sos.
“Ha vi am-se fe i to já quan do en cer rei de cho fre os meus tra ba -
lhos da mis são, 55 ca sa men tos de aman ce ba dos, 102 ba ti za dos e mais
400 con fis sões.
“No dia em que de vía mos par tir, fui pela ma nhã cha ma do
para uma con fis são de en fer mo, e acu di sem he si ta ção, se guin do uns
ho mens ar ma dos, que ti nham vin do cha mar-me a esse fim.
“Che gan do à casa in ter ro guei o do en te se que ria con fes sar-se, 
e res pon den do que sim, pedi aos tais ho mens ar ma dos que sa ís sem para 
não ou vir a con fis são. Eles não se mo ve ram, e um per fi lou-se e bra dou:
Cus te o que cus tar não sa í mos.
“Obser vei, en tão, ao do en te – que nem eu po dia ou vir a con -
fis são, nem ele es ta va obri ga do a fazê-la em tais cir cuns tân ci as e ime di a -
ta men te re ti rei-me, pro tes tan do em voz alta, da por ta da casa, e na rua, 
con tra aque la afron to sa vi o la ção das leis da re li gião e da ca ri da de.
“Re do brou, en tão, a fú ria da que les des va i ra dos, e vo mi tan do
in sul tos e im pre ca ções, e ju ras de vin gan ça, to ma ram a en tra da da casa
em que me hos pe da ra, e onde já me achava.
“A mi nha mis são ter mi na ra; a se i ta ha via le va do o ma i or gol -
pe que eu po dia des car re gar-lhe: e con ser var-me por mais tem po no
meio da que la gen te, ou sair-lhe ain da ao en con tro, se ria re ma ta da im -
pru dên cia, sem a mí ni ma uti li da de.
“Os com pa nhe i ros de vi a gem es pe ra vam-nos, com os ani ma is 
ar re a dos, nos fun dos da casa. Dan do cos tas aos mí se ros pro vo ca do res,
de lá mes mo se gui mos, e, gal gan do a es tra da, ao olhar pela úl ti ma vez o 
po vo a do, con do í do da sua tris te si tu a ção, como o di vi no Mes tre di an te
A Cam pa nha de Ca nu dos 33
de Jeru sa lém, eu sen ti um aper to n’alma, e pa re ceu-me po der tam bém
di zer-lhe:
‘“Des co nhe ces te os emis sá ri os da ver da de e da paz, re pe lis te
a vi si ta da sal va ção; mas aí vêm tem pos em que for ças ir re sis tí ve is te si -
ti a rão; bra ço po de ro so te der ru ba rá e, ar ra san do as tuas trin che i ras, de -
sar man do os teus es bir ros, dis sol ve rá a se i ta im pos to ra e ma lig na, que te 
re du ziu ao seu jugo odi o so e avil tan te.’
“Hoje, lon ge des sa in fe liz lo ca li da de, e po den do in for mar
sem res sen ti men to e com toda a exa ti dão e jus ti ça, eu re ca pi tularei o ex -
pos to di zen do o se guin te:
“A mis são de que fui en car re ga do, além da van ta gem de
apreen der e de nun ci ar a im pos tu ra e per ver si da de da se i ta fa ná ti ca, no
pró prio cen tro de suas ope ra ções, teve ain da um benéfico efe i to, que foi 
o de ar ran car-lhe inú me ras pre sas, de sen ga nan do a uns das vir tu des su -
pos tas, e pre munin do ou tros con tra as dou tri nas e prá ti cas abu si vas e
re pro va das de Antô nio Con se lhe i ro e de seus fa ná ti cos dis cí pu los. Des -
cre ram dele, e fe liz men te já o aban do na ram mul ti dões con si de rá ve is de
povo que, re gres san do a suas ter ras, mal di zem da hora em que o se gui -
ram, e vão res ga tar o seu erro pela obe diên cia às le gí ti mas au to ri da des e
pelo tra ba lho.
“Onde não che ga rem as vo zes dos que co lhe ram tão amar ga
ex pe riên cia, faça-se ou vir a pa la vra au to ri za da dos pas to res das al mas,
de nun ci an do o ca rá ter abo mi ná vel e a in fluên cia ma lé fi ca da seita, e ela
de cer to não lo grará fa zer no vos pro sé li tos.
“Entre tan to, com pra zen do-me em con sig nar que só se con -
ser vam atu al men te ao lado do Con se lhe i ro aque les que já es ta vam in -
cor po ra dos na le gião por eles in ti tu la da Com pa nhia do Bom Je sus, no in te -
res se da or dem pú bli ca e pelo res pe i to de vi do à lei, ga ran to a in te i ra ve -
ra ci da de do que in for mo, e acres cen to:
“A se i ta po lí ti co-re li gi o sa, es ta be le ci da e en trin che i ra da em
Ca nu dos, não é só um foco de su pers ti ção e fa na tis mo, e um pe que no
cis ma na Igre ja ba i a na; é prin ci pal men te um nú cleo, na apa rên cia des -
pre zí vel, mas um tan to pe ri go so e fu nes to, de ou sa da re sis tên cia e hos ti -
li da de ao Go ver no cons ti tu í do no país.
34 Aris ti des A. Milton
“Enca ra dos o ar ro jo das pre ten sões e a so be ra nia dos fa tos,
pode-se di zer que é aqui lo um Esta do no Esta do; ali não são ace i tas as
leis, não são re co nhe ci das as au to ri da des, não é ad mi ti do à cir cu la ção o
pró prio di nhe i ro da re pú bli ca.
“Antô nio Con se lhe i ro con ta a seu ser vi ço mais de mil com -
pa nhe i ros de ci di dos, en tre eles os ho mens, em nú me ro tal vez de 800,
sem pre ar ma dos, e as mu lhe res e cri an ças dis pos tas de modo a for ma -
rem uma re ser va que ele mo bi li za, e põe em pé de guer ra, quan do jul ga
pre ci so.
“Quem foi alis ta do na Com pa nhia di fi cil men te po de rá li ber -
tar-se, e vem a so frer vi o lên ci as, se fi zer qual quer re cla ma ção, como su -
ce deu du ran te mi nha es ta da a um po bre co i ta do que, por exigir a res ti -
tu i ção das ima gens que ha via tra zi do, foi pos to em pri são.
“A mi lí cia fa ná ti ca só dá en tra da no po vo a do a quem bem lhe 
apraz, aos ami gos do Go ver no, ou re pu bli ca nos co nhe ci dos ou sus pe i -
tos ela faz logo re tro ce der, ou to le ra que en trem, mas tra zen do-os em
vis ta e pron ta a ex pul sá-los; quan to aos in di fe ren tes, e que não se de ci -
dem a en trar na se i ta, es ses po dem vi ver ali, e têm li ber da de para se
ocu par de seus in te res ses, mas cor ren do gran des ris cos, en tre es tes o de 
se rem al gum dia ines pe ra da men te sa que a dos os seus bens, em pro ve i to
da San ta Com pa nhia; sor te esta pou co in ve já vel, que ain da re cen te men te
cou be a um cer to ne go ci an te que lá se es ta be le ce ra, vin do da ci da de do
Bon fim.
“Na que la in fe liz lo ca li da de, por tan to, não tem im pé rio a lei, e
as li ber da des pú bli cas es tão in te i ra men te coar ta das.
“O de sa gra vo da re li gião, o bem so ci al e a dig ni da de do po der 
ci vil pe dem uma pro vi dên cia, que res ta be le ça no po vo a do de Ca nu dos o 
pres tí gio da lei, as ga ran ti as do cul to ca tó li co e os nos sos fo ros de povo
ci vi li za do. Aque la si tu a ção de plo rá vel de fa na tis mo e anar quia deve ces -
sar para hon ra do povo bra si le i ro, para o qual é tris te e hu mi lhan te –
que, ain da na mais in cul ta nes ga de ter ra pá tria, o sen ti men to re li gi o so
des ça a tais aber ra ções, e o par ti da ris mo po lí ti co des va i re em tão es tul ta
e ba i xa re a ção.
“Re le ve-me V. Ex. Rev ma. a ru de za das con si de ra ções que ex -
pe di, e a pro li xi da de des ta ex po si ção, cujo in tu i to é mos trar – o quan to
es for çou-se o hu mil de mis si o ná rio por de sem pe nhar a ta re fa que lhe
A Cam pa nha de Ca nu dos 35
foi con fi a da, e in te i rar a V. Ex. Rev ma. de quan to ocor reu por essa oca -
sião, e da ati tu de re bel de e be li co sa, que Antô nio Con se lhe i ro e seus se -
qua zes as su mi ram e mantêm con tra a Igre ja e o Esta do, a fim de que,
dan do às in for ma ções pres ta das o va lor que me re çam, de li be re V. Ex.
Rev ma. so bre o caso, como em seu alto cri té rio e re co nhe ci do zelo jul -
gar con ve ni en te. 
“Deus guar de a V. Ex. Rev ma. – Exmo. e Rev mo. Sr. cô ne go
Cla rin do de Sou sa Ara nha, dig no go ver na dor do ar ce bis pa do do Esta do 
da Ba hia – fr. João Evan ge lis ta de Mon te Mar ci a no , mis si o ná rio apos tó li co
ca pu chi nho.”
Antô nio Con se lhe i ro, en tre tan to, con ti nu a va a se es for çar
pela edi fi ca ção da ca pe la, em cu jas obras fr. João Evan ge lis ta o en con -
tra ra; e, ter mi na da que foi ela, em pre en deu a cons tru ção de uma gran de
igre ja, para o que dis pu nha já de gros so ca pi tal, an ga ri a do me di an te es -
mo las, en vi a das de vá ri os lu ga res, al gu mas até por pes so as abas ta das,
cuja ve ne ra ção pelo San to Ho mem cada dia acen tu a va-se mais.
Para le va rem a cabo o edi fí cio pro je ta do, era ne ces sá ria, po -
rém, cer ta quan ti da de de ta bu a do, que só no Ju a ze i ro po de ria ser mais
fa cil men te ob ti da. Com este pro pó si to, pois, foi a essa ci da de um cer to
Ma cam bi ra, emis sá rio do Con se lhe i ro. E, ten do efe tu a do a de se ja da
com pra, des pa chou a ma de i ra pelo rio S. Fran cis co aba i xo, até o Ja ca ré,
sí tio que dis ta de Ju a ze i ro 100 qui lô me tros, mais ou me nos. Ali, o Con -
se lhe i ro aguar da va a che ga da de sua en co men da, que – fez trans por tar
para Ca nu dos à ca be ça de de vo tos, des de mu i to dis pos tos a se me lhan te
sa cri fí cio.
Cor ria já o ano de 1896 quan do o ci ta do Ma cam bi ra di ri giu
uma car ta ao co ro nel João Evan ge lis ta Pe re i ra de Mel o, pe din do-lhe –
que com pras se em Ju a ze i ro nova por ção de ta bua do, cu jas di men sões e
gros su ra de ter mi na va. Logo que hou ve abun dân cia de ma de i ra no mer -
ca do, o co ro nel pre ve niu dis to ao mis si vis ta. E en tão se es pa lhou – que
o Con se lhe i ro es ta va se pron ti fi can do para ir ao Ju a ze i ro es co lher, ele
pró prio, o ma te ri al de que ca re cia.
E, como su ce de com qua se to dos os bo a tos, esse foi se avo lu -
man do de mo men to a mo men to, de modo que – den tro em pou co – a
no tí cia se ti nha trans for ma do numa ame a ça tre men da.
36 Aris ti des A. Milton
O Con se lhe i ro, in va din do a ci da de, – or de na ria um sa que ge -
ral ao co mér cio. Em se gui da, ti ra ria uma vin gan ça ca bal do juiz de di re i -
to da co mar ca de quem não gos ta va, por fatos acon te ci dos em Bom
Con se lho, onde esse ma gis tra do ha via an te ri or men te ser vi do.
Apon ta-se como ca u sa do ra de to das es sas no vi da des uma car -
ta, es cri ta pelo co ro nel Fran cis co de Sa les Sil va, ci da dão co nhe ci do, e
dig no de cré di to.
Acha vam-se as cou sas nes te pé, quan do che gou às mãos do
go ver na dor um te le gra ma ur gen te, pas sa do pelo juiz de di re i to da co -
mar ca do Ju a ze i ro, e con ce bi do nos ter mos a se guir:
“Ju a ze i ro, 29 de ou tu bro de 1896 – Con se lhe i ro Go ver -
na dor – No tí ci as trans mi ti das por po si ti vo con fir mam bo a to
da vin da do per ver so Antô nio Con se lhe i ro, re u ni do a ban -
di dos; par ti rão Ca nu dos 2 vin dou ro. Po pu la ção re ce o sa.
Ci da de sem ga ran ti as. Re qui si to enér gi cas pro vi dên ci as. – O 
juiz de di re i to, Arlin do Le o ne.”
Ape sar do que fica ex pos to, o co ro nel João Evan ge lis ta Pe re i ra
de Melo e ou tros ci da dãos qua li fi ca dos de Ju a ze i ro não acre di ta vam nos
bo a tos, que por toda par te cir cu la vam, de in ten ções hos tis atri bu í das ao
Con se lhe i ro e seu sé qui to. Ten tan do acal mar os âni mos, ex ci ta dos por
no vas pro gres si va men te alar man tes, o re fe ri do co ro nel as se gu ra va – que 
o as ce ta de Ca nu dos não pe ne tra ria na ci da de; pois ain da quan do acom -
pa nhasse a sua gen te, se ria com cer te za para guar dar a re mes sa de ta -
bua do em Ja ca ré, como já de ou tra fe i ta ha via pra ti ca do.
O ju í zo as sim ex pen di do não ca lou, con tu do, no âni mo da
po pu la ção so bres sal ta da; e daí re sul tou a ex pe di ção do te le gra ma, que já 
de i xei tras la dado.
O go ver na dor – con se lhe i ro Luís Vi a na, em res pos ta ao juiz
lhe pon de rou – que não po dia mo ver for ça, in du zi do por sim ples bo a tos; mas ao 
mes mo tem po, lhe re co men dou – que, man das se vi gi ar as es tra das em dis tân -
cia, e, ve ri fi ca do o mo vi men to dos ban di dos, avi sas se por te le gra ma, pois o Go ver no
fi ca va pre ve ni do para en vi ar in con ti nen ti, num trem ex pres so, a for ça ne ces sá ria
para re cha çá-los e ga ran tir a ci da de.
Era esta a si tu a ção quan do, a 4 de no vem bro, o Dr. Arlin do
Le o ne di ri giu novo te le gra ma ao go ver na dor, nos ter mos que se vão ler:
A Cam pa nha de Ca nu dos 37
“Con se lhe i ro go ver na dor – Pe dro Se ra fim, emis sá rio
Con se lhe i ro, che ga do fa zen da Te nen te Mota afir ma – Ter
vin do es pe rar ban di dos sa í dos, on tem Ca nu dos, pas san do es -
tra da Ma ni ço ba, dis tan te da qui oito lé guas. Tra je to todo 40
lé guas. Re ce io que es pi as, pos tos na es tra da, che guem tem po
im pos sí vel dar pro vi dên ci as sa tis fa ze rem. Con vém múl ti plos
mo ti vos evi tar com ba te den tro da ci da de. Se ra fim afir ma sé -
qui to Con se lhe i ro ser su pe ri or a 1000 cla vi no te i ros. Nega in -
ten ções per ver sas, li mi tan do 9 dias Con se lhe i ro con du ção ta -
bua do. O de sâ ni mo do mi na a po pu la ção, apre en si va da pos -
si bi li da de de in va são, an tes da che ga da de for ça.”
Das pró pri as pa la vras do te le gra ma se vê – que o co ro nel
João Evan ge lis ta pa re cia es tar com a ver da de, quan do con tes ta va o pro -
pó si to si nis tro, ge ral men te atri bu í do ao Con se lhe i ro. O emis sá rio des te
tam bém ne ga va-lhe in ten ções per ver sas, e as si na la va como mo ti vo de sua vi a -
gem ao Ju a ze i ro a con du ção do ta bu a do.
Entre tan to, o go ver na dor ha via – por ca u te la – re qui si ta do do 
ge ne ral co man dan te do dis tri to mi li tar 100 pra ças de li nha, a fim de se -
gui rem para aque la ci da de ao pri me i ro avi so do juiz de di re i to res pec ti -
vo. Se me lhan te me di da fora di ta da pela cir cuns tân cia de exis tir, en tão,
na ca pi tal do Esta do um nú me ro li mi ta do de pra ças de po lí cia, por es tar 
a ma i or par te de las em Je quié, Len çóis, e ou tros pon tos, onde a or dem
pú bli ca ti nha sido al te ra da.
De ma ne i ra que, logo de po is da re cep ção do te le gra ma de 4,
o go ver na dor pôde fa zer se guir para Ju a ze i ro um for te des ta ca men to do 
9º Ba ta lhão de Infan ta ria do Exér ci to, sob o co man do do te nen te Ma -
nu el da Sil va Pi res Fer re i ra, que ali de ve ria pro ce der de acor do com o
juiz de di re i to da co mar ca.
A 7 de no vem bro, esse mes mo ma gis tra do te le gra fa va ao
go ver na dor as sim:
“Re qui si to or dem a te le gra fis ta para re ter qual quer te le -
gra ma, por ven tu ra ex pe di do, no ti ci an do par ti da ex pe di ção
con tra o Con se lhe i ro. For ça che gou. Envi do es for ços para
cum prir as or dens de v. ex. – Arlin do Le o ne.”
38 Aris ti des A. Milton
As or dens a que esse te le gra ma alu de re la ci o na vam-se com a
mar cha da for ça, que o go ver na dor pu nha à dis po si ção do juiz de di re i -
to, con fi an do em que este com bi na ria com o te nen te Pi res Fer re i ra o
me lhor meio de re pe lir a gen te do Con se lhe i ro.
E, efe ti va men te, en tre os dois fi cou as sen ta do – que con vi nha
sair ao en con tro dos ban di dos, a fim de evi tar que eles in va dis sem a ci da de.
Algu mas pes so as, no en tan to, se in sur gi ram con tra a de li be ra -
ção as sim to ma da; e den tre elas o co ro nel João Evan ge lis ta, que ao pró -
prio co man dan te da for ça fez ver – que era ver da de i ra aven tu ra ar ris -
cá-la numa luta in ques ti o na vel men te te mer ária, à vis ta da de si gual da de
de con di ções em que as duas par tes con ten do ras se en con tra ri am.
Re pe li das – em de fi ni ti va – as ob ser va ções por esse modo ex -
ter na das, e ace i to – como fi ca ra – o al ve drio de ir ata car o Con se lhe i ro
no pon to mes mo onde ele en tão se acha va, de ca mi nho para o Ju a ze i ro
con for me se di zia, não quis o já ci ta do co ro nel se re cu sar ao ser vi ço,
que dele exi gi am, em nome do Go ver no e da paz pú bli ca. For ne ceu,
por tan to, a ca va lha da e os gui as de que o te nen te Pi res Fer re i ra ca re cia
para re a li zar o seu pla no de ata que.
E, a 12 de no vem bro, a for ça – as sim pre pa ra da – par tiu do
Ju a ze i ro. Sem que, du ran te todo o per cur so de 192 qui lô me tros que fez,
hou ves se en con tra do o me nor obs tá cu lo à sua vi a gem, no dia 19 acam -
pou ela no ar ra i al de Uauá, que fica dis tan te de Ca nu dos 114 qui lô me -
tros apro xi ma da men te.
Na ma nhã de 21, os se qua zes do Con se lhe i ro, em nú me ro de
130, mais ou me nos, aco me te ram de sur pre sa esse des ta ca men to. Tra -
vou-se um vi go ro so com ba te, em que mor re ram – da tro pa do Go ver no 
– 1 ofi ci al e 10 pra ças, fora mais de 20 que sa í ram fe ri das; ten do os ja -
gun ços per di do tam bém cer ca de 100 ho mens.
O te nen te re tro ce deu, de cla ran do – que se dis pu ses se de um
re for ço de 100 sol da dos te ria mar cha do so bre Ca nu dos.
Antes de se re ti rar, con tu do, a for ça pu se ra fogo ao ar ra i al, o
que não se com pa de ce aliás com a ra zão e a jus ti ça. Por quan to, nem
Uauá era ha bi ta do pela gen te do Con se lhe i ro, que ali es ta va ape nas de
pou sa da, nem que o fos se – nada acres cen ta va ao bri lho da di li gên cia
A Cam pa nha de Ca nu dos 39
ta ma nho des co me di men to, que até po de ria pre ju di car in te res ses de ou -
tros bra si le i ros, alhe i os in te i ra men te ao con fli to. 
Nos tem pos que cor rem, no es ta do atu al da ci vi li za ção, e pe -
ran te os prin cí pi os do di re i to das gen tes mo der no, tais ex ces sos não po -
dem ser jus ti fi ca dos, so bre tu do tra tan do-se de uma guer ra ci vil. 
Cir cuns tân ci as di ver sas, po rém, con cor re ram para que a for ça, 
co man da da pelo te nen te Pi res Fer re i ra, che gas se a Ju a ze i ro qua se em
com ple ta de ban da da. Aban do na ra ela em

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