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Dê uma chance as contingências Vol 2 DELITTI, M. (Org.) . Sobre comportamento e cognição. 192 197 (1)

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:= Capítulo 20
"Mudanças do controle por regras falsas 
para o controle por contingências" ou: 
"Dê uma chance para as contingências"
M iily P c Iitti
PUC/SP
Q uando alguém procura por terapia o faz porque está sob controle de 
contingências aversivas e/ou não tem repertório para modificá-las. Ou então está sob 
controle de regras falsas que freqüentemente sinalizam comportamentos de esquiva e 
impedem que a pessoa entre em contato com as contingências.
No primeiro caso, o trabalho do terapeuta comportamental constará basicamente 
de instalar ou aperfeiçoar repertórios de comportamentos que habilitem o indivíduo a 
alterar as contingências aversivas ou sair do seu controle. No segundo caso, o terapeuta 
deverá atuar no sentido de levar o cliente a discriminar as regras falsas e sair do controle 
das mesmas para que fique sob controle das contingências mais adequadas à sua vida. 
Quem define a meta è o cliente mas, quem o orienta no processo de atingl-la é o terapeuta. 
Neste trabalho apresentarei um caso clínico em que meu papel como terapeuta foi o de 
indagar sistematicamente junto á cliente o por que e/ou a validade das regras, que 
controlavam todo um repertório de esquiva e a impediam de entrar em contato com as 
contingências. Na realidade, parece que o que fiz foi, através do meu questionamento, 
dar uma instrução ou regra que poderia ser assim resumida: dê uma chance para as 
contingências.
182 M d ly P clltt l
Cliente - a quem chamarei de X, é uma mulher de 30 anos, casada há 3 anos, 
com uma filha de 2 anos, estudante universitária. É o segundo casamento de seu marido 
que tem 42 anos e três filhos do primeiro casamento; um menino de 11 anos, um de 9 
anos e uma menina de 14 anos.
Queixas:
1. Dificuldade muito grande no âmbito do desejo sexual: pouco desejo, 
comparando-se ao desejo do marido, demora para se envolver sexualmente. Quando 
conseguia se envolver, o relacionamento era bom, com orgasmos satisfatórios.
Quando é fim-de-semana das crianças, (isto ó, dos filhos dele) fica ansiosa, 
insegura e assexuada. “Não consigo sentir tesâo pelo pai daquelas crianças."
2. Dificuldade de relacionamento com os filhos do primeiro casamento do marido, 
e principalmente com a menina.
Sente-se incomodada com a presença dos filhos dele. “Viro uma empregada" 
(ela tem cozinheira, babá, arrumadeira). Diz que os filhos são bobos, nâo comem nada, 
não sabem brincar.
O marido fica “meio bobo", atendendo aos três filhos. A menina compete comigo 
e ele, Y, fica dividido, sem me dar atenção."
História de Vida (resumo)
Filha de mãe solteira, não conheceu seu pai. Embora soubesse seu nome, não 
quis procurá-lo.
X teve um padrasto que lhe deu um sobrenome e uma irmã, com 14 anos no 
início da terapia de X. A mâe de X era hippye. X viveu em comunidades durante a 
infância e dizia que sua mãe tinha uma vida promíscua.
Sua avó materna, com a qual viveu durante toda a infância era católica, tradicional 
e “cheia de frases feitas como: moça de família não faz isto, moça de bem não faz 
aquilo” etc, etc. A própria mãe de X lhe dizia para “fazer o que digo e não fazer o que 
faço", passando-lhe mensagens incongruentes em relação ao seu comportamento verbal 
e o resto de seus comportamentos - promiscuidade, liberalidade, etc.
Dos 14 aos 17 anos X se envolveu com drogas e com "o pior rapaz da cidade" - 
filhinho de papai, desocupado, drogado. Passa a namorá-lo, vai viver com ele e junto 
com ele se muda para São Paulo. Trabalha em uma loja por um dia e depois vive nas" 
baladas de drogas, sexo e rock and roll". Vive com ele e outras pessoas, em uma casa 
"sempre cheia de gente, bebida e droga."
Quando tem 18 anos ele volta para o interior. X deixa as drogas e fica em São 
Paulo passando a trabalhar como "Garota de Programa". Como" garota de programa" X 
sai muito, viaja bastante, até para o exterior, faz algumas ‘pontas’ na TV e acaba 
conhecendo (como profissional) o futuro marido. Após mais ou menos oito meses saindo 
com ele como profissional, começam a namorar, deixa de se prostituir e vai viver com 
ele que efetua sua separação da esposa para ficar com ela.
Quando vem procurar a terapia (após já ter feito em outra abordagem) está 
vivendo com o marido há três anos e já tem o filho de 2 anos.
Sobrr corri(>or1iirricnto e cognlção 183
A partir dos dados da história de vida e de outras informações até aqui colocadas, 
já sé pode hipotetizarque a cliente, de alguma forma, seguiu o modelo de vida promíscua 
de sua mãe. Pode-se também concluir que a mesma não conseguia ter uma relação boa 
com o marido na presença dos filhos dele porque para ela, era aversivo não ser o centro 
das atenções. Ela concorre com os filhos, em especial com a menina, que também 
concorre com ela.
Apresentarei a seguir alguns trechos de sessões que chamei de fragmentos de 
sessões para ilustrar o processo terapêutico e o que penso ter ocorrido quanto ao controle 
por regras.
12 “Fragmento de sessões”
(11 * Sessão)
CL - Eu não te contei ainda mas... quero dizer que quando vou transar acontece 
uma coisa. Penso que se eu pensar em mulheres eu ficaria com tesão. Mas aí penso 
que é errado e fico ansiosa, não me envolvo.
TP - Por que você não pode pensar em mulher?
CL - Porque pode significar alguma tendência homossexual e eu não sou lésbica 
- já estive em uma cama com outra mulher-quando fazia programa - e não aconteceu 
nada - eu não quis.
TP - Então porque você não pode se permitir pensar? Não seria uma fantasia 
como qualquer outra?
CL - É, talvez...
(12« SESSÃO)
CL - Sabe, na hora de transar eu pensei que talvez pudesse pensar em mulher, 
afinal você disse que seria só uma fantasia e, sabe o que aconteceu? Não precisei 
pensar nada - me excitei olhando meu marido - me envolvi e foi muito bom. E em outra 
ocasião me permiti pensar em mulher, contei para o meu marido e ele também curtiu a 
fantasia.
Desta sessão em diante a cliente não “precisou mais pensar em mulher" ou, se 
pensava, envolvia o marido na fantasia pois sabia que não era proibido e aproveitava a 
relação sexual.
Nesta situação podemos levantar uma série de hipóteses quanto ao controle de 
seu comportamento por regras.
Começamos a discutir na terapia a idéia de que ela precisava transgredir regras 
-com o primeiro namorado, na situação atual com o marido, etc. Ela acabava incorporando 
como suas, as regras da avó, da mãe, da sociedade - isto é, extraídas de contingências, 
mas, que eram agora, regras falsas e tentava transgredir estas regras mesmo quando 
haviam conseqüências aversivas.
Exemplo: usar drogas - era SR e era aversivo e ainda havia a regra de que "não 
era moça de bem, de família". Pensar em mulheres era um comportamento encoberto
1 8 4 Mdly PcllMI
que sinalizava contingências reforçadoras sexualmente-“era sexo mais sofisticado, não 
sexo careta" - (sábado após os filhos dormirem). No entanto, este comportamento 
encoberto vinha acompanhado de uma regra que sinalizava punição - “então é errado - 
significa que sou lésbica". Parece que ficar se defrontando com esta regra era incompatível 
com envolver-se nas contingências reforçadoras da situação sexual. De alguma forma, 
a pergunta do terapeuta “porque não pensar?" (que eu traduzo por dê uma chance às 
contingências) liberou do controle daquela regra e permitiu que ela ficasse em contato 
com as contingências.
2fi Fragmento de sessões
(17* SESSÃO)
CL - Hoje pensei em te falar do passado, de quando eu fazia programa, mas 
deve doer muito, afinal é um passado triste, vida de garota de programa é horrível, é 
promíscua ( parece minha mãe) nem é bom lembrar...
TR - O que havia de bom naquela vida?
CL - Como, o que havia de bom?
TR - Acho que deveriam existir coisas boas, afinal você ficou vivendo assim 
durante um ano.
CL - Demonstra surpresa - “puxa, eu nunca parei para pensarque haviam 
coisas boas naquela vida, mas haviam mesmo - muitas - ganhei dinheiro, viajei de 
primeira classe até para o exterior, fiquei em hotéis 5 estrelas... o ruim era só transar 
com alguns clientes, porque até isto com alguns era agradável."
TR - Então acho que dá para entender um pouco melhor a diferença que você 
faz do sexo sofisticado e do sexo careta.
CL - É verdade, é como se eu não pudesse transar legal com Y (marido) exceto 
quando ele age como quando eu o conheci, me seduzindo e paquerando com sofisticação, 
inclusive me levando à transgressão"( conta que ele a levou a um streap tease e ambos 
gostaram muito).
A partir deste momento começamos a analisar em sua terapia o fato que parece 
que havia dois conjuntos de regras:
1. “Sexo bom é sofisticado, com requinte e até transgressão" que era incompatível
com...
2. "casamento, que dá respeitabilidade, estabilidade econômica, filhos, 
respeitabilidade, etc..."
Na realidade seu comportamento sexual “sofisticado e transgressor” foi muito 
reforçado - com o primeiro namorado, quando garota de programa - culminando com o 
reforçamento máximo - conhece o marido que ela achava ser um príncipe - rico, bonito, 
estável - que se separa da esposa para ficar com ela - isto lhe dá respeitabilidade, 
posição social, dinheiro, família, etc.
A respeito da respeitabilidade pode ser interessante comentar que quando saía
Sobre comporí.imcnfo c cognífiTo 185
com o marido e ia jantar fora, ela às vezes fazia questão de dar uma volta pelo restaurante 
sem o marido enquanto pensava - "estou aqui mas não para encontrar cliente - sou uma 
esposa com o marido."
Neste momento da terapia a cliente conta que teve o seguinte sonho: “O marido 
chegava e lhe dava um colar de pérolas, quando ela pega o colar se transforma numa 
bijuteria". Perguntei-lhe o que ela achava que era seu sonho e ela disse que estavam 
passando por uma situação econômica muito dificil, que o marido na verdade não era 
um príncipe ou uma jóia, mas um homem ou uma bijuteria. “Quero a pérola mas tenho a 
bijuteria e ela também é bonita."
Minha opinião quanto ao uso do sonho em terapia (como um comportamento 
encoberto) já foi colocada em outro trabalho. No entanto, creio que este exemplo ajuda 
a entender a discriminação que esta cliente estava passando a fazer, de que vivia em 
um mundo de fantasia com o marido, que este reforçava seu padrão de esquiva quanto 
à realidade sócio-econômica em que estavam vivendo.
Exemplo:
Marido diz:: O dinheiro está acabando e minha mãe não quer mais nos ajudar.
CL - Quer que eu despeça a babá?
Marido - Não precisa, a gente dá um jeito.
CL - Então está bem.
Na realidade, do conjunto de SDS fornecidos pelo marido, a cliente seleciona 
algumas para efetivamente controlarem seu comportamento. No caso aqui, a última 
frase - “Nâo precisa, a gente dá um jeito" é a única que controla o seu comportamento.
Este padrão de discriminação passou a se modificar. A cliente passou a viver 
mais de acordo com suas possibilidades. Por exemplo, deixando de ter aulas de tônis e 
diminuindo a freqüência à terapia, já que não conseguia pensar em trabalhar pois achava 
que tudo que fosse ganhar seria pouco em relação ao que precisava.
Neste momento aconteceu algo interessante. A cliente conheceu na rua, em 
uma loja, um rapaz rico, com carro importado, celular, roupas finas, etc, e ele a ficou 
paquerando embora ela dissesse que era casada.
O rapaz lhe deu o número do seu telefone e ela ficou 15 dias com o telefone dele 
guardado. Na terapia colocou que talvez ele sim fosse um príncipe, mas que ao sair com 
ele perderia a respeitabilidade e poria em risco seu casamento e não queria isso.
Nesta situação parece que a cliente desenvolveu uma regra para controlar seu 
comportamento. Ela emitiu os comportamentos encobertos, até fantasias com o rapaz 
mas a regra “quero ser respeitável", além das contingências de seu próprio casamento 
que estava muito melhor, controlaram seu comportamento de apenas guardar o telefone 
enem ligar.
Com os filhos do marido existia também uma regra - “eles nunca vão me respeitar, 
são filhos da ex-esposa."
Sobre essa ex-esposa vale a pena comentar: é uma empresária muito rica, de
186 Ma ly P c lU tl
família tradicional e muito bem sucedida profissionalmente. Também aqui a regra foi 
questionada pelo terapeuta e foi sugerido que X tentasse ver os filhos dele, principalmente 
a menina, como crianças e nâo como competidores. A medida em que X vai modelando 
uma nova relação com as crianças, o marido se sente menos ansioso. Relatou para ela 
que se sentia dividido demais e passou a dar mais atenção a X mesmo com os filhos 
juntos. Ex: fim de semana dos filhos ele vai jantar fora com ela e a leva ao motel - 
(reforço com sexo sofisticado).
Em entrevista de follow-up a cliente informou que uma determinada sessfio eu 
lhe pedi que observasse comportamentos agradáveis e/ou qualidades dos filhos do 
marido. Segundo ela, esta instrução foi muito importante, pois além de ter conseguido 
discriminar comportamentos das crianças, que eram reforçadores, ela também generalizou 
este comportamento, isto é, em cada situação que se percebia com idéias pré-concebidas, 
parava e tentava discriminar mais objetivamente os fatos. Parece claro que mesmo diante 
de uma regra já estabelecida, esta cliente passou a dar uma chance às contingências, 
ou seja, conseguiu enfrentar as regras falsas expondo-se às contingências do momento.
Esta cliente interrompeu as sessões temporariamente como um outro corte nas 
despesas - o marido também interrompeu sua terapia, ginástica, etc. No contato para 
follow-up, ela relatou que continua bem, “curtindo a bijuteria embora também gostasse 
de pérolas” e disse que pretende retomar para o atendimento quando for possível, pois 
está dando umas aulas particulares e entâo conseguirá pagar a terapia.
Em resumo, penso que meu papel neste processo foi o de analisar regras que 
nâo especificavam contingências e o de criar condições para a remoção destas regras, 
através do questionamento e da instrução “dê uma chance às contingências", que embora 
nunca tenha sido explicitada, esteve subjacente a quase todas minhas intervenções.
Bibliografia
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Sobre comportamento e cognlçâo 1 8 7
icaro
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