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Unidade I RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO BRASIL Profa. Elaine Nunes Objetivos gerais da disciplina Caberá à disciplina Relações Étnico- Raciais no Brasil contribuir para: a formação de uma consciência crítica em relação às questões étnico-raciais no Brasil; o conhecimento sobre a formação racial do país; problemas, preconceitos e estruturas autoritárias; Objetivos gerais da disciplina a interpretação e a compreensão das formas de discriminação; a avaliação das situações de conflitos interétnicos; uma futura prática pedagógica de promoção da igualdade racial na comunidade. Pense nestas questões Negros e brancos são tratados igualmente em nossa sociedade? Negros e brancos possuem as mesmas oportunidades de acesso à educação, emprego, saúde e outros direitos sociais? Afinal, somos um povo racista ou não? Por que precisamos de uma lei que afirme que “o racismo é crime inafiançável”? Como podemos realizar uma educação das relações étnico-raciais? E então? Percebeu como questões complexas estão envolvidas com as relações étnico-raciais? Lei 10.639/2003: inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e cultura afro- brasileira”. Lei 11.645, de 10 de março de 2008, inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-brasileira e Indígena”. Continuação Estatuto da Igualdade Racial: Lei 12.288/2010. 2011: Ano Internacional dos Afrodescendentes pela Organização das Nações Unidas (ONU). Nossa disciplina é um resultado desses movimentos. Conceito de “raça” Conceito criado no século XVI: diferenciação biológica dos seres humanos. Conceito desconsiderado pela ciência: raça humana. Genes > características hereditárias > genótipo/fenótipo. “Raça” e “etnia” não são sinônimos! Raça como construção social: forjada nas tensas relações entre brancos e negros, muitas vezes simuladas como harmoniosas; termo utilizado com frequência nas relações sociais brasileiras para informar como determinadas características físicas, como cor de pele, tipo de cabelo, entre outras, influenciam, interferem e até mesmo determinam o destino e o lugar social dos sujeitos no interior da sociedade brasileira. (BRASIL, Ministério da Educação, 2004) O conceito de raça: construção social, política e cultural Aprendemos a ser negros e brancos como diferentes na forma como somos educados e socializados, a ponto dessas ditas diferenças serem introjetadas em nossa forma de ser e ver o outro, na nossa subjetividade, nas relações sociais mais amplas. (Nilma Bentes, apud Kabengele Munanga e Nilma Lino Gomes, 2006) O conceito de etnia “Um grupo possuidor de algum grau de coerência e solidariedade, composto por pessoas conscientes, pelo menos em forma latente, de terem origens e interesses comuns. Um grupo étnico não é mero agrupamento de pessoas ou de um setor da população, mas uma agregação consciente de pessoas unidas ou proximamente relacionadas por experiências compartilhadas.” Dicionário de Relações Étnicas e Raciais (apud CASHMORE, 2000, p. 196, grifo nosso) O conceito de etnia Implica posicionamento, pertencimento, opção, escolha, autodenominação do sujeito, tendo por referência determinado grupo étnico. Portanto, a atribuição de pertença a determinado grupo étnico pode ser: endógena – parte do próprio sujeito, devendo ser necessariamente a decisão de pertencimento dele; exógena – quando os significados atribuídos partem de outros grupos. O conceito de etnia: principais aspectos da identidade étnica Atribuição categorial (processo sócio-histórico): os atores identificam-se ou são identificados pelos outros (endógena ou exógena). Origem comum (processo simbólico): necessidade dos atores de demonstrarem uma ancestralidade com o seu grupo étnico por meio de símbolos identitários. Interatividade O conceito de raça, de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, aprovadas em junho de 2004 pelo Ministério da Educação, tem como significado: a) A construção social justa em direitos de cidadania dos brancos e negros. b) Informar como as características físicas, influenciam, interferem e determinam o destino e o lugar social dos sujeitos no interior da sociedade brasileira. c) Reforçar preconceitos e discriminações de acordo com as concepções científicas desenvolvidas a partir do século XVI. d) Demonstrar que a genética indica as diferenças biológicas, portanto a diversidade biológica determina as diferenciações raciais. e) A segregação étnica inerente no país. Relações étnico-raciais no Brasil Histórico: positivismo > justificativa da organização social. Histórico: nazismo > superioridade de raça humana. Histórico: grupos eugenistas > contrários à miscigenação. Conflito: racismo científico + teoria racionalista x identidade nacional > mito da democracia racial = ideologia da alienação. O racismo científico Doutrina científica que sustentou, ideologicamente, durante os séculos XIX e XX, as políticas racistas e de exclusão comandadas pelos europeus: Naturalização – redução do cultural ao biológico. Determinismo – status social explicado por características naturais. Justificação – missão justificadora das diferenças sociais a fim de esconder suas causas reais e as relações de poder. Hierarquização – diferenças entre as raças colocam as pessoas, naturalmente, como umas superiores às outras. O racismo à brasileira História do Brasil: sociedade hierarquizada e autoritária. Heranças do Brasil colonial: brancos como colonizadores; índios como população original; negros como escravos. Processo de estigmatização das raças na construção da identidade nacional. A mistura de raças no Brasil era vista como um elemento negativo que explicaria, inclusive, o porquê de nossas mazelas sociais, de nosso fracasso político e de nossa dependência econômica. O mito da democracia racial no Brasil 1933 – publicação do livro “Casa Grande & Senzala”, de Gilberto Freyre. A partir de então, o racismo no Brasil toma outra configuração: bases para a construção do mito da democracia racial. Miscigenação: ganha contornos positivos, com ênfase nas qualidades do povo brasileiro miscigenado e mestiço. Suposta “convivência harmoniosa” entre as três raças: força e estatuto de uma ideologia dominante. Cordialidade: outro mito – o brasileiro como “o homem cordial” (livro “Raízes do Brasil”, de Sérgio Buarque de Hollanda). Afinal, o que é o racismo? Biologicamente, não existem raças, somos uma só raça humana. Raça é um conceito político. O racismo pressupõe: hierarquização; inferiorização; preconceito; discriminação; desigualdade. Pressupostos do racismo Hierarquização: existência de raças humanas com diferentes qualidades e habilidades. Inferiorização: da hierarquização decorre que uns são considerados superiores aos outros. Preconceito: crenças e expectativas de ação que não estão formalizadas. Discriminação: ações concretas que diferenciam grupos ou pessoas segundo critérios raciais. Desigualdade: desigualdade de oportunidades. Tipos de racismo Racismo pessoal ou individual: se crê superior em função da raça. Racismo institucional: instituições (governos, empresas), primazia de um grupo racial (por exemplo, japoneses). Racismo cultural: supremacia da herança cultural. Interatividade As concepçõescientíficas europeias a respeito de raça influenciaram as relações étnico-raciais no Brasil, bem como as propostas políticas de supremacia branca. Sendo assim, a respeito do racismo no Brasil, este sempre foi dotado de grande visibilidade? Assinale a alternativa correta. a) O racismo no Brasil nunca existiu, pois vivemos numa democracia racial. b) O racismo é uma construção utópica dos grupos eugenistas da década de 30. c) O racismo no Brasil é velado e se mostra nas relações cotidianas e interpessoais. d) As práticas discriminatórias divulgadas pelos meios de comunicação são invenções da mídia e interesse pelo Ibope. e) Relação étnica-racial é um fato isolado, sem consonância com a realidade brasileira. A condição dos afrodescendentes na sociedade brasileira Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística): Censos – a cada 10 anos, um levantamento completo sobre cada família brasileira. PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) – anualmente seleciona apenas uma amostra dos domicílios brasileiros para um levantamento parcial. Ambos trazem uma visão bastante representativa de nosso país e são importantes recursos para que sejam elaboradas políticas públicas que encontrem as melhores soluções para nossos principais problemas sociais. A condição dos afrodescendentes na sociedade brasileira Dados do IBGE Autodenominação de cor/raça nos levantamentos censitários brasileiros, o próprio entrevistado escolhe entre branco, preto, pardo, amarelo ou indígena. São considerados negros os entrevistados que se denominam como pretos e pardos. Pelos dados preliminares do Censo 2010, já somos mais de 200 milhões de brasileiros. Entretanto, quando o assunto é a igualdade social entre brancos e negros, os números são bastante desoladores e o país ainda precisa melhorar muito em distribuição equitativa de direitos e oportunidades. Distribuição racial brasileira Distribuição percentual da população segundo a cor ou raça. Brasil, 1998/2008. Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 1998/2008. (1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. Distribuição racial brasileira Distribuição racial no Brasil em 2008 (porcentagem). Fonte: PNAD - livro-texto As diferenças regionais Distribuição racial por região brasileira, 2009 (porcentagem). Fonte: PNAD - livro-texto Desenvolvimento econômico: distribuição do PIB por regiões Produto Interno Bruto per capita (em R$) por regiões brasileiras, 2008. Fonte: IBGE - livro-texto Acesso restrito ao ensino superior Proporção das pessoas de 25 anos ou mais de idade com ensino superior concluído, por cor ou raça, nas regiões Nordeste e Sudeste, 1998/2008. Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 1998/2008. Instituto Ethos Distribuição racial brasileira: desigualdade no mercado de trabalho: Instituto Ethos > perfil social, racial e de gênero das 500 maiores empresas do Brasil e suas ações afirmativas: executivo, gerência e supervisão (2003/2010). Desigualdade racial no sistema educacional Analfabetismo: PNAD, 2009 > acima de 15 anos > negros e pardos 13% > brancos 6%. Anos de estudo > negros e pardos 7% e brancos 8,5% > consequência > desigualdades no mercado de trabalho. Qualidade do ensino > analfabetismo funcional > aluno aprende códigos linguísticos e numéricos. Europa e América do Norte > alfabetismo funcional > nível de letramento > exigências do mercado globalizado. A questão de gênero e a condição feminina da mulher negra Mulher afrodescendente: experimenta situações de exclusão, marginalidade e/ou discriminação socioeconômica maiores que as mulheres brancas e que os homens bancos e negros. Quanto mais pobre, piores as condições de vida, menor o acesso aos serviços de saúde, bem como ao pré-natal (6% brancas, 12,8% negras – não realizaram); consequentemente, maior o risco de doenças durante a gravidez e, portanto, maior a incidência de mortalidade materna. A condição social dos indígenas no Brasil Diversidade étnica e cultural dos povos indígenas > duas línguas indígenas no mesmo domicílio. Baniwa (2006, p. 122): “[...] a discriminação linguística acarreta consequências muito graves. Por um princípio pedagógico aceito mundialmente, a língua materna deve ser utilizada para alfabetizar e educar as crianças, sobretudo nos primeiros anos”. Significado do trabalho para os indígenas = identidade coletiva. Interatividade Os grupos indígenas são parte da nossa sociedade e não um segmento exterior a ela. Portanto, os índios devem ser considerados como grupos estereotipados? a) Não, pelo contrário, devemos superar a visão estigmatizada sobre os índios e colocá-los como cidadãos de direitos. b) Sim, pois os índios são um grupo étnico humanista e que possuem uma cultura muito distinta do homem ocidental. c) Os índios são entendidos como um grupo ingênuo, logo o estereótipo é coerente com esta realidade. d) O estereótipo é uma ideologia a qual todos os seres estão sujeitos a ela, sendo assim, os índios recebem a mesma atribuição. e) Os índios não devem ser estereotipados, pois são tutelados por lei federal. Movimentos sociais e ações afirmativas: é possível acelerar o processo de mudança? Após tantos dados comprovando a condição desfavorável em que se encontram os negros na sociedade brasileira, você deve estar se perguntando: mas, afinal, será possível reverter esse processo perverso? Vamos apresentar algumas dessas possibilidades, partindo dos movimentos negros que atualmente lutam contra o racismo e por uma outra condição afrodescendente, passando à definição de ações afirmativas e suas principais implicações. O papel do movimento negro contemporâneo na luta contra as desigualdades raciais no Brasil Promoção de uma outra condição do afrodescendente. Tomada de consciência da importância dessas questões. Implantação de ações afirmativas. Resultado de um longo processo histórico: período pré- abolicionista (séculos XVI ao XIX). Os negros, de fato, nunca foram “passivos”, “pacíficos” ou “acomodados”. A realidade após a Lei 10.639/2003 As crianças precisam aprender uma outra história do Brasil. Essa lei torna obrigatória que a perspectiva africana e afro- brasileira seja considerada no ensino de História. Apagar o estigma do negro apenas como “escravo”: é preciso ensinar esse outro lado da história. Após a lei, grande incentivo à produção de material didático e pedagógico sobre a história da África e dos negros no Brasil. Faça uma pesquisa e confira. Principais consequências do movimento negro Legislação penal: pune todo ato discriminatório, considerando o racismo como “crime inafiançável”. Ações afirmativas, que visam a promover a igualdade de oportunidades a grupos desfavorecidos socialmente. Mas o que buscam as ações afirmativas? Uma “reparação” às perdas de oportunidades vividas pelos negros em consequência de políticas segregacionistas. Uma “aceleração” na lentidão histórica para a inclusão social a curto prazo dessa população, bem como a ascensão de minorias étnicas, raciais e sexuais. Medida paliativa, transitória e, portanto, temporária. Por que as ações afirmativas são realmente necessárias? Acelerar um processo histórico. Combater a “inércia histórica”. Assumir o “racismo institucional” presente no sistema social. Desmontar o “mito da democracia racial”. Ações afirmativas Promover uma “discriminação positiva” – facilidade temporária paraum acesso mais rápido aos direitos sociais básicos que lhes foram, por tanto tempo, sistematicamente negados. A polêmica das cotas para negros. Cotas para deficientes físicos, mulheres > obrigatórias nas universidades, empresas e partidos políticos. Interatividade O movimento negro foi e continua sendo um elemento essencial para a conquista e a garantia de direitos fundamentais à população afrodescendente. Quais seriam algumas das ações do movimento negro ao longo da história política brasileira? a) Quilombos, única expressão da resistência negra na história do Brasil. b) O racismo considerado crime inafiançável pela legislação vigente e implantação das políticas de ações afirmativas. c) Criação da lei optativa sobre a história e da cultura dos negros e dos afrodescendentes nos currículos escolares e pelos livros didáticos e paradidáticos. d) Organização de Fóruns e Congressos, para discussão da temática racial. e) Militância política e partidária. ATÉ A PRÓXIMA! Unidade II RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO BRASIL Profa. Elaine Nunes Objetivos gerais da unidade II Nesta unidade, abordaremos os seguintes assuntos: O antirracismo na Legislação Brasileira. Africanidades: alguns aspectos da história africana dos negros no Brasil. Nosso objetivo é tratar primeiramente sobre as legislações vigentes no Brasil no combate ao racismo e na promoção da igualdade racial e, em seguida, fazer um retorno histórico, a fim de compreender mais profundamente as raízes de nosso racismo. O antirracismo na legislação brasileira Temos as leis mais modernas e avançadas do mundo: Constituição de 1988. ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069, de 1990. LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394, de 1996. E tantas outras... Mas o grande problema é que nossas leis não têm correspondência com nossa vida cotidiana, o que dificulta, e muito, que sejam colocadas em prática. A carta maior: a Constituição Brasileira de 1988 “Art 5º, XLII – A prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei.” Inafiançável e não prescreve. Promulgada a Lei 7.716/89: crime resultante de preconceito de raça ou cor. Modificada em seus artigos pela Lei 9.459/97 – art. 140, Código Penal. Brasil: primeiro país em todo o continente americano a regular práticas racistas por meio de legislação específica. Movimento negro Citação De Paula e Heringer (2009, p. 9): “A partir dos anos 1990, observou-se a emergência de novos atores na luta antirracista. Começam a se constituir nas favelas e periferias urbanas brasileiras grupos de jovens ligados a iniciativas de cultura e arte, com um discurso de enfrentamento da violência, afirmação de pertencimento...orgulho racial.” Estatutos específicos: o ECA e o Estatuto da Igualdade Racial Visam a proteger grupos de minorias, bem como promover sua inclusão social e a garantia de acesso a direitos fundamentais desses cidadãos. Segundo o Portal Brasil, “um estatuto é um regulamento ou código com significado e valor de lei ou de norma” (disponível em: http://www.brasil.gov.br). Alguns exemplos: Estatuto do Idoso, Estatuto do Índio, Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e Estatuto da Igualdade Racial. Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei 8.069, de 1990 “Art. 5º: Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.” Crianças e adolescentes passam a ser tratados como cidadãos de direitos. Consequência de intenso debate internacional: Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948; Declaração dos Direitos da Criança, em 1959 (ONU), e Convenção Internacional dos Direitos da Criança, em 1989 (ONU). Estatuto da Igualdade Racial, Lei 12.288, de 20 de julho de 2010 Em maio de 2003, o senador Paulo Paim (PT-RS) apresentou o projeto de lei do Senado que instituiu o Estatuto da Igualdade Racial. No dia 20 de julho de 2010, o projeto foi aprovado com emendas validando, por meio da Lei 12.288, o Estatuto da Igualdade Racial. O documento versa sobre os principais direitos garantidos à população afrodescendente no Brasil, bem como busca combater toda forma de discriminação e intolerância étnica. Principais pontos do Estatuto da Igualdade Racial Pena de até três anos para quem praticar racismo pela internet. Incentivo à contratação de negros pelas empresas. Reconhecimento da capoeira como esporte. Reserva, nos partidos políticos, de 10% das vagas para candidatos negros (atualmente, só há reserva para mulheres). Retira a obrigatoriedade de cotas nas universidades públicas para alunos negros. Leis e diretrizes educacionais Grande influência do ECA sobre os debates educacionais a partir de sua publicação em 1990. Processos sociais de conquistas de direitos são lentos, graduais e integrados. Resultado de amplo e longo debate entre grupos e movimentos. A igualdade racial não pode ser encarada como uma necessidade apenas do movimento negro, mas de todos os brasileiros que buscam encontrar suas verdadeiras raízes históricas e culturais e querem viver em uma sociedade mais justa e igualitária. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9.394, de 1996 Art. 26 do Cap. 2 § 4º – “O Ensino de História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e europeia”. Daí a aprovação da Lei 10.639, de 2003, foi um passo, garantindo a afirmação, o reconhecimento e a valorização dos negros no quadro da diversidade da cultura brasileira. Lei 10.639, de 2003 Altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro- brasileira”. Essa legislação consegue chamar a atenção de autoridades, educadores e da sociedade para a importância da inclusão no currículo escolar da perspectiva étnico-racial. Institui o dia 20 de novembro como o Dia da Consciência Negra. Parecer no 003/2004 Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana de 2004 – Parecer CNE (Conselho Nacional de Educação) nº 003/2004. Traz orientações, informações e estratégias para a implantação da Lei 10.639. Busca identificar as contribuições da Lei 10.639 para o reconhecimento e a valorização da diversidade étnico-racial brasileira, passo fundamental para uma sociedade de fato igualitária e livre do racismo. Plano Nacional de Implementação do Parecer no 003/2004 Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana, de 13 de maio de 2009. Após 6 anos, o MEC, juntamente com a Subsecretaria de Políticas de Ações Afirmativas da SEPPIR (SubAA), toma a iniciativa de publicar este Plano, visando a facilitar o processo de implantação da Lei 10.639/2003 em todas as escolas brasileiras. Interatividade Sendo o Brasil o primeiro país do continente americano a criar leis específicas no combate ao racismo, indique quais leis efetivamente se referem ao racismo como crime: a) Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9.394/96) e o CódigoPenal. b) Estatuto da Igualdade Racial e o Estatuto da Criança e do Adolescente. c) Constituição Federal e Lei 10.639/03. d) Diretrizes Curriculares Nacionais para o ensino das relações étnico-raciais e para o ensino da história e cultura dos afrodescendentes e a Lei 11.645/08. e) Constituição Federal de 1988, Lei 7.716/89 e o Código Penal, artigo 140. Estatuto do Índio Lei 6.001/73: dispõe sobre as relações do Estado e da sociedade brasileira com os índios e os coloca como sendo relativamente incapazes e devem ser tutelados. Constituição Federal de 1988: reconhece o direito do índio de manter e preservar sua própria cultura. Novo Código Civil (2003): retira os índios da condição de relativamente incapazes, estipula legislação própria. Estatuto está em construção. Africanidades: alguns aspectos da história africana dos negros no Brasil As questões históricas são fundamentais para compreendermos: A inserção dos negros africanos no processo de colonização brasileira. As raízes de nossa construção nacional. Os fundamentos de nosso “racismo velado”. O conceito de africanidades Processo de valorização e resgate da história e da cultura africana e afrobrasileira, a fim de desfazer os estereótipos raciais construídos pelos grupos dominantes (diga-se: brancos, homens, proprietários, livres e ricos). Reconstrução histórica, por meio de uma perspectiva diferente daquela que temos aprendido em nossas escolas durante tanto tempo, que perceba toda a ampla contribuição que os africanos tiveram na formação do Brasil. Fio da história: África antes de 1500 As populações africanas dominavam inúmeras tecnologias quando incorporadas à empresa colonial portuguesa: Mão de obra especializada: área têxtil, construção de materiais como madeira e sabão. Regiões do continente africano destruídas pelos europeus por 400 anos de guerras, imposição da dominação ocidental. Heranças coloniais e formação de um país chamado Brasil Contexto histórico – século XVI: Colonização do Brasil: iniciativa política da monarquia portuguesa. Empresa capitalista: patrocinada pela então burguesia comercial. Projeto capitalista ambicioso: fazer essa empresa crescer e ser o mais lucrativa possível. Capitalismo comercial: monopolista e manufatureiro (envio de matérias-primas à Europa). Alguns mitos sobre a formação do Brasil Nossos problemas atuais estão diretamente ligados ao tipo de população que foi enviada para cá naquele momento. Para povoar um país-continente como o nosso, foram mandados para cá os “piores cidadãos” portugueses, indesejados na Europa, como ladrões, bandidos, vagabundos, prostitutas e desocupados de todo tipo. É por isso que nosso país “não deu certo”. Como assim? Pense conosco... Éramos a empresa mais rentável para Portugal na época. Alguém mandaria para o comando de sua empresa pessoas desqualificadas, desonestas e incapazes? Algum empresário, em sã consciência, seria leviano o bastante para entregar seu negócio a bandidos e vagabundos que levariam tudo a perder? Claro que não! A incumbência de fazer esse país-continente crescer e dar lucro Homens e mulheres passam a ser enviados ao Brasil. Esse país-continente deveria fornecer riquezas o bastante para sustentar os luxos e as extravagâncias da família real e sua aristocracia. Além disso, era preciso pagar os investimentos feitos pela burguesia na empresa colonial. Os portugueses começaram a explorar de todas as formas o território brasileiro, retirando de nossos solos e florestas todas as matérias-primas que tivessem algum valor no mercado capitalista europeu. A dinâmica de uma colônia de exploração No início, a extração do pau-brasil. Portugueses em pequeno número em relação à população indígena, que era de 5 milhões em 1500. Convivência possível entre portugueses e índios até 1530. Depois do extrativismo, a agricultura. Escassez de mão de obra e de terras: conflito com tribos indígenas. Na guerra dos portugueses com os índios, milhões de índios foram dizimados. A solução: escravos africanos! Problema: a falta de mão de obra numerosa para a exploração de terras tão extensas. Solução: escravização de africanos, vindos da Angola e do Congo. Como os portugueses já dominavam a arte das navegações, não foi difícil forçar populações africanas a se transferirem para o Brasil, submetendo-as a uma das condições de vida e trabalho mais desumanas que a história já assistiu. Interatividade Baseado na exploração colonial, na economia monopolista mercantil e no trabalho não assalariado dos escravizados, os portugueses trouxeram ao Brasil cerca de 3,6 milhões de pessoas. Esse contexto representou: a) Um investimento para expansão do catolicismo no país. b) Uma verdadeira diáspora entre os povoados africanos. c) O extermínio absoluto das aldeias indígenas. d) A expansão territorial dos povos de língua portuguesa. e) A consolidação da igualdade racial. Diáspora e travessia dos escravizados 1550: começam a chegar ao Brasil os primeiros africanos escravizados. Em mais de 3 séculos: cerca de 3,6 milhões de pessoas foram trazidas ao Brasil para o trabalho escravo. Isso representava um terço da população africana da época. Verdadeira diáspora: deslocamento separou e alterou culturas, línguas, costumes, religiões etc. As raízes de nossa sociedade hierarquizada e autoritária Foram quase 4 séculos de escravidão. Crença na existência dos escravos como categoria natural, ou seja, na existência de seres humanos que nasceram escravos na África. Naturalização da ideia de servidão e senhorio. Roberto DaMatta: “cada coisa tem um lugar e cada lugar tem uma coisa”: a ausência de valores igualitários. Lembre-se: nascemos todos livres, até que algum sistema nos escravize no decorrer de nossas vidas. Omissão da história da África “As condições deploráveis dos navios negreiros, das senzalas, os castigos e suplícios” (BANZO). Transformação em boçais. Outra forma de transformar seres humanos em coisas: apagar definitivamente toda sua herança cultural e histórica, sua origem e sua personalidade. História da África foi apagada e a nova história contada sob perspectiva do colonizador. A importância da Lei 10639/2003 Os livros de história do Brasil também colaboraram para “apagar” esse passado africano: ausência da perspectiva africana e afro-brasileira. Importância de uma lei que obrigue esse resgate histórico e cultural: promoção da igualdade racial nas escolas e na sociedade. E nossa disciplina vem colaborar nesse sentido, preparando professores e professoras para uma prática educativa consciente e igualitária. A transferência de pensamentos e tecnologias africanas para territórios não africanos Vasta contribuição africana na formação do Brasil. Vamos destacar apenas 3 aspectos: 1. No campo econômico: os negros como força de trabalho não remunerada, ajudando a construir as riquezas do país. 2. No campo demográfico: o elevado número de africanos fizeram parte da população brasileira. 3. No campo cultural: influência linguística, religiosa e no campo das artes, seja por instrumentos musicais, ritmos, danças. Interatividade Por que podemos afirmar que a Lei 10.639/2003 é um importante instrumento na promoção da igualdade racial no Brasil? a) Porque a herança cultural e histórica dos africanos no Brasil foi completamente apagada ao longo dos séculos. b) Porque devemos resgatar as africanidades, afirmando o valor e as contribuições dos negros para aformação do Brasil. c) Porque é necessário desfazermos os estereótipos raciais que colocam o negro apenas como escravo na história do Brasil. d) Porque a valorização da cultura afrodescendente contribui para a representação positiva dos negros. e) Todas as alternativas anteriores estão corretas. A resistência negra: passiva ou ativa? Resistência passiva: ações não utilizam violência direta, como recusa a trabalhar, trabalhos malfeitos, fugas e faltas. Resistência ativa: movimentos mais coletivos e violentos, seja pela organização dos quilombos, seja por meio das insurreições, guerrilhas, entres outros movimentos realizados durante todo o regime escravista no Brasil. Importância de ambas as manifestações de resistência contra a escravidão no Brasil: caráter extremamente conflituoso na relação senhor/escravo. Alguns exemplos de resistência negra durante a escravidão As revoltas urbanas: Revolta dos Alfaiates (Bahia, 1798). Revolta dos Malês (Bahia, 1835). Cabanagem (Pará, 1835-1840). Sabinada (Bahia, 1837-1838). Balaiada (Maranhão, 1838-1841). Os Quilombos: Seu principal objetivo era a implantação de uma nova forma de vida e organização social, diferente da estrutura política colonial e escravista. Foram centenas de quilombos espalhados por todos os estados do país, que tiveram duração mais curtas ou continuam ativos até os dias de hoje. A importância dos quilombos Importante demonstração de que os negros pretendiam construir no Brasil um outro modelo de associação entre os homens: Aberta a todos que pudesse desmontar a estrutura escravocrata. Implantação de “uma outra forma de vida, uma outra estrutura política na qual se encontraram todos os tipos de oprimidos” (MUNANGA, Kabengele; GOMES, Nilma Lino. “O Negro no Brasil de Hoje”. São Paulo: Global, 2006, p. 71). O abolicionismo como um movimento conservador Movimento organizado pela classe política da ocasião, que procurou trazer pouco ou nenhum prejuízo aos senhores de escravo nesse processo de “libertação”. A preocupação da elite da época era que a abolição se desse de forma pacífica, sem sustos e nem revoluções. Daí as três grandes leis abolicionistas: Ventre Livre (1871), Sexagenários (1885) e Áurea (1888) terem tido muito mais benefícios aos próprios senhores do que uma nova condição à população negra. A abolição como dissimulação de qualquer processo de confronto Entretanto, a abolição foi-nos passada como um presente, uma dádiva: imagem de superação lenta, ordenada, gradual e controlada pelo Estado. Base para o “mito da democracia racial”: como se o processo abolicionista tivesse sido capaz de acabar com todos os conflitos anteriores existentes entre senhores e escravos e, a partir da abolição, o país passasse a experimentar uma relação cordial e amistosa entre essas classes. Ideologia da igualdade racial e da oportunidade igual para todos. O projeto nacional de branqueamento Falta de planejamento do poder público no sentido de incorporar a mão de obra negra recém-liberta ao novo mercado de trabalho nacional naquele momento. O projeto nacional de branqueamento: a Guerra do Paraguai como estratégica sucção de mão de obra negra (cerca de 90.000 negros morreram nessa guerra). Tática para branquear a população brasileira e também justificar a política imigrantista, que trouxe para o Brasil cerca de 4 milhões de imigrantes brancos a partir de 1808. Movimentos negros pós-abolição 1888: Lei Áurea. Desigualdades sociais entre brancos e negros continuaram a existir, mesmo após a “libertação” dos escravos. Libertação “na força da lei”: efeitos diretos na continuidade da condição do negro. “Longo e árduo processo de construção de igualdade e de acesso aos diversos setores sociais” (MUNANGA e GOMES, 2006, p. 107). O processo de marginalização do negro Sem possibilidade de trabalho remunerado, os negros “recém-libertos” acabaram se instalando nas periferias das cidades, nas regiões mais pobres do Brasil. Somando-se a essa “periferização” das populações negras, outras formas de exclusão se impuseram, devido a processos discriminatórios e racistas. Esses e outros dados ainda são confirmados pelos levantamentos estatísticos atuais. As ideologias raciais: o alcance das políticas de branqueamento no Brasil A ideologia racial do branco: “consciência social de dominação, em que o próprio branco se representa superior aos outros, isto é, com direito de dispor dos outros.” A ideologia racial do negro: “fundada numa relação de inferioridade em face do branco, que detém presumivelmente o poder, exprime uma consciência de submissão.” (IANNI, Octavio. “Raças e Classes Sociais no Brasil”. Ed. rev. ampl. São Paulo: Brasiliense, 2004, p. 322-323) Interatividade A respeito do projeto nacional de branqueamento, assinale a alternativa incorreta: a) O Brasil procurava “apagar” seu passado escravista perante o então mercado internacional. b) Os movimentos de resistência negra estiveram diretamente relacionados ao chamado abolicionismo, movimento que culminou com a abolição da escravidão no Brasil. c) A Guerra do Paraguai foi uma das táticas encontradas pela elite política para a implantação desse projeto de branqueamento. d) A vinda de milhares de imigrantes brancos para o Brasil também era parte da estratégia de “branquear” a população brasileira. e) Esse projeto mostrou repercussões profundas nas ideologias raciais presentes até hoje na sociedade brasileira. ATÉ A PRÓXIMA! Unidade III RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO BRASIL Profa. Elaine Nunes Objetivos gerais da Unidade III Nesta unidade, abordaremos os seguintes assuntos: a pedagogia da exclusão – imagens e representações do negro no Brasil; identidade, interação e diversidade – por uma educação cidadã. Nosso objetivo é retomar a questão dos estereótipos raciais, passando à análise de imagens e representações do negro na literatura e na mídia. Em seguida, traremos a discussão para o campo da educação, a fim de pensarmos estratégias para uma educação igualitária e não racista. A pedagogia da exclusão: imagens e representações do negro no Brasil Projeto nacional de branqueamento. Era preciso “apagar” tudo o que remetia ao “nosso passado negro”. O mito da democracia racial. Racismo à brasileira: uma ideologia cada vez mais difícil de se detectar, desvendar e decodificar. Todos esses processos sociais continuam a marcar as imagens e representações feitas sobre o negro, seja por parte da mídia, na literatura ou no ambiente escolar. Imagens e representações do negro na literatura Monteiro Lobato: período pós-abolicionista. Seus livros reproduzem os estereótipos do negro como submisso e subserviente: “Embora liberto, não poderia sobreviver sem a tutela do senhor, pois era hereditariamente predisposto ao trabalho servil e desprovido de qualquer autonomia enquanto pessoa.” (BARBOSA, 2004, p. 56) A polêmica do “livro proibido” de Monteiro Lobato No final de 2010, o Conselho Nacional de Educação (CNE) proibiu a distribuição nas escolas públicas do país do livro “Caçadas de Pedrinho”, de Monteiro Lobato. Em suas descrições físicas de negros, os traços africanos se comparam muito ao de animais e recebem uma conotação negativa. O Conselho justifica o pedido citando trechos da obra: “Tia Nastácia, esquecida dos seus numerosos reumatismos, trepou, que nem uma macaca de carvão [...].” O papel da literatura na permanência de estereótipos dos negros Consideramos naturais algumas atitudes, piadase ditos populares de cunho preconceituosos. Derivam dessas ideias cristalizadas expressões do tipo: os “pretos de alma branca”, “tenho bons amigos pretos” e muitas outras que se perpetuaram e criaram raiz em nossa sociedade historicamente racista. A literatura como pedagogia da exclusão social: o trabalho de reforço dos estereótipos. Imagens e representações do negro na mídia Revisão: ontem – as personagens na televisão interpretadas por negros também reproduziam os papéis tradicionais de subserviência e servidão; hoje – personagens negros em papéis semelhantes aos brancos, com família constituída, com profissão bem remunerada, com formação acadêmica; ações afirmativas + politicamente correto. Internalização da ideologia do branqueamento Representações acabam sendo internalizadas pelos próprios negros, em um processo bem-sucedido de “aceitação passiva”: “O inconsciente racial coletivo brasileiro não acusa nenhum incômodo em ver tal representação da maioria do seu próprio povo, e provavelmente de si mesmo, na televisão ou no cinema.” (ARAÚJO, 2008, p. 984) “Naturalidade” na produção e recepção dessas imagens. A “monumental contradição” do racismo no Brasil Consequências da pedagogia da exclusão e da ideologia da alienação: a população “branca” brasileira se supõe “branca-europeia”; percepção absolutamente imaginária (e ilusória) de que somos de alguma forma descendentes de uma “linhagem europeia pura”; é como se todas as cabeças pensassem em um único sentido: contra nós mesmos. O conceito de violência simbólica (Pierre Bourdieu, sociólogo francês) A violência simbólica é uma das formas de dominação mais profundas e cruéis que se pode conceber: mecanismos sutis de dominação social, utilizados por indivíduos, grupos ou instituições, e impostos sobre outros. A construção da identidade brasileira se enraíza na interiorização por todos os brasileiros (todos mestiços, afinal) de normas enunciadas pelos discursos dos estrangeiros que nos colonizaram. Assumir o universo simbólico de um outro, sem perceber que essa “transferência” foi feita na forma de uma dominação no plano simbólico. Imagens e representações do negro na escola Para Bourdieu, na escola também se realiza a violência simbólica, quando essa passa a tratar como iguais indivíduos que são desiguais. A escola procura encobrir as diferenças de raça, cor, classe, origem etc.; dando a todos os alunos um único tratamento e favorecendo, assim, aqueles que já estão na condição de favorecidos. A eficácia da violência simbólica: ela só triunfa se aquele(a) que a sofre contribui para a sua eficácia. Trata-se de um longo processo de aprendizado, capaz de manter “cada coisa em seu lugar e cada lugar com sua coisa”. (Roberto DaMatta) A violência simbólica na escola Imagens e representações que, muitas vezes, o professor traz de maneira inconsciente para sua prática cotidiana em sala de aula e que colabora para a reprodução de estereótipos. Outra dificuldade: professoras afrodescendentes que não reconhecem sua origem étnico-racial. Os estereótipos vão sendo assimilados como verdades pela criança, que é vítima dessa violência simbólica. (CAVALLEIRO, E. “Do silêncio do lar ao silêncio escolar”. 6. ed. São Paulo: Contexto, 2012) Interatividade De que formas a literatura, a mídia e a escola podem ser responsáveis pela permanência de estereótipos raciais? I. Nas novelas, filmes e livros, reservando aos negros as personagens subservientes e submissas. II. Nos currículos escolares, pressupondo que todos os alunos apresentam as mesmas condições, o que acaba discriminando certos grupos. III. Nas salas de aula, quando os professores procuram trabalhar a diversidade e o resgate de aspectos culturais de diversos grupos. Estão corretas as afirmações: a) I e II. b) II e III. c) I, II e III. d) I e III. e) Nenhuma das afirmativas. O processo de construção da identidade afrodescendente na infância e na juventude A igualdade jurídica em meio a uma sociedade hierárquica. Dificuldade enfrentada por crianças e adolescentes negros em construírem sua identidade negra. O que significa “fazer-se negro”? Como a criança pode construir sua identidade negra? Conceito de identidade: grupo social e cultural “A criança percebe o mundo que a rodeia, passa a compreender suas regras, linguagens, hábitos, proibições. [...] É capaz de interiorizar alguns elementos culturais no processo de sua constituição como indivíduo, sujeito de sua própria identidade [...].” (LARAIA, 2008; KEMP, 2009) > base educação. A identidade se constrói no plano simbólico, isto é, no conjunto de significações, valores, crenças, gostos, que o indivíduo vai assumindo na sua relação com o outro. “Tornar-se negro” em uma sociedade hierarquizada Essas relações são permeadas por estereótipos raciais, preconceitos e desigualdades. Sociedade paradoxal: leis garantem igualdade de direitos e oportunidades para brancos e negros, mas as relações sociais revelam uma estrutura claramente hierarquizada e encharcada com um racismo às escondidas. Finalizando: como é construída a identidade? Herança cultural: transmitida pelo grupo familiar ou social. Socialização: processo de formar um novo membro da sociedade, apto a viver naquela determinada cultura (educação informal ou formal). Construção de si: seleção de aspectos da cultura com os quais o sujeito se identifica (relação eu-outro/trocas simbólicas). Cultura: dinâmica, diálogo e inter-relação entre os sujeitos. Diversidade e currículo Tarefa difícil à escola: 1. desconstruir estereótipos de raça/cor; 2. desmistificar os mitos raciais existentes na sociedade brasileira; 3. ter atitudes com os alunos em relações não discriminatórias e equitativas em sala de aula. O livro didático Influências: representação simplificada dos fatos históricos; estigmatiza segmentos sociais como mulheres, negros, idosos e trabalhadores; reforça estereótipos; invisibilidade dos segmentos sociais desfavorecidos. A importância da diversidade na construção identitária As nossas noções de igualdade e diferença: podem ser valorizadas, codificadas, trocadas e ressignificadas nesse complexo processo que é a formação do sujeito autônomo. Respeito às diferenças, necessário à construção identitária e às trocas simbólicas realizadas. A construção da identidade brasileira precisa passar necessariamente pela realidade da miscigenação e da constituição de nossa cultura a partir de nossas raízes negras, indígenas e europeias, ao mesmo tempo e em igual relevância. Como se constrói a identidade negra no Brasil? Resultado de um longo processo histórico de colonização e escravização do continente africano e de seus povos. “A identidade negra é entendida, aqui, como um processo construído historicamente em uma sociedade que padece de um racismo ambíguo e do mito da democracia racial. Como qualquer processo identitário, ela se constrói no contato com o outro, na negociação, na troca, no conflito e no diálogo. [...] ser negro no Brasil é tornar-se negro.” (UFSCar / NEAB. “Projeto São Paulo Educando pela Diferença para a Igualdade”. Módulo 2, 2004, p. 45) Interatividade Todas as afirmações abaixo expressam alguns motivos pelos quais crianças e adolescentes negros no Brasil encontram dificuldades em construir sua identidade negra, exceto: a) As relações sociais no Brasil são permeadas por imagens e representações estereotipadas dos negros. b) A construção da identidade pressupõe a diversidade,dificultada no Brasil pelo mito da democracia racial. c) As crianças e os adolescentes negros podem construir sua identidade a partir das representações e imagens positivas dos negros presentes na mídia, na literatura, nos livros didáticos etc. d) O projeto nacional de branqueamento trouxe reflexos que persistem até hoje em nossa sociedade de traços tão autoritários. e) Vivemos uma situação paradoxal, em que as leis ditam a igualdade racial, mas o cotidiano revela relações hierarquizadas. Identidade, interação e diversidade: por uma educação cidadã Resumindo: a identidade é um processo construído a partir da interação entre os sujeitos, que, na contraposição de suas diferenças e no respeito a essa diversidade, atribuem significados ao universo simbólico que passa a compor sua visão de mundo, influindo em suas escolhas e nos caminhos que irão percorrer. Professor como figura central de mediação nesse processo: persistência e intencionalidade para optar por valores éticos e uma prática educativa equitativa. Escola e diversidade: a promoção da igualdade racial Todos os envolvidos no processo educacional precisam estar atentos para a desconstrução de estereótipos de raça/cor, para a desmistificação dos mitos raciais existentes na sociedade brasileira. Escola: uso de recursos que possibilitem a ressignificação de conceitos como negro, África, africanos, de modo a transformar, no imaginário coletivo, representações negativas em positivas. “Diferenças e preconceitos na escola” – Julio Groppa Aquino (1. ed. São Paulo: Summus, 1998). Diversidade, livro didático e currículo: desafios para a prática educativa Livro didático: inúmeras pesquisas demonstram que a maioria traz uma representação muito simplificada dos fatos históricos. Isso ajuda a estigmatizar, caricaturar ou reforçar estereótipos de segmentos sociais como mulheres, negros, idosos e trabalhadores, por exemplo. Isso faz com que a criança afrodescendente não tenha parâmetros de igualdade e diversidade para a construção de sua identidade étnico-racial. Invisibilidade, recalque e inferiorização O conceito de recalque (Freud): uma tentativa de esquecer que ocorre inconscientemente. Recalcamos justamente aqueles pensamentos, ideias, lembranças etc. que não se ajustam à imagem ideal que temos do mundo e de nós mesmos. A inferiorização dos seus atributos por meio de estereótipos conduz esse povo a desenvolver comportamentos de autorrejeição, resultando em rejeição e negação dos seus valores culturais e na preferência por estética e valores culturais dos grupos sociais valorizados nas representações. Diversidade e currículo Os currículos são fruto de escolhas políticas e debates calorosos, que incorrem em incluir ou excluir assuntos, disciplinas ou aspectos que nos interessam ou não no processo de formação da criança e do jovem. Lei 10.639/2003: reconhece a necessidade urgente de incluir de uma vez por todas em nossos currículos a problemática das relações étnico-raciais, por meio do estudo da história e da cultura africana e afro-brasileira em todos os níveis escolares, chegando também à formação universitária de professores e professoras. A prática educativa com intencionalidade “Entender o que é a pobreza e como ela afeta de maneira trágica a vida de uma grande parcela da população. Nos posicionar politicamente dentro desse debate e construir práticas efetivas e democráticas que transformem a trajetória escolar dos nossos alunos e alunas negros e brancos em uma oportunidade ímpar de vivência, aprendizado, reconhecimento, respeito às diferenças e construção de autonomia.” (UFSCar / NEAB. “Projeto São Paulo Educando pela Diferença para a Igualdade”. Módulo 2, 2004, p. 7) Interatividade A prática educativa precisa ser desenvolvida com intencionalidade e persistência, com vistas à promoção da igualdade racial. Quais os desafios para os professores nessa prática? I. A desconstrução do mito da democracia racial. II. A simplificação excessiva de fatos históricos apresentados nos livros didáticos. III. A ausência da perspectiva étnico-racial na definição de currículos e conteúdos. Estão corretas as seguintes afirmações: a) I e II. b) II e III. c) I, II e III. d) I e III. e) Nenhuma das anteriores. Escola e a promoção da igualdade racial: estratégias e possibilidades Lei 10.639/2003: todos os envolvidos na instituição escolar estão convocados a promover mudanças estruturais no ensino: reformulação dos currículos, dos projetos pedagógicos, dos planos de aula, de materiais didáticos e paradidáticos; enfim, de toda a prática educativa de modo geral; promover o reconhecimento, o respeito e a garantia das diversidades culturais e, de forma especial, da população afrodescendente no Brasil. Africanidades brasileiras na escola Abordar o tema “africanidades brasileiras” em sala de aula. Três pontos dos princípios da pedagogia antirracista, a saber: 1. respeito às africanidades; 2. reconstrução do discurso pedagógico; 3. estudo da recriação das diferentes raízes da cultura brasileira. A escola e a comunidade Todos os agentes do processo de aprendizagem devem se colocar mais próximos da realidade sociocultural de seus alunos. Isso significa conhecer a comunidade escolar, seu perfil socioeconômico, o entorno da escola, os principais problemas do bairro, da cidade, assim como as principais manifestações culturais da comunidade, arte, música, religiosidade e outros aspectos que aproximem os educadores e educadoras aos alunos e seus familiares. O que o professor e a professora podem fazer? “Incorporar o discurso das diferenças não como um desvio, mas como algo enriquecedor de nossas práticas e das relações entre as crianças. Isso irá possibilitar desde cedo o enfrentamento de práticas de racismo e a construção de posturas mais abertas às diferenças e, consequentemente, à construção de uma sociedade mais plural.” (UFSCar / NEAB. “Projeto São Paulo Educando pela Diferença para a Igualdade”. Módulo 2, 2004, p. 32) O que o professor e a professora podem fazer? Construção de novos afetos, de novas formas de nos relacionar com o diferente, com a diversidade. “É na relação com o outro que constituímos nossa subjetividade, nossas diferenças. Construção de subjetividades outras, livres da clausura causada pelo modelo dito ‘ideal’.” É preciso que os professores se encontrem por meio da pluralidade e diferenciação, livrando-se dessa clausura subjetiva. (UFSCar / NEAB. “Projeto São Paulo Educando pela Diferença para a Igualdade”. Módulo 2, 2004, p. 32) O que o professor e a professora podem fazer? “Repensar a preponderância desse modelo hegemônico de vida (de ser). Escapar de toda essa homogeneização a partir da qual fomos produzidos e com a qual nos acostumamos. Lutar contra todas as formas de ‘assujeitamento’ (uma maneira de modelar as pessoas de uma mesma forma), uma luta contra as forças que nos querem fracos, tolos e servos, além de racistas.” (UFSCar / NEAB. “Projeto São Paulo Educando pela Diferença para a Igualdade”. Módulo 2, 2004, p. 32) Para concluir: o que você pode fazer? Mudança de discursos e de práticas. Respeito à pluralidade. Novas relações interpessoais, mais afetuosas, profundas e significativas. Uma subjetividade livre de clausuras e modelos preestabelecidos. Crítica ao atual modelo hegemônico de homogeneização e “assujeitamento”. Recriação de novos sentimentos e reconhecimentos, especialmente em relação a si mesmo, em um movimento de respeito a toda forma de diversidade.Interatividade A partir da vigência da Lei 10.639/2003, todo professor precisa encontrar estratégias para uma educação para a igualdade racial. As alternativas abaixo apresentam algumas dessas possibilidades, exceto: a) Reformulação dos projetos pedagógicos, dos planos de aula, de materiais didáticos e paradidáticos. b) Estabelecer uma relação mais afetuosa e significativa com os alunos e sua família. c) Conhecer os problemas do bairro e do entorno da escola, garantindo uma relação escola-comunidade. d) Preparar os alunos para se adequarem aos modelos sociais estabelecidos e ao ideal de vida moderno. e) Respeitar todas as diferenças e incentivar a diversidade cultural. ATÉ A PRÓXIMA!
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