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1º Bimestre Aula 1 A expressão filosofia jurídica nasceu de fato entre os filósofos, mais exatamente entre os pensadores alemães do final do séc. XVIII e do início do séc. XIX que, estudando o problema da moralidade, acabaram colocando o Direito como um fenômeno distinto da ética. Essa distinção entre direito e ética apareceu principalmente nas obras de dois filósofos: Kant (Metafísica dos Costumes) e Hegel (Princípios de Filosofia do Direito). Essa origem histórica faz com que muitos juristas até hoje considerem a filosofia jurídica como uma parte da filosofia voltada para a especulação teórico-abstrata sobre a ideia do Direito. Porém, veremos a filosofia jurídica como uma disciplina jurídica, prática e peculiar. A filosofia jurídica foi desenvolvida por juristas, especialistas em direito positivo, que seguindo o exemplo de kant e Hegel, acabaram pesquisando o direito em separado. Entre esses juristas, merecem destaque: o advogado inglês John Austin, o juiz norte-americano Oliver W. Holmes Jr., o legislador e juiz Hans Kelsen, Norberto Bobbio, Herbert L. A. Hart., o constitucionalista alemão Robert Alexy, Ronald Dworkin, Miguel Reale, Tercio Sampaio Ferraz. A filosofia jurídica não é “contemplação especulativa” perante o Direito. Ela é, antes, uma atitude ou atividade dos juristas. Tema do ano: O discurso do “juridicamente correto” (suas origens, suas características e seus desafios para a prática). Aula 3 Em termos históricos, desde a Antiguidade Clássica já existia uma associação entre direito e correção. O direito = o correto Na cultura greco-romana, foi construída a associação entre lei e razão. Essa razão não correspondia à simples racionalidade humana (essa razão era uma força imanente do universo que se manifestava na ordem natural das coisas). E essa razão não apenas determinava o campo físico da vida humana, mas também orientava o homem em todos os aspectos da sua conduta, determinando as ações corretas e as ações não corretas. Não é possível, portanto, pensar em um direito incorreto nas origens da cultura ocidental. Dentro desse discurso clássico, não havia uma preocupação específica com um juridicamente correto. O processo de especificação do juridicamente correto apenas teve início no final da Idade Média. Nesse período, a cultura cristã consolidou duas novas ideias: a visão do Cosmos como uma criação da vontade divina e a nova visão do Ethos como obediência, vontade que determina o bem comum. A cultura cristã criou uma divisão entre os seres superiores e inferiores, havendo assim uma hierarquia. O mundo temporal tem de acompanhar aquilo que “vem de cima”. Isso altera a ideia de lei dentro da cultura medieval. A lei agora não é um fenômeno imanente, que está dentro da vida humana, ela agora vem de um lugar acima dos homens. Agora ela pode ser pensada como a vontade do governante. Algumas leis aparecem no campo da religião, outras leis aparecem no campo da moral, e outras no campo da política. Essas divisões são visíveis em particular no século XIII na obra do cristão São Tomás de Aquino Lei humana: ordenações particulares que o homem estabelece sem desrespeitar as demais leis Lei natural: ordenações comuns da Razão divina que o homem conhece por meio da razão humana. Lei divina: ordenações comuns da Razão divina que Deus revelou ao homem (Novo e Velho testamento) Lei eterna: razão divina que governa o universo Lei: ordenação da razão direcionada ao Bem Comum A transformação moderna Contexto social da transformação: Renascimento Reforma protestante Filosofia moderna Ciência moderna O renascimento trouxe uma nova ideia de dignidade da pessoa humana. A reforma protestante acrescentou a essa ideia uma nova visão da liberdade, que foi desenvolvida pela filosofia e pela ciência como uma prioridade da razão humana sobre todos os fenômenos. De tal forma que entre os séculos XVI e XVII a lei natural passa a ser a lei completamente racional. Separação 1: Direito natural =/= Teologia moral Leis naturais são leis da razão para a liberdade do homem. Direito se torna autônomo à teologia. Separação 2: Justiça (ação justa) =/= Virtude (ação virtuosa) A justiça atua na vida pública, enquanto a virtude atua na vida privada, um não podendo interferir no outro. Separação 3: Direito =/= Ética A doutrina do direito de Kant Na obra de Kant, a Moral em sentido amplo cobre todas as leis da razão para a liberdade. A ação correta é ação que se adequa às leis da liberdade. Dentro do campo da Moral, a Ética (moralidade em sentido estrito) tem sua diferença específica na exigência de que a própria lei ou o dever dela decorrente constitua o “móbil determinante do arbítrio”. A partir do final do séc XVIII, dentro da cultura Iluminista, a Moral não é considerada como um simples conjunto de crenças subjetivas e relativas, pertencentes a cada indivíduo. Essa separação entre direito e ética distinguiu o “juridicamente correto” (ação de acordo com a legislação jurídica) e o “eticamente correto” (ação de acordo com a legislação ética). Compreender a moral no mundo moderno é compreender a diferença entre tais padrões. Segundo Kant, a diferença específica entre Ética e Direito está no papel que a lei exerce ao determinar o arbítrio. A outra espécie da Moral, ao lado da Ética, é o Direito, que não se diferencia por apresentar uma legislação de conteúdo diferente, mas simplesmente por admitir (possibilidade) ou mesmo exigir (necessidade) um “móbil diferente do respeito pela lei”. Nesse sentido, o que diferencia o juridicamente correto é a exterioridade. Os deveres do direito são deveres externos. O Direito não é uma questão de consciência, o Direito é um fenômeno externo da vida humana, que se manifesta em alguns elementos exteriores, como por exemplo, a coerção. Três principais critérios de distinção entre as legislações: Forma da ação – A ação é cumprida por puro respeito ao dever Caráter da obrigação – A obrigação ética não pode ser externa Caráter da liberdade – A liberdade ética é a liberação do interior da consciência individual Immanuel Kant - “O que é o Direito? O Direito é o conjunto de condições sob as quais o arbítrio de cada um pode conciliar-se com o arbítrio de outrem segundo uma lei universal de liberdade. A lei universal do Direito é: age exteriormente, de modo que o livre uso de teu arbítrio possa se conciliar com a liberdade de todos.” O aparecimento dessa questão específica sobre o que é o Direito não traz apenas autonomia para a área jurídica, ela também traz uma dúvida que não tinha aparecido antes: se o Direito é um fenômeno exterior, que aparece na vida social, em especial quando há coerção, então toda situação de coerção é Direito? Basta ter coerção para ser juridicamente correto? Quais são afinal os elementos exteriores do Direito? Enfoque Fático O critério de identificação do direito está em fatos sociais “Imperativo Jurídico” (John Austin) Nesta obra, Austin discute o que é o direito de um modo muito específico, traduzindo a pergunta como “o que é uma lei jurídica?”. Sempre existe confusão entre a lei positiva e a moralidade, e entre a lei positiva e a lei divina. Austin propõe o método na análise conceitual, ou seja, ele propõe que o estudo da lei jurídica seja feito por meio de distinções e separações de conceito. Diferenciando a lei jurídica em sentido próprio e estrito perante outros conceitos de lei. Por meio da análise, o conceito mais próprio das leis jurídicas se revela como o conceito de comando. O que uma lei jurídica traz que outras leis não trazem é uma situação social composta por três elementos. Características Manifestação de um desejo Feita entre seres racionais Quando um deles é superior, ouseja, tem a possibilidade de infligir um mal ou um sofrimento. Fato social que define a lei jurídica: a vontade do soberano político “Realismo Jurídico” (Oliver W. Holmes Jr.) A teoria elaborada pelo juiz Holmes, no final do séc XIX lembra muito a teoria do direito como comando proposta por Austin. Holmes também quer responder o que é o direito com fatos sociais e esses fatos estão ligados ao comando do poder político. Porém, Holmes entende que esses comandos não vêm do legislador abstrato, e sim dos juízes. Logo, a compreensão do direito com fatos sociais envolve a previsão do comportamento dos juízes. Portanto, conhece o direito quem sabe predizer o que os tribunais farão de fato. Ele chamou essa visão de Realismo Jurídico.
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