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BASILE MARCELLO o Imperio Brasileiro

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PARTEB
CONSOLIDAÇÃO E CRISE DO IMPÉRIO
Aprimeira dessas reformas referia-se ao tráfico negreiro transatlântico. Deci-
o apôr fim ao comércio de escravos africanos que só crescera desde oBillAberdeen,
,'vemo inglês aumentou, ao longo de 1849, a sua esquadra encarregada de comba-
,00 tráfico nas proximidades da costa brasileira e, em 22 de abril de 1850, deu or-
ns para que a mesma não limitasse mais suas operações apenas ao alto-mar, po-
ndo penetrar em águas territoriais e inclusive nos portos brasileiros para dar bus-
apreender ou afundar embarcações negreiras. Seguiu-se uma série de inciden-
'ao longo da costa brasileira, havendo até troca de tiros entre um brigue de guerra
'tânico e o forte de Paranaguá. A ação ostensiva inglesa mais uma vez causou uma
neralizada indignação popularno Brasil, como um atentado que era à soberania
iõhal; falou-se até em guerra contra a Inglaterra. Pressionado, por um lado, pela
:õcfê potência mundial da época e, por outro, pela opinião pública do país, o go-
mo conservador brasileiro buscou uma soluçãü-d~compLOmisso:~eliminar..o tráfi-
negrciro afro-brasileiro, mas não por meio de um novo tratado com a Inglaterra-
que'denotaria fraqueza e sujeição -, e~simpela cr}aç!.o de uma lei brasileira - o que
, ria a entender que a iniciativa e a decisão partiram do governo imperial, de acordo
,mos interesses nacionais. Em 12 de julho de 1850, Eusébio de Queiroz apresen-
üàCâmara um projeto de lei que abolia o tráfico negreiro para o Brasil, tornando-o
alente à pirataria e estabelecendo tribunais marítimos especiais para julgar os
os "de infração. Aprovado rapidamente na Câmara e no Senado, converteu-se na
Ide 4 de setembro de 1850. Aplicada com rigor, o tráfico de fato chegou ao fim; em
51, desembarcaram no Brasil apenas três mil, duzentos e oitenta e sete escravos
'canos, contra oitocentos no ano seguinte, ocorrendo em 1855 o último desem-
'que registrado (noventa escravos). A repressão feita pelo Governo - facilitada,
,rcerto, pelas reformas centralizadoras de 1840 e 1841 - recaiu essencialmente
bre os traficantes, julgados pela Auditoria da Marinha, com recurso ao Conselho
Estado, ao passo que os compradores, julgados pelo júri, ficaram, assim, pratica-
ente livres de qualquer punição. A partir daí, o tráfico negreiro somente se realiza-
internamente, entre as províncias, verificando-se umain-tensificação progressiva
transferência de escravos de regiões em crise, como o Nordeste, para áreas mais
issoras, como o Vale do Paraíba e o Oeste Paulista.
Asegunda reforma promovida pelo gabinetesaquaremaestava intimamente re-
ionada com o problema diretamente colocado pelo fim do comércio de escravos
ricanos: o suprimento de mão-de-obra para as grandes fazendas, sobretudo para
~~er a expansão cafeeira. Como a população escrava dependia de influxos exter-
s para crescer, já que o seu índice de mortalidade era maior do que o de natal ida-
,e como a mão-de-obra nacional era descartada, por ser considerada desqualifica-
, a~~~~o só poderia ser a imigração de trabalhadores estrangeiros (particular-
ente e.uropeus) para o Brasil. Isto, por sua vez, implicava o estabelecimento de
~põIí~ica de terras que as tornasse inacessíveis a esses imigrantes, pois, caso con-
-~"ao chegarem ao Brasil, não iriam estes, trabalhar para os grandes fazendeiros,
~~ara eles mesmos, nas terras que logo adquiririam. Por outro lado, havia tam-
'~~ma necessidade urgente de definir um novo regime de acesso e posse das ter-
~Jaque o sistema de sesmarias dos tempos coloniais havia sido suspenso desde 17
Julho de 1822 e nenhuma lei congênere o havia substituído até então. Neste con-
to, uma lei de terras fazia-se premente, visto ser preciso regularizar não só as an-
A HEGEMONIA SAQUAREMA
O govern? con~ervador que diri~iu a ~~íti~ajmperial a partir de setembro de1848 fOIo mais forte que teve o Impeno até então, sobretudo depois da refor-
mulação realizada um 8 de outubro de 1849, quando o visconde de Monte Alegre,
José da Costa Carvalho, substituiu Araújo Lima na Presidência do Conselho de Mi-
nistros. Reúne-se, então, respectivamente nas pastas da Justiça, da Fazenda e dos
Estrangeiros, ~ célebre "trindade saquarema" - Eusébio de Queiroz Matoso da Câ-
mara.joaquim josé Rodrigues Torres (futuro visconde de Itaboraí) e josé Soares de
Sousa (depois visconde de Uruguai): Er~m estes os principais líderes dos saquare-
mas, denominação que se referia, fundamentalmente, a um grupo de políticos con-
servadores da província fluminense ligados à cafeicultura, mas que logo se generali-
zou de forma a abranger os políticos conservadores de todo o Império.
Como destacou limar Rohloff de Mattos, em trabalho fascinante, I foi este gru-
po que, afirmando-se como classe dirigente, logrou estabelecer a sua hegemonia po-
lítica, ao integrar os conservadores de todo o Império e conseguir, por meio da força
e do consenso, que os liberais afinal aderissem ao princípio da ordem. À frente de_~
governo coeso, contaram os saquaremas com o apoio de uma Câmara conservadora-
mente homogênea (havia apenas um único deputado liberal) e de um Conselho ~e
Estado também afinado com seus interesses, no qual sobressaíam Bernardo "~.;;
de Vasconcellos e Honório Hermeto Carneiro Leão. Desta forma, tiveram a._orça
necessária não só para reprimir, com sucesso, o derradeiro ato de rebeldia liberal-o
movimento praieiro -, como também para promover uma série de reformas bast,"'"
246 te polêmicas que completariam a obra do Regresso.
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tigas sesmarias, que estavam em situação jurídica caótica, como as posses ilega],
mente efetuadas desde 1822, sobretudo aquelas grandes concentrações resultan_
tes da expansão cafeeira.
Somente em 1842 o problema foi enfrentado pelo primeiro gabinete conse-,
vador formado após aMaioridade, que solici tou ao Conselho de Estado que elaboras_
se uma proposta de legislação sobre regime de terras e colonização. O projeto, que
tinha Bernardo Pereira de Vasconcellos como relator, e era inspirado no plano de E.
G. Wakefield para a colonização e ocupação de terras na Austrália, foi apresentado
com algumas modificações, pelo então ministro da Marinha Rodrigues Torres à Câ-
mara dos Deputados, em 10 de junho de 1843, e propunha: a aquisição de terras de-
volutas somente por meio da compra em dinheiro, com pagamento à vista e sõ6ãi:
tos preços; a revalidação das sesmarias concedidas até julho de 1822 e a legitimação
das posses de mais de um ano e um dia feitas desde então; a exigência de registro õe
todas as terras dentro de um prazo de seis meses, sendo confiscadas as propriedades
de quem não fizesse a declaração dentro de seis anos; a medição e a demarcação de
todas as terras, sob pena de serem consideradas terras devolutas; a criação de uma
taxa de revalidação (direito de chancelaria) e de um imposto territorial sobre às
ras, as quais seriam confiscadas caso o imposto não fosse pago por três anos, conse-
cutivos ou não; a aplicação dos recursos provenientes da venda de terras no financia-
mento da imigração. O projeto causou grande polêmica na Câmara, não tantopelâs
medidas relativas ao suprimento de mão-de-obra (embora a imigração só interessas-
se, naquele momento, aos cafeicultores fluminenses), mas sobretudo pelas medi-
das que acarretariam despesas e perdas aos proprietários, como as de teor tributário,
as exigências de medição e demarcação, e as cláusulas de expropriação. Conforme
assinalou José Murilo de Carvalho, aos não fluminenses, o projeto parecia pretender
uma socialização de custos euma prioatizaçâo de benefíciospor parte dos cafeicultoresfluminen-
ses.Apesar das controvérsias que gerou, o projeto foi aprovado na Câmara semgran-
des modificações, e enviado ao Senado em outubro de 1843, onde permaneceu es-
friando durante todo o qüinqüênio liberal, só sendo reaquecido pelo gabinete saquare-
ma de 1848. Após serem suprimidas algumas daquelas disposições mais polêmicas,
como o imposto territorial e a expropriação de terras (substituída por multas), o
projeto finalmente passou pelo Senado, voltando para a Câmara, onde foi rapida-
mente aprovado, tornando-se a Lei 601 de 18 de setembro de 1850, sancionada ca-
torze dias depois da lei de abolição do tráfico negreiro.
Mas, ao contrário desta, a chamada Lei de Terras sofreu sempre todQ.tipo de
resistência dos proprietários ao se tentar colocá-Ia em prática. A maioria das sesma-
rias e das posses permaneceu sem revalidação e Iegitimação; as terras públicas con-
tinuaram a ser ocupadas ilegalmente; nunca veio a ser obedecida a determinação de
que as posses, para serem reconhecidas, deveriam, no máximo, igualar-se em ta~a-
nho às últimas sesmarias concedidas; grande parte das propriedades não foi medld~,
demarcada e registrada, ou foi de maneira imprecisa; as multas freqüentemente n~o
eram pagas; e as províncias pouco informavam sobre suas terras devolutas. Além dIS-
so, o objetivo da lei de atrair imigrantes europeus resultou em relativo fracasso, de-
vido às melhores condições (doação de pequenos lotes de terra, com qualidade su;
p_~!~el~~~~st:~:_~:"~~~~~I~~~~~~aed~~T~~~~:~~~~~~:~~:~~~:!~:::;e:;4~
de 1862. Nas palavras de José Murilo, a Lei de Terras, que não deixou de represen-
r um avanço em relação a suas propostas regulamentadoras, sofreu o veto dos barões.
ta .. bé às camad d b .Mas, por outro lado, ela mesma se consutuiu tam ~m em u~ veto as cama as e al-
condição social quanto ao acesso à terra, cumpnndo, assim, o seu papel de preser-
var e de favorecer a concentração fundiária nas mãos dos detentores de capi~al.
Outra das reformas saquaremas foi a que, em 19 de setembro de 1850.,modificou
Guarda Nacional. A pretexto de acabar com a desorganização da instituição a nível
~õcal,admitida por conservadores e por libe~ais, efetuou-se uma reforma que a colo-
cou sob o forte controle do governo central. E suprimido o princípio e1etivo para o ofi-
cialato, e o ministro da Justiça - que desde o início já nomeava os coronéis-chefes e
majores de legião da cidade e da província do Rio de Janeiro (nas demais províncias, as
nomeações eram feitas pelos presidentes) - passa, então, a nomear, com base nas pro-
postas dos respectivos comandantes, todos os oficiais da corporação (à exceção dos
suboficiais e oficiais de companhia, nomeados pelos comandantes de sua unidade e
pelos presidentes de província, respectivamente). Além disso, as atribuições do Go-
verno multiplicaram-se, indo desde a organização especial das unidades nas províncias
de fron teira até a aprovação do número e do fardamento dos componentes das bandas
de música. Dentro ainda do propósito de eliminação da ingerência das autoridades
sujeitas ao poder local sobre o comando da Guarda, sua instância imediata de subordi-
nação deixou de ficar a cargo dos juízes de paz e juízes criminais, passando a estar dire-
tamente submetida, nos lugares fora da Corte e das capitais provinciais, à autoridade
policial mais graduada. A renda para o ingresso na Guarda foi uniformizada em duzen-
tos mil-réis e a idade mínima baixou para dezoito anos.
Dentre esta série de reformas deve ser mencionado, ainda, o Código Comer-
cial do Império do Brasil, promulgado em 25 de junho de 1850 e até hoje em vigor. O
Código sistematizava e atualizava a confusa legislação comercial anterior, em boa
parte procedente da época colonial. Arrastando-se pela Câmara e pelo Senado des-
de 1834, ao ser promulgado veio prontamente regulamentar a febre de negócios
provocada pela liberação de capitais até então aplicados no tráfico negreiro e pelo
notável crescimento dos investimentos estrangeiros (sobretudo inglês e francês)
no país, particularmente no Rio de Janeiro. Enquan to de 1830 a 1850 o Governo ha-
via autorizado o funcionamento de apenas dezessete companhias, deste último ano
até 1860 este número subiu para cento e cinqüenta e cinco, destacando-se aí os se-
tores bancário e de serviços públicos de infra-estrutura urbana. Daí a importância da
regulamentação das sociedades anônimas feita pelo Código.
Por tudo isso, o ano de 1850 é visto pela historiografia como um marco decisivo
no processo de consolidação do Estado ImperiaT;-para o que se mostr-;~e funda-
mental importância a hegemonia saquarema. Esta, como assinalou limar Rohloff de
Matt?s, não se limitou ao gabinete instituído em setembro de 1848, continuando
no m~nistério conservador que o sucedeu, o de 11 de maio de 1852, presidido por
Rodngues Torres, e no célebre Ministério da Conciliação, formado em 6 de setembro
de 1853, sob o comando de Honório Hermeto Carneiro Leão, visconde e depois
marquês de Paraná. O Tempo Saquarema ainda se prolongaria pelos três gabinetes
~onservadores seguintes (presididos, respectivamente, pelo visconde de Abaeté,
Angelo Ferraz e marquês de Caxias), só chegando ao fim com o renascer liberal marca-
d~elo ministério de2::J..de~marco de 1862~.__ ~ _ 249
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POLÍTICA EXTERNA NO PRATA:
A GUERRA CONTRA ORIBE E ROSAS
\
Resolvidos os conflitos internos e realizadas as reformas pendentes o 1m ,.
derá - I ' penopo era, entao, vo tar novamente sua atenção para assuntos externos que desd
I .. bi de i e ostempos co oruais eram o jeto e interesse e desentendimentos, nomeadame t
aqu~le~ r~l~cionados à região plat,i~a. En:re as décadas de 1850 e 1870 o Imp~i:
brasileiro na desenvolver uma política de intervenções militares no Prata, que terá
início na guerra contra Oribe e Rosas (1851-1852) e terminará com a Guerra do Pa-
raguai (1864-1870), passando pela campanha contra Aguirre (1864-1865). Confor-
me destacou José Luiz Werneck da Silva, a política externa do Brasil Imperial foi
marcada, de um lado, por uma face de relativa dependência e submissão em relação
à Inglaterra e, de ou tro, por uma face de interferência e dominância relativa perante
as questões platinas; faces estas que se articulavam, dada a consonância muitas ve-
zes observada entre os interesses político-econômicos ingleses e brasileiros no to-
cante ao Prata, como na sustentação das divisões políticas e territoriais existentes,
na defesa da liberdade de navegação nos rios Uruguai, Paraguai e Paraná, e na prote-
ção e no fomento aos capitais dos dois países que penetravam, não raro associados,
na região.
A primeira dessas intervenções tem origem na postura cada vez mais agressiva
e ameaçadora do governador da província de Buenos Aires, juan Manuel de Rosas,
em relação ao Uruguai e ao Paraguai, possivelmen te pretendendo reconsti tuir o an-
tigo Vice-Reino do Prata; na postura desfavorável ao Brasil do governador de Mon-
tevidéu, o blanco Manuel Oribe, aliado de Rosas; e na política intevencionistasaqua-
rema desenvolvida pelo ministro dos Negócios Estrangeiros Paulino Soares de Sou-
sa, tendente a impor o domínio brasileiro na região, para assegurar a satisfação dos
interesses platinos do Império. Até 1850 o Brasil, ainda inteiramente voltado para a
resolução de seus conflitos internos, procurou manter uma posição de neutralidade
e não-ingerência acerca das questões do Prata. Mas, a partir daquela data, com a
efetivação da hegemonia saquarema e o fracasso da intervenção franco-britânica
(1845-1850) contra Rosas, o Império irá adotar uma política agressiva na região. Te-
mia-se, então, que o caudilho argentino, sentindo-se fortalecido pelo confronto
bem sucedidocom as potências européias, e já controlando o Uruguai, levasse
adiante o seu expansionismo em direção ao Paraguai, cuja Independência não reco-
nhecia, e, quiçá, ao Rio Grande do Sul, sobre o qualjá demonstrara viva ambição (em
1843, Rosas, interessado em uma separação que enfraqueceria a província, recusara
um pedido de colaboração do Império para combater a Farroupilha). Da mes~a ~or-
ma, Oribe, além de aliar-se a Rosas, criava entraves aos vultosos negócios braSileiros
em Montevidéu (sobretudo a cargo de Irineu Evangelista de Sousa) e impedimen-
tos para que os estancieiros brasileiros que também tinham propriedades no Uru-
guai, passassem seu gado pela fronteira rumo às suas estâncias no Rio Gran~e do
Sul, gerando uma série de inciden tes na área. Decidido a derru bar os dois caudtlhos,
o Império firmou alianças com o Paraguai, presidido por Carlos Antonio Lópe~, e
com os inimigos políticos de Oribe e Rosas em seus próprios países - respectl~a-
mente, Frutuoso Rivera, chefe do Partido Colorado (que se opunha ao Partido
- .-.-.-----. _ •.•_:_~_da
bém o apoio de outra província argentina, Corrientes. Irineu Evangelista de Sousa
dispôs-se a financiar a resistência uruguaia à Oribe em Montevidéu. A estratégia
brasileira era atacar primeiro Oribe para, depois de vencê-Io, derrotar Rosas. E as-
sim foi feito, contando as forças brasileiras com Caxias, à frente do Exército, e com o
almirante inglês Grenfell, no comando da Marinha. Oribe foi facilmente derrotado
aindaem 1851 e Rosas pouco depois, na batalha de Monte Caseros, em 3 de feverei-
ro de 1852.
Com isso, o Império estabeleceu seu domínio ostensivo no Prata, que iria se
prolongar durante todo o terceiro quartel do século. O Uruguai foi colocado na con-
dição de um semiprotetorado brasileiro, sendo-lhe imposto cinco tratados - um de
aliança, que garantia sua Independência, mas previa a intervenção brasileira, a pedi-
do do governo legal uruguaio, e outros quatro de limites, comércio e navegação, ex-
tradição e subsídio, que asseguraram a delimitação das fronteiras segundo a vontade
brasileira, a liberdade de iniciativa para Evangelista de Sousa, a exploração brasileira
das pastagens do Uruguai e o controle das finanças públicas uruguaias. A Confede-
raçãoArgentina ficou também sob certo controle, recorrendo Urquiza aos emprésti-
mos de Mauá e do governo brasileiro, permitindo a livre navegação e o comércio re-
gular, aceitando a ingerência brasileira sobre o Uruguai e reconhecendo a Indepen-
dência do Paraguai. E deste obteve o Brasil um tratado de navegação e comércio e
uma convenção de limites. Apesar de tudo, o domínio brasileiro era incerto, e novas
demonstrações de força seriam mais tarde necessárias para rnantê-lo.
A CONCILIAÇÃO
A direção saquarema reafirmou-se no Ministério da Conciliação.., uma composição
conjunta de conservadores e liberais à frente do Governo, sob as diretrizes dos pri-
!f!eiros. Além da própria participação de políticos dos dois partidos no mesmo gabi-
nete, o principal aceno de abertura para os liberais consubstanciou-se na proposta
de reforma eleitoral que procurou garantir a representação das minorias. As sucessi-
vas revoltas políticas que desde os tempos regenciais abalavam o Império, sobretu-
do a última delas, a Praieira (o principal artífice da Conciliação, Honório Hermeto
Carneiro Leão, fora presidente de Pernambuco após o malogro do movimento), en-
sinaram aos conservadores que o alijamento duradouro dos liberais do poder coloca-
va em risco a estabilidade do sistema e a própria unidade do país. A reforma que pro-
punha a chamada Lei dos Círculos Eleitorais (ou distritos) consistia na introdução
de dois pontos centrais: o voto distrital único e as incompatibilidades elêitõrais. O
primeiro, ao acabar com a circunscrição eleitoral única por província e dividí-la em
div~rsos distritos eleitorais, cada qual representado por um deputado, conferiu
mais força aos potentados locais, favorecendo sua ascensão em detrimento dos líde-
ré~partidários nacionais e dos presidentes de província, tornando-se, assiffi:uma
for~a de romper o monolitismo das grandes bancadas provinciais e permitir uma
maIOrdiversidade e autenticidade da representação. Já o segundo ponto visava re-
duzir a influência do Governo sobre o resultado das eiêiçõeserestringir õêfomínio
e~ercido pelos funcionários públicos, especialmente os juízes, na Câmara dos De-
pUtados, ao tornar inelegíveis, nos distritos em que exercessem suas funções, os
funcionários nÚblic.o.sLdeutr.eos ouaís.nresidences de.nroví ncia. secretários mo~in.... 2<;
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ciais, inspetores gerais da fazenda pública, comandantes das armas, juízes de p
de direito e municipais, chefes de polícia, delegados e subdelegados. Outra novi:~
de proposta era a eleição de um suplente para cada deputado. Como era de se e; a
rar, a lei provocou grande polêmica no Parlamento, só sendo promulgada, em 19P;;
setembro de 1855, graças ao empenho de Paraná, que a tratou como "questão ._
. . I" mlnlstena .
Os efeitos da leijá se fizeram notar nas eleições de 1856, quando se registro
uma ampla renovação da Câmara (67%), com o decréscimo do número de funcioná~
rios públicos eleitos (e o aumento do de profissionais liberais) e com um crescimen_
to elevado da quantidade de lideranças locais, algumas vezes suplantando nomes de
maior projeção (como é o caso do filho de Paraná, qerrotado, em um distrito de Mi-
nas Gerais, por um padre desconhecido nacionalmente). Diante de tamanho im-
pacto, a lei foi ai terada já em 18 de agosto de 1860, passando os distri tos a eleger três
deputados, ao invés de um. Mesmo assim, com círculos de um ou de três deputados,
a reforma eleitoral conseguiu o seu maior intento: garantir a representação da oposi-
ção, no caso, os liberais, cujo número de deputados aumentou consideravelmente
nas legislaturas de 1857-1860 e 1861-1863, apesar de persistir a maioria conserva-
dora. Com isto, abrira caminho para a virada liberal de 1862.
Além da reforma eleitoral, oMinistério da Conciliação também procurou reorde-
nar a vida financeira do Império, recriando, pela terceira vez, em 1853, o Banco do
Brasil, que passou novamente a deter o monopólio das emissões de dinheiro e de tí-
tulos do Governo, o que desde meados do período regencial vinha sendo feito por
bancos regionais.
O espírito da Conciliação foi muito bem traduzido pelo jornalista e político con-
servador [ustiniano José da Rocha, em seu notável panfleto Ação; Reação; Transação,
publicado em 1855. Embuído de uma visão cíclica, de sentido evolucionista, da his-
tória política do Brasil Imperial, justiniano a entendia como a sucessão de uma eter-
na luta entre os princípios da Autoridade e da Liberdade, produzindo, progressiva-
mente, momentos de Ação -democrática (no período entre 1822 e 1836) -, de Reação
-monárquica (de 1836 a 1852) e de Transação - entre os dois princípios (iniciado em
1852 e ainda em curso quando da escrita do texto). Para [ustiniano, se aAção demo-
crática, partindo do medo e da suspeita em relação ao poder, aniquilara, por seus ex-
cessos, a autoridade, a Reação monárquica, partindo do medo e da aversão à anarquia,
e também pecando por excessos, aniquilou a liberdade; era indispensável, porta,nto,
se ter liberdade como condição da ordem, ordem como condição da liberdade. Em sua visão, a
sociedade brasileira havia chegado agora a um período de maturidade política, liv~e
de ódios e de paixões radicais, próprio, portanto, para o advento de uma transaçao
que teria em vista apenas as necessidades públicas e o bem comum, independ~~te
departidos. Era evidente, assim, o seu obj.f:tÍ.YQ..ap.olog~t.teo·defortalecer a poht~ca
concilia~a cf~Paraná. Mas Justiniano não deixava de reconhecer que, a despelt.o
ãsPromessas entusiastas, esta política fora, até 1855, infecunda quanto a prodUZir
uma transação efetiva, aludindo, neste ponto, ao autoritarismo e à concentração de
poderes do ministério, particularmente do chefe de gabinete. Apesar disso, mostra-
va-se confiante de que, no decorrer de 1855 e de 1856, o equilíbrio necessário entre
os princípios democráticos e monárquicos (a Transação) seria alcançado, evitan-
252 do-se, assim, o retorno aos períodos sucessivos de Ação e de Reação.
Todavia, no mesmo ano de 1855, justiniano romperia com Paraná, pronuncian-
do em 19 de maio, um duro discurso contra este na Câmara, em que atacava a sua po-
rtica personalista, acusando-o de despótico e o responsabilizando pelas prisões ar-
~itrárias que vinham sendo cometidas. Uma semana depois, faria um emocionado
ronunciamento autobiográfico na Câmara, onde destacava a coerência de sua tra-
~tória política, como jornalista e deputado, e os serviços que prestara ao Partido
bonservador, sem deixar de mencionar alguns pequenos favores oficiais que rece-
bera em troca (tais como verba para financiar seus jornais e escravos apreendidos no
contrabando de africanos). Era o fim da curta carreira política de Justiniano; concluí-
do o seu mandato, não seria mais reeleito.
Mesmo sendo ridicularizadas por Paraná, as críticas feitas por [ustiniano vie-
ram ao encontro do que muitos pensavam a respeito da conduta personalista do pre-
sidente do Conselho de Ministros. Mas, além disso, a Conciliação desagradava tanto
a liberais como a conservadores intr~ntes, pois, enquanto estes a viam como
um sinal de fraqueza do partido e do Governo, aqueles a encaravam como uma ma-
nobra política para encobrir suas idéias e enfraquecer o Partido Liberal. O principal
adversário do gabinete, o conservador Ângelo Ferraz, defendia justamente o emba-
te de idéias e de princípios como a essência do governo representativo, sustentando
que a pluralidade de partidos era necessária para que um fiscalize e contenha o ou-
tro. No entanto, não pretendia a Conciliação eliminar os partidos e a diversidade de
opiniões, mas não se pode negar que havia um sentido de reduzir as'margens de con-
flito e de cooptar os liberais sob uma direção conservadora. Como afirmou Francisco,
Iglésias,foi antes a conciliação de homens que de princípios. ••. -
Amorte de Paraná, em 3 de setembro de 1856, abalou ainda mais a política da
Conciliação. Seu substituto na presidência do Conselho de Ministros, o marquês de
Caxias, e menos ainda o sucessor deste, o marquês de Olinda, não conseguiram revi-
gorá-Ia, apesar de manterem o discurso conciliador e de seus gabinetes permanece-
rem mistos. Enfrentaram uma oposição ainda mais acirrada, sobretudo da parte dos
conservadores, que perdiam espaço para os liberais, pesando sobre estes ministérios
a acusação de indefinição política. A crise financeira que voltou a assolar o Império a
partir de 1857 constituiu outro objeto de severas críticas ao Governo, gerando insa-
tisfação inclusive dentro do próprio ministério Olinda; isto porque o ministro da Fa-
zenda, o liberal Bernardo de Sousa Franco, em 1858 recorreu a um novo empréstimo
externo, contraído com a casa bancária inglesa Rothschild, e, em face da carência de
moeda circulante e à falta de recursos do Banco do Brasil, decidiu permitir a vários
bancos regionais o direito de emitir, aumentando, assim, o custo de vida e a especu-
lação. Afalta de unidade política do ministério, somado à crescente oposição da Câ-
mara e do Senado, determinou a sua queda, em 12 de dezembro de 1858.
h . O I~pera~or, que sempre fora um entusiasl&. da Conciliação,_percebe que não
avia mais condições de sustentá-Ia, e decide manter os conservadores no Governo,
q~e C~ntavam com ampla maioria parlamentar. Segue-se, então, uma sucessão de
t~es ministérios conservadores, o primeiro dos quais presidido pelo ex-liberal Anto-t Paulino Limpo de Abreu, visconde de Abaeté, vindo depois os gabinetes de
d gelo Ferraz e do marquês de Caxias. Mas, sem condições efetivas de governabili-
ade, não se manteriam no poder por muito tempo. Além da persistência do proble-
~a financeiro, a ol2osição liberaLcrescera significativamente com as eleições de 22,
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1860, quando voltaram à Câmara vários liberais históricos; entre eles, Theophilo
Ottoni, que levou o povo de volta às ruas na Corte, com sua campanha simbolizada
pelo uso do lenço branco, e que redigiu, na ocasião, a famosa Circular Dedicada aos
Srs. Eleitores de Senadores pela Provincia deMinas-Geraes, causando grande repercussão
no país. Embora os conservadores ainda obtivessem, de início, a maioria parlamen_
tar, esta de pouco lhes adiantaria, pois estavam agora divididos entre as lideranças
tradicionais, mais afeitas ao antigo espírito partidário, e as novas, mais moderadas.
Herdeiros da Conciliação, irão estes dissidentes aliar-se aos liberais históricos, tam-
bém descontentes com a orientação que seu partido vinha seguindo, formando, as-
sim, em princípios de 1862, a Liga Progressista. Sem sustentação política, e diante
da moção de censura ao gabinete Caxias aprovada pela Câmara, os conservadores
são, afinal, apeados do poder e substituídos, em 24 de maio de 1862, pelo gabinete
presidido por Zacarias de Góis e Vasconcelos, um dos principais articuladores da
nova composição política na Câmara, ao lado do conservador dissidente Nabuco de
Araújo, no Senado.
o RENASCER LIBERAL
o chamado renascer liberal dos anos sessenta já fora anunciado, no início deste
•...••.•.. período, por uma série de textos políticos que marcaram época na história do Impé-
~ rio, três dos quais devem ser destacados. O primeiro, de 1860, é a mencionada Circu-
lar Dedicada aos Srs. Eleitores de Senadores pela Provincia deMinas-Gemes, de Theophilo
Ottoni, na qual, narrando a trajetória política de sua vida e do país, recorda a antiga
luta liberal e reafirma seus princípios, reacendendo a chama há tanto tempo apaga-
da da luta contra os conservadores e da causa liberal. O segundo é o livro de Zacarias
de Góis e Vasconcelos, Da Natureza e Limites do Poder Moderador, lançado também
em 1860 e republicado dois anos depois, que constitui um firme ataque ao que con-
siderava o peso excessivo do Poder Moderador no sistema constitucional, por meio
do qual o Imperador dispunha livremente do poder de dissolver a Câmara, de nomear
e demitir os ministros, e de, assim, promover a ascensão e a queda dos partidos, con-
forme a sua vontade pessoal. O terceiro escrito, por fim, publicado pela primeira vez
entre setembro de 1861 e março de 1862, no Correio Mercantil, do Rio de Janeiro, são
as Cartas do Solitário, do deputado Tavares Bastos, que constitui a mais completa
exposição feita até então dos princípios liberais; ao longo de trinta missivas, o autor
apresenta uma ampla defesa de temas como a descentralização política e adminis-
trativa, a separação entre Igreja e Estado, a liberdade de culto, a liberdade de co-
mércio (opondo-se ao protecionismo alfandegário como forma de incentivo à indús-
tria nacional), a liberdade de navegação (com a abertura do Arnazonas às nações.es-
trangeiras e o fim do monopólio nacional da navegação de cabotagem), o estrerta-
mento dos laços com os Estados Unidos, a emancipação dos escravos e a imigração
européia.
As idéias de Tavares Bastos contrastavam com as do líder conservador viscon-
de de Uruguai, em seu famoso Ensaio sobre o Direito Administrativo, publicado em
1862, e nos Estudos Práticos sobre a Administração das Províncias no Brasil, de 1865, am-
bos em doisvolumes. Para Uruguai, não era apenas o Estado que ameaçava a lib~r-
254 dade, mas também os poderes locais, como evidenciara a anarquia n.~Qrovínclas
d rante a Regência. Pensava, assim, que o Estado podia ser o elemento garantidor
du liberdade e dos direitos do cidadão contra o arbítrio do poder privado, um instru-
a ntOpedagógico de civilização, que preparasse o povo para o autogoverno. Partin-
;edo princípio de que a tirania de um poder que está próximo, logo muito prfSente,
é~áis insuportável do que a de u~~~d.er mais dist.ante, l!ruguai irá defender a cen-
1ãIíiação política, como forma de dirigir e harmonizar os interesses comuns de uma
t~b tão heterogênea e com baixopível ç!e ipstrução, e de asseguraJl...~sim!....auni-
ãã(le do país. Mas, reconhecendo os males de uma centralização excessiva para a li-
õêrÕade dos cidadãos e para a vida nas localidades, e a maior agilidade e competên-
cia destas em resolver determinados assuntos mais particulares, defenderá também
uma certa descentralização administrativa. Preferia, portanto, para um país como o
Brasil- ainda em formação, sem tradição de autogoverno, multifacetado e pouco
ilustrado -, a organização político-administrativa francesa (centralizada) do que a
inglesa ou a estadunidense (descentralizada), desde que adaptada às peculiarida-
des e às necessidades brasileiras, de modo a se evi tar a centralização excessiva e a se
introduzir gradual, parcial e seletivamente alguns dos princípios administrativos do
self-government.
Mas, mesmo entre os conservadores, havia agora quem aceitasse certas propo-
sições que, desde o Primeiro Reinado, integravam a bandeira de luta dos liberais. É
o caso de Ferreira Vianna, em seu panfleto A Conferência dos Divinos, de 1867, uma
alegoria crítica ao Poder Moderador. Nele, dom Pedro 11 é retratado como um dés-
pota dissimulado, conversando com um tirano que parecia ser Nero e com mais ou-
tro, os quais lamentavam não terem conseguido subjugar os anseios por liberdade e
justiça de seus povos. O Imperador brasileiro Ihes conta, então, como conseguia go-
vernar acima de tudo e de todos, sem recorrer à violência, apenas fazendo uso do seu
poder pessoal para corromper e manipular seus súditos; deu-lhes empregos públi-
cos e os dividiu em partidos, que jogava uns contra os outros, às vezes fingindo con-
ciliá-los para confundi-los e enfraquecê-Ios ainda mais, servindo-se arbitrariamente j
ora de um, ora de outro, conforme lhe convinha.
O revigoramento liberal do início dos anos sessenta consubstanciou-se também
na própria Liga Progressista, que levou adiante o ideal da conciliação de partidos,
mas, desta vez, sob uma orientação predominantemente liberal, ditada, sobretudo,
por Zacarias de Góis e Theophilo Ottoni (a despeito da maior parte de seus integran-
tes serem dissidentes conservadores e dos esforços de Nabuco de Araújo - principal
mentor da nova composição egresso do lado conservador- para imprimir a direção da
mesma). Tanto assim que, ao passar de um simples bloco parlamentar, transforman-
do-se no Partido Progressista, em 1864, constava em seu programa (o primeiro for-
m~l~ente elaborado durante o Império) a descentralização e a responsabilidade dos
~mlstros pelos atos do Poder Moderador, assim como a reforma da lei regressistade 3
e dezembro de 1841, considerada excessivamente coerci tiva, no intui to de dar mais
gar~ntias à liberdade individual, separar as funções policiais das judiciais e conferir
maIOr.autonomia e profissionalização aos magistrados. As antigas proposições liberais
pareciam ser quase que um patrimônio comum neste momento.
. Tanto na legislatura de 1864-1866 como na de 1867-1868, os progressistas do-
ml~~ram a Câmara. Todavia, esta, em ambos os momentos, não foi capaz de dar es-
1I1dade I . . »Ó» • d b / . E 1862__ -=-....aC-'QuaglH~LmJnlSI_e.ILQ.~aIDLa.•,{LU_e.-tam_em....D.r.OE:r.ess.1s.ta.~ntr.e~ __ . ~e 55.
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1868, sucederam-se nada menos que seis gabinetes (o primeiro dos quais, de Zaca-
rias de Góis, durou apenas seis dias, caindo diante de um voto de desconfiança da
Câmara, a qual seria, por sua vez, dissolvida cerca de um ano depois); foi o período
de maior instabilidade ministerial do Império. Na realidade, era frágil o predomínio
liberal na aliança progressista, de tão heterogênea composição. Nunca houve de
fato ali uma comunhão de princípios e de interesses, e era intensa a troca de posi-
ções partidárias. Mesmo o eleitorado das diferentes partes do Brasil encarava com
desconfianças a identidade da nova facção política; Joaquim Nabuco, na magistral
biografia que escreveu sobre seu pai, Nabuco de Araújo, relata que, nas eleições de
1863, foi preciso apresentar a agremiação de maneiras diversas: nas províncias onde
os liberais eram mais fortes, como São Paulo e Minas Gerais, dizia-se que correspon-
dia ao Partido Liberal, ao qual alguns conservadores mais progressistas haviam ade-
rido, enquanto que naquelas onde estes é que predominavam, como a Bahia, o in-
verso era dito, ao passo ainda que nas províncias onde ambos os partidos se equipa-
ravam em poder, como em Pernambuco, explicava-se a coalizão como uma aliança
em igualdade de condições, mas conservando cada partido sua individualidade e
suas aspirações próprias.
À instabilidade política interna somaram-se graves conflitos externos. O pri-
meiro deles, mais uma vez com a Inglaterra, por conta do incidente diplomático cria-
do pelo representante britânico na Corte, William Dougal Christie. As relações en-
tre os dois países encontravam-se tensas desde a recusa brasileira em renovar o tra-
tado comercial de 1827 e as controvérsias em torno da questão do tráfico negreiro. A
Inglaterra não revogou o Bill Aberdeen mesmo depois que aquele comércio foi aboli-
do (a revogação só ocorreria em 1869), alegando que o Brasil se recusava a firmar um
novo tratado que autorizasse o governo inglês a manter a supressão do tráfico. O
Império brasileiro queixava-se, assim, da vigência do ato e das capturas navais e sen-
tenças proferidas por conta do mesmo, ao passo que a Inglaterra, em represália, re-
clamava antigas compensações pelas perdas sofridas por seus súditos em função dos
distúrbios ocorridos durante o processo da Independência brasileira e da Guerra
Cisplatina. A comissão bilateral instituída em 1858 para avaliar as queixas terminou
em impasse, em face da recusa inglesa em aceitar as reivindicações brasileiras, sen-
do afinal dissolvida, o que estremeceu ainda mais as relações entre os dois países.
Sob este pano de fundo é que se daria a chamada Questão Christie, configurada
a partir de dois incidentes sem muita importância, não fosse a disposição do diploma-
ta inglês (e de seu governo) em fazer disso um grande problema. O primeiro decorreu
do naufrágio, em 7 dejunho de 1861, da fragata inglesa Prince ofWales em um ponto re-
moto do litoral do Rio Grande do Sul, seguido da pilhagem da carga que chegara às
.praias, pairando ainda a suspeita, nunca comprovada, de que alguns tripulantes haviam
sido assassinados na ocasião. Julgando que as autoridades brasileiras delongavam a
apuração do caso, Christie decidiu interferir nas investigações, enviando, a mando do
governo inglês, o capitão Thomas Saumarez para acompanhar o inquérito, o que foi
impedido pelo presidente da província. A esta altura (junho de 1862), ocorreu o se-
gundo incidente, envolvendo três oficiais da fragata inglesa Fort, que, bêbados, à pai-
sana e sem se identificar, entraram em atrito com uma sentinela quando voltavam de
um passeio pelo Alto da Tijuca, no Rio de Janeiro, do que resul tou sua prisão, relaxada
256 no dia seguinte. Acei tando a versão dos marinheiros de que estavam sóbrios, foram
atacados pela sentinela e submetidos a maus-tratos na cadeia, Christie exigiu uma
censuraàs autoridades policiais envolvidas no caso e um pedido de desculpas do go-
verno imperial pelo que considerou um insulto à marinha britânica, acrescentando
também a exigência de indenização pelo primeiro incidente. Em represália à recusa
do governo brasileiro em atender suas reivindicações, Christie ordenou ao almirante
Warren que bloqueasse o porto do Rio de Janeiro, o que de fato ocorreu entre os dias
31 de dezembro e 5 de janeiro do ano seguinte, sendo capturados, ainda, cinco navios
mercantes brasileiros. As ruas da Capital foram tomadas por multidões em polvorosa,
que ameaçavam atacar a legação bri tânica, e só foram contidas por um apelo fei to pes-
soalmente pelo Imperador. No dia 5, o governo brasileiro aceitou pagar, sob protesto,
uma indenização pelo primeiro incidente, mas rejeitou as demais exigências, e ainda
se deu o direito de cobrar um pedido expresso de desculpas e uma compensação por
parte da Inglaterra, pela violação cometida ao território brasileiro. Diante da recusa
do governo inglês, o Brasil rompeu suas relações diplomáticas com a Inglaterra em
1863, ficando o caso sujeito ao arbitramento do rei Leopoldo I, da Bélgica. Este emi-
tiu parecer favorável ao Brasil, mas as relações diplomáticas entre os dois países só fo-
ram reatadas em novembro de 1865, quando o enviado inglês Edward Thornton apre-
sentou desculpas em nome de seu governo ao Imperador, apesar de não ser paga a
compensação requerida. .
Na mesma época em que se desenrolava a Questão Christie, o Império envol-
veu-se em um conflito internacional mais sério, desta vez tendo o Prata novamente
como cenário. O domínio brasileiro no Uruguai ficou ameaçado quando oblanco Ber-
nardo Berro elegeu-se presidente, em 1860, e procurou restringir o assentamento
de brasileiros (que, em número de mais de vinte mil, constituíam mais de 10% da
população uruguaia, possuindo cerca de 30% das terras do país), assim como o direi-
to de possuírem escravos (já que este tipo de trabalho barateava a produção do char-
que, prejudicando os produtores uruguaios, que empregavam mão-de-obra livre);
além disso, se recusou a renovar o Tratado de Comércio e Navegação com o Brasil,
que expirou em 1861, e tentava controlar e taxar o comércio bovino feito através da
fronteira e a passagem do gado para as charqueadas do Rio Grande do Sul. Assim,
quando o general colorado Venâncio Flores iniciou uma rebelião contra os blancos de
Berro, em abril de 1863, o Brasil o apoiou tacitamente, bem como aArgentina, cujo
governo, afinal unificado pelo portenho Bartolomé Mitre, em 1862, recebeu a ajuda
de Flores, na luta travada contra as províncias federalistas de Entre-Ríos e Corrien-
tes, que eram comandadas por Urquiza e recebiam apoio do governo uruguaio.
Em meio à luta civil uruguaia, o Império enviou, em abril de 1864,já sob a pre- -
sidência do sucessor de Berro, o também blancoAtanasio Aguirre, uma missão diplo-
mática chefiada por José Antonio Saraiva, que, a pretexto de exigir o respeito aos di-
reitos antes adquiridos pelos brasileiros no país e a punição dos funcionários uru-
guaios que haviam cometido abuso de autoridade contra os mesmos, buscava, de
fato, criar condições para justificar uma intervenção militar no Uruguai. Acompa-
nhado por uma esquadra comandada pelo então vice-almirante Tamandaré, Saraiva -
ainda tentou impor uma recomposição do governo uruguaio, no sentido de substituir
os blancos do ministério por colorados. Aguirre, que já entrara em entendimentos com
o vizinho Paraguai, esperando contar com o apoio do presidente Sola no López, re-
cusou-se a ceder às pressões brasileiras, o que motivou o ul timato dado pelo enviado 257
I1
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imperial, em zr de agosto, ameáçanao-mvadlr-o-país-;-cãSo-an~·xlgenclas·5fa-slleTt
não fossem atendidas em um prazo de seis dias. ComoAguirre manteve sua posição,
no dia 12 de setembro tropas brasileiras invadiram o Uruguai, aliando-se às forças
rebeldes locais, enquanto Tamandaré bloqueava o porto de Montevidéu. O governo
argentino apenas manifestou apoio diplomático velado ao Brasil, mas se manteve
formalmente neutro, temendo a reação contrária de Entre-Rios e Corrientes. Em
fevereiro de 1865, Flores conseguiu, enfim, tomar o poder em Montevidéu, selando
um acordo de paz com o Império.Aesta altura, um novo conflito, de proporções mu-
ito mais sérias, já se iniciara, quando o Paraguai decidiu declarar guerra ao Brasil.
A GUERRA DO PARAGUAI
~
No dia 12 de novembro de 1864, em resposta à intervenção imperial no Uru-
guai, o Paraguai capturou o vapor mercante brasileiro Marquês de Olinda, que zarpara
de Assunção em direção à Corumbá e transportava o presidente da província de
Mato Grosso. Em seguida, rompeu relações diplomáticas com o Brasil e, a 13 de de-
zembro, declarou formalmente guerra a este país, dando início à invasão do Mato
Grosso. Começava, assim, a Guerra da Tríplice Aliança, mais conhecida no Brasil
como a Guerra do Paraguai.
As razões do conflito suscitaram um polêmico debate historiográfico, ainda
hoje em curso, em torno do qual interpretações distintas foram produzidas. A visão
dita tradicional, composta, basicamente, por relatos militares e diplomáticos, sur-
giu logo após a guerra, predominando até fins da década de 1950. Dotada de forte.. .~ ,.,.
cunho patriótico, factual por excelência, e centrada nas batalhas, nas negociações
diplomáticas e nos atos dos grandes heróis ou vilões, esta visão atribui o conflito às
pretensõesexpansionistas ou hegemonicasnaregião platina ao presidente para-
guaio Francisco Solano López, sempre retratado como um ditador sangumano e
megalomaníaco, ao passo que os brasileiros nada mais teriam feito do que reagir à
agressão sofrida, sendo figuras como Tamandaré, Osório e Caxias, s06retudo, apre-
sentadas como os grandes heróis da guerra, salvadores da pátria ultrajada.
A partir da década de .1960, no bojo da crítica marxista às ditaduras militares
sul-~ericaQas, surgem versões revisionistas do conflito, como as do historiador ar-
gentino Leon Pomer e do jornalista brasileiro Julio José Chiavenato, que se contra-
põem radicalmente à "história oficial", pretendendo apresentar uma visão crítica da
guerra. De acordo com estas versões, ao contrário do Brasil ~_<.!~..Algentina, sub-
servien tes ao capi tal e ao governo ingleses, o Paraguai seria, an tes da guerra, uma re-
pública próspera, cujo Estado provia o país de uma via nacionalista de desenvolvi-
mento econômico auto-sufi-ciente, que o mantinha independente da ingerência ~
do capital estrangeiros, fomentando a produção industrial e põSslí)illtando aos cam~
poneses a posse de pequenas extensões de terra, em grande parte p"'ertencentes ao
EStado,~ão_a uma aristocracia rural. Nestas condições, o Paraguai seria um obstá-
~lo e uma ameaça à expansão britânica no Prata, sendo a guerra provocada por Bra-
sil e Argentina, que, temendo a potência do país vizinho, teriam agido como instrU-
mento do imperialismo inglês na região, ainda que tivessem, diante da heróica re-
sistência paraguaia, que destruir todo o país e massacrar a quase totalidade de sel.l
povo.
/'I
258
pegllrao-erelT(}SeUUToT~euveTamau:<ruecau<rue-r;"m:,,;"essasceseS-COITl'rpl- iri
tórias do conflito vêm sendo questionadas por trabalhos mais recentes, como os
de Ricardo Salles, de Francisco Doratioto e de Leslie Bethell. ~odos estes autores
e testam os principais fundamentos revisionistas - a mão oculta do imperialismo
con d I b 'A' d B '1
b~· ânico a manipular o desencadeamento a guerra, a tota su serviencia o rasifita I ia e a orosoerid d . Are-daArgentina diante da nglaterra, e a.autono~l1Ia e a p~ospen a e p~rAa~uaIa. ~u-
rarn assim que não era o Paraguai um pais avesso a presença britânica e muitomen, ' o'• -
nos auto-Suficiente; se, em comparaçao a seus vizinhos do Prata, ocupava de fato
me a posição periférica no contexto dos investimentos ingleses na região, isto, em
um ., d I I ' dJ1rimeirolugar, se deve mars a um ~enor mteresse a ng aterra po~es~e ~als o que
uma opção própria de desenvolvimento, e, em segundo lugar, nao significa qu~ o
~apital inglês estivesse afastado do Paraguai, co~o atest~m ascasas ~omerciai~ bri-
tânicas existentes em Assunção, as crescentes importaçoes paraguaras de tecidos,
artigos de ferro, utensílios industriais e material bélico oriundos da Inglaterra, e a
contratação de técnicos ingleses para serem empregados em empreendimentos
manufatureiros e de infra-estrutura. P~!!l0nstrar, por sua vez, a incon~ruência
da idéia de total submissão do Brasil e da Argentina em face da Grã-Bretanha, basta
assinalar o fato do governo brasileiro estar enfrentando esta potência européia na
Questão Christie, inclusive estando, no início da guerra, com as relações diplomá~i-
cãs cortadas com a mesma, por iniciativa do Império brasileiro, asquais só foram rea-
tadas quando o governo inglês decidiu pedir desculpas a este. Quanto a se atribuir
ao imperialismo inglês o papel de eminência parda na deflagração do conflito, argu-
mentam aqueles autores que o mesmo não interessava em absoluto à Inglaterra,
cujo anseio maior (tal como o do Brasil) era justamen te preservar o mapa geopolí tico
do Prata, mantendo, assim, o equilíbrio de poderes existente na região (até porque
o Paraguai estava longe de ser uma potência regional emergente ou de representar
qualquer ameaça aos interesses bri tânicos); além disso, a guerra não só poderia colo-
car em risco as vidas, as propriedades e os negócios britânicos na região, como, ao
seu término, o que se observou foi, não um maior incremento ou abertura, mas o de-
créscimo dos investimentos e das importações de produtos ingleses para o Paraguai.
Isto não quer dizer, todavia, que, uma vez tendo sido detonada a guerra, qualquer
que fossem seus desdobramentos e desfecho, não importariam à Inglaterra; não há
como negar que havia por parte desta uma certa preferência pelos países aliados,
q~e, afinal de contas, concentravam a maior parte dos investimentos ingleses na re-
grao, mas daí a inferir que o conflito teria sido estimulado, promovido QU mesmo
correspondido aos interesses da Grã-Bretanha é, se não um disparate, um grande
exagero.2
. Assim, parece mais apropriado pensar a Guerra do Paraguai como um conflito
c~~otivações encontram-se, essencialmente, na QróPJjWinâmica de constitui-
çao,d.osEstados nacionais platinos e na disputa, entre esses países, pelo predomínio
POhtlco-econoAm' d '0 b o • 1-nh- . ICO a regiao, ~m ora nao se possa negar que "ª.pre;sença.Ulg esa te-
,~~,dõum fator complicador a mais neste processo. O Brasil já era então um país
~?Itlcamente consolidado, que exercia um certo controle sobre o Prata, mas que
lalsempre esta preponderância ameaçada pela Argentina e, mais recentemente,
~: o Paraguai. A primeira assegurara há pouco a unificação do país, com a centraliza-
ao efetuada em torno de Buenos Aires, mas também se sen tia ameaçada não só pela 259
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ascensão do Paraguai como potênciâ'iii.iritar emergente no cenano prannor como,
mais especificamente, pelas boas relações nutridas por este com as províncias de
Entre-Rios e Corrientes, onde o ideal federalista ainda não fora de todo extirpado.
Já o Paraguai procurava assumir uma posição de destaque no Prata e estabelecer um
novo equilíbrio na região; para o que, além de fortalecer-se militarmente, como vi-
nha fazendo, precisava, por um lado, aproximar-se do Uruguai, d~_modo a impedir a
ingerência do Brasil sobre o mesmo e ª poder ampli~u comércio exterior (me-
diante o acesso ao porto de Montevidéu), e, por outro, manter acesos os entendi-
mentos com úrquiza, a fim de enfraquecer a união argentina(embora em ambos os
casos, evitasse, a princípio, firmar uma aliança formal, que poderia desencadear
uma reação mais enérgica por parte do Império e da Argentina) . Quanto ao Uruguai,
durante o domínio blanco buscou estabelecer uma aliança com OParaguai, desenvol-
vendo uma política avessa ao Brasil e à Argertina que muito interessava a este, mas,
ao serem os coiorados recolocados no poder pela intervenção brasileira contra Aguir-
re, voltou a ficar sob o controle do Império. Acrescente-se a tudo isto a tensão exis-
tente em razão da indefinição das fronteiras entre Argentina, Brasil e Paraguai, e da
liberdade, sempre ameaçada, de navegação nos rios da bacia platina.
Ao declarar guerra ao Brasil, não sem antes adverti-Io para não invadir o Uru-
guai, Solano López acreditava poder contar com a ajuda deste país, ainda em poder
dos b/ancos e já em luta contra o Império, e de Entre-Rios e Corrientes, gue, segundo
imaginava, se não entrassem na guerra do lado paraguaio, ao menos forçariam o go-
verno argentino a se manter neutro no conflito. Além de superestimar o potencial
bélico de seu país e de subestimar o brasileiro, não contava López com a rápida der-
rota de Aguirre e com a negativa daquelas províncias argentinas em lhe prestar apoio.
Para piorar, depois de ver recusado o pedido de permissão para que suas tropas atra-
vessassem o território argentino das Missiones, de forma a poder então atacar o Rio
Grande do Sul, o presidente paraguaio, em 18 de março de 1865, declarou guerra à
Argentina, invadindo e ocupando Corri entes em seguida. A esta altura, o Uruguai
estava de novo sob o poder colorado e a tutela brasileira.
Estavam criadas, assim, as condições para que, em 12 de maio, fosse formada a
Tríplice Aliança, reunindo Brasil, Argentina e Uruguai. Os termos do tratado secre-
~~ -.-~--~-..~to de aliança definiam como objetivos destituir a ditadura de López; garantir a livre
navegação pelos rios Paraguai e Paraná, destruindo as fortificações fluviais para-
guaias existentes; impor aoParaguai o pagamento de indenizações pelasdespesas
aliadas com a guerra e pelos prejuízos causados a particulares; e estabelecer os limi-
tes do Paraguai com.o.Brasil,e com a.:\.rgentin~~ntindo para estes os territórios
sobre os quais julgavam ter direito (o primeiro, a área situada entre os nos Apa e
Branco, e a segunda, a zona do Chaco). Se a guerra não fora planeT;da nem desejada
por nenhum dos aliados, nem por isso deixou de representar uma oportunidade para
enfraquecer ou mesmo destruir um poder emergente incômodo para todos, ainda
mais porque era crença geral (inclusive do Paraguai) que seria um conflito de curta
duração, cada lado acreditando em uma rápida vitória sobre o outro.
O tempo, porém, não tardaria a mostrar o quanto eram equivocadas estas pre-
visões. Uma'longa guerra estava então apenas se iniciando. Em sua primeira fase, foi
esta marcada pela ofensiva paraguaia, quando, após ocupar Mato Grosso e Corrien-
260 tes, as tropas comandadas pelo coronel Estigarribia, entre maio e agosto de 1865,
arravcssaram as ivussrorres e mvatrrrsrrrsao Bo-rJá'e'depols urugualana, no KlOLrran-
de do Sul. Todavia, não conseguiram manter-se aí por muito tempo, e nem, tarn-
pouco, alcançar o Uruguai, sendo logo contidas pelas forças aliadas, obrigando Esti-
garribia a render-se em Uruguaiana, em 14 de setembro. Antes disto, em 11 de ju-
nho, na batalha naval do Riachuelo, no rio Paraná, a marinha de guerra paraguaia ata-
cou a brasileira, mas foi vencida e destruída por esta, que, em seguida, empreendeu
um efetivo bloqueio do Paraguai, mantido até o fim da guerra. Ao final do primeiro
ano de conflito, a única parte do território aliado ainda ocupada por tropas paraguaias
era uma região, de interesse secundário, situada no Mato Grosso.
A segunda e mais importante fase da guerra foi, por sua vez, marcada pelo
avanço das forças aliadas,com o início da invasão do Paraguai, a 16 de abril de 1866.
Estabeleceram seu quartel-general em Tuiuti, onde, em 24 de maio, venceram a
primeira grande batalha terrestre, rechaçando a investida paraguaia. Depois disto,
somente em 3 de setembro os aliados conseguiriam avançar novamente, ao baterem
seus inimigos em Curuzu. No dia 22 do mesmo mês, porém - dez dias após o então
comandante-em-chefe das forças aliadas, Bartolorné Mitre, rejeitar a proposta de
pôr fim à guerra apresentada por López (que oferecia vantagens incluindo conces-
sões territoriais, em troca da preservação de si mesmo e do território paraguaio res-
tante) -, os aliados sofreram, em Curupaiti, a sua pior derrota na guerra. No mês se-
guinte, o então marquês de Caxias era nomeado para substituir Mitre no comando
geral das forças navais e terrestres, o qual só seria assumido pelo marechal brasileiro
em janeiro de 1868. Enquan to isso, os governos da Argen tina e do Uruguai enfren ta-
vam sangrentas rebeliões internas, e no Mato Grosso dava-se, em maio e junho de
1867, o episódio - celebremente relatado na obra homônima de Alfredo d'Es-
cragnolle-Taunay - da Retirada da Laguna pelas tropas brasileiras que tentavam
por ali invadir o Paraguai. Nenhum avanço aliado foi registrado até julho de 1867,
quando se iniciou o movimento de cerco à grande fortaleza fluvial de Humaitá (que
bloqueava o acesso ao rio Paraguai e àAssunção), só efetivamente tomada em 5 de
agosto do ano seguinte. A partir daí, o avanço aliado não mais seria detido, culminan-
do na campanha da Dezembrada (dezembro de 1868), cOm sucessivas vitórias nas
batalhas de Itororó.Avaí, Lomas Valentinas (onde o exército paraguaio foi aniquila-
do) e Angostura. Entre 12 e 5 de janeiro de 1869, a Capital Assunção foi finalmente
conquistada pelas tropas brasileiras.
Mas uma terceira fase da guerra ainda viria em seguida, quando Solano López,
que escapara da investida aliada, organizou um novo exército e liderou uma campa-
nha de guerrilha COntraessas forças, desde 15 de abril comandadas pelo conde d'Eu.
Em 11 de junho, é estabelecido um Governo Provisório emAssunção, integrado por
representantes aliados. Em 12 de agosto, dá-se o ataque bem sucedido à Peribebuí,
centro da resistência paraguaia, e, quatro dias depois, as tropas restantes são massa-
cradas na batalha de Campo Grande ou Acosta Nu, López, todavia, escapou de
novo, seguindo rumo ao norte do país, com as tropas brasileiras em seu encalço; em
1
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de março de 1870, é afinal encurralado e morto em Cerro Corá. Terminada a guer-
ra, a última tropa brasileira só deixaria o Paraguai em 22 de junho de 1876, permane-
cendo, ainda, uma força argentina até maio de 1879.
A Guerra do Paraguai foi o conflito internacional de maior duração do conti-
nente americano, superando inclusive a Guerra de Secessão (1860-1865), nos Esta- 261
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dos Unidos. Foi também a mais destrutiva das guerras que assolaram a América do
Sul em toda a sua história, e, segundo Leslie Bethell, com exceção da Guerra da Cri-
méia (1854-1856, envolvendo Rússia, Inglaterra e França), foi, ainda, a guerra inte-
restados mais violenta ocorrida em todo o mundo entre 1815 e 1914. As estimativas
existentes acerca do número de combatentes e de mortos apresentam grande dis-
paridade. As tropas brasileiras eram compostas pelo Exército regular de linha, pela
Guarda Nacional, pelos corpos de Voluntários da Pátria, e por contingentes de ho-
mens livres recrutados à força e de escravos libertados com o fim de servirem nas
frentes de batalha, perfazendo um efetivo estimado ao longo do conflito entre cen-
to e trinta mil e cento e cinqüenta mil indivíduos (a imensa maioria, proveniente da
Guarda Nacional e dos voluntários). Estas tropas representavam pelo menos dois
terços das forças aliadas, as quais eram compostas também por algo em torno de vin-
te e cinco mil a trinta mil soldados argentinos (amplamente reduzidos após a com-
pleta expulsão dos paraguaios da Argentina, a ponto de, em 1869, restarem apenas
cerca de quatro mil em armas) e por reles cinco mil soldados uruguaios. Quanto às
forças paraguaias, chegaram a reunir aproximadamente oitenta mil homens, ou seja,
quase toda a população masculina adulta do país. De todo este contingente, estive-
ram em operação, nos momentos de maior mobilização, entre cem mil e cento e cin-
qüenta mil combatentes. Ao todo, morreram cerca de trezentas mil pessoas (entre
militares e civis) ao longo dô..s:2.nflitq,em combate, ou em decorrência de doenças e
epidemias. Agrande maioria era oriunda do Paraguai, que, ao final da guerra, perdeu
cerca d(95% de sua população adulta masculina.
O saldo da guerra, evidentemente, foi bastante negativo para o Paraguai; além
do massacre que sofreu sua população, das perdas materiais e da devastação de seu
território, teve toda sua economia arruinada (agricultura, pecuária, comércio inter-
nacional e indústria emergente), ficou sob a tutela do Brasil no imediato pós-guerra
(ainda que preservando sua Independência formal), foi-lhe imposta pelos aliados
uma vultosa indenização (revista mais tarde, embora pelo Brasil somente durante a
Segunda Guerra Mundial) e ainda perdeu cerca de 40% de seu território para Brasil
e Argentina. Esta, apesar das perdas elevadas que teve em termos de vidas humanas
e recursos materiais, dos prejuízos econômicos e dos empréstimos contraídos com a
casa bancária inglesa Baring Brothers, conseguiu assegurar para si o território litigioso
das Missiones e a região do Chaco central, embora, graças à intervenção da diploma-
cia brasileira, o mesmo não tenha ocorrido com a pretendida área norte do Chaco. O
Uruguai, cuja participação na guerra fora bastante limitada, quase não foi afetado
pela mesma, pouco lucrando ou perdendo. Quanto ao Brasil, obteve do Paraguai
todo o território que reivindicava, entre os rios Apa e Branco, e passou a exercer um
controle sobre o Paraguai ainda maior do que o que tinha no Uruguai, além de ver es-
timulada a sua produção fabril têxtil e de artigos bélicos; mas, por outro lado, teve
enormes perdas humanas e materiais (só superadas, talvez, pelas do Paraguai), fi-
cou com as finanças públicas profundamente abaladas e se viu obrigado a pedir,
em setembro de 1865, um empréstimo de sete milhões de libras ao banco
Rothschild.
Um outro efeito teve, ainda, a Guerra do Paraguai sobre os quatro países en-
volvidos: favoreceu o fortalecimento dos laços nacionais e, entre os vitoriosos, a con-
~ solidação dos Estados nacionais. No caso brasileiro - em que, como visto, nem a
)
Independência, nem os acontecimentos subseqüentes tiveram êxito em desenvol-
ver um sentimento profundo de identidade nacional (esboçada apenas na xenofo-
bia manifesta, sobretudo, em relação a portugueses e ingleses) -, José Murilo de
Carvalho destacou a Guerra do Paraguai como ofator mais importante na construção da
identidade brasileira no século XIX, superando inclusive, mais tarde, a Proclamação
da República. Da mesma forma, Ricardo Salles enfatizou a forte impressão cívica
marcada pela Guerra na vida de todos aqueles segmentos populares (livres e, até en-
tão, escravos) que, a despeito de sua posição social marginalizada, participaram das
lutas em defesa da pátria ameaçada. A Guerra agitou todo o país, constituindo-se
em um poderoso elemento integrador, e despertando um sentimento patriótico
nunca antes visto em escala nacional. Cerca de cinqüenta e cinco mil pessoas, ou
seja, mais de um terço de todo o contingente brasileiro enviado para a guerra, apre-
sentaram-se espontaneamente como voluntários para irem lutar nos campos de ba-
talha. Provinham de todos os cantos do país, o que permitiu que, pela primeira vez,
entrassem em contato, se conhecessem e lutassemjuntos por uma causa comum
brasileiros de origens geográfica, social e cultural as mais distintas. Havia aqueles
que se dispuseram a ir para as zonas de guerra para atuarem não como combatentes,
mas em funções como médicos, enfermeiros, engenheiros e cozinheiros. Muitos ou-
tros ainda, que não puderam ou não quiseram ir para os campos de batalha, preferi-
ram prestar sua colaboração de várias maneiras diferentes: fazendo doações em di-
nheiro, em mantimentos ou em materiais diversos (roupas, tecidos, remédios);
dando prêmios em dinheiro ou financiando as despesas para quem se alistasse; e
oferecendo-se para prestar gratuitamente certos serviços, como confeccionar far-
das, realizar exame médico nos praças que se alistavam, ou mesmo servir nos corpos
policiais ou da Guarda Nacional permanecidos no país, em substituição àqueles que
haviam partido para a guerra. De quase todas essas atividades participavam não só
homens, como também mulheres. Houve, inclusive, o caso peculiar da cearense [o-
vita Alves Feitosa, que, aos dezoito anos de idade, apresentou-se, em Teresina,
como vol untário para o combate, fazendo-se passar por homem, e mesmo tendo sido
descoberta a sua identidade, foi aceita pelas autoridades provinciais, recebendo o
posto de sargento. De especial importância também foi a ampla participação de ne-
gros livres e libertos, a ponto de constituírem a maior parte das tropas brasileiras.
Um desses negros livres é particularmente digno de nota: Cândido da Fonseca Gal-
vão, o popular Dom Obá 11d'África, conforme se intitulava; como relatou Eduardo
Silva, este baiano de Lençóis apresentou-se como voluntário à frente de mais trinta
companheiros, todos possuídos do mais vivo edenodado patriotismo, e, recebendo o pos-
to de sargento, com eles passou a integrar o 242 Corpo de Voluntários da Pátria, que
seguiu para a guerra, tendo, inclusive, tomado parte na batalha do Tuiuti, Deve-se
ainda observar que sociedades patrióticas formaram-se no Brasil inteiro, incenti-
vando os combatentes, estimulando as colaborações e o voluntariado (inclusive or-
ganizando arregimentações coletivas), ajudando a fomentar, enfim, um sentimento
de integração nacional. O patriotismo foi também exaltado e impulsionado durante
e logo após a guerra por cerimônias cívicas, pela música e pela poesia (eruditas e po-
pulares), por espetáculos teatrais, pela pintura e, sobretudo, pela Imprensa (quer
sejam os jornais, quer sejam as revistas, com destaque para as charges). Ainda que o
entusiasmo e o apoio diminuíssem à medida que a guerra se prolongava, e que tenha 263
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havido muita resistência ao recrutamento forçado a que também se recorria, não se
pode negar a importância da Guerra do Paraguai na formação de uma identidade na-
cional brasileira, forjada no vivenciamento da própria luta ou na assimilação de seus
significados simbólicos.' Todavia, a definição desta identidade traria consigo uma
conscientização que teria desdobramentos ainda mais profundos sobre o desenvol-
vimento do Império brasileiro.
AS NOVAS COMPOSIÇÕES POLÍTICAS
E O CLAMOR PELAS REFORMAS
Os anos que se seguiram ao término da Guerra do Paraguai assinalam um novo
[
e decisivo período de inflexão na história do Império. O Brasil passava, então, por
profundas transformações econômicas e sociais, que teriam efeitos marcantes sobre
a política imperial. A lavoura cafeeira encontrava-se em expansão acelerada, com o
desenvolvimento, c:fêsdemeados do século, da produção do Oeste Paulista, a qual,
aproveitando-se de condições geológicas mais favoráveis e de técnicas de beneficia-
lmentomais aperfeiçoadas, irá progressivamente suplantar a do Vale do Paraíba, atésuperá-Ia por volta de 1880. Por outro lado, para resolver o problema da substituição
da mão-de-obra cativa - imposto pelo fim do tráfico negreiro lnte.JnaciQn~, pelo au-
mento crescente do preço dos escravos adquiridos no tráfico interno (deslocados
das lavouras nordestinas em crise e dos centros urbanos para as prósperas zonas ca-
feeiras) e pela tradicional resistência ao aproveitamento do trabalhador livre nacio-
nal->, a imigração européia (principalmen te italiana e portuguesa) passou a ser esti-
mulada, sobretudo para aquelas zonas; contando com a subvenção parcial do gover-
no provincial (paulista), a vinda de imigrantes dava-se agora não mais sob o fracassa-
do sistema de parceria, introduzido por Nicolau Vergueiro em 1847 (que resultou
em uma revolta dos colonos da fazenda Ibicaba, em Limeira, em fevereiro de 1857),
mas por regime assalariado ou de locação de serviços. Os meios de transporte, por
sua vez, tiveram um grande aperfeiçoamento, com a co'fistrução de ferwylas - que
agilizaram enormemente o escoamento e reduziram os custos da produção.cafeeira
- e a substituição das embarcações a vela por navios a vapor. Nas principais cidades,
verifica-se um processo de urbanização acentuado, com a expansão do espaço físico
~das freguesias urbanas, a conversão de áreas rurais em suburbanas, a introdução de
diversos melhoramentos nos serviços públicos de infra-estrutura urbana (ilumina-
ção a gás, rede de esgotamen to sani tário, abas tecimen to domiciliar de água encana-
da, bondes de tração animal, calçamento com paralelepípedo) e a multiplicação dos
espaços de sociabilidade (passeios públicos, teatros, cafés, confeitarias, livrarias, as-
(
SOCiações literárias, artísticas e musicais). Além disso, ocorre também nas cidades
um notável incremento do comércio e dos negócios, com a criação de indústrias,
bancos, instituições de crédito, companhias de seguro, sociedades anônimas e esta-
belecimentos comerciais de todo tipo. Desenvolve-se, assim, o mercado interno e
emergem novos grupos sociais - os fazendeiros do Oeste Paulista, os empresários,
as camadas médias urbanas (profissionais liberais, intelectuais, funcionários públi-
cos, artesãos, pequenos e médios comerciantes) -, que logo se mobilizarão e passa-
rão a manifestar suas idéias, suas aspirações, e a disputar o espaço político de forma
Neste espaço, as transformações que iriam se processar foram já anunciadas
com a crise política desencadeada pela queda do último (o terceiro, desde a volta
'dos liberais ao poder, em 1862) gabinete Zacarias de Góis. As divisões políticas e a
instabilidade que marcaram todo o período de predomínio da Liga ou do Partido
Progressista acentuaram-se ainda mais em decorrência do andamento da guerra e
do agravamento da crise financeira produzida por esta. O apoio geral que o Parla-
mento dera à guerra em sua fase inicial foi crescentemente dando lugar a críticas,
como demonstrou Amado Cervo, primeiro por parte da oposição conservadora e
depois pelos liberais; questionava-se a monopolização da condução das operações
pelo gabinete, sem o devido respeito e atenção às atribuições do Parlamento, o fo-
mento ao militarismo e o descuido dos problemas internos, o excessivo prolonga-
mento da guerra e seus altos custos, e a dita incompetência do comando das opera-
ções. Os desentendimentos culminaram nas divergências, referentes ao comando
das operações no Paraguai, entre Caxias, que era ligado ao Partido Conservador, e
o ministério Zacarias, resultando na saída deste, para o que também contribuiu a
escolha pelo Imperador do já agora conservador Sales Torres Homem para o Seria-
rdo. Pedro II decidiu, então, chamar de volta os conservadores ao poder, convocan-
~do para presidir o novo gabinete, de 16 de julho de 1868, um antigo líder do parti-
do, o visconde de Itaboraí.
J O retorno dos conservadores ao governo fora uma decisão pessoal de dom Pe-
dro, jáql!e estes não contavam com maioria no Parlamento, dominado pelos pro-
-gressistas.A decisão, todavia, correspondia a uma tentativa de acabar com a instabi-
lidade politica que as divisões entre os progressistas só vinham a acentuar; também
era uma forma de alinhar a direção da guerra exterior com a política interna. Mas o
ato do imperante deflagrou uma forte oposição parlamentar, que considerava o novo
ministério legal- pelas prerrogativas de que o Poder Moderador gozava consti tucio-
nalmen te -, porém não legí ti mo - por não corresponder à von tade da maioria dos re-
presentantes da nação, eleitos pelo povo. Daí a célebre formulação de Nabuco de
Araújo em seu discurso do sorites, pronunciado no Senado, em 17 de julho, em que,
após acusar de absolutista a convocação de um gabinete cujo partido fora derrotado
nas urnas, declarava: Vede este sori tes fatal, este sori tes que acaba com a existência do siste-
ma representativo: o Poder Moderador pode chamar a quem quiser para organizar ministérios;
estapessoa faz a eleição,porque há defazê-Ia; esta eleiçãofaz a maioria. Eis aí está o sistema re-
presentativo do nossopaisl. O dilema de Nabuco colocava, assim, em questão o próprio
funcionamento do sistema representativo imperial, que, regulado pelo Poder Mo-
derador e sujeito à interferência determinante do partido governista no processo
eleitoral, afigurava-se falseado em seus fundamentos.
O discurso ousado de N abuco, conclamando à concentração de todas asforças libe-
rais para ogrande fim da salvação do sistema representativo do Brasil, além de precipi tar a
dissolução da Câmara - substituída, como a confirmar o sorites, por uma unanime-
mente conservadora (os liberais, em protesto, abstiveram-se do pleito) -, deu novo
ânimo aos liberais e a sua dissidência progressista. Estes, com a volta dos antigos
ç~nservadores, se reagruparam, em 3 de outubro de 1868, no Centro Liberal, presi-
dido por Nabuco de Araújo, embrião do novo Partido Liberal, fundado no ano se-
guinte. No manifesto que as lideranças do Centro dirigiram ao público em 30 de
março de 1869, o ministério Itaboraí é acusado de ignorar as reformas pendentes e 265
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são.reiteradas as críticas ao.sistema representativo. imperial, acusando-se o.Governo
de, sob uma capa democrática, ser de fato absoluto, empregando. a máquina admi-
nistrativa, judiciária e policial, e todo. tipo. de fraude e violência, para obter a vitória
nas eleições: o Governo absoluto não perde o seu caráter, porque se rodeia de um Parlamento.
Se ele mesmo elege o Pari cimento, não há senão simulacro de Parlamento. Mas não. se atribui
[
culpa ao.Imperador, e sim à Reforma do.Código. do.Processo. Criminal, que teria res-
tringido. as liberdades individuais e deixado o.cidadão. sujeito às arbitrariedades po-
liciais e judiciárias. Do Centro Liberal irá sair, em 7 de abril, o.Clube da Reforma,
que, alicerçado no.jornal cario.caA Reforma, dirigido. por Francisco. Otaviano, irá pro-
rnover os principais pontos que constituiriam o.programa, lançado. em 16 de maio.de
1869, do. no.vo.Partido. Liberal. Defendia-se, neste documento, além das clássicas
teses liberais (responsabilidade ministerial, descentralizacão política e administra-
tiva, supressão. do Senado. vitalício, Conselho de Estado. apenas administrativo, e li-
berdades de comércio, indústria, conSCiência e educação), propostas cama: uma re-
forma eleitoral, que instituísse a eleição. direta nas capitais e cidades cam mais de
dez mil habitantes; uma reforma policial e judiciária, que limitasse as poderes dos
chefes de polícia e delegados, que confiasse toda a jurisdição. definitiva criminal ou
cível aos juízes de direitos, e que assegurasse e ampliasse as garantias individuais
contra a prisão. arbitrária; a suspensão. da recru tamento forçada; a fim da Guarda Na-
cional; e a emancipação dos escravos, a começar pela libertação. do.ventre e a alforria
gradual dos cativas existentes. -
Um das principais integrantes deste renovado movimento liberal de oposição
é Tavares Bastos, que, em 1870, publica a sua abra mais impo.rtante,A Província: Es-
tudo sobre a Descentraiização no Brasil. É a con tribuição pessoal do au tor ao.movimen to
pelas reformas constitucionais, indicando-se a que era precisa reformar para revigo-
rar a Império. e manter a sua integridadejj'retendendo resgatar a espírito liberal dos
primeiros anos da Regência, e opondo-se às idéias centralizadoras defendidas pela
visconde de Uruguai em suas abrasjTavares Bastas retomou alguns temas antes
discutidas nas Cartas do Solitário, corno a emancipação. das escravas e a imigração. eu-
ropéia, e introduziu outros, coma o.ensina público. obrigatório e gratuito, a abolição
da Guarda Nacianal (que se transformara em instrumento da despatismagoverna-
mental) e a fim do.Senado. vitalício. (cam m-andato de oito anos). Todavia, a autono-~ ---
mia provincial, a federalismo, continuava a ser a centro. de suas atenções, agora de
forma ainda mais elaborada e contundente. Defendia, assim, a restituição. dos pode-
res conferidos às assembléias legislativas pelo. Ato Adicional, a criação. de Senados
provinciais (com mandato de quatro anos), a eleição. dos presidentes de província
(feita, a princípio, pelas assembléias legislativas), a instauração. de tribunais da Re-
tlaçãa em cada província e a autonomia municipal (cabendo. às câmaras municipais apoder de legislar sobre as despesas, a aplicação. dos recursos, a fixação. de impostos,os empréstimos e as posturas das municipalidadeslÊornente o.federalismo. evitaria
novas revoluções e a desintegração. da Impéria)á iminente em vista da crescente
sujeição e espoliação impostas às províncias pelo. governo central. O federalismo,
segunda a político alagoano, era a base da governo representativa, equiparava-se à
liberdade, opondo-se ao.despotismo, que era produto da centralização. Assim, da
fórmula que concebeu - absolutismo, centralização, império, são, neste sentido, expressões
266 sinônimas - é possivel inferir que o.oposto fosse também verdadeiro -liberdade, fe-
deralismo e república seriam expressões equivalentes -, embora Tavares Bastos
não. se declarasse republicano.
~
Em meio a essa recomposição das forças políticas, uma ala mais radical de libe-
rais históricos que estiveram ligados ao.Partido. Progressista foi mais além e fundou,
ainda em 1868, o.Clube Radical, núcleo. do futuro Partido Republicano. Já desde
1866 que esses elementos, descontentes com a hesitante orientação progressista,
procuraram marcar sua posição exal tada, fundando, na Corte, o.jornal Opinião Libe-
ral, redigido. por Francisco. Rangel Pestana, Henrique Limpo de Abreu e J. L. Mon-
teiro de Sousa. Em novembro de 1869, os dois primeiros passaram a editar o.Correio
Nacional, de feições mais agressivas, que será o.porta-voz na Imprensa do Clube Ra- ~
dical.íO programa desta agremiação. foi o.mais radical oficialmente proposto duran-
te tod-o o.Império, nele constando propostas como. o.fim da Guarda Nacional, da vi-
taliciedade do Senado, do.Conselho de Estado e do Poder Moderador, a eleição dos
presidentes de província, o sufrágio direto e universal, e a abolição da escravidão],....
Além da Imprensa, o Clube Radical serviu-se também, em 1870, de uma série de
conferências públicas sobre Direito Constitucio.nal, de ampla repercussão. na épo-
ca, proferidas, entre outros, pelo senador e professor daAcademia de Direito de São
Paulo, Silveira da Mora, no teatro Fênix Dramático, na Corte; o objetivo era não. só
divulgar as reformas radicais propostas, mas também dar início a um movimento em
favor do desenvolvimento de práticas autênticas do sistema representativo, de for-
ma a que tais reformas partissem

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