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15237832 historia da cidade cap 3

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3. A CIDADE NO EXTREMO ORIENTE 
No Extremo Oriente — a índia, a Indochina, a 
China e as ilhas próximas — a civilização urbana 
começa um pouco mais tarde do que na zona compreen-
dida entre o Mediterrâneo e o Golfo Pérsico, isto é, por 
volta do II milênio a.C. A ocorrência da diferenciação 
social e da formação dos grandes Estados repate-se em 
grandes linhas, mas com características especiais, que 
derivam do ambiente geográfico, das opções econômi-
cas da agricultura primitiva e das diretivas culturais. 
Trata-se de territórios tropicais, mais quentes do 
que os precedentes, isolados do resto da Ásia por meio 
do grande sistema montanhoso do Himalaia, e rega-
dos pelos rios que descem daqueles montes. Os rios, 
impetuosos e inconstantes devido ao clima das mon-
ções, foram canalizados, e permitiram irrigar as planí-
cies, adequadas para o estabelecimento de uma popula-
ção numerosa. A pesquisa das culturas mais rendosas, 
levou—no I milênio a.C. — à seleção quase que exclusi-
va do arroz, que cresce na água e não requer rotação 
com outras culturas, mas somente um minucioso con-
trole dos reabastecimentos hídricos. Os montes circun-
dantes permanecem incultos e habitados por nômades 
não-civilizados; assim o ambiente humano continua 
caracterizado por uma oposição fundamental: ao nor-
te, as montanhas hostis e desconhecidas, de onde vêm 
os ventos frios, os inimigos, os animais selvagens; ao 
sul, a planície cultivada e o mar, onde o sol dá seu 
calor e onde se desenvolvem as atividades civis. 
Esta organização econômica, rígida e sem mar-
gens de manobra, tende a perpetuar-se no local, favore-
cendo a formação de grandes Estados unitários, como 
no Egito, pois concentra nas mãos dos soberanos e da 
classe dirigente um enorme excedente, que serve em 
primeiro lugar para garantir as condições de sobrevi-
vência geral. A relação entre poder, prosperidade e 
virtude domina assim a cultura oriental desde o início. 
O poder justifica-se caso assegure a paz e a harmonia 
social, isto é, a mediação entre os princípios opostos do 
yin e do yang (o frio e o calor, a sombra e a luz, o 
descanso e a atividade). No campo dos conjuntos habi-
tacionais humanos, o poder deve garantir o justo equi-
líbrio entre o norte e o sul, manter à distância os peri-
gos que vêm do norte, refrear as águas que descem dos 
altiplanos, e transformá-las em elemento da vida no 
sul. 
Neste sistema, a cidade ocupa um posto domina-
te e carregando-se de grande quantidade de significa-
dos utilitários e simbólicos. É a sede do poder, sendo 
pois, o órgão onde se dá a mediação entre os opostos, 
que regula e representa todo o território. A ordem laten-
te no universo torna-se aqui uma ordem visível, geomé-
trica e arquitetônica. Os eixos de simetria ligam a 
cidade aos pontos cardeais, isto é, ao universo celeste; 
os muros imprimem-lhe uma forma regular e a defen-
dem dos inimigos; a multiplicidade dos espaços e dos 
edifícios revela a complexidade das funções civis e 
religiosas, com seu minucioso cerimonial. 
As regras urbanísticas e de construção — como 
muitos outros elementos da civilização chinesa — 
formam-se na era Chu (1050-250 a.C), são codificadas 
no final deste período, quando nasce o império unitá-
rio, e são transmitidas com continuidade por todo o 
período sucessivo, até a época moderna. 
As cidades chinesas, estritamente ligadas ao ter-
ritório agrícola, começam como cidade-refúgio, desti-
nada à residência estável da classe dirigente (sacerdo-
tes, guerreiros e técnicos) sendo capaz acolher tempo-
rariamente a população camponesa do distrito circun-
dante. Deve ter portanto dois cinturões de muros: um 
interno, que encerra a cidade habitada verdadeira e 
própria, e um externo, que cinge um espaço vazio de 
hortas e de pomares. Estas cidades se distinguem, se-
gundo sua grandeza, em três categorias, denominadas 
com três nomes diferentes: tscheng, ji e tu. 
As regras para sua projeção são descritas pelo 
literato Meng-Tsi (372-289 a.C). A unidade de medida 
urbanística é o li, que corresponde a mais ou menos 530 
metros. Na cidade tscheng menor, o cinturão interno 
tem um perímetro de llieo externo de 3 li; ela pode se 
tornar o núcleo de uma cidade tscheng maior, com o 
cinturão interno de 3 li e o externo de 7 li; esta pode 
formar o núcleo de uma cidade ji (com o cinturão inter-
no de 7 li e o externo de 11 li), e esta última pode 
constituir o núcleo de uma cidade tu (com o ciníurão 
interno de 11 li e o externo de 14 li). Uma outra série 
paralela é conseguida partindo de uma cidade tscheng 
pequena com o cinturão interno de llieo externo de 5 
li; obtém-se deste modo, a tabela da Fig. 121, que diz 
respeito às cidades de medida normal: as capitais po-
dem ser muito maiores, de até 100 li de perímetro exter-
no (Figs. 122-124). 
A cidade tscheng com perímetro externo de 7. li 
pode conter 3.200 habitantes, e serve a um território 
agrícola com 32 aldeias, que mede mais ou menos 12 x 
12 quilômetros; deste modo, de cada ponto do território 
é possível chegar a pé à cidade, com percurso máximo 
de uma hora e meia. As capitais imperiais maiores — 
Chang-an, Hang-Chu e Pequim — alcançaram e tal-
vez superaram o total de um milhão de habitantes. A 
orientação permanece sempre rigorosamente ligada 
aos pontos cardeais. 
Também as regras de construção para a projeção 
das casas permanece fixas desde o período Han até os 
tempos recentes. A casa é um recinto análogo à cidade, 
vinculada à mesma orientação e acessível, habitual-
mente, pelo sul. Todos os ambientes se abrem sobre um 
ou mais pátios internos, quadrados ou retangulares, de 
modo a realizar a desejada alternância de sombra e de 
sol (yin e yang). Os elementos construtivos principais e 
fixos são os perimetrais (a plataforma de base, os muros 
externos e a cobertura de madeira); as divisórias inter-
nas de tijolos não têm função sustentatória e são, por-
tanto, móveis, para acompanhar as mudanças das fun-
ções domésticas. Todos os edifícios têm, habitualmente, 
um só pavimento, sendo a densidade de população nas 
cidades chinesas bastante baixas: não mais de 100 habi-
tantes por hectare. 
As casas se desenvolvem a partir de ruas de lar-
gura moderada (Fig. 128), sobre as quais se abrem 
somente as portas de entrada e as altas janelas de 
alguns ambientes secundários. 
Fora da cidade, a casa chinesa pode interpene-
trar-se com a natureza. Os ambientes individuais ou 
grupos de ambientes conservam uma forma regular e 
simétrica, mas o conjunto se torna irregular, para ade-
rir às características do local, e recria com os meios da 
arquitetura a complicação do cenário natural. A jardi-
nagem converte-se no quadro vinculador das obras 
arquitetônicas. 
Nos grandes conjuntos monumentais, e especial-
mente nos palácios do imperador — suprema autorida-
de religiosa e civil — as duas regras tradicionais da 
projeção aparecem muitas vezes combinadas entre si. 
Os edifícios destinados às cerimônias públicas são rigi-
damente agrupados ao redor do eixo de simetria, que 
vai do sul para o norte, e o eixo se torna um percurso 
impressionante, através de uma sucessão de pátios 
fechados. Os edifícios e os espaços para a vida privada 
apresentam-se incorporados ao jardim paisagístico, que 
foge de toda regra geométrica e desequilibra, à direita ou 
à esquerda, a composição geral. Esta se faz, assim, uma 
recapitulação de todo o ambiente cósmico, com sua alter-
nância de regularidade e irregularidade. 
O quadro geográfico do Japão — com a falta dos 
grandes espaços planos e dos rios navegáveis — exclui 
nos primeiros tempos a presença de grandes cidades. 
Mas depois da unificação do país, no final do século III 
a.C, nasce a exigência de uma cidade capital, que é 
projetada conforme as regras chinesas, codificadas 
nos períodos Han e Tang. Do séculoVI ao VIII d.C, 
uma série destas cidades são fundadas a curta distân-
cia na região Yamato (Figs. 149-158). As arquiteturas 
utilizam os modelos chineses, com características ori-
ginais de simplificação geométrica e de desenvoltura. 
Nas residências e nos templos suburbanos, imer-
sos na natureza, a arquitetura japonesa alcança os 
resultados mais novos e requintados. Estas composi-
ções (Figs. 165-169) são reguladas por duas normas 
complementares: a liberdade informal da instalação 
paisagistica (que precede e influencia os jardins ingle-
ses do século XVIII) e a constância da esquadria nos 
edifícios, baseados no módulo planimétrico e altimétri-
co dos tatami (cerca de 0,90 x 1,80 m).

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