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Criminologia
Parte 1
Criminologias Etiológicas (final do século XIX)
É o modelo de criminologia que define a disciplina como o estudo das causas científicas da criminalidade.
Tem raízes nos pensamentos do Positivismo (Spencerianismo) e do Darwinismo.
Em meados do séc. XX, nos EUA, iniciou-se a mudança dos paradigmas da criminologia.
 o paradigma da reação social e as Criminologias Críticas
 Interacionismo simbólico + Marxismo
Paralelamente às Criminologias Críticas, há a formação de outras Criminologias (de meados do séc. XX até a atualidade), focadas no:
 Feminismo e Gênero (Criminologias Feministas)
 Racismo (Criminologias Raciais)
Por fim, como resposta à desconstrução operada pelas Criminologias Críticas, surge o horizonte das alternativas ao atual modelo de controle social, como a Justiça Restaurativa, para desconstrução do atual sistema penal.
O paradigma etiológico
Fundado com o Positivismo, nasce a tentativa de criar uma “ciência” causal explicativa da criminalidade.
Os pilares estão no positivismo italiano (Cesare Lombroso, Enrico Ferri, Raffaele Garofalo). Fontes oficiais desse paradigma etiológico.
O crime seria uma realidade ontológica; existe na pessoa e dela deriva. O criminoso seria ontologicamente criminoso e a potencialidade de delinquir esta ínsita em suas características, em suas anomalias, sejam de ordem biológica, psicológica, anatômica ou fisiológica, sejam num momento posterior pelo meio físico ou social.
A primeira resposta da razão da criminológica é de ordem ANTROPOLÓGICA, imortalizada na obra “O homem criminoso”, de Cesare Lombroso (entre 1871 e 1876).
Ferri seguiu essa linha, mas com foco em uma dimensão SOCIOLÓGICA (meio ambiente, condição econômica, status social etc.). Cria o conceito de “temibilidade” (periculosidade), capacidade iminente, potencial de alguém produzir um mal a outrem, que levou à conceituação de classes perigosas. Sociologia criminal.
Fundam-se assim os pilares da ideologia da defesa social, com o princípio maniqueísta do BEM contra o MAL. Nasce o diagnóstico da criminalidade e, ao seu lado, o da penalidade. A PENA serviria para defender a sociedade, contra o perigoso representado pela criminalidade (prevenção especial positiva). Discurso de tratamento do delinquente através da prisão, como os fins da readaptação e ressocialização dos criminosos.
As teorias etiológicas buscavam não apenas dar um diagnóstico da criminalidade, mas também uma profilaxia criminal, uma política criminal de solução do problema e de cura do homem por meio do laboratório da prisão.
A continuidade das teorias etiológicas, o pós-positivismo lombrosiano e ferriano, aconteceu nos EUA neoliberal (não mais influenciado pelo positivismo, mas pelo interacionismo simbólico e pelo construtivismo social), por meio de teorias psicanalíticas, estrutural-funcionalistas (Durkheim), de subculturas criminais, das técnicas de neutralização, labelling approach (a partir de 1960), teorias do conflito. 
A partir desse momento, a criminalidade não é mais vista como um dado ontológico, oriundo do homem delinquente, passando a ser considerada uma CONSTRUÇÃO SOCIAL, produto do sistema de controle penal e social, pela totalidade das agências de controle punitivo em interação com as agências de controle formal. A criminalidade não é resultado da prática de uma minoria de pessoas, é resultado da ação de definição e seleção realizada pelo sistema de justiça penal, com o respaldo da família, da escola, da religião, da mídia. MUDANÇA DO OBJETO DA CRIMINOLOGIA
Parte 2
Criminologias Críticas
Essa teoria procura se despir da visão estereotipada da criminalidade (o criminoso como o homem pobre, negro etc.), para entendê-la como uma construção social. O resultado da AÇÃO ao lado da REAÇÃO do sistema penal, selecionando algumas para lhes atribuir o status de criminoso.
O controle social e penal (sistema penal) como objeto criminológico.
A Criminologia como Teoria das condições da criminalização
Mudança do conceito de criminalidade a criminalidade e o criminoso como CONSTRUÇÃO SOCIAL SELETIVA.
A grande tese desse paradigma é a teoria da seletividade estigmatizante: a conduta criminal é majoritária e ubíqua (acontece em todas as classes, etnias, gênero, sexualidades, idades), mas a criminalização é desigualmente distribuída.
Relação da Criminologia Crítica com o paradigma da reação social: incide sobre a sociologia as teses do marxismo, do materialismo histórico. São inseridas as teses da criminologia crítica (iniciadas com o labelling approach e as teorias do conflito) na estrutura econômica da sociedade, no sistema jurídico-político, passando a estudá-las a partir das categorias do marxismo, fundadas no conceito chave de modo de produção da vida social, de totalidade, de dialética. Concluindo pela relação estrutural entre o modo de funcionamento do sistema punitivo e a estrutura social.
Teorias materialistas do desvio:
As Criminologias Críticas como amadurecimento do paradigma da reação social (e das teorias do conflito) por dentro do Marxismo
Antecedentes na Economia Política da Pena (Escola de Frankfurt): Teorias materialistas do desvio e da criminalização ou Sociologia do Direito Penal
A seletividade do sistema penal não pode ser compreendida abstratamente, porque ela expressa e reproduz a estrutura social capitalista.
Relação funcional entre o funcionamento seletivo do sistema penal e a desigualdade de classe no capitalismo; entre seletividade ou violência seletiva (Microssociologia) e desigualdade social ou violência estrutural (Macrossociologia).
São revistas e descontruídas as concepções de criminalidade e criminoso das teorias etiológicas, de base positivista. nasce uma “ciência” do controle social e penal.
Diferentes contextos e nomenclaturas das Criminologias Críticas:
Criminologia Radical (EUA)
Nova Criminologia (Inglaterra)
Criminologia Crítica (Europa; Itália, Alemanha...)
Em meados de 1970 e 1980, a Criminologia Crítica chega à América Latina, recebendo diversas nomenclaturas como criminologia de raízes, dialética, da libertação, das margens, sociologia do controle penal, teoria crítica do controle social, realismo jurídico – penal marginal.
Nascimento das Criminologias Críticas Latino-americanas
Ideia e importância de uma Criminologia emancipatória, voltada à politização, ao caráter libertário, utópico, tendente à superação do sistema punitivo vigente. Nascimento de conceitos como: sistemas penais subterrâneos, poder configurador, criminologia das margens. Os sistemas brasileiros são muito mais violentos e graves, além de punir criminosos seletivamente, eles os MATAM, os TORTURAM. sistemas punitivos brasileiros destituídos de legalidade, com penas cruéis informais (tortura, morte etc.); as pessoas morrem antes de entrarem no sistema.
 SELETIVIDADE + LETALIDADE = genocídio e extermínio como objetos das criminologias latino-americanas.
Parte 3
Com a incidência das ideias do Marxismo na Criminologia Crítica, a prisão passa a ser vista como método punitivo funcional ao capitalismo e à criminalização da pobreza da função declarada da ressocialização à função latente e real de disciplinamento para o trabalho fabril e construção do proletariado europeu.
A prisão é a pena do capitalismo.
Na periferia (américa latina), a prisão serviu essencialmente para o aprisionamento dos NEGROS. aqui, a mudança da escravidão para o capitalismo foi direta, não houve um período intermediário de feudalismo, mercantilismo etc.
No Brasil, o racismo é um elemento estruturante do funcionamento desigual do sistema penal desde a Colônia.
A Criminologia Crítica europeia voltou-se mais à estrutura social capitalista e à luta de classes, não tendo como foco o racismo.
Uma das marcas da brasilidade é a perpetuação da violência qualitativa e quantitativamente diferenciada.
Em síntese:
Criminologia Etiológicas: criminologia da violência individual, intrínseca a cada um dos indivíduos criminosos; a criminalidade como uma realidade ontológica.
Criminologia Crítica:
com a mudança de paradigma, deu-se origem a uma criminologia da violência institucional, do sistema penal, seletiva; a partir do labelling approach em diante, do paradigma da reação social; deslocamento do objeto: das causas da criminalidade para as causas das condições da criminalização (busca explicar a violência praticada pelas instâncias que criminalizam).
Desenvolvimento materialista e racial, aprofundando-se no paradigma da reação social dá origem à Criminologia da Violência Estrutural, da Violência Racial, criminologia da violência da estrutura capitalista, com resquícios de escravismo, que se projeta no sistema punitivo.
O que vem depois da desconstrução e “desocultação” das violências do sistema penal?
Crise de legitimidade do sistema penal, incapaz de proteger bens jurídicos, de prevenir crimes. A função real do sistema não é ressocializar pessoas, é mantê-las eternamente separadas, segregadas e excluídas. Excluem-se, por meio do aprisionamento, pessoas que não têm capacidade de integrar a estrutura social capitalista.
Daí surgem as Teorias Abolicionistas, buscando a superação do modelo punitivo como mecanismo de controle social. possibilidades não violentas, justiça restaurativa etc.
Parte 4
Ainda dentro do paradigma da reação social: introdução das relações de gênero, da estrutura e da dominação patriarcal.
Influência do feminismo a partir de 1960: introdução da ideia do patriarcado.
A Criminologia é uma ciência androcêntrica, com uma linguagem masculina, feita por homens (criminólogos) e para os homens (criminosos).
Desafio de superar o silenciamento do sexo e do gênero feminino no controle penal.
Cesare Lombroso depois também escreveu sobre a fêmea delinquente: contrastando a “dama” com a “prostituta”. Iniciou aí não uma Criminologia Feminista, mas uma criminologia de desbravamento das causas dos crimes femininos.
A Criminologia Crítica Feminista vai propor perguntas de acordo com o paradigma da reação social, no sentido de como as mulheres são tratadas pelo sistema penal? Como trabalhadoras/operadoras do sistema, como vítimas e/ou autoras de crime? Qual o papel delas ao exercerem papéis no sistema punitivo? São papéis de transformação ou manutenção do sistema? Por que o tráfico de drogas ampliou substancialmente a presença feminina nos cárceres do mundo capitalista inteiro?
Como as mulheres são tratadas como vítimas?
Pesquisa empírica feita pela Profa. Vera Andrade, sobre o julgamento de crimes de estupro e atentado violento ao pudor em Florianópolis, na década de 1980: julgamentos feitos a partir da moral sexual, que não protege a liberdade sexual feminina, mas a família capitalista patriarcal. Predominou a “lógica da honestidade”, como sublógica da seletividade as vítimas eram tratadas desigualmente e de acordo com estereótipos de “mulher (des)honesta”.
Além disso, a Profa. Vera Andrade demonstrou que, mesmo nos casos em que a mulher é considerada “honesta”, não havia punibilidade. O sistema patriarcal é omisso na responsabilidade dos homens que cometeram crimes contra mulheres, notadamente porque esses se dão dentro da família, em relações patriarcais (maridos, familiares, chefes, vizinhos etc.).
Em regra, violência sexual não é punida pelo sistema penal e este não é o melhor mecanismo para tratar da violência de gênero. A justiça restaurativa é o grande desaguadouro para essa modalidade de conflitos entre gêneros e sexos.
Como as mulheres são tratadas como criminosas?
Grande relevância na sociedade, cujo eixo de criminalização baseia-se nas drogas, o que levou ao aumento exponencial do aprisionamento das mulheres, que pariram filhos nas prisões, transformando até mesmo os cárceres em “creches” para amparar os filhos ali nascidos.
A segregação do sistema é de CLASSE, RAÇA e GÊNERO. 
Parte 5
Justiça Restaurativa
Origens do restaurativismo (um movimento): década de 1970 (Canadá, EUA, Nova Zelândia, Austrália, África, Inglaterra, Bélgica, América Latina – Colômbia, Peru, Bolívia, Brasil)
Fontes imediatas: movimentos abolicionistas, comunitaristas, vitimológicos, feministas, direitos dos presos, direitos civis. todos eles têm como causa, como condicionamento em comum o esgotamento / deslegitimação do sistema penal e prisional em suas múltiplas funções; as constantes e sistêmicas violações de direitos fundamentais, os danos e altos custos financeiros resultantes desse sistema; superencarceramento; racismo. 
Fontes mediatas: a ancestralidade das tradições indígenas. Um retorno ao simples. experiências nas décadas de 1960 e 1970 (Canadá, por exemplo); teorizações só vêm posteriormente, a partir de 1980.
Em razão da pluralidade de fontes, há uma pluralidade de sentidos e concepções acerca do que é Justiça Restaurativa paradigma em construção.
Objetivos da Justiça Restaurativa (que, ora, se complementam, ora, se tensionam):
Encontro: propõe o encontro entre pessoas diretamente implicadas num crime, num conflito, numa situação problemática; busca devolver o conflito às partes, para que elas sejam as protagonistas da solução do problema; ideia de justiça vivenciada pelo implicados, pelos diretamente envolvidos, que são os propositores e negociadores da solução, sempre sob uma perspectiva de futuro, este o foco do restaurativismo (em contraponto ao foco do punitivismo, que é o passado).
Tem um caráter dialógico, includente, requer a participação voluntária e promovo o empoderamento dos participantes como protagonistas da própria história.
Reparação do dano: propõe que a ideia da justiça é a reparação do dano (na medida do possível, evidentemente); o foco é a reparação dos danos porque o crime é uma violação de pessoa e de relacionamentos, que produz danos; por meio da escuta e do tratamento das vítimas afetadas e da responsabilidade dos ofensores; a justiça restaurativa deve reunir: danos, necessidades e responsabilidades; diferencia-se da justiça punitiva, porque para esta, o crime é uma violação à lei do Estado, não necessariamente uma violação a pessoas e um rompimento de relações.
Enquanto a justiça punitiva pergunta “Quem é o culpado? Como ele deve ser punido?”, a restaurativa pergunta “Quem foi afetado, prejudicado (ofensores, vítimas, comunidades)? Como vamos pactuar a vida para o futuro?”
O núcleo da justiça restaurativa é o holismo, a ideia de que todos nós estamos inter-relacionados.
Transformação: propõe a transformação das pessoas e das relações; a justiça restaurativa não é um novo modelo de juridicidade, é um modelo de sociabilidade, um novo modo de relações entre as pessoas, para que elas não se relacionem com violência; comunicação não-violenta, pacificação etc.
Parte 6
Principais práticas restaurativas:
Encontros vítima-ofensor
Câmaras restaurativas
Conferências familiares
Mediação
Círculos restaurativos (forte influência dos povos indígenas)
Círculos de paz (para vários espaços – sociais, comunitários, interindividuais, familiares – e situações, além do crime)
Kay Pranis (EUA) e Juiz Barry Stuart (Canadá)
Elementos da justiça restaurativa: não é uma mera técnica nem uma mera resolução pontual e final de conflitos.
Concepção
Princípios
Valores e práticas
A justiça restaurativa não é...
... não é uma técnica para evitar reincidência
... não visa o perdão; ela visa reparar relações, pessoas, danos, na medida do possível, de acordo com as necessidades e as responsabilidades possíveis.
... não, necessariamente, exclui o sistema penal.
... não é focada na resolução de conflitos.
... não foi criada apenas para crimes ou questões leves; é para todo o tipo de problema que as pessoas envolvidas julgarem possível.
No mínimo, a justiça restaurativa se propõe a ser um novo modelo de juridicidade, em superação ao modelo punitivo.
No máximo, ela pretende ser um paradigma de sociabilidade, de construção de uma nova subjetividade.
Justiça restaurativa no Brasil:
 Pesquisa do CNJ “Pilotando a Justiça Restaurativa”: o papel do Poder Judiciário (Vera Andrade e Aline Pedra Jorge-Birol).
Muitas vezes, a justiça restaurativa é
desnaturada a partir do transporte de funções do sistema punitivo (evitar reincidência, ressocialização etc.). Por isso é importante que a justiça restaurativa seja ampliada para FORA do sistema punitivo tradicional, mormente para a COMUNIDADE, onde suas funções e finalidades possam ser efetivadas na sua inteireza e amplitude. Não se pode converter o restaurativismo a um sistema paralelo, um mero anexo do sistema punitivo (assim como ocorreu com o Juizado).
O discurso das alternativas ao cárcere e à pena serão meramente simbólicos se não conseguirem uma instrumentalidade, uma interferência concreta na clientela central do sistema penal (quanto à classe, gênero e raça).

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