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REGISTRO DE IMÓVEIS AULA 3 Prof. Lucas Fernando de Castro 2 CONVERSA INICIAL Nesta aula, iremos analisar os princípios do direito imobiliário brasileiro de forma um pouco mais detida sobre os principais princípios. Isso porque a doutrina nacional aponta a existência de inúmeros princípios: princípio da instância, princípio da segurança jurídica, princípio da autonomia do registrador, princípio da unitariedade, princípio da continuidade, princípio da legalidade ou legitimidade, princípio da centralização local, princípio da concentração dos atos na matrícula, entre outros. Vamos focar nos principais. TEMA 1 – PRINCÍPIO DA INSCRIÇÃO O conceito do princípio da inscrição significa que a constituição, transmissão e extinção dos direitos reais nascem com o registro junto ao ofício imobiliário (art. 1.227 e 1.245, CC). Com a inscrição do contrato, a relação jurídica assume publicidade e este deve ser por todos respeitado, ou seja, confere ao negócio a característica erga omnes. É literalmente adoção da versão romana da tradição dos negócios jurídicos imobiliários. Este princípio apresenta dois efeitos: constitutivo e declarativo. Com o primeiro, surge o direito real e, com declarativo, declara a constituição anterior. Um exemplo do efeito constitutivo é o registro de uma escritura, pública ou particular de um contrato de compra e venda. O efeito declarativo deriva de uma situação já consolidada. O registro de um formal de partilha, por exemplo. Em virtude do princípio da saisine (art. 1.784, CC), os herdeiros recebem os direitos relativos aos direitos reais no momento do falecimento. Com o registro, declara-se a situação derivada de tal aquisição. A inscrição declarativa pode ser classificada como integrativa ou preventiva: integrativa se a inscrição diz respeito à complementação dos dados da cadeia dominial ou relativa à complementação do objeto do imóvel. Podemos citar como exemplo averbação de alterações na situação do imóvel, tais como numeração, construção ou demolição (art. 213, Lei n. 6.015/1973). A preventiva refere-se a uma situação provisória que será confirmada ou deverá ser cancelada. Tem como finalidade identificar riscos aos direitos existentes e alertar terceiros. Podemos citar como exemplos a inscrição de citação em ação executiva (art. 799, IX, CPC), hipoteca judiciária (art. 495, CPC), 3 condição suspensiva em negócio jurídico, penhora, arresto, sequestro, indisponibilidade de bens (art. 185-A, CTN e Provimento 39/2014 do CNJ) e citação em ações reais e reipersecutórias (art. 792, I, CPC e art. 167, I, 25, Lei n. 6.015/1973). Importante anotar que não há fixação de prazo para registro dos contratos. TEMA 2 – PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO E DA FÉ PÚBLICA Estamos diante de dois princípios que estão ligados intrinsecamente e que, por sua importância, estão no cerne da própria função dos registros públicos. O princípio da presunção está previsto no artigo 1.245, §2º do Código Civil. O primeiro princípio é conceituado como daquele que se presume titular do direito, cujo direito está inscrito na tábua registral. Somente poderá ser afastado por prova em contrário, mediante o ajuizamento de ação própria ou de retificação (art. 1.247, CC). A Lei n. 6.015/1973, em seu artigo 252, apontou no mesmo sentido, de que enquanto não houver declaração de anulação, extinção, rescisão ou distrato, o registro continua a produzir todos os seus efeitos legais, ou seja, o detentor do direito real continuará na sua qualidade, inclusive para fins tributários. A retificação dos dados pode ser extrajudicial, inclusive pela própria iniciativa do registrador, ou judicial, pela via da anulação da inscrição por falhas formais ou materiais. O princípio da fé pública está relacionado à proteção do terceiro adquirente de boa-fé e sua confiança nos dados cadastrados no ofício imobiliário. Tanto o Código Civil de 1916 como o de 2002 e a Lei de Registros Públicos não acolheram textualmente esse princípio. Inclusive o Supremo Tribunal Federal, no RE 85.223/MG, de relatoria do Ministro Soares Munhoz, julgado em 09/10/1979, firmou procedente que o direito brasileiro não havia acolhido o princípio da fé pública. Porém, ainda existem divergências jurisprudenciais, como a posição tomada no REsp 988.505/DF de relatoria da Ministra Nancy Andrighi. Reforçando a inexistência de adoção do princípio da fé pública, foi determinado por conta da Lei n. 7.433/1985, regulada pelo Decreto n. 93.240/1986 que seriam exigidas para realização de contratos que envolvessem direitos reais: certidões fiscais, feitos ajuizados e ônus reais. Portanto, além da 4 certidão emitida pelo registro de imóveis, seriam necessárias as certidões negativas fiscais, para acautelar-se de possíveis ações que pudessem reduzir o vendedor à insolvência. Entretanto, modificando tal lei foi promulgada a Lei n. 13.097/2015, que tratou da concentração dos atos na matrícula, nos artigos 54 a 62. Esses dispositivos visaram afastar a necessidade de tais certidões para realização de vendas relativas a tais imóveis e protegendo o terceiro adquirente de boa-fé. Quanto a isso, devemos destacar que o artigo 61 da Lei 13.097/2015 indicou que os atos jurídicos anteriores à edição da norma deveriam ter se adequado a ela em até dois anos, contados de sua vigência (20 de fevereiro de 2015), logo, até 20 de fevereiro de 2017. Inclusive, reforçando este entendimento, em recente decisão, o Conselho Nacional de Justiça firmou procedente no sentido de ser dispensável a exigência por parte do registrador de certidão negativa de débito para efetuar o registro de títulos (CNJ. 0001230-82.2015.2.00.0000. Pedido de Providências. Plenário. Unânime. Con. Rel. Marcio Evangelista Ferreira da Silva. J. 27/10/2017). Portanto, apesar de não positivado, tal princípio vem sendo cada vez mais aplicado, especificamente para resguardar os interesses de terceiros que, confiando nas informações existentes nos cadastros imobiliários, fazem negócios jurídicos. TEMA 3 – PRINCÍPIO DA PRIORIDADE Vários direitos reais poderão recair sobre um mesmo imóvel, por exemplo, propriedade, hipoteca, servidão, penhor, usufruto, Tais direitos deverão ser classificados de acordo com a sua graduação, graus estes atribuídos de acordo com a anterioridade no registro. O princípio atua de forma diferenciada, de acordo com cada direito: compatíveis ou incompatíveis entre si. Caso os direitos sejam compatíveis, por exemplo, duas hipotecas, a regra é da graduação entre eles, de acordo com a prioridade no ingresso do contrato. Se incompatíveis, como é o caso do direito de propriedade, este princípio determina a manutenção do direito que primeiro se prenota, excluindo-se aquele posterior. Para o primeiro caso (direitos compatíveis), pode-se citar como exemplo a existência de duas hipotecas firmadas pelo proprietário dominial: a primeira 5 que for levada a registro será graduada como de primeiro grau e terá prevalência frente ao direito creditório da hipoteca em segundo grau (art. 1.477, CC). Já no caso de incompatibilidade de direitos, podemos citar a existência de dois contratos de compra e venda. O primeiro adquirente que ingressar no registro terá acolhido seu direito, enquanto o segundo será excluído (art. 186 da Lei n. 6.015/1973). Esse princípio assegura a prioridade de acordo com a data de apresentação do contrato, não tendo qualquer relação com a data que este foi assinado ou formalizado o negócio. Isso porque a Lei de Registros Públicos (art.190) determina a impossibilidade de se efetuar o registro de direitos contraditórios sobre o mesmo imóvel. Em caso de apresentação de 2 títulos no mesmo dia, contendo direitos contraditórios entre si, aquele que tiver o menor número de ordem no livro de protocolo, ou seja, tiver sido apresentado antes, terá a prevalência. Podemos citar o exemplo de duas penhoras no mesmo dia, em horários diferentes: aquela a que tiver sido conferido o menor número de ordem no livro protocolo, será registrada em primeiro lugar, e a segunda será registrada no próximo dia útil. No caso de serem apresentados pelo mesmo interessado, este deverá determinar a ordem de preferência, de acordo com seu interesse. Exceção a isso é o conflito entre duas escrituras públicas que, sendo lavradas na mesma data e apresentadas no mesmo dia, uma delas ou as duas mencione a hora de sua lavratura. A Lei de Registros (art. 192) determina que aquela que mencionar o horário deve prevalecer, ainda que tenha o menor número de ordem. Mencionando as duas o horário, prevalecerá aquela lavrada em primeiro lugar. Outra exceção se dá no registro de hipotecas, no caso de menção à hipoteca anterior. O artigo 1.495 do Código Civil determina que a hipoteca ulterior será prenotada e ficará sobrestada pelo prazo de 30 dias, para que a cédula pretérita seja registrada. Se registrada, garante a prevalência da hipoteca anterior e, caso não seja, a nova hipoteca terá preferência. Os créditos tributários e trabalhistas terão prioridade em face de outros direitos. 6 TEMA 4 – PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE O princípio da especialidade é caracterizado como a individualização mais precisa possível do bem, das partes e do negócio jurídico em tela. Está previsto no artigo 176, §1º, II, item 3, da Lei de Registros Públicos. No artigo 225 da mesma lei, impõe-se a obrigação dos notários, juízes e escrivães fazer constar nas escrituras e atos judiciais todas as características do imóvel, inclusive mencionando os nomes dos confrontantes, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da esquina mais próxima. Os Códigos de Normas das Corregedorias de Justiça de cada um dos estados disciplinam de forma mais pormenorizada a necessidade de cumprimento da especialidade objetiva. Da mesma forma que a Lei n. 6.015/1973 determina a necessidade de cumprimento do princípio da especialidade para o objeto do direito real, também é obrigatória para a qualificação do detentor do direito real (art. 176, §1º, II, item 4 alíneas “a” e “b”). Igual exigência se dá para os caracteres do negócio jurídico a ser inscrito, devendo constar no título condições, valores do negócio, pagamento, quitação, cláusulas especiais, taxa de juros, entre outros. TEMA 5 – PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE É o encadeamento lógico e continuo das transmissões, modificações, extinções e constituições dos direitos reais inscritos no registro de imóveis. Isso porque a função do registro de imóveis é dar segurança às mutações jurídico reais impedindo transmissão de direitos por quem não é seu titular. A razão de ser dos ofícios públicos é a publicidade e a garantia de segurança ao tráfico dos negócios jurídicos. Este princípio se liga diretamente com o princípio da inscrição, ao disciplinar que todas as transformações estejam registradas e averbadas para que elas gerem efeitos. Não será aceita a inscrição de título cujo outorgante não detenha a inscrição prévia do direito que busca transmitir. Entretanto, as próprias alterações decorrentes das relações jurídicas do proprietário, tais como casamento, divórcio, falecimento, modificações no regime de bens dos cônjuges, devem constar na matrícula. 7 Podemos apontar que o princípio da continuidade é de extrema importância, principalmente para que se possa encadear o patrimônio dos eventuais interessados dos direitos inscritíveis, para preservar a conjunção realidade fática com realidade jurídica. NA PRÁTICA A aplicação do princípio da inscrição, da especialidade, da prioridade, da presunção e da fé pública é a própria dinâmica da vida registral. Em sua maioria, estão positivados, afastam dúvidas e garantem que a realidade fática espelhe na vida real. Visando melhor compreender os temas discutidos, sugerimos a resolução do seguinte exercício: O imóvel A pertence ao Sr. João dos Anzóis e sua esposa, Sra. Maria das Dores. A matrícula não menciona o regime de casamento do casal nem a qualificação da Sra. Maria das Dores. Chegam ao registro de imóveis, no mesmo dia, 5 títulos sobre o imóvel A, na seguinte ordem de prenotação: o primeiro, de escritura pública de compra e venda, figura como vendedor o Sr. João dos Anzóis e a Sra. Maria das Dores, para o Sr. Tício, lavrada em 01/01/2017, sem horário da lavratura; o segundo, de escritura pública de hipoteca em primeiro grau, na qual figuram como hipotecantes o Sr. João dos Anzóis e sua esposa Sra. Maria das Dores, lavrada em 10/07/2016, sem horário da lavratura; o terceiro, de escritura pública de hipoteca, em primeiro grau, figuram como hipotecantes o Sr. João dos Anzóis e sua esposa Sra. Maria das Dores, com data de 10/07/2016, lavrada às 09:30; o quarto, um contrato particular de locação, firmado em 05/01/2010, pelo Sr. João dos Anzóis somente, sem descrever sobre qual imóvel se daria a locação; por fim, o quinto, uma escritura de doação do Sr. João dos Anzóis e sua esposa, Sra. Maria das Dores, para o Sr. Mévio, datado de 01/05/2014, sem horário. Analisando o contexto, responda: quais são os princípios aplicáveis em cada um dos títulos e, caso sejam registrados, qual será a ordem de registro? FINALIZANDO Entender os princípios aplicáveis ao registro de imóveis é de suma importância para o operador do direito. Entender a dinâmica registral é aplicar tais princípios, que impedem uma séria de conflitos e facilitam a aquisição dos 8 direitos reais por parte de todos os interessados, conferindo segurança e confiabilidade à instituição registral. 9 REFERÊNCIAS BRASIL. Planalto – Presidência da República. Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 8 jan. 2018. BALBINO FILHO, N. Direito registral imobiliário. São Paulo: Saraiva, 2012. CARVALHO, A. de. Registro de Imóveis: comentários ao sistema de registro em face da Lei n. 6.015 de 1973 com as alterações da Lei n. 6.216 de 1975, Lei n. 8.009 de 1990 e Lei nº 8.935 de 18.11.1994. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
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