Buscar

EXERCICIO INTERTEXTUALIDADE

Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original

EQUIPE 01
TEXTO 01
TEXTO 02
A NOVA ROUPA DO IMPERADOR
(Hans Christian Andersen)
Um bandido, fugindo de outro reino, decidiu se esconder e fingir ser um alfaiate nas novas terras. Muito malandro, o bandido, o “novo alfaiate” conquistou a todos e até conseguiu uma audiência com o Rei.
“Nas terras distantes de onde vim, inventei uma forma de tecer a melhor de todas as roupas!” disse o farsante alfaiate. E continuou “Consigo tecer uma roupa que somente os inteligentes conseguem ver!” .
O rei, muito vaidoso, gostou da proposta e pediu ao bandido que fizesse uma roupa dessas para ele.
O bandido recebeu vários baús cheios de riquezas, rolos de linha de ouro, seda e outros materiais raros e exóticos, exigidos por ele para a confecção das roupas. Ele guardou todos os tesouros e ficou em seu tear, fingindo tecer fios invisíveis. Todos passavam na frente da alfaiataria e ele não parava de fazer sua performance: puxava panos, cortava o ar, olhava com cara de quem poderia fazer melhor, refazia e pendurava nada no mancebo. E assim o fez por semanas, enquanto recebia o dinheiro do rei. Claro que todas as pessoas que passavam pela janela alegavam ver o tecido, para não parecerem estúpidas.
Até que um dia, o rei se cansou de esperar, e ele e seus ministros quiseram ver o progresso do suposto “alfaiate”. Quando o falso tecelão mostrou a mesa de trabalho vazia, o rei exclamou: “Que lindas vestes! Fizeste um trabalho magnífico!”, embora não visse nada além de uma simples mesa, pois dizer que nada via seria admitir na frente de seus súditos que não tinha a capacidade necessária para ser rei.
Os nobres ao redor soltaram falsos suspiros de admiração pelo trabalho do bandido, nenhum deles querendo que achassem que era incompetente ou incapaz. O bandido garantiu que as roupas logo estariam completas, e o rei resolveu marcar uma grande parada na cidade para que ele exibisse as vestes especiais.
Durante o evento, contudo, uma criança, inocente e sincera, gritou “ O rei está nu!”. O grito é absorvido por todos, A sinceridade e o olhar da criança tocou a todos. Os burburinhos começaram e todos começaram a confessar que não enxergavam a nova roupa do rei.
O rei, sempre incomodado por nunca sentir nem o peso da roupa, se encolhe por um segundo. Há versões em que dizem que o bandido foi punido, mas há também versões em que o rei faz pose, ostentando sua “roupa” e fazendo todos ficarem em dúvida se havia mesmo ou não uma vestimenta.
EQUIPE 02
A ROSA DE HIROXIMA [HIROSHIMA]
Vinícius de Moraes
Rio de Janeiro , 1954
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroxima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A antirrosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada.
EQUIPE 03
Fita Verde no Cabelo
João Guimarães Rosa
Havia uma aldeia em algum lugar, nem maior nem menor, com velhos e velhas
que velhavam, homens e mulheres que esperavam, e meninos e meninas que nasciam e cresciam. Todos com juízo, suficientemente, menos uma meninazinha,a que por enquanto. Aquela um dia, saiu de lá, com uma fita verde inventada no cabelo. Sua mãe mandara-a, com um cesto e um pote, à avó, que a amava, a uma outra e quase igualzinha aldeia. Fita-Verde partiu, sobre logo, ela a linda, tudo era uma vez. O pote continha um doce em calda, e o cesto estava vazio, que para buscar framboesas.
Daí que indo, no atravessar o bosque, viu só os lenhadores que por lá lenhavam; mas o lobo nenhum, desconhecido nem peludo. Pois os lenhadores
tinham exterminado o lobo. Então, ela mesma, era quem se dizia: Vou à vovó, com cesto e pote, e a fita verde no cabelo, o tanto que a mamãe me mandou.
A aldeia e a casa esperando-a, acolá, depois daquele moinho, que a gente pensa que vê, e das horas, que a gente vê que não são. E ela mesma resolveu escolher tomar este caminho de cá, louco e longo, e não o outro, encurtoso. Saiu, atrás de suas asas ligeiras, sua sombra, também vindo-lhe correndo, em pós. Divertia-se com ver as avelãs do chão não voarem, com inalcançar essas borboletas nunca em buquê nem em botão, e com ignorar se cada uma em seu lugar as plebéinhas flores, princesinhas e incomuns, quando a gente tanto por elas passa. Vinha sobejadamente. Demorou, para dar com a avó em casa, que assim lhe respondeu, quando ela toque, toque, toque, bateu:
- Quem é?
- Sou eu... - e Fita-Verde descansou a voz. - Sou sua linda netinha, com cesto e pote, com fita verde do cabelo, que a mamãe me mandou.
Vai, a avó, difícil disse:
- Puxa o ferrolho de pau da porta, entra e abre. Deus te abençoe.
Fita-Verde assim fez, e entrou e olhou. A avó estava na cama, rebuçada e só. Devia, para falar agagado e fraco e rouco, assim, de ter apanhado um ruim defluxo. Dizendo:
- Depõe o pote e o cesto na arca, e vem para perto de mim, enquanto é tempo.
Mas agora Fita-Verde se espantava, além de entristecer-se de ver que perdera em caminho sua grande fita verde no cabelo atada; e estava suada, com enorme fome de almoço. Ela perguntou:
- Vovozinha, que braços tão magros, os seus, e que mãos tão trementes!
- É porque não vou poder nunca mais te abraçar, minha neta - a avó murmurou.
- Vovozinha, mas que lábios, ai, tão arroxeados!
- É porque não vou nunca mais poder te beijar, minha neta... - a avó suspirou.
- Vovozinha, e que olhos tão fundo e parados, nesse rosto encovado e pálido?
- É porque já não te estou vendo, nunca mais, minha netinha... - a avó ainda gemeu.
Fita-Verde mais se assustou, como se fosse ter juízo pela primeira vez.
Gritou:
- Vovozinha, eu tenho medo do Lobo!
Mas a avó não estava mais lá, sendo que demasiado ausente, a não ser pelo frio, triste e tão repentino corpo.
 [Extraído do livro Meus primeiros contos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, Antologia de Contistas Brasileiros vol. 3, 2001.]
EQUIPE 04
	MAR PORTUGUEZ
Fernando Pessoa
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
[Retirado do livro Mensagem, 1934]
Equipe 05
Via Crucis
Clarice Lispector
Maria das Dores se assustou. Mas se assustou de fato.
Começou pela menstruação que não veio. Isso a surpreendeu porque ela era muito regular.
Passaram-se mais de dois meses e nada. Foi a uma ginecologista. Esta diagnosticou uma evidente gravidez.
— Não pode ser! gritou Maria das Dores.
— Por quê? a senhora não é casada?
— Sou, mas sou virgem, meu marido nunca me tocou. Primeiro porque ele é homem paciente, segundo porque já é meio impotente.
A ginecologista tentou argumentar:
— Quem sabe se a senhora em alguma noite…
— Nunca! mas nunca mesmo!
— Então, concluiu a ginecologista, não sei como explicar. A senhora já está no fim do terceiro mês.
Maria das Dores saiu do consultório toda tonta. Teve que parar num restaurante e tomar um café. Para conseguir entender.
O que é que estava lhe acontecendo? Grande angústia tomou-a. Mas saiu do restaurante mais calma.
Na rua, de volta para casa, comprou um casaquinho para o bebê. Azul, pois tinha certeza que seria menino. Que nome lhe daria? Só podia lhe dar um nome: Jesus.
Em casa encontrou o marido lendo jornal e de chinelos. Contou-lhe o que acontecia. O homem se assustou:
— Então eu sou São José?
— É, foi a resposta lacônica. Caíram ambos em grande meditação.
Maria das Dores mandou a empregada comprar as vitaminas que a ginecologista receitara. Eram para o benefício de seu filho.
Filho divino. Ela fora escolhida por Deus para dar ao mundo o novo Messias.
Comprou o berço azul. Começou a tricotar casaquinhos e a fazer
fraldas macias.
Enquanto isso a barriga crescia. O feto era dinâmico: dava-lhe violentos pontapés. Às vezes ela chamava São José para pôr a mão na sua barriga e sentir o filho vivendo com força.
São José então ficava com os olhos molhados de lágrimas. Tratava-se de um Jesus vigoroso. Ela se sentia toda iluminada.
A uma amiga mais íntima Maria das Dores contou a história abismante. A amiga também se assustou:
— Maria das Dores, mas que destino privilegiado você tem!
— Privilegiado, sim, suspirou Maria das Dores. Mas que posso fazer para que meu filho não siga a via crucis?
— Reze, aconselhou a amiga, reze muito.
E Maria das Dores começou a acreditar em milagres. Uma vez julgou ver de pé ao seu lado a Virgem Maria que lhe sorria. Outra vez ela mesma fez o milagre: o marido estava com uma ferida aberta na perna, Maria das Dores beijou a ferida. No dia seguinte nem marca havia.
Fazia frio, era mês de julho. Em outubro nasceria a criança.
Mas onde encontrar um estábulo? Só se fosse para uma fazenda do interior de Minas Gerais. Então resolveu ir à fazenda da tia Mininha.
O que lhe preocupava é que a criança não nasceria em vinte e cinco de dezembro.
Ia à igreja todos os dias e, mesmo barriguda, ficava horas ajoelhada. Como madrinha do filho escolhera a Virgem Maria. E para padrinho o Cristo.
E assim foi se passando o tempo. Maria das Dores engordara brutalmente e tinha desejos estranhos. Como o de comer uvas geladas. São José foi com ela para a fazenda. E lá fazia seus trabalhos de marcenaria.
Um dia Maria das Dores empanturrou-se demais — vomitou muito e chorou. E pensou: começou a via crucis de meu sagrado filho.
Mas parecia-lhe que se desse à criança o nome de Jesus, ele seria, quando homem, crucificado. Era melhor dar-lhe o nome de Emmanuel. Nome simples. Nome bom.
Esperava Emmanuel sentada debaixo de uma jabuticabeira. E pensava:
Quando chegar a hora, não vou gritar, vou só dizer: ai Jesus!
E comia jabuticabas. Empanturrava-se a mãe de Jesus.
A tia — a par de tudo — preparava o quarto com cortinas azuis. O estábulo estava ali, com seu cheiro bom de estrume e suas vacas.
De noite Maria das Dores olhava para o céu estrelado à procura da estrela-guia.
Quem seriam os três reis magos? quem lhe traria incenso e mirra?
Dava longos passeios porque a médica lhe recomendara caminhar muito. São José deixara crescer a barba grisalha e os longos cabelos chegavam-lhe aos ombros.
Era difícil esperar. O tempo não passava. A tia fazia-lhes, para o café da manhã, brevidades que se desmanchavam na boca. E o frio deixava-lhes as mãos vermelhas e duras.
De noite acendiam a lareira e ficavam sentados ali a se esquentarem. São José arranjava para si um cajado. E, como não mudava de roupa, tinha um cheiro sufocante.
Sua túnica era de estopa. Ele tomava vinho junto da lareira. Maria das Dores tomava grosso leite branco, com o terço na mão.
De manhã bem cedo ia espiar as vacas no estábulo. As vacas mugiam. Maria das Dores sorria-lhes. Todos humildes: vacas e mulher. Maria das Dores a ponto de chorar. Ajeitava as palhas no chão, preparando lugar onde se deitar quando chegasse a hora. A hora da iluminação.
São José, com seu cajado ia meditar na montanha. A tia preparava lombinho de porco e todos comiam danadamente. E a criança nada de nascer.
Até que numa noite, às três horas da madrugada, Maria das Dores sentiu a primeira dor. Acendeu a lamparina, acordou São José, acordou a tia. Vestiram-se. E com um archote iluminando-lhes o caminho, dirigiram-se através das árvores para o estábulo. Uma grossa estrela faiscava no céu negro.
As vacas, acordadas, ficaram inquietas, começaram a mugir.
Daí a pouco nova dor. Maria das Dores mordeu a própria mão para não gritar. E não amanhecia.
São José tremia de frio. Maria das Dores, deitada na palha, sob um cobertor, aguardava.
Então veio uma dor forte demais. Ai Jesus, gemeu Maria das Dores. Ai Jesus, pareciam mugir as vacas.
As estrelas no céu.
Então aconteceu.
Nasceu Emmanuel.
E o estábulo pareceu iluminar-se todo.
Era um forte e belo menino que deu um berro na madrugada.
São José cortou o cordão umbilical. E a mãe sorria. A tia chorava.
Não se sabe se essa criança teve que passar pela via crucis. Todos passam.
[retirado do livro A Via Crucis do Corpo, 1974]

Teste o Premium para desbloquear

Aproveite todos os benefícios por 3 dias sem pagar! 😉
Já tem cadastro?

Continue navegando