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Hormônio Paratireóideo, Calcitonina, Metabolismo do Cálcio e do Fosfato,Vitamina D, Ossos e Dentes A fisiologia do metabolismo do cálcio e do fosfato, a função da vitamina D e a formação do osso e dos dentes estão reunidas em um sistema comum, juntamente com os dois hormônios regu- ladores, o hormônio paratireóideo e a calcitonina. Por conse- guinte, esses tópicos serão discutidos em conjuntoneste capítulo. CÁLCIO E FOSFATO NO LÍQUIDO EXTRACELULAR E NO PLASMA - FUNÇÃO DA VITAMINA D ABSORÇÃO E EXCREÇÃO DE CÁLCIO E DE FOSFATO Absorção intestinal de cálcio e de fosfato. O cálcio é pouco absorvido pelo tubo intestinal, devido à relativa insolubilidade de muitos de seus compostos, bem como à absorção deficiente de cátions bivalentes. Por outro lado, o fosfato é facilmente absorvido na maior parte do tempo, exceto quando existe excesso de cálcio na dieta; o cálcio tende a formar compostos de fosfato de cálcio quase insolúveis, que não são absorvidos, mas passam pelo intestino e são excretados nas fezes. Excreção do cálcio nas fezes e na urina; velocidade efetiva de absorção. Cerca de nove décimos da ingestão diária de cálcio são excretados nas fezes, enquanto o décimo restante é eliminado na urina. Os valores diários aproximados de renovação para o cálcio no adulto são os seguintes: A excreção do cálcio na urina segue muitos dos mesmos princípios que regem a excreção de sódio. Cerca de dois terços do cálcio do filtrado glomerular são reabsorvidos nos túbulos proximais. A seguir, nos ramos ascendentes da alça de Henle e nos túbulos distais e dutos coletores, a reabsorção do cálciorestante é muito seletiva, dependendo da concentração dos íons cálcio no sangue. Quando ela é baixa, essa reabsorção é muito grande, de modo que quase não ocorre perda de cálcio na urina. Por outro lado, mesmo pequeno aumento da concentração de íons cálcio, acima da normal, eleva acentuadamente a sua excre- ção. Mais adiante, veremos que o hormônio paratireóideo é um dos fatores mais importantes para o controle da reabsorção do cálcio nas porções distais do néfron e, por conseguinte, para o controle da excreção do cálcio. Excreção intestinal e urinária de fosfato. À exceção da fiação de fosfato excretada nas fezes, em combinação com o cálcio, quase todo o fosfato da dieta é absorvido no sangue a partir do intestino e, posteriormente, excretado na urina. O fosfato é uma substância com limiar, isto é, quando sua concentração plasmática está abaixo do valor crítico de aproxima- damente 1 mmol/1, não há perda de fosfato na urina; porém, acima dessa concentração crítica, a perda do fosfato é diretamente proporcional ao novo aumento. Por conseguinte, o rim regula a concentração de fosfato no líquido extracelular, alterando sua excreção de acordo com a concentração plasmática. Todavia, conforme discutido adiante, a excreção renal de fosfato é muito aumentada peio hormônio paratireóideo, que desempenha, portanto, importante papel no controle da concen- tração plasmática de fosfato. VITAMINA D E SEU PAPEL NA ABSORÇÃO DO CÁLCIO E DO FOSFATO A vitamina D exerce um potente efeito, aumentando a absor- ção de cálcio pelo tubo intestinal. Além disso, exerce efeitos importantes sobre a deposição e a reabsorção ósseas, conforme discutido mais adiante. Todavia, a vitamina D, em si, não é a substância ativa que realmente produz esses efeitos. Na verda-de, é necessário que a vitamina D seja inicialmente convertida no produto final ativo, 1,25-diidroxicolecalciferol, também deno- minado 1,25(OH)2-D3, através de uma série de reações no fígado e no rim. A Fig. 79.1 ilustra a sucessão de etapas que levam à formação dessa substância a partir da vitamina D. Consideremos essas etapas. Compostos da Vitamina D. Vários compostos diferentes deri- vados de esteróis pertencem à família da vitamina D; todos eles desempenham mais ou menos as mesmas funções. O mais importante desses compostos, denominado vitamina D3, é o colecal- ciferol. A maior parte dessa substância é formada na pele, como consequência da irradiação do 7-desidrocolesterol pelos raios ul- travioleta do sol. Por conseguinte, a exposição adequada ao sol impede o desenvolvimento de deficiência da vitamina D. Os compostos de vitamina D nos alimentos são idênticos ao colecal- ciferol, à exceção de um ou mais átomos substituídos que não afeiam sua função. Conversão do colecalcíferol em 25-hidroxicolecalciferol no fígado e seu controle por feedback. A primeira etapa na ativação do colecal ciferol consiste na sua conversão em 25- hidroxicole- calciferol, que ocorre no fígado. Todavia, o processo é, em si, limitado, visto que o 25-hidroxicoiecalciferol exerce efeito inibi-dor por feedback sobre essas reações de conversão. Esse efeito de feedback é de suma importância, por duas razões: Em primeiro lugar, o mecanismo de feedback regula com muita precisão a concentração do 25-hidroxicolecalciferol no plas- ma; esse efeito é ilustrado na Fig. 79.2. Observe que a ingestão de vitamina D3 pode modificar-se, e, apesar disso, a concentração de 25-hidroxicolecalciferol ainda permanece dentro de alguns pontos percentuais de seu valor médio normal. Naturalmente, esse elevado grau de controle por feedback impede a ação exces- siva da vitamina D quando ela está presente em quantidades excessivas. Em segundo lugar, essa conversão controlada da vitamina D3 em 25-hidroxicolecalciferol! conserva a vitamina D para uso futuro, visto que, uma vez convertida, ela só permanece no orga- nismo por algumas semanas, ao passo que, sob a forma de vita- mina D, pode ser armazenada no fígado durante muitos meses. Formação do 1,25-diidroxicolecalciferol nos rins e seu con- trole pelo hormônio paratireóideo. A Fig. 79.1 também ilustra a conversão do 25-hidroxicolecalciferol em 1,25- diidroxicolecalciferol nos túbulos proximais dos rins. Essa substância é, sem dúvida alguma, a forma mais ativa da vitamina D, visto que os produtos anteriores, no esquema da Fig. 79.1, possuem menos de1/1.000 doefeitoda vitamina D. Por conseguinte, na ausência dos rins, a vitamina D perde quase toda sua eficácia. Observe ainda que, na Fig. 79.1, a conversão do 25-hidroxi- colecalciferol em 1,25-diidroxicolecalciferol requer a presença de hormônio paratireóideo. Na ausência desse hormônio, a for- mação de 1,25-diidroxicolecalciferol é nula ou quase nula. Por conseguinte, o hormônio paratireóideo exerce potente efeito so- bre a determinação dos efeitos funcionais da vitamina D no orga- nismo, especialmente seus efeitos sobre a absorção de cálcio no intestino e seus efeitos sobre o osso. Efeito da concentração de íons cálcio sobre o controle da formação do 1,25-diidroxicolecalciferol. A Fig. 79.3 mostra que a concentração plasmática de 1,25-diidroxicolecalciferol é inver- samente afetada pela concentração plasmática de cálcio. Existem duas razões para explicar esse fato. Em primeiro lugar, o próprio íon cálcio exerce um ligeiro efeito ao impedir a conversão do 25- hidroxicolecalciferol em 1,25- diidroxicolecalciferol. Em segundo lugar, exercendo um efeito ainda mais importante, como veremos adiante, a velocidade de secreção do hormônio parati-reóideo fica acentuadamente deprimida quando a concentração plasmática de íons cálcio aumenta para níveis superiores a 10 mg/dl. O hormônio paratireóideo promove a conversão do 25-hi- droxicolecaleiferol em 1,25-diidroxicolecalciferol nos rins; toda- via, quando esse hormônio está deprimido, o 25- hidroxicole- calciferolé convertido num composto ligeiramente diferente --o 24,25- diidroxicolecalciferol -, que possui pouco efeito de vitamina D. Por conseguinte, quando a concentração plasmática de cálcio já está muito elevada, a formação de 1,25- diidroxicolecalciferolsofre redução acentuada. Por sua vez, a falta de 1,25-diidroxicole- calciferol diminui a absorção do cálcio pelo intestino, ossos e túbulos renais, com a conseqüente diminuição e normalização da concentração dos íons cálcio. Efeito “hormonal” do 1,25-diidroxicolecalciferol sobre o epi- télio intestinal no sentido de promover a absorção de cálcio. O 1,25-diidroxicolecalciferol funciona como "hormônio", promo- vendo a absorção intestinal de cálcio. Exerce esse efeito principal- mente ao aumentar, durante um período de cerca de 2 dias, a formação da proteína de ligação do cálcio nas células epiteliais intestinais. Essa proteína atua na borda em escova dessas células, transportando cálcio para o interior do citoplasma; a seguir, o cálcio atravessa a membrana basolateral da célula por difusão facilitada. A velocidade da absorção de cálcio parece ser direta- mente proporcional à quantidade dessa proteína de ligação do cálcio. Além disso, essa proteína permanece nas células durante várias semanas após a remoção do 1,25-diidroxicolecalciferol do organismo, causando, assim, um efeito prolongado sobre a absor- ção de cálcio. Outros efeitos desse "hormônio", 1.25-diidroxicolecalcife- rol, que poderiam desempenhar algum papel na promoção da absorção do cálcio, incluem (1) formação de ATPase estimulada pelo cálcio na borda em escova das células epiteliais e (2) forma- ção de fosfotase alcalina nas células epiteliais. Infelizmente, des- conhecem-se os detalhes precisos desses efeitos. Efeito da vitamina D sobre a absorção de fosfato. Sabe-se muito menos acerca do efeito da vitamina D sobre a absorção de fosfato do que sobre a absorção de cálcio. Além disso, essa absorção é muito menos importante, visto que o fosfato costuma ser absorvido com relativa facilidade. Todavia, o fluxo de fosfato através do epitélio gastrintestinal é aumentado pela vitamina D. Acredita-se que isso resulte de um efeito direto do 1,25-diidro- xicolecalciferol, mas é possível que decorra secundariamente da ação desse hormônio sobre a absorção de cálcio, que atua, por sua vez, como mediador do transporte do fosfato. CÁLCIO NO PLASMA E NO LÍQUIDO INTERSTICIAL A concentração aproximada de cálcio no plasma é de 9,4 mg/dl, variando normalmente entre 9,0 e 10,0 mg/dl. Isso equivale à cerca de 2,4 mmol/l. E evidente que o nível plasmático de cálcio é regulado dentro de limites muito estreitos - e principal- mente pelo hormônio paratireóideo, conforme discutido mais adiante. O cálcio no plasma encontra-se presente sob três formas diferentes, como mostra a Fig. 79.4. (1) Cerca de 40% (l,0mmol/ 1) do cálcio estão combinados às proteínas plasmáticas e, nesta forma, não se difundem através da membrana capilar. (2) Cerca de 10% do cálcio (0,2 mmol/l) difundem-se através da membrana capilar, mas encontram-se combinados com outras substâncias do plasma e dos líquidos intersticiais (por exemplo, citrato e fosfato) sob forma não-ionizada. (3) Os 50% restantes de cálcio do plasma são difusíveis através da membrana capilar e ionizados. Por conseguinte, o plasma e os líquidos intersticiais possuem concentração normal de íons cálcio de aproximadamente 1,2 mmolll ou 2,4 mEqll, correspondendo a apenas metade da con- Fig. 79.4 Distribuição do cálcio iônico (Ca ++), do cálcio difusível porém não-ionizado (Ca X) e de proteinato de cálcio (Ca Prot) no plasma sanguíneo. centração plasmática total de cálcio. Esse cálcio iônico é impor- tante para a maioria das funções do cálcio no organismo, incluindo seu efeito sobre o coração, o sistemanervoso e a formação óssea. FOSFATO INORGÂNICO NOS LÍQUIDOS EXTRACELULARES O fosfato inorgânico no plasma encontra-se principalmente sob duas formas: HPO4- - e H2PO4-. A concentração aproximada de HPO4- - é de 1,05 mmol/l, e a concentração de H2PO4-, de cerca de 0,26 mmol/l. Quando a quantidade total de fosfato no líquido extracelular aumenta, também se verifica aumento na quantidade de cada um desses dois tipos de íons fosfato. Além disso, quando o pH do líquido extracelular fica mais ácido, ocor- rem aumento relativo do H,PO4- e diminuição do HPO4- -, en- quanto se verifica o oposto nos casos em que o líquido extracelular fica alcalino. Essas relações foram apresentadas na discussão do equilíbrio ácido-básico, no Cap. 30. Como é difícil determinar quimicamente as quantidades exa- tas de HPO4- - e H2PO4- no sangue, a quantidade total de fosfato costuma ser expressa em termos de miligramas de fósforo por decilitro de sangue. A quantidade média total de fósforo inorgâ- nico, representada pelos dois íons fosfato, é de cerca de 4 mg/dl, variando entre os limites normais de 3 a 4 mg/dl nos adultos e entre 4 e 5 mg/dl nas crianças. EFEITOS DAS ALTERAÇÕES DAS CONCENTRAÇÕES DE CÁLCIO E DE FOSFATO NOS LÍQUIDOS CORPORAIS A variação do nível de fosfato no líquido extracelular, desde valores bem inferiores ao normal até três a quatro vezes acima do normal, não provoca efeitos imediatos significativos no orga- nismo. Por outro lado, a elevação ou a depleção do íon cálcio no líquido extracelular causam efeitos extremos e imediatos. Tanto a hipocalcemia quanto a hipofosfatemia crônicas diminuem acen- tuadamente a mineralização óssea, conforme explicado mais adiante. Tetania resultante da hipocalcemia. Quando a concentração de íons cálcio no líquido extracelular cai abaixo do normal, o sistema nervoso torna-se progressivamente mais excitável, devido ao aumento da permeabilidade da membrana neuronal aos íons sódio, permitindo o fácil início dos potenciais de ação. Na presença de concentrações plasmáticas de íons cálcio de cerca de 50% abaixo do normal, as fibras nervosas periféricas, em particu- lar, tornam-se tão excitáveis que começam a descarregar esponta- neamente, iniciando uma série de impulsos nervosos que passam para os músculos esqueléticos e desencadeiam contrações muscu- lares tetânicas. Em conseqüência, a hipocalcemia provoca teta- nia. Todavia, ela também provoca, em certas ocasiões, convulsões devido à sua ação no sentido de aumentar a excitabilidade no cérebro. A Fig. 79.5 ilustra a tetania na mão que costuma ocorrer antes do aparecimento de tetania na maioria das outras partes do corpo. Trata-se do denominado "espasmo carpopédico". Em geral, ocorre tetania quando a concentração sanguínea de cálcio cai de seu nível normal de 9,4 mg/dl para cerca de 6 mg/dl, o que corresponde a apenas 35% abaixo da concentração normal de cálcio; costuma ser letal com níveis de cerca de 4 mg/dl. Em animais experimentais, nos quais é possível reduzir o nível de cálcio abaixo da faixa letal normal, a hipocalcemia extre- ma pode causar outros efeitos que raramente são evidentes em pacientes. Esses efeitos consistem em dilatação pronunciada do coração, alteração nas atividades enzimáticas celulares, aumento da permeabilidade da membrana celular de outras células além das células nervosas, e comprometimento da coagulação san- guínea. Hipocalcemia. Quando o nível de cálcio nos líquidos corpo- rais se eleva acima do normal, ocorre depressão do sistema nervo- so, e as atividades reflexas do sistema nervoso central ficam bem mais lentas. Além disso, o aumento da concentração de íons cálcio diminui o intervalo QT do coração e provoca consti- pação e falta de apetite, provavelmente devido à contratilidade deprimida das paredes musculares do tubo gastrintestinal. Os efeitos depressivos do aumento dos níveis de cálcio come- çam a aparecer quando a calcemia se eleva acima de cerca de 12 mg/dl, podendo tornar-se pronunciados à medida que o nível de cálcio se eleva e ultrapassa 15 mg/dl. Quando o nível de cálcio aumenta acima de cerca de 17 mg/dl nos líquidos corporais, o fosfato de cálcio tende a precipitarem todo o organismo; essa condição é discutida resumidamente em relação com a intoxicação pelo hormônio paratireóideo. O OSSO E SUAS RELAÇÕES COM O CÁLCIO E O FOSFATO EXTRACELULARES O osso é composto de uma matriz orgânica rígida, que é muito fortalecida pelo depósito de sais de cálcio. O osso compacto médio contém, em peso, cerca de 30% de matriz e 70% de sais. Todavia, o osso recém-formado pode conter uma percen- tagem consideravelmente maior de matriz em relação aos sais. Matriz orgânica do osso. A matriz do osso é constituída por 90 a 95% de fibras colágenas, sendo o restante representado por um meio homogêneo, denominado substância fundamental. As fibras colágenas estendem-se primariamente ao longo das linhas de força tensional. Essas fibras dão ao osso sua poderosa força elástica. A substância fundamental é composta de líquido extracelular e proteogticanos, especialmente condroitinossulfato e ácido hialu- rônico. Desconhece-se a função exata dessas substâncias, embora talvez ajudem a controlar a deposição dos sais do cálcio. Sais ósseos. Os sais cristalinos depositados na matriz orgânica do osso são compostos principalmente de cálcio e fosfato; a fórmula para o principal sal cristalino, conhecido como hidroxiapatita, é a seguinte: Ca10 (PO4) 6 (OH)2 Cada cristal — com cerca de 400 angstróms de comprimento, 10 a 30 angstróms de espessura e 100 angstróms de largura — têm a forma de uma placa longa e achatada. A proporção relativa entre cálcio e fósforo pode variar acentuadamente em diferentes condições nutricionais, variando a relação Ca/P entre 1,3 e 2,0 numa base ponderai. Os íons magnésio, sódio, potássio e carbonato também estão presentes entre os sais ósseos, embora os estudos de difração pelos raios X não consigam mostrar cristais definidos formados por esses íons. Por conseguinte, acredita-se que estejam conju- gados aos cristais de hidroxiapatita, em vez de estarem organi- zados em cristais distintos. Essa capacidade que possuem muitos tipos diferentes de íons de conjugar-se com os cristais ósseos estende-se a numerosos íons normalmente estranhos ao osso, como estrôncio, urânio, plutônio e outros elementos transurânicos, chumbo, ouro, outros metais pesados e pelo menos 9 dos 14 produtos radiativos principais liberados pela explosão da bomba de hidrogênio. A deposição de substâncias radiativas no osso pode ocasionar irradiação prolongada dos tecidos ósseos, e, se houver deposição de quantidade suficiente, verifica-se quase sem- pre o desenvolvimento posterior de sarcoma osteogênico (câncer ósseo). Forças elásticas e de compressão do osso. Cada fibra colágena do osso compacto é constituída por segmentos periódicos repeti- dos, tendo, cada um, comprimento de 640 A. Os cristais de hidroxiapatita situam-se ao lado de cada segmento da fibra, firme- mente ligados a ela. Essa íntima fixação impede qualquer "cisa- Ihamento" do osso, isto é, impede que os cristais e as fibras de colágeno escorreguem de seu lugar, o que é essencial para conferir força ao osso. Além disso, os segmentos das fibras coláge- nas adjacentes sobrepõem-se uns aos outros, determinando tam- bém a superposição dos cristais de hidroxiapatita, lembrando tijolos ligados uns aos outros para formar uma parede. As fibras de colágeno do osso, da mesma forma que as dos tendões, são dotadas de grande força elástica, enquanto os sais de cálcio, que possuem propriedades físicas semelhantes ao mármore, apresentam grande força de compressão. Essas pro- priedades combinadas, somadas ao grau de ligação entre as fibras de colágeno e os cristais, produzem uma estrutura óssea dotada ao mesmo tempo, de força elástica e de compressão. Por conse- guinte, os ossos são construídos exatamente da mesma maneira como é construído o concreto armado. O ferro do concreto arma- do proporciona a força elástica, enquanto o cimento, a areia e a pedra proporcionam a força de compressão. Com efeito, a força de compressão do osso é maior que a do melhor concreto armado, e a força elástica aproxima-se da do concreto armado. PRECIPITAÇÃO E ABSORÇÃO DO CÁLCIO E DO FOSFATO NO OSSO - EQUILÍBRIO COM OS LÍQUIDOS EXTRACELULARES Estado de supersaturação dos íons cálcio e fosfato no líquido extracelular em relação à hidroxiapatita. As concentrações de íons cálcio e fosfato no líquido extracelular são consideravelmente maiores do que as necessárias para causar precipitação de hidro- xiapatita. Todavia, existem inibidores na maioria dos tecidos do organismo, bem como no plasma, para impedir essa precipi- tação; um deles é o pirofosfato. Por conseguinte, os cristais de hidroxiapatita não se precipitam nos tecidos normais, exceto no osso, a despeito do estado de supersaturação dos íons. Mecanismo de calcificação óssea. O estágio inicial da produ- ção do osso consiste na secreção de moléculas de colágeno (deno- minadas monômeros de colágeno) e da substância fundamental (principalmente proteoglicanos) pelos osteohlastos. Os monôme- ros de colágeno sofrem rápida polimerização, formando fibras colágenas; o tecido resultante é o osteóide, isto é, um material semelhante à cartilagem, porém diferindo dela, devido à precipi- tação de sais de cálcio. À medida que o osteóide se forma, alguns ostcoblastos ficam aprisionados no osteóide, passando a ser deno- minados osteócitos. Dentro de poucos dias após a formação do osteóide, os sais de cálcio começam a se precipitar sobre as superfícies das fibras colágenas. Os precipitados surgem inicialmente a determi- nados intervalos ao longo de cada fibra colágena, formando dimi- nutos "ninhos" que se multiplicam rapidamente e crescem no decorrer de um período de dias e semanas, com a conseqüente formação do produto final, cristais de hidroxiapatita. Inicialmente, os sais de cálcio a serem depositados não são cristais de hidroxiapatita, porém compostos amorfos (não- cristalinos), consistindo numa provável mistura de sais como CaHPO4-2H,O, Ca3(PO4),-3H2O, e outros. A seguir, através de um processo de substituição e adição de átomos, ou de reabsorção e reprecipitação, esses sais são convertidos em cristais de hidroxia- patita no decorrer de um período de semanas ou meses. Contudo, até 20 a 30% podem manter-se permanentemente na forma amor- fa. Isso é importante, uma vez que esses sais podem ser rapida- mente absorvidos quando houver necessidade de cálcio adicional no líquido extracelular. Desconhece-se ainda o mecanismo responsável pela depo- sição de sais de cálcio no osteóide. Uma das teorias sustenta que, no momento de sua formação, as fibras de colágeno já estão especialmente constituídas de modo a provocar a precipi- tação de sais de cálcio. Supostamente, os osteoblastos também secretam uma substância no osteóide, a fim de neutralizar um inibidor (talvez pirofosfato) que normalmente impede a cristali- zação da hidroxiapatita. Uma vez neutralizado o pirofosfato, a afinidade natural das fibras de colágeno pelos sais de cálcio irá supostamente provocar a precipitação. Essa teoria vem sendo apoiada pelo fato de que as fibras de colágeno adequadamente preparadas de outros tecidos do organismo, além do osso, tam- bém provocam a precipitação de cristais de hidroxiapatita do plasma. Precipitação de cálcio nos tecidos não-ósseos em condições anormais. Embora os sais de cálcio quase nunca se precipitem nos tecidos normais além do osso, eles podem fazê-lo em condi- ções anormais. Por exemplo, precipitam-se nas paredes arteriais na condição denominada arteriosclerose, de modo que as artérias se transformam em tubos semelhantes a ossos. Da mesma manei- ra, os sais de cálcio quase sempre se depositam nos tecidos em degeneração ou em antigos coágulos sanguíneos. É provável que, nesses casos,os fatores inibidores que normalmente impedem a deposição de sais de cálcio desapareçam dos tecidos, permi- tindo, assim, a ocorrência da precipitação. CÁLCIO PERMUTÁVEL Quando se injetam sais solúveis de cálcio por via venosa, as concentrações dos íons cálcio podem elevar-se imediatamente e atingir níveis muito elevados. Todavia, dentro de meia hora a uma hora ou mais, a concentração de íons cálcio se normaliza. De forma semelhante, quando grandes quantidades de íons cálcio são removidas dos líquidos corporais circulantes, a concentração de íons cálcio volta novamente ao normal dentro de 30 minutos a 1 hora. Esses efeitos resultam, em parte, do fato de o organismo conter um tipo de cálcio permutável, que está sempre em equilí- brio com os íons cálcio nos líquidos extracelulares. Uma pequena fração desse cálcio permutável é representada pelo cálcio encon- trado em todas as células teciduais, em particular nos tipos de células altamente permeáveis, como as do fígado e do tubo gas- trintestinal. Todavia, a maior parte do cálcio permutável, confor- me demonstrado por estudos que utilizaram cálcio marcado radia- tivamente, encontra-se no osso e corresponde, normalmente, a cerca de 0,4 a 1,0% do cálcio ósseo total. A maior parte desse cálcio deposita-se provavelmente nos ossos, sob a forma de sais rapidamente mobilizáveis, como CaHPO4 e outros sais amorfos. A importância do cálcio permutável para o organismo é que ele representa um rápido mecanismo tampão, de modo a evitar que a concentração de íons cálcio nos líquidos extrace- lulares se eleve excessivamente ou caia até níveis muito baixos, em condições transitórias de excesso ou de menor disponibilidade de cálcio. DEPOSIÇÃO E ABSORÇÃO ÓSSEAS DO OSSO- REMODELAGEM DO OSSO Deposição de osso pelos osteoblastos. O osso é continuamente depositado pelos osteoblastos e é constantemente absorvido nos locais em que os osteoclastos estão ativos. Os osteoblastos são encontrados nas superfícies externas dos ossos, bem como em suas cavidades. Verifica-se um pequeno grau de atividade contínua osteoblástica em todos os ossos vivos (cerca de 4% de todas as superfícies, num dado momento, conforme ilustrado na Fig. 79.6), de modo que ocorre formação constante de pelo menos uma certa quantidade de osso novo. Absorção óssea - função dos osteoclastos. O osso também está sendo continuamente absorvido na presença de osteoclastos, que consistem em grandes células multinucleadas (até 50 núcleos) e fagocíticas, deriva- das de monócitos ou de células semelhantes a monócitos formadas na medula óssea. Em condições normais, os osteoclastos estão ativos em menos de 1% das superfícies ósseas. Mais tarde, neste capítulo, veremos que o hormônio paratireóideo controla a atividade absortiva do osso pelos osteoclastos. Histologicamente, a absorção óssea ocorre na região imediatamente adjacente aos osteoclastos, conforme ilustrado na Fig. 79.6. Acredita-se que o mecanismo dessa absorção seja o seguinte: Os osteoclastos emitem projeções semelhantes a vilosidades para o osso, formando a denominada borda ondulada adjacente ao osso. As vilosidades secretam dois tipos de substâncias: (1) enzimas proteolíticas, liberadas dos lisossomas dos osteoclastos, e (2) vários ácidos, incluindo o ácido cítrico e o ácido láctico, liberados principalmente das mitocôndrias. Presumivelmente, as enzimas digerem ou dissolvem a matriz orgânica do osso, enquanto os ácidos ocasionam a dissolução dos sais ósseos. Equilíbrio entre a deposição e a absorção óssea. Normalmente, exceto nos ossos em crescimento, a velocidade de deposição e a velocidade de absorção óssea são iguais, de modo que a massa ósseatotal permanece 764 Fig. 79.6 Atividade osteoblástica e osteoclástica no mesmo osso. Fig. 79.7 Estrutura do osso. constante. Em geral, os osteoclastos existem em massas pequenas, porém concentradas; quando a massa de osteoclastos começa a se desenvolver, ela costuma corroer o osso durante cerca de 3 semanas, perfurando um túnel que pode atingir 1 rnm de diâmetro e vários milímetros de extensão. Ao fim desse tempo, os osteoclastos desaparecem, e o túnel é invadido por osteoblastos: a seguir, começa a surgir novo osso. A deposição óssea prossegue, então, durante vários meses, sendo o novo osso depositado em camadas sucessivas de círculos concêntricos (lamelas) nas superfícies internas da cavidade, até preencher o túnel. A deposição de novo osso cessa quando o osso começa a invadir os vasos sanguíneos que irrigam essa área. O canal através do qual correm esses vasos, deno- minado canal de Havers, é, por conseguinte, tudo o que restada cavidade original. Cada nova área de osso assim depositada é denominada ósteon, conforme ilustrado na Fig. 79.7. Importância da remodelação continuo do osso. A deposição e a absorção ósseas contínuas desempenham algumas funções fisiológicas importantes. Em primeiro lugar, o osso adapta habitualmente sua força ao grau do estresse ósseo. Por conseguinte, os ossos sofrem espessamento quando submetidos a cargas pesadas. Em segundo lugar, mesmo a forma do osso pode ser reorganizada para a sustentação adequada das forças mecânicas, pela deposição e absorção ósseas, de acordo com o tipo do estresse. Em terceiro lugar, como o osso velho torna-se relativamente fraco e quebradiço, é necessária a formação de nova matriz orgânica à medida que a matriz antiga sofre degeneração. Dessa maneira, é mantida a rigidez normal do osso. Com efeito, os ossos de crianças, em que a velocidade de deposição e de absorção é rápida, são pouco quebradiços em comparação com os ossos do indivíduo idoso, quando a velocidade de deposição e absorção fica lenta. Controle da velocidade de deposição óssea por "estresse" ósseo. O osso é depositado em proporção à carga de compressão que ele deve suportar. Por exemplo, os ossos dos atletas ficam consideravelmente mais pesados que os das outras pessoas. Além disso, se a pessoa tiver uma das pernas engessada, mas continuar a andar com a perna oposta, o osso da perna engessada fica fino e sofre descalcificação de até 30% dentro de algumas semanas, enquanto o osso oposto permanece espesso e normalmente calcificado. Por conseguinte, o estresse físico contínuo estimula a calcificação e a deposição osteoblástica de osso. O estresse ósseo também determina a forma dos ossos em certas circunstâncias. Por exemplo, quando um osso longo da perna sofre fratura em sua parte central e, a seguir, consolida-se em angulação, o estresse de compressão sobre o lado interno do ângulo determina aumento da deposição óssea, verificando-se aumento da absorção no lado externo do ângulo, onde o osso não é comprimido. Depois de muitos anos de maior deposição na face interna do osso angulado, com absorção no lado externo, o osso volta a ser quase reto, sobretudo em crianças, devido à rápida remodelação do osso nessa época. Sugere-se que a deposição de osso nos pontos de estresse de com- pressão é causada por um efeito piezoeleinco, da seguinte forma: A compressão do osso gera potencial negativo nas áreas comprimidas e potencial positivo nos outros pontos do osso. Foi demonstrado que a passagem de diminutas quantidades de corrente pelo osso provoca ativi- dade osteoblástica no pólo negativo da corrente, o que poderia explicar a maior deposição óssea nos locais de compressão. Por outro lado, a atividade osteoclástica habitual poderia ser a responsável pela reabsorção óssea nos outros locais. Reparo de fratura. A fratura de um osso, de certa maneira, ativa ao máximo todos os osteoblastos periósteos e intra-ósseos envolvidos na fratura. Além disso, forma-se grande número de novos osleoblastos, quase imediatamente, a partir das denominadas células osleoprogtni-toras, que são células-tronco ósseas. Por conseguinte, em pouco tempo surge, entre as duas extremidades fraturadas do osso, uma grande eleva- ção de tecido osteoblástico e nova matriz óssea orgânica, seguida rapida- mente pela deposição de sais de cálcio. Trata-se do denominado calo. Muitos cirurgiões ortopedistas utilizam o fenômeno do estresse ósseo para acelerar a velocidade de consolidação da fratura. Isso é feito pelo uso de aparelhos de fixação mecânica especiais para manter unidas as extremidades fraturadas, de modo que o paciente possa utilizar o osso imediatamente. É evidente que isso causa estresse nas extremidades opostas dos ossos fraturados, o que acelera a atividade osteoblástica no local da fratura, reduzindo quase sempre o tempo de convalescença. Fosfatase alcalina do sangue como indicadora da velocidade da depo- sição óssea. Os osteoblastos secretam grande quantidade de fosfatase alcalina quando estão depositando ativamente a matriz óssea. Acredita-se que essa fosfatase aumente a concentração local de fosfato inorgânico ou ative as fibras de colágeno, de modo a causar a deposição de sais de cálcio. Devido à difusão de certa quantidade de fosfatase alcalina no sangue, o nível sanguíneo dessa enzima constitui, em geral, um bom indicador da velocidade de formação óssea. HORMÔNIO PARATIREÓIDEO Durante muitos anos, soube-se que o aumento da atividade da glândula paratireóide causava rápida absorção de sais de cálcio dos ossos, resultando em hipercalcemia no líquido extracelular. Por outro lado, a hipofunção das glândulas paratireóides causa hipoculcetnia, quase sempre com tetania resultante. Além disso, o hormônio paratireóideo é importante no metabolismo do fosfa- to, bem como no metabolismo do cálcio. Anatomia fisiológica das glândulas paratireóides. Normal- mente, existem quatro glândulas paratireóides no ser humano, localizadas imediatamente atrás da glândula tireóide — uma atrás de cada um dos pólos superiores e inferiores da tireóide. Cada glândula paratireóide mede aproximadamente 6 mm de compri- mento, 3 mm de largura e 2 mm de espessura e possui o aspecto macroscópico da gordura marrom-escura; por conseguinte, é difí- cil localizar as glândulas paratireóides durante a cirurgia da tireói- de. Por essa razão, antes que fosse reconhecida a importância dessas glândulas, a tireoidectomia total ou subtotal resultava qua- se sempre na remoção total das glândulas paratireóides. A remoção da metade das glândulas paratireóides causa em geral pouca anormalidade fisiológica. Todavia, a remoção de três das quatro glândulas normais costuma provocar hipoparatireoidismo transitório. Entretanto, até mesmo uma pequena quantidade de tecido paratireóideo restante é habitualmente capaz de sofrer hipertrofia, de modo a desempenhar a função de todas as glândulas. A glândula paratireóide do ser humano adulto, ilustrada na Fig. 79.8, contém sobretudo células principais e células oxífilas; todavia, estas últimas estão ausentes em muitos animais e nos seres humanos jovens. As células principais secretam a maior parte do hormônio paratireóideo. A função das células oxífilas é incerta; acredita-se que sejam células principais modificadas ou que sofreramdepleção, demodo que não mais secretam hormônio. Química do hormônio paratireóideo. O hormônio paratireói- deo foi isolado em sua forma pura. É inicialmente sintetizado nos ribossomas, sob a forma de pré-pró-hormônio, uma cadeia polipeptídica de 110 aminoácidos. Essa cadeia é clivada, resul- tando na formação do pró- hormônio e, finalmente, do próprio hormônio pelo retículo endoplasmático e pelo aparelho de Golgi. A seguir, o hormônio é armazenado em grânulos secretores no citoplasma das células. O hormônio final, que é constituído por 84 aminoácidos, possui peso molecular aproximado de 9.500. Também foram isolados das glândulas paratireóides compostos menores apenas com os 34 aminoácidos adjacentes ao terminal da molécula; esses compostos exibem toda a atividade do hormônio paratireóideo. EFEITO DO HORMÔNIO PARATIREÓIDEO SOBRE AS CONCENTRAÇÕES DE CÁLCIO E DE FOSFATO NO LÍQUIDO EXTRACELULAR A elevação da concentração de cálcio é causada principalmente por dois efeitos: (1) pelo efeito do hormônio paratireóideo, no sentido de promover a absorção de cálcio e de fosfato do osso e (2) pelo rápido efeito do hormônio paratireóideo no sentido de reduzir a excreção renal de cálcio. Por outro lado, o declínio na concentração de fosfato é ocasionado por um efeito muito forte do hormônio paratireóideo sobre os rins, resultando em excreção excessiva de fosfato, efeito este que, em geral, é grande o suficiente para sobrepujar o aumento da absorção de fosfato do osso. Absorção de cálcio e de fosfato do osso causada pelo hormônio paratireóideo O hormônio paratireóideo parece exercer dois efeitos distintos sobre o osso no sentido de determinar a absorção de cálcio e de fosfato. Um deles consiste numa fase muito rápida que ocorre em minutos e resulta, provavelmente, da ativação das células ósseas já existentes, de modo a promover a absorção de cálcio e de fosfato. A segunda fase é muito mais lenta e necessita de vários dias ou até mesmo semanas para instalar-se por completo; resulta da proliferação dos osteoclastos, seguida por aumento pronunciado da reabsorção osteoclástica do próprio osso, e não apenas da absorção de sais de fosfato de cálcio do osso. Fase rápida de absorção do cálcio e do fosfato — osteolise. Quando são injetadas grandes quantidades de hormônio paratireóideo, a concentração de íons cálcio no sangue começa a elevar- se dentro de minutos, bem antes do desenvolvimento de qualquer célula óssea nova. Estudos histológicos e fisiológicos demons- traram que o hormônio paratireóideo induz a remoção dos sais ósseos da matriz óssea, na vizinhança dos osteócitos situados no interior do próprio osso, bem como na vizinhança dos osteo- blastos ao longo da superfície óssea. Todavia, por estranho que pareça, não se pensa em geral que os osteoblastos ou os osteócitos estejam funcionando no sentido de causar a absorção dos sais ósseos, uma vez que esses dois tipos de células são de natureza osteoblástica e estão normalmente associados à deposição óssea e sua calcificação. Entretanto, estudos recentes mostraram que os osteoblastos e os osteócitos formam um sistema de células interconectadas que se espalham por sobre toda a superfície ós- sea, exceto nas pequenas áreas superficiais adjacentes aos osteoclastos. Além disso, longos processos membranosos estendem-se do osteócito para outro osteócito em toda a estrutura óssea; esses processos ligam-se também aos osteócitos e aos osteoblastos superficiais. Acredita-se que esse extenso sistema, denominado sistema da membrana osteocítica, proporcione uma membrana que separa o próprio osso do líquido extracelular. Entre a membrana osteocítica e o osso, existe uma pequena quantidade de líquido denominado simplesmente líquido ósseo. Experiências indiretas indicam que a membrana osteocítica bombeia íons cálcio do líquido ósseo para o líquido extracelular, criando uma concen- tração de íons cálcio no líquido ósseo de apenas um terço da concentração existente no líquido extracelular. Quando a bomba osteocítica torna-se excessivamente ativada, a concentração de cálcio do líquido ósseo cai ainda mais, e os sais de fosfato de cálcio são, então, absorvidos do osso. Esse efeito, denominado osteólise, ocorre sem absorção da matriz óssea. Quando a bomba é inativada, a concentração de cálcio do líquido ósseo aumenta para .níveis mais elevados, e os sais de fosfato de cálcio são, então, redepositados na matriz. Todavia, em que ponto se situa o hormônio paratireóideo nessequadro? Em primeiro lugar, as membranas celulares dos osteoblastos e dos osteócitos possuem proteínas receptoras para a ligação do hormônio paratireóideo. Parece que esse hormônio tem capacidade de ativar fortemente a bomba de cálcio, causan- do, portanto, a remoção rápida dos sais de fosfato de cálcio dos cristais ósseos amorfos que se localizam próximo às células. Acredita-se que o hormônio paratireóideo estimule essa bomba, aumentando a permeabilidade ao cálcio do lado da membrana osteocítica voltada para o líquido ósseo, permitindo, assim, a difusão de íons cálcio do líquido ósseo para as células da membrana. A seguir, a bomba de cálcio do outro lado da membrana celular transfere os íons cálcio para o líquido extracelular. Fase lenta de absorção óssea e liberação de fosfato de cálcio - ativação dos osteoclastos. A ativação dos osteoclastos é um efeito muito mais conhecido do hormônio paratireóideo, cuja evidência é também muito mais clara. Contudo, por estranho que pareça, os osteoclastos não possuem proteínas receptoras de membrana para o hormônio paratireóideo. Na verdade, acre- dita-se que os osteoblastos e osteócitos ativados emitem um "sinal" secundário, porém, desconhecido, para os osteoclastos, os quais, por sua vez, são estimulados a desempenhar sua tarefa habitual de "devorar" o osso. A ativação do sistema osteoclástico ocorre em duas fases: (1) ativação imediata dos osteoclastos que já estão formados e (2) formação de novos osteoclastos. Em geral, o excesso de hormônio paratireóideo durante vários dias faz com que o sistema osteoclástico fique bem desenvolvido; todavia, ele continua a crescer praticamente durante meses sob a influência da estimulação muito forte do hormônio paratireóideo. Depois de algumas semanas a meses, a reabsorção osteoclástica do osso leva à debilitação dos ossos e ao estímulo secun dário dos osteoblastos. Por conseguinte, o efeito tardio consiste, na realidade, em aumentar tanto a atividade osteoblástica quanto a atividade osteoclástica. Ainda assim, mesmo nas fases tardias, ocorre mais absorção óssea do que deposição. O osso contém quantidades tão grandes de cálcio, em compa- ração com a quantidade total existente em todos os líquidos extracelulares (cerca de 1.000 vezes), que, mesmo quando o hor- mônio paratireóideo determina elevação acentuada da concen- tração de cálcio nos líquidos, é impossível discernir qualquer efeito imediato sobre os ossos. Contudo, a administração ou a secreção prolongada de hormônio paratireóideo - no curso de um período de meses ou até mesmo de anos - resultam, finalmente, em absorção evidente de todos os ossos, com forma- ção de grandes cavidades preenchidas com osteoclastos muito grandes e multinucleados. Efeito do hormônio paratireóideo sobre a excreção de fosfato e de cálcio pelos rins A administração de hormônio paratireóideo provoca perda rápida e imediata de fosfato na urina, devido à redução da reab- sorção tubular proximal dos íons fosfato. O hormônio paratireóideo também aumenta a reabsorção tubular de cálcio, ao mesmo tempo que diminui a reabsorção de fosfato. Além disso, também aumenta a velocidade de reabsor- ção dos íons magnésio e íons hidrogênio, enquanto diminui a reabsorção de íons sódio, potássio e aminoácidos, da mesma forma que afeta o fosfato. Todavia, o aumento da absorção de cálcio ocorre nos ramos ascendentes das alças de Henle, túbulos distais e túbulos coletores, e não nos túbulos proximais. Não fosse pelo efeito do hormônio paratireóideo sobre os rins, no sentido de aumentar a reabsorção de cálcio, a perda contínua de cálcio na urina levaria eventualmente à depleção desse mineral nos ossos. Efeitos do hormônio paratireóideo sobre a absorção intestinal de cálcio e fosfato Neste ponto devemos lembrar novamente que o hormônio paratireóideo aumenta de maneira apreciável tanto a absorção de cálcio quanto a de fosfato pelo intestino, aumentando a forma- ção nos rins do 1,25-diidroxicolecalciferol a partir da vitamina D, conforme discutido no início deste capítulo. Efeito da vitamina D sobre o osso e sua relação com a atividade do hormônio paratireóideo A vitamina D desempenha papéis importantes tanto na absorção quanto na deposição óssea. A administração de quantidades extremas de vitamina D causa absorção óssea, da mesma maneira que a administração de hormônio paratireóideo. Além disso, na ausência de vitamina D, o efeito do hormônio paratireóideo no sentido de causar absorção óssea encontra-se muito reduzido ou até mesmo ausente. Desconhece-se o mecanismo dessa ação da vitamina D, mas acredita-se que resulte do efeito do 1,25-diidroxicolecalciferol (o principal produto ativo da vita- mina D) sobre o aumento do transporte de cálcio através das membranas celulares. A vitamina D, em quantidades menores, promove a calcificação do osso. Naturalmente, um dos mecanismos pelos quais ela exerce esse efeito consiste em aumentar a absorção intestinal de cálcio e de fosfato. Todavia, mesmo na ausência desse aumen- to, a vitamina ainda intensifica o processo de mineralização do osso. Nesse caso, também se desconhece o mecanismo do efeito, mas é provável que decorra da capacidade do 1,25-diidroxicole- calciferol de induzir o transporte de íons cálcio através das mem- branas celulares — mas, talvez, na direção oposta, através das membranas celulares dos osteoblastos ou osteócitos. Papel do monofosfato de adenosina cíclico como mediador da estimulação paratireóidea. Grande parte do efeito do hormô- nio paratireóideo sobre seus órgãos-alvo é quase certamente me- diada pelo mecanismo de segundo mensageiro do monofosfato de adenosina cíclico (AMPc). Dentro de poucos minutos após a administração de hormônio paratireóideo, a concentração de AMPc aumenta nos osteoclastos e em outras células-alvo. Por sua vez, esse AMPc é provavelmente responsável por certas fun- ções, como secreção osteoclástica de enzimas e ácidos que indu- zem a reabsorção óssea, formação do 1,25-diidroxicolecalciferol nos rins etc. Todavia, existem, com toda probabilidade, outros efeitos diretos do hormônio paratireóideo que funcionam inde- pendentemente do mecanismo do segundo mensageiro. CONTROLE DA SECREÇÃO PARATIREOIDEA PELA CONCENTRAÇÃO DE ÍONS CÁLCIO Até mesmo a menor redução da concentração de íons cálcio no líquido extracelular determina, em poucos minutos, aumento da velocidade de secreção das glândulas paratireóides; se a con- centração diminuída de cálcio persistir, as glândulas hipertro- fiam-se, algumas vezes por até cinco ou mais vezes. Por exemplo, as glândulas paratireóides tornam-se acentuadamente aumenta- das no raquitismo, onde o nível de cálcio costuma estar ligeira- mente deprimido; além disso, também se verifica aumento pro- nunciado dessas glândulas durante a gravidez, embora a diminui- ção da concentração de íons cálcio no líquido extracelular da mãe seja dificilmente mensurável. As glândulas paratireóides também aumentam acentuadamente durante a lactação, devido à utilização do cálcio para a formação do leite. Por outro lado, qualquer condição capaz de elevar a concen- tração de íons cálcio determina a diminuição da atividade e do tamanho das glândulas paratireóides. Essas condições incluem: (1) quantidades excessivas de cálcio na dieta; (2) aumento da vitamina D na dieta; (3) absorção óssea causada por fatores distintos do hormônio paratireóideo (por exemplo, absorção ós- sea causada pelo desuso dos ossos). A Fig. 79.10 ilustra, em termos quantitativos, a relação apro- ximada entre a concentração plasmática de cálcio e a concen- tração plasmática de hormônio paratireóideo. A curva contínua em vermelho mostra a relação imediata quando a concentraçãode cálcio é alterada no decorrer de um período de algumas horas. Isso mostra que uma redução da concentração de cálcio de seu valor normal de 9,4 mg/dl para 8,4 mg/dl duplica ou triplica a concentração plasmática do hormônio paratireóideo. Por outro lado, a relação crônica aproximada que se encontra quando a concentração de íons cálcio é alterada no decorrer de várias semanas, permitindo a ocorrência de hipertrofia das glândulas, é ilustrada pela linha tracejada em vermelho; isso ilustra que uma diminuição por fração de miligrama por decilitro na concen- tração plasmática de cálcio é capaz de duplicar a secreção do hormônio paratireóideo. Obviamente, essa é a base do sistema extremamente potente de feedback para o controle da concen- tração plasmática de íons cálcio. CALCITONINA Há cerca de 30 anos, foi descoberto um novo hormônio que exerce efeitos fracos sobre a calcemia, opostos aos do hormô- nio paratireóideo. Esse hormônio, denominado calcitonina por reduzir a concentração sanguínea de íons cálcio, não é secretado, no ser humano, pelas glândulas paratireóides, mas pela tireóide. Nos peixes, anfíbios, répteis e aves, a calcitonina é secretada pelas glândulas ultimobranquiais; desempenha papel essencial- mente importante no controle da concentração sanguínea de íons cálcio quando esses animais mudam de ambiente, da água doce para a salgada, onde existe grande excesso de cálcio. Além disso, sua concentração nessas glândulas ultimobranquiais é extrema- mente elevada. No ser humano, as glândulas ultimobranquiais não existem como tais, mas foram incorporadas à glândula tireói- de. As denominadas células parafoliculares, ou células C, no tecido intersticial entre os folículos da glândula tireóide humana são remanescentes das glândulas ultimobranquiais dos animais inferiores, constituindo apenas 0,1% da tireóide. São essas células que secretam a calcitonina. A calcitonina é um grande polipeptídio com peso molecular de aproximadamente 3.400; é constituída por uma cadeia de 32 aminoácidos. Efeito da calcitonina sobre a redução da concentração plasmá- tica de cálcio. Em alguns animais jovens, porém muito pouco no ser humano, a calcitonina diminui rapidamente a concentração de íons cálcio no sangue, dentro de alguns minutos após sua injeção. Por conseguinte, o efeito da calcitonina sobre a concen- tração sanguínea de íons cálcio é exatamente o oposto do hormô- nio paratireóideo, além de ocorrer mais rapidamente. A calcitonina reduz as concentrações plasmáticas de cálcio por pelo menos duas maneiras distintas: 1. O efeito imediato consiste em diminuir a atividade absor- tiva dos osteoclastos e, provavelmente, também o efeito osteo- lítico da membrana osteocítica em todo o osso, com o conse- quente desvio do equilíbrio em favor da deposição de cálcio no compartimento rapidamente permutável de sais de cálcio do osso. Esse efeito é especialmente significativo em animais jovens, devido ao rápido intercâmbio do cálcio absorvido e depositado. 2. O segundo efeito da calcitonina, que é mais prolongado, consiste em diminuir a formação de novos osteoclastos. Além disso, como a reabsorção osteoclástica de osso leva secunda riamente à atividade osteoblástica, a diminuição do número de osteoclastos é seguida por números diminuídos de osteoblastos. Por conseguinte, no decorrer de um longo período de tempo, o resultado final consiste simplesmente numa acentuada redução da atividade osteoclástica e osteoblástica; conseqüentemente, não se verifica qualquer efeito prolongado significativo sobre a con- centração plasmática de íons cálcio. Isto é, o efeito sobre o cálcio plasmático é principalmente transitório, tendo duração de poucas horas a alguns dias, no máximo. A calcitonina também exerce efeitos menores sobre o processamento do cálcio nos túbulos renais e no tubo intestinal. Nesse caso também, os efeitos são opostos aos do hormônio paratireóideo; todavia, em termos quantitativos, parecem ser de tão pouca monta que raramente são considerados. Importância do efeito da calcitonina sobre a concentração plasmática de cálcio. A calcitonina exerce apenas efeito muito fraco sobre a concentração plasmática de cálcio no ser humano adulto. Existem duas razões para isso. Em primeiro lugar, qualquer redução inicial da concentração de íons cálcio causada pela calcitonina leva, dentro de poucas horas, a um poderoso estímulo da secreção de hormônio paratireóideo, que sobrepuja quase por completo o efeito da calcitonina. Em segundo lugar, no adulto, a velocidade diária de absorção e de deposição de cálcio é muito pequena, e até mesmo quando a velocidade de absorção é reduzida e a deposição e aumentada pela calcitonina, o efeito observado continua sendo muito pequeno sobre a concentração plasmática de íons cálcio. Por outro lado, o efeito nas crianças é muito mais pronunciado, devido à rápida ocorrência de remodelação óssea, com absorção e deposição de cálcio de até 5 g ou mais por dia — o que corresponde a 5 a 10 vezes o cálcio total de todo o líquido extracelular. Além disso, em certas doenças ósseas, como a doença de Paget, em que a atividade osteoclástica está acentuadamente acelerada, a calcitonina tem o potente efeito de reduzir a absorção de cálcio. Efeito da concentração plasmática de cálcio sobre a secreção de calcitonina Em animais jovens, porém bem menos em animais velhos e nos seres humanos, um aumento na concentração plasmática de cálcio de cerca de 10% determina elevação imediata de duas a seis vezes na velocidade de secreção da calcitonina, o que é ilustrado pela linha pontilhada da Fig. 79.10. Isso proporciona um segundo mecanismo de feedback hormonal para o controle da concentração plasmática de íons cálcio; todavia, trata-se de um mecanismo que funciona exatamente de forma oposta ao do sistema do hormônio paratireóideo. Todavia, existem duas grandes diferenças entre os sistemas de feedback da calcitonina e do hormônio paratireóideo. Em primeiro lugar, o mecanismo da calcitonina opera mais rapidamente, atingindo sua atividade máxima em menos de 1 hora, em contraste com o período de 3 a 4 horas necessário para que seja alcançada a atividade máxima após o início da secreção paratireóidea. A segunda diferença é que o mecanismo da calcitonina atua principalmente como regulador a curto prazo da concentração de íons cálcio, uma vez que é rapidamente sobrepujado pelo mecanismo de controle muito mais potente das paratireóides. Por conseguinte, no decorrer de um período prolongado de tem- po, é o sistema paratireóideo que ajusta quase que inteiramente o nível de íons cálcio do líquido extracelular a longo prazo. Toda- via, para curtos períodos de tempo, como uma hora ou mais após a ingestão de refeição rica em cálcio, a calcitonina parece desempenhar um papel significativo em alguns animais jovens, diminuindo a elevação da concentração de íons cálcio que ocor- reria de outro modo. Quando a glândula tireóide é removida, e a calcitonina não é mais secretada, a concentração sanguínea de íons cálcio a longo prazo não sofre alteração mensurável — demonstrando, também, o maior efeito do sistema de controle do hormônio paratireóideo. CONTROLE GLOBAL DA CONCENTRAÇÃO DE ÍONS CÁLCIO Às vezes, a quantidade de cálcio absorvida ou perdida pelos líquidos corporais atinge 0,3 g por hora. Por exemplo, nos casos de diarréia, podem ser secretados vários gramas de cálcio nos sucos intestinais; esse cálcio passa pelo intestino e é eliminado diariamente nas fezes. Por outro lado, após a ingestão de grandes quantidades de cálcio, em particular quando existe também exces- so de atividade da vitamina D, a pessoa pode absorver até 0,3 g em 1 hora. Este valor é comparável à quantidadetotal de cálcio em todo o líquido extracelular, que é de cerca de 1 g. A adição ou a retirada de 0,3 g dessa pequena quantidade de cálcio do líquido extracelular levaria, obviamente, ao desenvolvimento de hiper ou hipocalcemia grave. Todavia, existe uma primeira linha de defesa no sentido de evitar esse acréscimo ou retirada, até mesmo antes da atuação dos sistemas de feedback do hormônio paratireóideo e da caicitonina. Função de tampão do cálcio permutável nos ossos. Os sais de cálcio permutável nos ossos, que foram discutidos no início deste capítulo, são compostos amorfos de fosfato de cálcio, talvez principalmente CaHPO4 ou algum composto semelhante, frouxa- mente fixado ao osso e em equilíbrio reversível com os íons cálcio e fosfato do líquido extracelular. A quantidade desses sais imediatamente disponível para troca é de cerca de 0,5 a \% dos sais de cálcio totais do osso, perfazendo até 5 a 10 g de cálcio. Devido à facilidade de deposição desses sais permu- táveis e à sua fácil ressolubilidade, a elevação das concentrações de íons cálcio e fosfato do líquido extracelular acima do normal provoca deposição imediata de sal permutável. Por outro lado, a diminuição dessas concentrações provoca absorção imediata de sal permutável. Essa reação é tão rápida que uma só passagem do sangue contendo altas concentrações de cálcio por um osso irá remover quase todo o excesso de cálcio. Esse rápido efeito resulta do fato de que os cristais ósseos amorfos são extremamente pequenos, e sua área total de superfície exposta aos líquidos do osso é, talvez, de 4.000 m2 ou mais. Além disso, cerca de 5% de todo o sangue fluem pelos ossos a cada minuto — isto é, cerca de 1 % de todo o líquido extracelular a cada minuto. Por conseguinte, cerca de metade do excesso de cálcio que aparece no líquido extracelular é removida por essa função tampão dos ossos em aproximadamente 70 minutos. Além da função tampão dos ossos, as mitocôndrias de muitos tecidos, em particular do fígado e do intestino, também contêm quantidade razoável de cálcio permutável (um total de cerca de 10 g em todo o corpo) que forma um sistema tampão adicional para manter a constância da concentração de íons cálcio no líquido extracelular. Controle hormonal da concentração de íons cálcio, a segunda linha de defesa. Ao mesmo tempo que o mecanismo do cálcio permutável nos ossos exerce sua função de tamponamento sobre o cálcio do líquido extracelular, tanto o sistema do hormônio paratireóideo quanto o da calcitonina também começam a atuar. Dentro de 3 a 5 minutos após elevação aguda das concentrações de íons cálcio, a velocidade de secreção do hormônio parati- reóideo diminui. Conforme explicado antes, esse processo desencadeia diversos mecanismos destinados a reduzir e normalizar a concentração dos íons cálcio. Todavia, trata-se de um processo lento. Por outro lado, ao mesmo tempo que o hormônio paratireóideo diminui, a calcitonina aumenta. Em animais jovens e, possivelmente, também em crianças de pouca idade (mas provavelmente muito pouco nos adultos), a calcitonina determina a rápida deposição de cálcio nos ossos e, talvez, em algumas células de outros tecidos. Por conseguinte, em animais muito jovens, a calcitonina em excesso pode induzir a normalização das concentrações elevadas de íons cálcio, sendo esse efeito, talvez, consideravelmente mais rápido do que o obtido pelo mecanismo de tamponamento do cálcio permutável. Na presença de excesso prolongado de cálcio ou de deficiência de cálcio de longa duração, apenas o mecanismo do hormônio paratireóideo parece ser de real importância na manutenção das concentrações normais de íons cálcio no plasma. Quando uma pessoa apresenta deficiência contínua de cálcio na dieta, o hormônio paratireóideo quase sempre pode estimular a absorção de cálcio do osso, o suficiente para manter a concentração plasmática normal de íons cálcio durante 1 ano ou mais; todavia, eventual- mente, até mesmo os ossos sofrem depleção de seu cálcio. Por conseguinte, os ossos representam um grande reservatório tam- pão de cálcio, que pode ser manipulado pelo hormônio parati-reóideo; todavia, o controle final a longo prazo da concentração de íons cálcio é exercido pelo hormônio paratireóideo e pela vitamina D no controle da absorção intestinal de cálcio e de sua excreção na urina. FISIOLOGIA DAS DOENÇAS PARATIREÓIDEAS E ÓSSEAS HIPOPARATIREOIDISMO Quando as glândulas paratireóides não secretam quantidades sufi- cientes de hormônio paratireóideo, a reabsorção osteocítica do cálcio permutável diminui, e os osteoclastos também ficam quase totalmente inativos. Como conseqüência, a reabsorção de cálcio do osso fica tão deprimida que o nível de cálcio nos líquidos corporais diminui. Todavia, como o cálcio e os fosfatos não estão sendo absorvidos do osso, este geralmente permanece forte. Quando as glândulas paratireóides são subitamente removidas, o nível de cálcio do sangue cai de seu valor normal de 9,4 mg/dl para 6 a 7 mg/dl dentro de 2 a 3 dias, enquanto a concentração sanguínea de fosfato pode duplicar. Ao ser alcançado esse baixo valor do cálcio, verifica-se o aparecimento dos sinais habituais de tetania. Dentre os músculos especialmente sensíveis ao espasmo tetânico, destacam-se os músculos da laringe. O espasmo desses músculos obstrui a respiração, constituindo a causa habitual de morte na tetania, a não ser que seja instituído o tratamento adequado. Tratamento do hipoparatireoidismo. Hormônio paratireóideo (para- tormônio). Em certas ocasiões, o hormônio paratireóideo é utilizado no tratamento do hipoparatireoidismo. Todavia, devido ao elevado custo desse hormônio e também à pouca duração de seus efeitos, que no máximo é de algumas horas, e considerando-se a tendência do organismo a desenvolver anticorpos contra ele, tornando-o cada vez menos ativo, o tratamento do hipoparatireoidismo com hormônio paratireóideo é raro atualmente. Terapia comvitamina De cálcio. Na maioria dos pacientes, a adminis- tração de quantidades extremamente grandes de vitamina D. da ordem de 100.000 unidades por dia, juntamente com ingestão de 1 a 2 g de cálcio, é suficiente para manter a concentração de íons cálcio dentro da faixa normal. Algumas vezes, pode ser necessária a administração de 1,25- diidroxicolecalciferol em lugar da forma não-ativada da vitamina D, devido à sua ação muito mais potente e muito mais rápida. Todavia, isso também pode causar efeitos adversos, visto ser algumas vezes difícil evitar a hiperatividade por meio dessa forma ativada de vitamina D. HIPERPARATIREOIDISMO Em geral, a causa do hiperparatireoidismo é um tumor de uma das glândulas paratireóides. Esses tumores são muito mais freqüentes nas mulheres do que nos homens ou nas crianças, provavelmente porque a gravidez e a lactação estimulam as glândulas paratireóides e, portanto, predispõem ao desenvolvimento desse tumor. O hiperparatireoidismo provoca intensa atividade osteoclástica no osso, o que eleva a concentração de íons cálcio do líquido extracelular, deprimindo em geral (mas nem sempre) a concentração de íons fosfato, devido à maior excreção renal desses íons. Doença óssea no hiperparatireoidismo. Embora no hiperparatireoidismo leve possa ocorrer deposição de novo osso rápido o suficiente para compensar o aumento da reabsorção osteoclástica, no hiperparatireoidismo grave a absorção osteoclástica logo sobrepuja a deposição osteoblástica, de modo que o osso pode ser quase totalmente devorado. Com efeito, a razão pela qual o indivíduo portador de hiperparatireoidismo procura o médico é quase sempre uma fratura óssea. As radiografias do osso revelam extensa descalcificação e, em certas ocasiões, grandes áreas císticas em saca-bocado do osso, repletas de osteoclastos, na forma do denominado "tumor" de células gigantes. Naturalmente, múltiplas fraturas dos ossos debilitados podem resultar de traumatismo leve, especialmente nos locais em que surgem cistos. A doença óssea cística do hiperparatireoidismo é denominada osteíte fibrosa cística. A atividade osteoplástica nos ossos também aumenta acentuada- mente, na tentativa de formar novo osso suficiente para compensar o osso velho absorvido pela atividade osteoclástica. Conforme explicado antes, quando os osteoblastos tornam-se ativos, eles secretam grandes quantidades de fosfatase alcalina. Por conseguinte, um dos achados diag- nósticos importantes no hiperparatireoidismo consiste em níveis muito elevados de fosfatase alcalina no plasma. Efeitos da hipercalcemia no hiperparatireoidismo. Algumas vezes, o hiperparatireoidismo pode determinar elevação do nível plasmático de cálcio por até 12 a 15 mg/dl e, raramente, até mais. Os efeitos desses níveis elevados de cálcio, como foi assinalado no início do capítulo, consistem em depressão dos sistemas nervosos central e periférico, fraqueza muscular, constipação, dor abdominal, úlcera péptica, falta de apetite e diminuição do relaxamento do coração durante a diástole. Intoxicação paratireóidea e calcificação metastática. Quando, cm raras ocasiões., são secretarias quantidades extremas de hormônio paratireóideo, o nível de cálcio nos líquidos corporais se eleva rapidamente e atinge valores muito altos. Mesmo a concentração de fosfato do líquido extracelular quase sempre aumenta acentuadamente, em lugar de diminuir, como acontece normalmente, talvez pelo fato de os rins não serem capazes de excretar com rapidez suficiente todo o fosfato que está sendo absorvido do osso. Por conseguinte, o cálcio e o fosfato dos líquidos corporais tornam-se muito supersaturados, de modo que os cristais de fosfatode cálcio (CaHPO4) começama se depositar nos alvéolos dos pulmões, nos túbulos renais, na glândula tireóide, na área da mucosa gástrica produtora de ácido e nas paredes das artérias em todo o corpo. Essa extensa deposição metastática de fosfato de cálcio pode aparecer dentro de poucos dias. Habitualmente, 6 necessária elevação do nível sanguíneo de cálcio acima de 17 mg/dl para que haja risco de intoxicação paratireóidea; todavia, quando essa elevação ocorre juntamente com aumento do fosfa- to, a morte pode sobrevir em apenas alguns dias. Formação de cálculos renais no hiperparatireoidismo. A maioria dos pacientes com hiperparatireoidismo leve exibe alguns sinais de doença óssea e poucas anormalidades gerais em conseqüência da elevação do cálcio. Todavia, possuem tendência extrema para formar cálculos renais. A razão disso é que todo excesso de cálcio e de fosfato absorvido do intestino ou mobilizado dos ossos no hiperparatireoidismo é excretado pelos rins, ocasionando elevação proporcional das concentrações urinárias dessas substâncias. Em conseqüência, os cristais de fosfato de cálcio tendem a precipitar-se nos rins, formando cálculos de fosfato de cálcio. Além disso, verifica-se o desenvolvimento de cálculos de oxalato de cálcio, visto que o oxalato, até mesmo em níveis normais, determina a precipitação de cálcio quando os níveis deste último estão elevados. Como a solubilidade da maioria dos cálculos renais é pequena em meio alcalino, a tendência à formação de cálculos renais é consideravelmente maior na urina alcalina do que na urina ácida. Por esse motivo, as dietas ácidas e as substancias acidificantes são quase sempre utilizadas no tratamento dos cálculos renais. RAQUITISMO O raquitismo ocorre principalmente nas crianças em conseqüência da deficiência de cálcio ou de fosfato no líquido extracelular. Todavia, em geral, o raquitismo é devido mais à falta de vitamina D do que à carência dietética de cálcio ou de fosfato. Se a criança for adequada- mente exposta à luz solar, o 7-desidrocolesterol na pele torna-se ativado pelos raios ultravioleta e forma a vitamina D;,, que impede o desenvol- vimento do raquitismo, ao promover a absorção de cálcio e de fosfato do intestino, conforme discutido no início deste capítulo. As crianças que permanecem dentro de casa durante todo o inverno geralmente não recebem quantidades adequadas de vitamina D, a não ser que seja fornecido algum suplemento na dieta. O raquitismo tende a ocorrer especialmente durante a primavera, porque a vitamina D forma- da durante o verão anterior é armazenada no fígado e ainda disponível para uso nos primeiros meses de inverno. Além disso, a absorção de cálcio e de fosfato dos ossos pode evitar o aparecimento de sinais clínicos de raquitismo nos primeiros meses de deficiência de vitamina D. Concentrações plasmáticas de cálcio e de fosfato no raquitismo. Habitualmente, a concentração plasmática de cálcio no raquitismo está apenas ligeiramente deprimida, enquanto o nível de fosfato apresenta-se acentuadamente diminuído. Isso decorre do fato de que as glândulas paratireóides evitam a queda do nível de cálcio, promovendo a absorção óssea toda vez que o nível de cálcio começa a diminuir. Por outro lado, não existe um sistema regulador satisfatório para evitar a redução do nível de fosfato, e o aumento da atividade paratireóidea eleva, na realidade, a excreção urinária de fosfatos. 770 Efeito do raquitismo sobre o osso. Durante u raquitismo prolongado, o acentuado aumento compensador da secreção de hormônio paratireóideo determina absorção osteoclástica extrema do osso; isso, por sua vez, torna o osso progressivamente mais fraco e impõe estresse físico acentuado sobre o osso, resultando em rápida atividade osteoblástica. Os osteoblastos depositam grandes quantidades de osteóide que não se calcifica, devido à quantidade insuficiente de tons cálcio e fosfato. Em conseqüência, o osteóide recém-formado, não- calcificado e muito fraco substitui gradualmente o osso mais velho que está sendo reabsorvido. Tetania no raquitismo. Nos estágios iniciais do raquitismo, quase nunca ocorre tetania, porque as glândulas paratireóides estimulam conti- nuamente a absorção osteoclástica do osso, mantendo, portanto, um nível quase normal de cálcio no líquido extracelular. Todavia, quando os ossos sofrem depleção total de cálcio, o nível desse elemento pode cair rapidamente. A medida que o nível sanguíneo de cálcio cai para valores inferiores a 7 mg/dl, surgem os sinais habituais de tetania, e a criança pode morrer por espasmo respiratório tetânico, a não ser que lhe seja administrado cálcio por via venosa, aliviando imediatamente a tetania. Tratamento. Naturalmente, o tratamento do raquitismo depende do suprimento adequado de cálcio e de fosfato na dieta, bem como da administração de grandes quantidades de vitamina D. Se a vitamina não for administrada, haverá pouca absorção intestinal de cálcio e de fosfato. Osteomalacia A osteomalacia refere-se ao raquitismo do adulto e quase sempre é denominada "raquitismo adulto". Os adultos normais raramente apresentam grave deficiência dietética de vitamina D ou de cálcio, visto não haver necessidade de grandes quantidades de cálcio para o osso em crescimento como ocorre nas crian- ças. Todavia, verifica-se a ocorrência ocasional de grave deficiência de vitamina D e de cálcio em conseqüência de esteatorréia (incapacidade de absorver gorduras), visto que a vitamina D é lipossolúvel, e o cálcio tende a formar sabões insolúveis com a gordura; conseqüentemente, na esteatorréia, a vitamina D e o cálcio tendem a ser eliminados nas fezes. Nessas condições, o adulto apresenta ocasionalmente absorção deficiente de cálcio e de fosfato, o que pode levar ao desenvolvimento de raquitismo adulto, embora isso quasenunca evolua para o estágio de tetania — apesar de ser freqüentemente causa de grave incapacidade óssea. Osteomalacia e raquitismo causados por doença renal. O "raquitismo renal" é um tipo de osteomalacia resultante de lesão renal prolongada. A causa dessa condição consiste principalmente na incapacidade dos rins lesados de formar 1,25- diidroxicolecalciferol, a forma ativa da vitamina D. Nos pacientes cujos rins foram totalmente removidos ou destruídos e que estão sendo tratados por hemodiálise, o problema do raquitismo renal é quase sempre muito grave. Outro tipo de doença renal que leva ao raquitismo e a osteomalacia é a hipofosfatemia congênita, resultante da diminuição congênita da reab- sorção de fosfatos pelos túbulos renais. Esse tipo de raquitismo deve ser tratado com compostos de fosfato, em lugar de cálcio e de vitamina D, sendo por isso denominado raquitismo resistente à vitamina D OSTEOPOROSE A osteoporose é a mais comum de todas as doenças ósseas do adulto, sobretudo na velhice. Difere da osteomalacia e do raquitismo por resultar mais da diminuição da matriz orgânica do que da calcificação anormal do osso. Em geral, na osteoporose, a atividade osteoblástica do osso é inferior ao normal, c, conseqüentemente, a velocidade de deposição de osteóide fica reduzida. Todavia, em certas ocasiões, como no hiperpa- ratireoidismo, a causa da diminuição do osso consiste numa excessiva atividade osteoclástica. As causas comuns de osteoporose incluem; (1) falta de estresse físico dos ossos, devido à inatividade; (2) desnutrição suficientemente extensa a ponto de impedir a formação da matriz protéica; (3) falta de vitamina C, que é necessária para a secreção das substâncias interce- lulares por todas as células, incluindo a formação de osteóide pelos osteoblastos; (4) falta de secreção de estrogênio na pós-menopausa, visto que os estrogênios exercem atividade estimulante sobre os osteoblastos; (5) velhice, devido à acentuada diminuição do hormônio do crescimento e de outros fatores do crescimento, somada ao fato de que muitas das funções anabólicas protéicas estão deficientes, de modo que não pode haver deposição satisfatória de matriz; e (6) doença de Cushing, visto que a presença de quantidades maciças de glicocorticóides determina redução da deposição de proteína emtodo o organismo, provoca aumento do catabolismo protéico e efeito específico no sentido de deprimir a atividade osteoblástica. Por conseguinte, a osteoporose pode ser causada por numerosas doenças ou deficiências do metabolismo das proteínas. . Outras Observações: Osteólise Osteocítica: O PTH atua sobre a matris óssea por um sistema de AMPc dependente, promovendo um aumento da secreção de ácidos orgânicos como citrato e lactato, que promove então a dissociação da hidroxiapatita (fosfato de cálcio). O cálcio passa então do osteocito para o osteoblasto, após ser dissociado do fosfato. Há então uma bomba de Ca+ ATPase na membrana para fazer o transporte de Ca+. Isto porque apesar de estar estabelecido um quadro de Hipocalcemia, a concentração de Ca+ extracelular é sempre maior do que a intracelular (no osso). Osteólise Osteoclástica: O PTH atua sobre a matriz óssea por um sistema de AMPc dependente, promovendo um aumento da secreção de ácidos orgânicos como citrato e lactato, que promove então a dissociação da hidroxiapatita (fosfato de cálcio). O PTH promove ainda um fenomeno semelhando a fagocitose sobre vesículas (lisossomo vacuolar) contendo pedaços ósseos. A acidez dentro das vesículas é grande por prótons são bombeados para dentro delas (bomba H+ ATPase vacuolar), onde há estoque de enzimas proteolíticas para agir sobre os pedações de ossos.
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