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Significados do conceito de paisagem

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http://www.pucsp.br/~diamantino/PAISAGEM.htm - Acesso em 3.5.2009 
 
SIGNIFICADOS DO CONCEITO DE PAISAGEM: UM DEBATE ATRAVÉS DA 
EPISTEMOLOGIA DA GEOGRAFIA [1] 
 
Demian Garcia Castro – UERJ - demiancastro@yahoo.com.br 
 
Em momentos assim, num barco ou numa praia, pela janela de um trem ou em uma 
casa em um bairro qualquer, a paisagem esta sempre atraindo nossa atenção. É como se 
estivéssemos em um teatro, diante de uma cenografia recém revelada por um abrir de 
cortinas. Bela ou feia, clara ou mal iluminada, próxima ou distante – não importa – somos 
atraídos pela paisagem como são os olhares dos espectadores atraídos pelo palco. E o 
que vemos ou percebemos estimula nossa imaginação e desenvolve nossa capacidade de 
observação. Aquilo que os olhos vêem junte-se os estímulos sonoros provenientes de uma 
circunstância qualquer e já não somos alvo apenas do que vemos, mas também do que 
ouvimos. (Nunes, 2002, p.216) 
 
INTRODUÇÃO 
As discussões sobre epistemologia da geografia começam a ganhar espaço no cenário da 
Geografia Humana, a contribuição de Bailly e Ferras (1997) vem no sentido de sistematizar e 
esclarecer coisas que costumamos enxergar de forma muito parecida. História do Pensamento 
Geográfico, Metodologia da Geografia, Teoria da Geografia e Epistemologia da Geografia não são 
a mesma coisa. Podemos dizer, por exemplo, que epistemologia não significa história, não 
somente história, por outro lado não existe epistemologia sem história (Bailly & Ferras, 1997). 
A palavra epistemologia etimologicamente divide-se em episteme (conhecimento científico) 
e logia (explicação, opinião, razão, proposição). Algumas expressões aparecem com significado 
similar, tais como: Gnosiologia, Teoria do Conhecimento, Filosofia da Ciência. As distinções 
revelam-se de acordo com a escola de pensamento com que se está trabalhando. No ”mundo” 
Anglo-saxão, epistemology, vincula-se a teoria do conhecimento, já no ”mundo” francês, 
épistémologie relaciona-se a filosofia da ciência. Podemos definir epistemologia como o estudo 
das ciências consideradas como realidade que se observam, se descrevem e se analisam, 
designando a estrutura dos conceitos, métodos, princípios, hipóteses e até mesmo o estudo do 
desenvolvimento histórico. (Machado, 2003) 
Desenvolveremos a seguir um trabalho sobre Epistemologia da Geografia. A base filosófica 
de interpretação está relacionada as proposições de Habermas descritas em Unwin (1995). 
Habermas divide as ciências em empírico-analíticas, histórico-hemenêuticas e críticas. Não 
iremos aqui discutir estas filosofias, observaremos como o conceito de paisagem pode ser 
inserido em cada uma destas classificações a partir de três importantes autores da Geografia: 
Sauer, Duncan e Santos, tentando observar como estes são embasados por estas diferentes 
concepções teórico-filosóficas. Antes, porém, faremos uma apresentação a respeito do conceito 
de paisagem. 
 
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONCEITO DE PAISAGEM 
Paisagem, palavra de uso quotidiano, que cada pessoa utiliza a seu modo; o que não 
impediu de se tornar um vocábulo à moda. Paisagem, uma destas noções utilizadas por 
um número sempre crescente de disciplinas, que muitas vezes ainda se ignoram. 
Paisagem, enfim, um dos temas clássicos da investigação geográfica. Conforme o 
interesse do que é objeto ou uma maneira como se encara a própria noção de paisagem 
difere. Se um geógrafo, um historiador, um arquiteto se debruçarem sobre a mesma 
paisagem, o resultado de seus trabalhos e a maneira de conduzi-los serão diferentes, 
segundo o ângulo de visão de cada um dos que a examinam. (Chantal & Raison, p.138) 
O termo paisagem é extremamente polissêmico, e as acepções disciplinares a ele 
relacionadas são tão vagas quanto variadas. Para a geografia a paisagem é um conceito-chave, 
ou seja, um conceito capaz de fornecer unidade e identidade à geografia num contexto de 
afirmação da disciplina. A importância deste conceito ao longo da história do pensamento 
geográfico tem sido variada, sendo relegado a uma posição secundária, suplantada pela ênfase 
nos conceitos de região, espaço, território e lugar, considerados mais adequados as necessidades 
contemporâneas (Corrêa e Rosendahl, 1998, p.7). 
Os geógrafos produziram uma reflexão conceitual própria, seguindo os passos de Humboldt 
e de outros naturalistas românticos. A geografia, tendo como objeto de estudo a paisagem, 
viabilizou-se enquanto disciplina acadêmica. Estes geógrafos associaram ”a paisagem a porções 
do espaço relativamente amplas que se destacavam visualmente por possuírem características 
físicas e culturais suficientemente homogêneas para assumirem uma individualidade” (Holzer, 
1999, p.151). O conceito varia de sentidos de acordo com a escala de observação e os critérios 
de classificação, conforme a geografia for entendida prioritariamente como ciência natural ou 
como ciência humana (Chantal & Raison, ano). 
O entendimento da paisagem geográfica conheceu duas fases: no início do século XX com 
a escola regionalista francesa na qual a paisagem era capaz de fornecer boa carga de informação 
sobre a organização social nela compreendida, e outra fase em meados do século XX com o 
desenvolvimento dos transportes e meios de comunicação, da circulação de mercadorias e 
capitais, o que fez com que ”(...) a paisagem perdesse seus fundamentos locais para refletir as 
relações das redes de economia e sua simbologia universalizante. (...) Entenda-se que uma 
medida econômica situada nos centros mundiais de decisão pode modificar a paisagem situada a 
milhares de quilômetros”. (Yázigi, 2002, p.19) 
Depois de ser um tema central da Geografia no início do século XX, o conceito de paisagem 
teve sua importância reduzida no contexto de contestação que a geografia clássica passou com a 
incorporação de outras bases epistemológicas ao pensamento desta ciência, como as 
relacionadas ao positivismo lógico. Porém, o conceito está novamente em debate, mas o 
problema de seu significado permanece em aberto. Retomada com a emergência de uma Nova 
Geografia Cultural, a discussão sobre paisagem passou a ser revestida de novos conteúdos, 
devido a ampliação dos horizontes explicativos da disciplina com a incorporação de noções como 
percepção, representação, imaginário e simbolismo (Castro, 2002). Esta retomada da dimensão 
cultural no pensamento geográfico pode ser ampliada para o contexto do debate científico como 
um todo, no âmbito de revisão das questões que fundamentaram a modernidade. 
 
Uma nota sobre o vocábulo alemão landschaft 
Breve esclarecimento merece ainda as diferentes acepções que o vocábulo recebe de 
acordo com a língua em que é empregado. Assim, landschaft (alemão) e paysage (francês), 
certamente não significam a mesma coisa. A palavra alemã é mais antiga e possui um significado 
mais complexo que a de língua latina, associada ao renascimento e, em sua origem, as artes 
plásticas. De acordo com Holzer 
"Landschaft” se refere a uma associação entre sítio e os seus habitantes, ou se 
preferirmos, de uma associação morfológica e cultural. Talvez tenha surgido de ”Land 
schaffen”, ou seja, criar a terra, produzir a terra. Esta palavra transmutada em ”Landscape” 
chegou a geografia norte-americana pelas mãos de Sauer que, cuidadosamente, 
enfatizava que seu sentido continua sendo o mesmo: o de formatar (land shape) a terra, 
implicando numa associação das formas físicas e culturais. (1999, p.152) 
Podemos completar nos utilizando de Freitas et. al. (1999), que nos diz que landschaft não 
tem correspondente em outras línguas, comportando um conjunto de significados e visões de 
mundo que fornecem ao conceito uma gama de interpretações e utilizações muitas mais amplas 
que das demais escolas de geografia. Segundo estes autores ”a paisagem alemã compreende um 
complexo natural total, representado, de forma integrada, pelanatureza e pela ação humana” 
(Freitas et. al., 1999, p. 31). 
A pesar de amplamente utilizado na linguagem comum de diversos paises de histórias 
políticas e culturais absolutamente distintas, a paisagem guarda consigo o sentido de estar 
associada ao olhar. 
 
A paisagem entre visibilidade e visualidade 
Sendo a paisagem o que se vê, supõe-se necessariamente a dimensão real do concreto, o 
que se mostra, e a representação do sujeito, que codifica a observação. A paisagem resultado 
desta observação é fruto de um processo cognitivo, mediado pelas representações do imaginário 
social, pleno de valores simbólicos. A paisagem apresenta-se assim de maneira dual, sendo ao 
mesmo tempo real e representação (Castro, 2002). 
Menezes nos diz que devemos descartar os enfoques polares, realistas ou idealistas. Os 
primeiros pautados na materialidade e objetividade morfológica da paisagem em seu modo dado 
ou marcado pela ação humana. Os segundos pensam a paisagem como uma projeção do 
observador. Segundo o autor não devemos pensar em duas faces do mesmo fenômeno, uma 
material, inerte e outra mental, criadora. Melhor é reconhecer que ela é ”um dado tal como 
percebido, um fragmento do mundo sensível tal qual está dotado de personalidade por uma 
consciência” (Lenclud apud Menezes, 2002, p. 32). 
Lucrécia Ferrara nos traz importante contribuição ao discutir visualidade e visibilidade, 
categorias dos modos de ver, de natureza da imagem. A visualidade corresponde a imagem do 
mundo físico e concreto, já a visibilidade à elaboração reflexiva do que é fornecido visualmente 
transformado em fluxo cognitivo. Nas palavras da autora, se utilizando também de Jameson, 
A visualidade corresponde registro um dado físico e referencial; a visibilidade, ao contrário, 
é propriamente, semiótica, partindo de uma representação visual para gerar um processo 
perceptivo complexo claramente marcado como experiência geradora de um 
conhecimento contínuo, individual e social (Jameson, 1994). Na visibilidade o olhar e o 
visual não se subordinam ou conectam-se um ao outro, como ocorre com a visualidade, 
ao contrário, ambos se distanciam um do outro para poder ver mais. Estratégico e 
indagativo o olhar da visibilidade esquadrinha o visual para inseri-lo, comparativamente, 
na pluralidade da experiência de outros olhares individuais e coletivos, subjetivos e 
sociais, situados no tempo e no espaço. (Ferrara, 2002, p. 74) 
Talvez como síntese destas questões possamos apresentar o brilhante pensamento de 
Berque, segundo o qual a paisagem é simultaneamente uma marca, uma geo-grafia, que é 
impressa pela sociedade na superfície terrestre, e ao mesmo tempo estas marcas são matrizes, 
ou seja, constituem a condição para a existência e para a ação humana. Se por um lado ela é 
vista por um olhar pelo outro ela determina este olhar. Nas palavras do autor, ”(...) a paisagem é 
plurimodal (passiva-ativa-potencial.) como é plurimodal o sujeito para o qual a paisagem existe; 
(...) a paisagem e o sujeito são co-integrados em um conjunto unitário que se autoproduz e se 
auto-reproduz”. (Berque, 1998, p.86). 
Partiremos a seguir para uma discussão pautada no pensamento filosófico de Habermas, 
apresentando suas diferentes abordagens de ciência e posteriormente observando como o 
conceito de paisagem pode ser inserido em cada uma destas classificações. 
 
DIFERENTES ABORDAGENS DAS CIÊNCIAS 
Nossas discussões têm por base o pensamento de Habermas, lido através da obra de 
Unwin (1995), que discute a teoria da geografia a partir das contribuições deste pensador. Aqui no 
Brasil tal classificação vem sendo utilizada, recebendo denominações um pouco diferenciadas, 
por Spósito (1999). Habermas divide as ciências em três tipos, ou seja, categorias de processo 
que apontam conexão entre regras metodológicas e interesse do conhecimento: 1. Empírico-
analítica, no qual se enquadra o positivismo clássico e o positivismo lógico; 2. Histórico-
hermenêutica, englobando a fenomenologia, a hermenêutica e o existencialismo; 3. Crítica, 
relacionada à Marx e Freud. É claro que não utilizaremos esta classificação como uma camisa de 
força, mas buscaremos através dela elementos para uma melhor compreensão de textos 
geográficos. 
 
APRESENTANDO DIFERENTES LEITURAS DO CONCEITO DE PAISAGEM: UMA DISCUSSÃO 
EPISTEMOLÓGICA 
Com a retomada do conceito de paisagem na década de 1970, surgiram novas definições 
embasadas em outras matrizes epistemológicas. Na realidade, na paisagem apresentam-se 
simultaneamente as diversas dimensões que cada matriz epistemológica privilegia. Assim, podem 
ser observadas as seguintes dimensões: morfológica, funcional, histórica, espacial e simbólica 
(Corrêa & Rosendahl, 1998). Desta forma analisamos a seguir os textos de Carl Sauer, Denis 
Cosgrove e Milton Santos, buscando estas dimensões. 
 
Carl Sauer e a Morfologia da Paisagem 
As proposições de C. Sauer para o estudo da paisagem estavam na tentativa de resolver os 
maiores problemas da geografia da época, isto é, suas dualidades fundamentais, geografia física 
e Humana, Geral e Regional, e também a ausência de um método objetivo próprio. As inspirações 
de Sauer são em grande parte provenientes de seu contato com a Geografia Alemã, e as obras de 
Schlüter e Passarge. Para estes o estudo da paisagem deveria se restringir às formas, aos 
aspectos visíveis, excluindo os fatos não materiais da atividade humana (Gomes, 1996). 
Sauer logo no começo de seu artigo ”A morfologia da paisagem” afirma que a ciência 
adquire identidade através da escolha de um objeto e de um método, a geografia deveria se 
limitar ao que é evidente da mesma forma que as outras disciplinas. Neste caso o evidente está 
na paisagem, devendo esta ser o objeto fundamental da geografia. 
Corrêa & Rosendahl indicam que para Sauer 
a paisagem geográfica é vista como um conjunto de formas naturais e culturais 
associadas em uma dada área, é analisada morfologicamente, vendo-se a integração das 
formas entre si e o caráter orgânico ou quase orgânico delas. O tempo é uma variável 
fundamental. A paisagem cultural ou geográfica resulta da ação, ao longo do tempo, da 
cultura sobre a paisagem natural. (1998, p.9) 
A análise de Sauer procura sempre um plano sistemático mais geral, enfatizando as 
análises estruturais e funcionais, observam-se claramente as bases do pensamento positivista em 
sua definição de paisagem. 
Por definição a paisagem tem uma identidade que é baseada na constituição 
reconhecível, limites e relações genéricas com outras paisagens. Sua estrutura e função 
são determinadas por formas integrantes e dependentes. A paisagem é considerada, 
portanto, em um certo sentido, como tendo uma qualidade orgânica. (Sauer, 1998, p.23) 
O que fica mais claro quando o autor nos fala da aplicação de um método morfológico, no 
qual ”A agregação e o ordenamento dos fenômenos como formas que estão integradas em 
estruturas e o estudo comparativo dos dados dessa maneira organizados constituem o método 
morfológico de síntese, um específico método empírico.” (1998 p. 30-31). 
As criticas efetuadas ao pensamento de Sauer referem-se ao fato de que a análise da 
paisagem não pode estar limitada aos sentidos. O que a confundiria com o sentido genérico do 
senso comum que serve para designar ”a aparência de um espaço tal como ele é imediatamente 
percebido, e serve também, simplesmente para designar uma parte limitada do espaço.” (Gomes, 
1996, p. 239). 
 
Denis Cosgrove e o Simbolismo da Paisagem 
O estudo de Cosgrove destaca questões que de forma alguma fariam parte de uma 
geografia pautada no positivismo clássico ou no positivismo lógico. Já em destaque no título de 
seu texto, o autor nos diz que ”a geografia está em toda parte”, para destacar a cultura e o 
simbolismo nas paisagens humanas. Temos aqui temas e abordagens próprias de uma renovação 
das ciênciasque ganha força na década de 1970, substituindo os ideais positivistas anteriores. 
Cosgrove destaca que o geógrafo deveria se esforçar para mostrar que a geografia existe 
para ser apreciada, e que muitas das vezes temos agido no sentido de ”obscurecer em vez de 
aumentar esse prazer”. No meio de um funcionalismo utilitário, a explicação geográfica é 
estritamente prática. Sendo banidas da Geografia 
"as paixões inconvenientemente, às vezes assustadoramente poderosas, motivadoras da 
ação humana, entre elas as morais, patrióticas, religiosas, sexuais e políticas. Todos 
sabemos quão fundamentalmente estas motivações influenciam nosso comportamento 
diário. (...) Contudo na geografia humana parecemos intencionalmente ignorá-las ou negá-
las. (...) nossa geografia deixa escapar muito do significado contido na paisagem humana 
tendendo a reduzi-la a uma impressão impessoal de forças demográficas e econômicas". 
(Cosgrove, 1998, p.97) 
O autor propõe-se a aplicar a interpretação das paisagens humanas as habilidades que 
empregamos ao analisar um romance, um poema, um filme ou um quadro. Assim, a trataríamos 
como expressão humana composta de muitas camadas de significados, o que é bastante 
incomum. Desta forma o que ele se propõe a tratar a Geografia como uma humanidade e como 
uma ciência social. 
Uma característica importante de ser ressaltada é que o autor aborda estas questões 
relacionadas ao simbolismo e a cultura, o que encaixa seu trabalho em um determinado tipo de 
ciência, mas há também um forte conteúdo crítico. Observa-se como o estudo da cultura está 
intimamente ligado ao estudo do poder. Revelando as relações de dominação e opressão. 
Segundo o autor 
Um grupo dominante procurará impor sua própria experiência de mundo, suas próprias 
suposições tomadas como verdadeiras, como a objetiva e válida cultura para todas as 
pessoas. O poder é expresso e mantido na reprodução da cultura. Isto é melhor 
concretizado quando menos visível, quando as suposições culturais do grupo dominante 
aparecem simplesmente como senso comum. Isto é as vezes chamado de hegemonia 
cultural. Há, portanto, culturas dominantes e subdominantes ou alternativas, não apenas 
no sentido político, mas também em termos de sexo, idade e etnicidade. (Cosgrove, 1999, 
p.104-105). 
Muito do simbolismo da paisagem reproduz as normas culturais estabelecendo os valores 
de grupos dominantes por toda uma sociedade. 
Podemos terminar esta parte observando como o autor propõe trabalhar as paisagens ao 
mesmo tempo de forma crítica e original, incorporando a dimensão simbólica, contribuindo 
sobremaneira ao pensamento geográfico 
As paisagens tomadas como verdadeiras de nossas vidas cotidianas estão cheias de 
significado. Grande parte da Geografia mais interessante está em decodificá-las. (...) 
Porque a geografia esta em toda parte, reproduzida diariamente por cada um de nós. A 
recuperação do significado em nossas paisagens comuns nos diz muito sobre nós 
mesmos. Uma geografia efetivamente humana crítica e relevante, que pode contribuir para 
o próprio núcleo de uma educação humanista: melhor conhecimento e compreensão de 
nós mesmos, dos outros e do mundo que compartilhamos. (Cosgrove, 1999, p. 121) 
 
Milton Santos e a distinção entre paisagem e espaço 
O prof. Milton Santos dispensa apresentação, com uma postura sempre crítica, enxergando 
o mundo a partir do lugar, desenvolveu desta forma um pensamento singular sobre os países de 
Terceiro Mundo, reconhecido por toda comunidade geográfica. 
Santos em seu livro a Natureza do Espaço (2002), estabelece uma necessidade de 
distinção epistemológica entre espaço e paisagem. Utiliza-se de Hägerstrand, segundo o qual, "a 
ação é uma ação na paisagem, sendo a paisagem que dá forma a ação". Santos discorda da 
posição do autor sueco, dizendo que onde este escreve paisagem teria escrito espaço. Paisagem 
e espaço não são sinônimos. "A paisagem é um conjunto de formas que, num dado momento, 
exprime as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre homem e 
natureza. O espaço são as formas mais a vida que as anima" (2002, p.103). 
O autor nos oferece como exemplo desta distinção a bomba de nêutrons, um projeto do 
Pentágono abortado por Kennedy durante a Guerra Fria. Esta bomba seria capaz de aniquilar 
toda a vida humana em uma dada área, mas mantendo as construções. Se esta bomba fosse 
utilizada teríamos antes o espaço e após a explosão somente a paisagem. 
Define a paisagem como sendo transtemporal, pois junta objetos passados e presentes em 
uma construção transversal. Já o espaço é sempre o presente, uma construção horizontal, uma 
situação única. 
O seu caráter de palimpsesto revela um passado já morto que permite rever as etapas do 
passado numa perspectiva de conjunto. "A paisagem é história congelada, mas participa da 
história viva. São suas formas que realizam, no espaço, as funções sociais" (p.107). 
O autor trabalha dentro de uma perspectiva crítica incorporando o materialismo histórico e 
dialético em sua análise. A questão é que ele esvazia o conceito de paisagem em prol de uma 
valorização do espaço. A paisagem é o que é possível de ser abarcada com a visão, destituída da 
sociedade, possuidora de um caráter histórico em suas distintas materialidades presentes. As 
contradições se realizam na dialética entre espaço e sociedade, nas palavras do autor 
Não existe dialética possível das formas enquanto formas. Nem a rigor entre paisagem e 
sociedade. A sociedade se geografiza através das formas, atribuindo-lhe uma função que 
vai mudando ao longo da história. O espaço é a síntese sempre provisória entre o 
conteúdo social e as formas espaciais. A contradição é entre sociedade e espaço.(Santos, 
2002, p.109) 
Quando são atribuídos valores a paisagem esta se transforma em espaço geográfico. O fato 
de existirem simplesmente enquanto forma não basta. Porém, a forma utilizada é diferente, 
porque seu conteúdo é social. Assim, esta se torna espaço, porque forma-conteúdo. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS (porém não conclusivas) 
A definição mais simples de paisagem, como um espaço abarcado por um "golpe de vista", 
bastante usual no senso comum, não dá conta da complexidade que o termo abrange. Como 
buscamos demonstrar neste trabalho. 
Chantal & Raison almejam "que em torno deste vocábulo, inçado de tantas inspirações 
existenciais quando de significados científicos, se realize uma síntese eficaz das relações 
dialéticas entre natureza e sociedade" (p.158). 
O conceito de paisagem e seus significados objetivos e subjetivos, marca e matriz, real e 
representação, material e mental, tempo e cultura formatando o espaço, impregnado de diversos 
símbolos, reveladora de relações de poder, etc., nos confirma a polissemia e amplitude do 
conceito. Revelada de acordo com a matriz epistemológica segundo o qual se está embasado. 
Enfim, paisagem é um conceito-chave para nós geógrafos a partir do qual podemos construir 
diversificadas abordagens, as mais ricas possíveis para a nossa ciência. 
 
Referências Bibliográficas: 
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Paris, 1997. 191p. 
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CHANTAL, Blanc-Pamard & RAISON, Jean-Pierre. Paisagem. In: Enciclopédia Einaudi. v.8. Lisboa: 
Imprensa Nacional. p. 138-159 
CORRÊA, Roberto Lobato & ROZENDAHL, Zeny. Apresentando leituras sobre paisagem, tempo e cultura. 
In: CORRÊA, Roberto Lobato & ROZENDAHL, Zeny (orgs.). Paisagem, Tempo e Cultura. Rio de Janeiro: 
Eduerj, 1998.123p. p.7-11 
COSGROVE, Denis. A geografia está em toda parte: Cultura e simbolismo nas paisagens humanas. In: 
CORRÊA, Roberto Lobato & ROZENDAHL, Zeny(orgs.). Paisagem, Tempo e Cultura. Rio de Janeiro: 
Eduerj, 1998.123p. p.92-123 
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São Paulo: Contexto, 2002. 226p. p. 65-82 (Coleção Turismo) 
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