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LICENCIATURAS em foco LICENCIATURAS EM FOCO UNIASSELVI 2016 Organização Ana Clarisse Alencar Barbosa Fábio Roberto Tavares Autoria Clara Aniele Schley Jean Carlos Morell Patrícia Cesário Pereira Offial Reitor da Uniasselvi Prof. Hermínio Kloch Pró-Reitora de Ensino de Graduação a Distância Prof.ª Francieli Stano Torres Pró-Reitor Operacional de Graduação a Distância Prof. Hermínio Kloch Diagramação Matheus Cristi Capa Djenifer Luana Kloehn Revisão Final José Roberto Rodrigues Marcio Kisner Propriedade do Centro Universitário Leonardo da Vinci CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, nº 1.040, Bairro Benedito 89130-000 - INDAIAL/SC www.uniasselvi.com.br LICENCIATURAS em foco Ficha catalográfica Elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri – UNIASSELVI – Indaial. 370 S339l Schley; Clara Aniele Licenciaturas em foco/ Clara Aniele Schley; Jean Carlos Morell; Patrícia Cesário Pereira Offial : UNIASSELVI, 2016. 243 p. : il. ISBN 978-85-7830-997-8 1.Educação. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. Impresso por: LICENCIATURAS em foco LICENCIATURAS em foco ------------------ [ APRESENTAÇÃO LICENCIATURAS EM FOCO ] ------------------ Pesquisas atuais destacam a relevância da educação como fator da diversidade, da inclusão, da paz, e da solidariedade. Sabemos que muitos dos nossos alunos provêm de situações sociais e familiares adversas e caóticas, e que acabam por reproduzir na escola aquilo que vivem em seus lares. Na grande maioria das vezes, os pais estão distantes da vida escolar de seus filhos e a escola se vê só e incapaz de resolver todos os conflitos que a assolam. Uma educação que valoriza a diversidade surge como uma alternativa para que possamos buscar respostas para as problemáticas existentes no cotidiano escolar. Muito embora a Declaração dos Direitos Humanos tenha sido aprovada em 1948, os estudos acerca dos seus encaminhamentos continuam mais atuais do que nunca, tendo em vista a premência de provocar discussões e estudos sobre a temática. Principalmente no que diz respeito ao preconceito em seus mais variados contextos. Ao entender que a escola é promotora de mudança para o indivíduo, que traz em si a profundeza dessa modificação, por meio de seus potenciais, é fundamental valorizá-lo, respeitá-lo em suas diferenças com base numa educação cidadã. Para abranger melhor o tema em discussão, apresentaremos debates em torno da educação e diversidade, contidas na unidade 1; sobre as políticas educacionais na unidade 2; e ao final, uma discussão sobre as metodologias de ensino para educação básica e as tecnologias da informação, explanadas na unidade 3. Atende para as questões Enade no final de cada tópico em discussão e exercite seus conhecimentos. Boa leitura! LICENCIATURAS em foco SUMÁRIO UNIDADE 1: EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE .................................................. 1 TÓPICO 1 - DIVERSIDADE E OS DESAFIOS ATUAIS .................................. 3 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 3 2 DIVERSIDADE UMA PROBLEMÁTICA: DO INDIVIDUALISMO À COLETIVIDADE E SUAS INTERFACES ...................................................... 3 2.1 EDUCAÇÃO, POLÍTICA E O DIREITO À IGUALDADE ............................. 6 3 CULTURA E PRECONCEITO: UMA CONSTRUÇÃO SOCIAL ................... 11 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................... 17 RESUMO DO TÓPICO 1 .................................................................................. 21 AUTOATIVIDADE ............................................................................................ 22 TÓPICO 2 - EDUCAÇÃO INTERCULTURAL .................................................. 25 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 25 2 EDUCAÇÃO PARA RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS ................................... 25 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................... 38 RESUMO DO TÓPICO 2 .................................................................................. 43 AUTOATIVIDADE ............................................................................................ 44 TÓPICO 3 - EDUCAÇÃO FORMAL E NÃO FORMAL .................................... 47 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 47 2 TRÊS CONCEITOS NO ENTORNO DO EMARANHADO PESSOAL E PROFISSIONAL: EDUCAÇÃO FORMAL/INFORMAL/NÃO FORMAL ... 47 2.1 EDUCAÇÃO: FORMAL/INFORMAL/NÃO FORMAL .................................. 49 3 EDUCAÇÃO FORMAL E NÃO FORMAL: INTERPENETRAÇÃO NA PRÁTICA DOCENTE .............................................................................. 52 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................... 58 RESUMO DO TÓPICO 3 .................................................................................. 60 AUTOATIVIDADE ............................................................................................ 61 LICENCIATURAS em foco UNIDADE 2: POLÍTICAS EDUCACIONAIS .................................................... 65 TÓPICO 1 - EDUCAÇÃO INCLUSIVA ............................................................. 67 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 67 2 COMUNIDADE ESCOLAR E A POLÍTICA DE INCLUSÃO ......................... 67 3 OS EDUCADORES E A EDUCAÇÃO INCLUSIVA ...................................... 79 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................... 84 RESUMO DO TÓPICO 1 .................................................................................. 87 AUTOATIVIDADE ............................................................................................ 88 TÓPICO 2 – PROCESSOS DE APRENDIZAGEM NA DIVERSIDADE E NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS .................... 91 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 91 2 APRENDIZAGEM NUMA CONCEPÇÃO INCLUSIVA: ESTRATÉGIAS DE RESPOSTAS À DIVERSIDADE ................................... 91 3 A AVALIAÇÃO E OS DESAFIOS NA DIVERSIDADE E NECESSIDADES ESPECIAIS................................................................... 96 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................... 99 RESUMO DO TÓPICO 2 .................................................................................. 102 AUTOATIVIDADE ............................................................................................ 103 TÓPICO 3 – POLÍTICAS EDUCACIONAIS: LDB, PPP, PNE ......................... 107 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 107 2 LEI DE DIRETRIZES E BASES – LDB - UM POUCO DE SUA HISTÓRIA ....................................................................................... 107 2.1 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 – ARTIGO 205 ............................... 107 2.2 A EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL .......................................................... 109 2.3 LEI DE DIRETRIZES E BASES - LDB ....................................................... 111 3 UM POUCO DE HISTÓRIA ........................................................................... 116 4 PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO - PPP ............................................... 117 4.1 O PPP COMO INSTRUMENTO DE INTERAÇÃO DA COMUNIDADE E DE INTERVENÇÃO NA REALIDADE ESCOLAR ...................................120 4 PLANO NACIONAL DA EDUCAÇÃO - PNE ................................................ 123 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................... 125 RESUMO DO TÓPICO 3 .................................................................................. 127 AUTOATIVIDADE ............................................................................................ 128 LICENCIATURAS em foco UNIDADE 3: METODOLOGIAS DE ENSINO NA EDUCAÇÃO BÁSICA ....... 131 TÓPICO 1 – FUNDAMENTOS E TÉCNICAS DE ENSINO NA EDUCAÇÃO BÁSICA ........................................................... 133 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 133 2 A FILOSOFIA, A TECNOLOGIA E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR ........ 133 3 FORMAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIZAÇÃO ........................................... 138 4 LINGUAGEM DE ENSINO, DIDÁTICA E TECNOLOGIA ............................ 141 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................... 150 RESUMO DO TÓPICO 1 .................................................................................. 156 AUTOATIVIDADE ............................................................................................ 157 TÓPICO 2 – CONHECIMENTO, TECNOLOGIA E EDUCAÇÃO .................... 163 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 163 2 A CIBERCULTURA E OS DESAFIOS SOCIAIS DO ENSINO ..................... 163 2.1 DEBATENDO A QUESTÃO DO ENADE .................................................... 168 3 LINGUAGEM E TECNOLOGIA .................................................................... 171 4 A INCORPORAÇÃO DE TECNOLOGIAS NO AMBIENTE ESCOLAR ....... 173 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................... 181 RESUMO DO TÓPICO 2 .................................................................................. 186 AUTOATIVIDADE ............................................................................................ 187 TÓPICO 3 – DIFERENTES TICS APLICADAS À EDUCAÇÃO ..................... 191 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 191 2 DISCUTINDO PROJETOS E IMPLEMENTANDO IDEIAS ........................... 191 2.1 ELABORAÇÃO DE VÍDEOS ...................................................................... 194 2.2 O PORTAL DO DOMÍNIO PÚBLICO .......................................................... 196 2.3 OS BLOGS COMO UMA POSSÍVEL FONTE DE ESTUDO ...................... 197 2.4 GEOGRAFIA VISUAL ................................................................................. 199 2.5 O FLIGHT RADAR ..................................................................................... 200 2.6 O INSTITUTO TEAR .................................................................................. 202 2.7 INSTITUTO PAULO FREIRE ..................................................................... 203 2.8 PORTAL DA TV ESCOLA ........................................................................... 204 2.9 PORTAL DA MATEMÁTICA ........................................................................ 205 2.10 CLUBES DE MATEMÁTICA DA OBMEP ................................................. 207 2.11 PORTAL DA LÍNGUA PORTUGUESA ...................................................... 208 LICENCIATURAS em foco 2.12 PORTAL DO PROFESSOR DE PORTUGUÊS - LÍNGUA ESTRANGEIRA .......................................................................... 209 2.13 BIBLIOTECA NACIONAL DIGITAL ........................................................... 210 2.14 TRABALHANDO COM MAPAS ................................................................ 211 2.15 AS PINTURAS HISTÓRICAS ................................................................... 216 2.16 O PROJETO DE RÁDIO NA ESCOLA ..................................................... 218 2.17 PODCAST ................................................................................................ 224 RESUMO DO TÓPICO 3 .................................................................................. 227 AUTOATIVIDADE ............................................................................................ 228 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 233 LICENCIATURAS em foco LICENCIATURAS em foco 1 UNIDADE 1 EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM A partir desta unidade você será capaz de: • Compreender a diversidade e seus desafios no contexto atual. • Refletir sobre o papel da educação para a transformação humana. • Entender a educação formal e não formal e a interpenetração na prática docente. PLANO DE ESTUDOS Esta unidade está dividida em três tópicos. Em cada um deles você encontrará atividades visando à compreensão dos conteúdos apresentados. TÓPICO 1 - DIVERSIDADE E OS DESAFIOS ATUAIS TÓPICO 2 - EDUCAÇÃO INTERCULTURAL TÓPICO 3 - EDUCAÇÃO FORMAL E NÃO FORMAL LICENCIATURAS em foco 2 LICENCIATURAS em foco 3 ------ [ TÓPICO 1 - DIVERSIDADE E OS DESAFIOS ATUAIS ] ------ 1 INTRODUÇÃO No trabalho intelectual sério e crítico não existem “inícios absolutos” e poucas são as continuidades inquebrantáveis. Não basta o interminável desdobramento da tradição, tão caro à história das ideias, tampouco o absolutismo da “ruptura epistemológica” (...) O que importa são as rupturas significativas - em que velhas correstes de pensamento são rompidas, velhas constelações deslocadas, e elementos novos e velhos são reagrupados ao redor de uma nova gama de premissas e temas (HALL, 2003, p. 123). No argumento do autor, devemos elevar nosso pensamento crítico frente às novas temáticas que causam certa ruptura na sociedade. Uma postura ingênua ou cética diante de situações novas, seja o nascimento de um paradigma ou rompimento de tradições, pode levar ao engessamento dos velhos conceitos. Devemos aprender a enxergar o mundo com olhar de pesquisador, buscando entender o presente, o passado e as novas tendências. Diante disso, acenamos para a importância de você compreender a diversidade no atual contexto social e suas ramificações presentes também no espaço educativo. Para tanto, abordaremos temas e pesquisas que envolvem os desafios da diversidade, como forma de ampliação de culturas, sendo também uma problemática social, quando não compreendida. 2 DIVERSIDADE UMA PROBLEMÁTICA: DO INDIVIDUALISMO À COLETIVIDADE E SUAS INTERFACES Para compreendermos o que é diversidade, convidamos você a contemplar o mundo à sua volta. O que vê? A começar pelas plantas, uma variedade de tamanhos, cores e formas, cada uma delas com sua função, com seu cheiro característico, que despertam os diferentes sentidos daqueles que os percebem, pois, a percepção é subjetiva. LICENCIATURAS em foco 4 FIGURA 1 - DIVERSIDADE FONTE: Disponível em: <http://www.trilogiacontemporanea.com.br/>. Acesso em: 9 maio 2016. De norte a sul de nosso país encontramos riquezas imensuráveis da biodiversidade, contidas não só na vegetação, ou animais dos mais comuns aos mais raros, como ainda na face de cada pessoa. Rostos que revelam os diferentes tipos de sentimentos contidos no desenhar de seus traços, na expressão corporal, que de alguma maneira demonstram uma identidade própria. A individualidade expressa por cada um, ou seja, a sua forma de ser, de aprender, de representar e utilizar o conhecimento, resulta de sua história e dos valores culturais nos quais o indivíduo está imerso. A cultura e o contexto oferecem os símbolos, os produtos simbólicos, os diferentes sistemas simbólicos que se conectam com o sistema nervoso do indivíduo no momento da aprendizagem. Assim, cadapalavra, frase ou história, vistas como entidades simbólicas, são interpretadas e reconhecidas de acordo com seus significados existentes na cultura (MORAES, 2010, p. 178). Valorizamos as diferentes culturas, contidas não somente num determinado grupo social, mas pertencente a cada indivíduo. Cada ser, com suas particularidades, entende o mundo por meio de seus contextos. Cada qual com sua história, com sua identidade, formando uma consciência coletiva que podemos chamar de sociedade. LICENCIATURAS em foco 5 Falar de diversidade envolve também entender as multiculturas, que vêm se tornando cada vez mais comuns na constituição das atuais sociedades. Para esclarecer como se formam essas multiculturas, podemos citar os imigrantes que colonizaram as regiões brasileiras. Também um exemplo recente que ocorreu no ano de 2010, a imigração de alguns haitianos ao Brasil após sofrerem com um terremoto em seu país, uma tragédia que deixou 150 mil mortos e muitos em estado de total pobreza. O governo brasileiro, com o apoio das empresas, ofereceu trabalho e os mesmos direitos que cidadãos brasileiros possuem, garantindo o acesso à saúde e ao ensino. Esse acolhimento envolveu não só recebê-los fisicamente no espaço concedido, como também envolvê-los em nossa cultura, todavia, há uma adaptação de ambas as partes que deverá ser construída com o tempo. Outro exemplo da constituição das multiculturas vem ocorrendo na Alemanha. O país concedeu a entrada de imigrantes da Síria, África e Oriente Médio, refugiados da guerra, que de um lado abrigou as pessoas vítimas desse sofrimento e, de outro, causou problemas, aumentando a violência no seu próprio país, pois não se pensou numa política para essa integração. A partir desses exemplos, queremos que você entenda a diferença entre multicultural e multiculturalismo, pois são termos que envolvem as discussões pertinentes à diversidade e que divergem de acordo com a concepção de cada autor. Multicultural, segundo Hall (2003, p. 50), é um termo qualitativo e: Descreve as características sociais e os problemas de governabilidade apresentados por qualquer sociedade na qual diferentes comunidades culturais convivem e tentam construir uma vida em comum, ao mesmo tempo em que retêm algo de sua identidade “original”. Ambos os exemplos dos países acima citados trazem a integração de países e culturas diferentes, que é a ideia de sociedades multiculturais. No entanto, essa prática deve estar acompanhada de ações e estratégias políticas que apoiem na prática toda essa diversidade, a isso chamamos de multiculturalismo. Em contrapartida, o termo “multiculturalismo” é substantivo. Refere-se às estratégias e às políticas adotadas para governar ou administrar problemas de diversidade e multiplicidade gerados pelas sociedades multiculturais. LICENCIATURAS em foco 6 Perceba que a complexidade da diversidade absorve vários fatores, entre eles a formação da identidade do indivíduo, ou de um determinado grupo e a sua expressão coletiva. Nesse sentido, acendemos uma discussão para abrangermos a diversidade, não só no contexto das diferenças, mas num conjunto que desenha todo esse cenário intercultural, anunciado no sistema educativo, político e governamental, sendo os desafios atuais da sociedade. 2.1 EDUCAÇÃO, POLÍTICA E O DIREITO À IGUALDADE Pautados nos direitos humanos, entendemos que todos têm o direito à educação. A partir daí enfrentamos um desafio. Quem são todos? Ora, todos são todos, independentemente de questões relativas à etnicidade, ao gênero, à religião, entre outros. Então, devemos saber lidar com as diferenças em sala de aula, respeitando o individualismo de cada sujeito sem torná-lo diferente, não é? No entanto, eis o grande desafio, entender o sujeito em seu processo individual e coletivo ao mesmo tempo. E ainda, como ensinar considerando as diferentes formas de aprender, representar e utilizar o conhecimento, sem enxergar os indivíduos como uma coletividade social? Como, então, pensar numa educação centrada apenas no indivíduo sem levar em consideração as relações e as interconexões recíprocas que ocorrem entre os diferentes sujeitos? (...) Piaget, Paulo Freire, Gardner e Papert são unânimes em reconhecer que o conhecimento decorre das interações produzidas entre o sujeito e o objeto, de uma interação solidária entre ambos, que se constrói por força da ação do sujeito sobre o meio físico e social e pela repercussão dessa ação sobre o sujeito. Reconhecem a existência de uma dimensão individual e, ao mesmo tempo, coletiva, dinâmica, sistêmica e aberta entre sujeito e objeto e sujeitos entre si (MORAES, 2010, p. 161). Os pensadores, citados por Moraes (2010), pugnam pelo entendimento do sujeito ser entendido na ambiguidade do individual e do coletivo, respeitando as formas diferentes que se expressam nos contextos e de como se aglutinam nos grupos de convívio formando uma consciência coletiva. O que representam essas diferenças para a sociedade? Veremos o que nos diz Santos (1999, p. 26): LICENCIATURAS em foco 7 Nos planos econômico, social, político e das relações pessoais, "diferença" tem significado, em nosso país, quase sempre de "desigualdade"; ou mais exatamente: as diferenças étnicas, culturais, fenotípicas, serviram de marcas entre desiguais sociais. No plano da cultura, porém, a aplicação dessa equivalência (diferença = desigualdade) confunde os partidários da "democracia", levando-os a postular o fim das diferenças como garantia de igualdade. Eis o que pensaria um "democrata" bem-intencionado: "nossos alunos serão iguais a nós quando não forem diferentes”. A partir dessa reflexão, podemos conjeturar que a problemática da diversidade não está relacionada às diferenças, mas à desigualdade e à exclusão. Nesse sentido, “(...) temos o direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza, temos o direito a ser diferentes sempre que a igualdade nos descaracteriza” (SANTOS, 1999, p. 62). O autor alerta para a necessidade do reconhecimento à diferença, como parte essencial da singularidade humana, não abrindo mão da igualdade de direitos e condições. Essa complexidade que envolve cultura e educação vem sendo debatida por Hall (2003, p. 43), quando afirma que a cultura não apenas é herança, mas uma construção coletiva em processo. A cultura é uma produção. Tem sua matéria-prima, seus recursos, seu “trabalho produtivo”. Depende de um conhecimento da tradição enquanto “o mesmo em mutação” e de um conjunto efetivo de genealogias. Mas o que esse “desvio através de seus passados” faz é nos capacitar através da cultura, a nos produzir a nós mesmos de novo, como novos tipos de sujeitos. Portanto, não é uma questão do que as tradições fazem de nós, mas daquilo que nós fazemos de nossas tradições. Paradoxalmente, nossas identidades culturais, em qualquer forma acabada, estão à nossa frente. A cultura não é uma questão de ontologia, de ser, mas de se tornar. Conforme o pensamento do autor, podemos dizer que a diversidade cultural no contexto escolar deve ser compreendida pelo mesmo viés, vinculado a tradições, porém, em processo de transformação na ação coletiva, ou seja, o aprendiz deve ser respeitado pela bagagem cultural que traz, mas no contato com o outro haverá novas formas de entender o mundo, criando laços culturais, ampliando significados de vida. E é esse o grande desafio do educador ao estar à frente das diferentes LICENCIATURAS em foco 8 identidades, lidando com sua coletividade. Quando Habermas (1983, p. 22) discute que “ninguém pode edificar a sua própria identidade independentemente das identificações que os outros fazem dele”, nos reforça que somos construídos por uma coletividade, e com isso devemos cuidar para que essa coletividade não sufoque ou discrimine um específico indivíduo.É isso que acontece quando entra num grupo “homogêneo” alguém com características - sejam elas físicas ou culturais - diferentes. No caso de ser em ambiente escolar, deve o educador saber lidar com essa situação, não permitindo que rótulos ou discriminações façam parte de um grupo em formação. Os valores como a ética e o respeito ao próximo devem ser eixo norteador no sentido de combater ações discriminatórias, bem como colaborar para a formação cidadã do sujeito. Eis que surge aqui outro desafio da diversidade, o de educar para a cidadania num ambiente plural que é a escola. Como formar cidadãos que zelam pelos seus direitos e deveres, que contribuem para uma sociedade justa e equilibrada, num mundo globalizado? Educar para a cidadania global requer a compreensão da multiculturalidade, o reconhecimento da interdependência com o meio ambiente e a criação de espaço para o consenso entre os diferentes segmentos da sociedade. Nesse sentido, a escola deve preocupar-se em “(...) educar para a diversidade dos outros, saber que somos diferentes e que cada um tem o direito de ser diferente, único e singular, o que exige um aprofundamento no respeito pelo outro e na compreensão do outro” (MORAES, 2010, p. 225). Nesse contexto, Taylor (1994, p. 58) esclarece que: (...) um indivíduo ou um grupo de pessoas podem sofrer um verdadeiro dano, uma autêntica deformação se a gente ou a sociedade que os rodeiam lhes mostram como reflexo uma imagem limitada, degradante, depreciada sobre ele. (...) a projeção sobre o outro de uma imagem inferior ou humilhante pode deformar e oprimir até o ponto em que essa imagem seja internalizada. Para você entender melhor o que quer dizer essa projeção de imagem e os danos que ela poderá causar a alguém ou a um grupo, analise a seguir o que LICENCIATURAS em foco 9 expressa a pesquisa desenvolvida pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), no ano de 2009, apontando o percentual de respondentes com algum nível de preconceito: GRÁFICO 1 - ABRANGÊNCIA DA ATITUDE PRECONCEITUOSA FONTE: Brasil (2009) De acordo com esta instituição de pesquisa, o preconceito e as práticas discriminatórias ocorrem no ambiente escolar, e envolvem não só alunos, como todos os atores que dele fazem parte. Nesse aspecto, cabe refletir que, se o preconceito se instaura na consciência dos próprios professores ou funcionários de uma determinada escola, como educar para a diversidade, se as práticas divergem da teoria? As pessoas não assumem que são preconceituosas. Contudo, estão predispostas a manter distância social de outros grupos. Seria oportuno iniciar e potencializar um processo de mudança no ambiente escolar para promover a diversidade por meio de um plano, envolvendo: • Ações para disseminação de informações (condição necessária, mas não suficiente para a promoção de mudanças). • Ações específicas e pontuais que visem à mudança de comportamento. • Principalmente, no longo prazo, ações para a mudança de valores dos agentes escolares em relação ao preconceito e à discriminação (BRASIL, 2009, s.p.) LICENCIATURAS em foco 10 De acordo com o resultado e a conclusão da pesquisa apresentada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas em 2009, as pessoas não se julgam preconceituosas, mas suas ações representam a discriminação. É o exemplo de quem diz “não tenho nada contra, porém não quero contato”. Essa questão é muito complexa, pois envolve a subjetividade do indivíduo. Alguns acham que tal comportamento não define uma prática discriminatória, já outros julgam que sim. Cabe refletirmos que, à medida que nos afastamos dessas pessoas socialmente não aceitas, entramos no círculo do preconceito e da discriminação, embora que muitos não concordem. Verifiquem agora como os próprios professores vêm sofrendo ações discriminatórias quanto ao seu conhecimento de acordo com suas características: GRÁFICO 2 - ÍNDICE DE CONHECIMENTO DE PRÁTICAS DISCRIMINATÓRIAS COM PROFESSORES (ESCALA VARIA ENTRE 0 E 100) FONTE: Brasil (2009) Como você pode analisar, as pessoas dentro da própria escola acabam julgando, ou nivelando o grau de conhecimento do professor de acordo com sua cor, etnia, poder aquisitivo, sexualidade, gênero, condição física e de moradia. O preconceito maior se expressa no professor negro, pobre ou homossexual. Não consideram seu grau de estudo, formação, empenho, leituras, entre outros, mas julgam pelas características, na maior parte, física. LICENCIATURAS em foco 11 Percebam a seguir como este quadro se altera: quando se trata de funcionários, o grau de conhecimento de práticas discriminatórias sofridas por funcionários se expressa um pouco diferente, analisem: GRÁFICO 3 - ÍNDICE DE CONHECIMENTO DE PRÁTICAS DISCRIMINATÓRIAS COM FUNCIONÁRIOS (ESCALA VARIA ENTRE 0 E 100) FONTE: Brasil (2009) 3 CULTURA E PRECONCEITO: UMA CONSTRUÇÃO SOCIAL Pode-se considerar que uma forma de discriminação já ocorria desde os tempos primórdios, época em que os indivíduos lutavam apenas pela sua sobrevivência. Você já deve ter ouvido a expressão “os melhores sobrevivem”. Nossos antepassados necessitavam batalhar pelo seu próprio alimento, enfrentando uma série de perigos na natureza. Confrontavam-se com animais selvagens, com oscilação do tempo, frio, calor, tempestades, chuvas, sem os recursos que hoje possuímos para nos protegermos. Em busca do sustento, pessoas com algum tipo de defiência, acabavam fazendo longas caminhadas pois não eram aceitos pelos grupos de convívio, esses eram abandonados ou mesmo mortos. Neste caso, o gráfico aponta para maior índice de preconceito e práticas discriminatórias com idosos, homossexuais e mulheres. No entanto, não é tão simples compreendermos as razões pelas quais os preconceitos concorrem para ações discriminatórias, devemos antes entender a raiz dessa problemática. LICENCIATURAS em foco 12 Perceba que esta ação é um tipo de preconceito primário, pois por uma questão de sobrevivência, o ser humano não tinha valor, ele era apenas o caçador. Lembramos também dos escravos na antiga Grécia, numa época em que só tinha prestígio quem vivia no ócio, quem exercia o trabalho braçal não era considerado um cidadão. Mais tarde, esse preconceito se propagou por uma questão de estética e poder e não só por uma questão de sobrevivência. Academico(a), você já ouviu falar da “raça ariana”? Esse termo surgiu dos termos “indo-germânico” e “indo-europeu”, substituídos depois por ariano, fundamentado no evento de os povos que invadiram a Índia e cuja língua era o sânscrito se chamarem “árias” (COMAS, 1960). Acompanhe a explicação da discriminação a partir da suposta raça ariana: QUADRO 1 - RAÇA ARIANA E O PRECONCEITO FONTE: Comas (1960, p. 38) Hitler pensava que a superioridade ariana estava sendo ameaçada por casamentos mistos. Se isto acontecesse, acreditava que a maior civilização do mundo poderia desaparecer em virtude do processo de miscigenação. Ainda que soubesse que outras raças/etnias iriam resistir a esse processo, acreditava que cabia aos arianos o dever de controlar o mundo, o que comprovaria sua tese racista e preconceituosa. Isto seria LICENCIATURAS em foco 13 difícil e a força teria que ser utilizada, mas poderia acontecer (MACHADO, 2009, s.p.) Vejam que o preconceito e a discriminação foram ao ponto de envolver a economia, afastando os judeus dos negócios, conforme representa a foto a seguir: FIGURA 2 - PRECONCEITO AO JUDEU EM DEFESA À RAÇA ARIANA FONTE: Machado (2009, s.p.) Entendam que os desafios atuais da diversidade têm raízes no passado, por isso é uma questão de consciência coletiva. Nesse sentido, quando se trata de diversidade, há uma ampla compreensão que abarca estudos mais complexos para circundar maior entendimento do assunto. Compete aqui não se estender,mas apresentar significados dos estudos que envolvem este tema, segundo o quadro a seguir: LICENCIATURAS em foco 14 QUADRO 2 - CONTEXTOS DA DIVERSIDADE Aculturação Globalização Multiculturalismo Aldeia global O processo de aculturação se dá pelo contato de duas ou mais matrizes culturais diferentes, isto é, pela interação social entre grupos de culturas diferentes, sendo que todos, ou um deles, sofrem mudanças, tendo como resultado uma nova cultura (RIBEIRO, 2016, s.p.) A globalização entendida como um processo histórico, simultaneamente social, econômico, político e cultural, no qual se movimentam indivíduos, povos e governos, sociedades e culturas, línguas e religiões, nações e continentes, formas de espaço e possibilidades dos tempos (FEITOSA 2016, s.p.) O multiculturalismo surge das lutas pelo reconhecimento de outras formas de saberes, diferentes e silenciadas ao longo da história e a cada dia mais suprimidas pelo processo de globalização hegemônica (KRETZMANN, 2007, p. 11) Aldeia global quer dizer que o progresso tecnológico está reduzindo todo o planeta à situação de uma aldeia, ou seja, que as pessoas têm a possibilidade de se intercomunicar diretamente umas com as outras, independentemente da distância (SILVA e ALVARENGA, 2019, p. 140) FONTE: Adaptado de Ribeiro (2016), Feitosa (2016), Kretzmann (2007), Silva e Alvarenga (2009). O processo de aculturação não significa abandono de uma cultura em detrimento a outra, mas o acolhimento da outra cultura como parte de seu contexto cultural. Vimos muito isso na culinária oriental trazida ao Brasil, nas comidas típicas de outros países ou regiões brasileiras que contribuem com suas músicas, vestuários, danças, entre outros. A globalização envolve um contexto mundial com propósito de expandir a questão econômica, política, social, cultural e tecnológica. A comunicação tecnológica foi o alvo de toda essa expansão. Já o termo multiculturalismo carece de mais aprofundamento para sua elucidação, pois seu significado ainda vem causando distorções entre alguns LICENCIATURAS em foco 15 teóricos. Diante disso, traremos o conceituado autor deste assunto, Hall (2003, p. 50), que nos esclarece, sustentando que: Pode ser útil fazer aqui uma distinção entre o “multicultural” e o “multiculturalismo”. Multicultural é um termo qualificativo. Descreve as características sociais e os problemas de governabilidade apresentados por qualquer sociedade na qual diferentes comunidades culturais convivem e tentam construir uma vida em comum, ao mesmo tempo que que retêm algo de sua identidade “original”. Em contrapartida, o termo “multiculturalismo” é substantivo. Refere-se às estratégias e às políticas adotadas para governar ou administrar problemas de diversidade e multiplicidade gerados pelas sociedades multiculturais. (...) Ambos os termos são hoje interdependentes, de tal forma que é praticamente impossível separá-los. Contudo, o “multiculralismo” apresenta algumas dificuldades específicas. De acordo com o autor, a multicultura refere-se a diferentes grupos sociais, enquanto que o multiculturalismo denota estratégias políticas para lidar com problemas sociais específicos. Nesse sentido, Hall (2003) sugere diferentes tipos de multiculturalismo, uma vez que há diferentes grupos sociais e seus mais variados problemas. O autor classificou ainda seis tipos de multiculturalismo, cada um com sua concepção, são eles: LICENCIATURAS em foco 16 QUADRO 3 - DIFERENTES CONCEPÇÕES DE MULTICULTURALISMO Multiculturalismo Conservador Multiculturalismo Crítico ou Revolucionário Multiculturalismo Liberal Pugna pela assimilação da diferença às tradições e aos costumes da maioria. Prioriza o poder, o privilégio, a hierarquia das opressões e os movimentos de resistência. Integra os diferentes grupos culturais o mais rápido possível a uma sociedade majoritária, numa concepção de cidadania individual e universal. Multiculturalismo Pluralista Multiculturalismo Comercial Multiculturalismo Corporativo Assegura as diferenças grupais em termos culturais e concede direitos de grupo distintos a diferentes comunidades dentro de uma certa ordem política comunitária. Parte do pressuposto de que se as diferenças entre pessoas numa comunidade são reconhecidas, não haverá mais problemas no consumo privado Foca na solução dos problemas culturais da minoria, atendendo aos interesses do centro. FONTE: Adaptado de Hall (2003) Hall (2003) apontou em seus estudos as divergentes posições e concepções que vêm provocando grandes discussões entre teóricos quando se trata do multiculturalismo. Por hora, cabe compreendermos que o termo multiculturalismo expressa um conceito amplo e complexo dos problemas atuais da diversidade. Passamos agora a entender o conceito de aldeia global, que, como visto no Quadro 1, representa o encurtamento da distância entre pessoas pelos meios tecnológicos. Toda essa globalização, trazida pelas mídias, tem um propósito bem acentuado quando se trata de capitalismo, criticamente debatida a seguir: LICENCIATURAS em foco 17 Fala-se, por exemplo, em aldeia global para fazer crer que a difusão instantânea de notícias realmente informa as pessoas. A partir desse mito e do encurtamento das distâncias – para aqueles que realmente podem viajar – também se difunde a noção de tempo e espaço contraídos. É como se o mundo houvesse se tornado, para todos, ao alcance da mão. Um mercado avassalador dito global é apresentado como capaz de homogeneizar o planeta quando, na verdade, as diferenças locais são aprofundadas. Há uma busca de uniformidade, ao serviço dos atores hegemônicos, mas o mundo se torna menos unido, tornando mais distante o sonho de uma cidadania verdadeiramente universal. Enquanto isso, o culto ao consumo é estimulado (SANTOS, 2000, p.9). A “aldeia global” é uma das problemáticas da diversidade cultural, uma vez que tem a tendência de aglutinar e homogeneizar modos de ser e entender o mundo. De acordo com Santos (2000), há interesses fortemente econômicos ao consumo de recursos tecnológicos que vendem a ideia de aproximação, mas que na realidade é uma outra forma de exclusão, uma vez que ainda não é a maioria que tem o acesso tecnológico. Vamos refletir agora sobre uma questão ENADE de 2008, que trata de uma das problemáticas da diversidade, a educação escolar e a desigualdade social. ------ [LEITURA COMPLEMENTAR] ------ QUESTÃO ENADE 2008 A relação entre educação escolar e desigualdade social vem sendo estudada pela Sociologia há mais de um século. Diferentes autores e diversas correntes de pensamento explicam os complexos mecanismos dessa relação. Mesmo considerando as grandes diferenças existentes entre países e épocas, a escolarização progressiva da população: (A) Vem acompanhada de um aumento das exigências educacionais do mercado de trabalho. (B) Garante empregabilidade compatível com o nível de instrução. (C) Proporciona acesso ao mercado de trabalho devido à diminuição da competitividade. LICENCIATURAS em foco 18 (D) Está relacionada às crises econômicas e favorece o desemprego. (E) Gera equanimidade entre segmentos sociais e diminuição de conflitos culturais. Tipo de questão: escolha simples, com indicação da alternativa correta. Alternativa correta: A Comentários: Talvez aquilo que melhor defina a Sociologia da Educação como campo de conhecimento seja a relação entre a ação dos dispositivos e aparatos educacionais e as transformações da sociedade. A escola,sem dúvida, é a principal forma de institucionalização desse processo, atuando diretamente na formação individual e coletiva e articulando estratégias de ensino, instrução, formação, socialização e capacitação, entre tantos outros. Desde seu surgimento como disciplina, em meados do século XIX, no âmbito da sociedade europeia, um dos principais focos da Sociologia da Educação é a análise da implicação da educação escolar na produção, reprodução ou superação das desigualdades sociais e culturais da população. O enunciado da questão destaca esse aspecto, chamando a atenção para o fato de que diferentes correntes de pensamento, através da expressão de inumeráveis intelectuais, se preocupam com a investigação dos diferentes níveis, formas e naturezas dessa implicação. Cada um, orientado pela particularidade dos seus componentes teóricos e compreensivos acerca da realidade, formula suas explicações. Entretanto, a raiz da questão dá destaque para a ideia de que há unanimidade entre eles, a despeito de suas diferenças. A partícula “mesmo”, no início do período, suplanta o fator condicionante no sentido de significar “ainda que”, ou seja, no sentido de que, para além das diferenças geográficas e históricas que contingenciam os postulados teóricos, algo há em comum entre eles. O foco proposto, como elemento de referência para esse ponto em comum, é apresentado na segunda oração da frase, “a escolarização progressiva da população”, a partir do que é solicitado ao respondente que complete o pensamento. LICENCIATURAS em foco 19 A alternativa A é a única que se atém a um dado de realidade factível e, portanto, é a alternativa correta. Seu tom é prosaico e despretensioso, redundando em uma constatação óbvia e aparentemente sem importância. Há uma relação de continuidade, embora não determinista: “a escolarização progressiva da população vem acompanhada de um aumento das exigências educacionais do mercado de trabalho” e não postula o que vem antes ou depois, o que determina o que. A expressão “vem acompanhada” indica uma condição de indissociabilidade entre as premissas, ou seja, afirma que uma coisa (a escolarização progressiva) vem acompanhada da outra (o aumento das exigências educacionais). Por vezes, o aumento da complexidade no mundo do trabalho faz aumentar as exigências educacionais para seu acesso e, em consequência, isso demanda um aumento da escolarização da população; por vezes, é a escolarização progressiva da população que vai empurrar o nível de exigência do mercado de trabalho. A segunda alternativa tenta forçar uma conclusão improvável, uma vez que a garantia da empregabilidade não deriva do aumento da escolaridade da população. De certa forma, considerando o argumento já destacado na alternativa anterior, até poderíamos dizer que esse aumento de escolarização vai fazer aumentar as exigências do mercado e exigir progressiva compatibilidade com o nível de instrução. No entanto, não é verdade que garanta empregabilidade em alguma instância. A alternativa (C) faz uma afirmação incorreta quando aponta a “diminuição da competitividade” como correlata à “escolarização progressiva da população”. Bem ao contrário: o aumento da escolarização aumenta a competitividade ao possibilitar acesso ao mercado de trabalho a cada vez mais pessoas com nível elevado de escolarização. A quarta alternativa sugere dois aspectos que, embora relacionados entre si (as crises econômicas e o desemprego), não têm correspondência com a premissa inicial (a escolarização progressiva da população). Ao contrário, de modo geral é factível considerar que o aumento da escolaridade é um fator que favorece a autonomia laboral da população, independente das condições de oferta de empregos (aqui entendidos como postos formais de trabalho). As condições de empregabilidade mantêm relações de dependência com inúmeros outros fatores que não apenas as condições objetivas da qualificação profissional do trabalhador. LICENCIATURAS em foco 20 De modo geral, as crises econômicas e o desemprego andam juntos, mas não há nenhuma relação evidente entre elas e a escolarização progressiva da população. Por fim, a última alternativa peca pela associação de duas assertivas que não mantêm correlação entre si (a equanimidade entre os segmentos sociais e a diminuição dos conflitos culturais) e pela pretensão de associá-las à escolaridade. Muito embora se pretenda que a escolarização progressiva contribua para a diminuição da desigualdade social através da equiparação das condições de acesso da população às mesmas benesses sociais, sabemos que isso não representa a equalização social idealizada. A escolarização progressiva da sociedade proporciona, talvez, uma relativa equilibração em termos do repertório das pessoas no nível do conhecimento disciplinar processado no âmbito da escola. Podemos até mesmo considerar que a escola viabiliza acesso às noções e às habilidades necessárias para o exercício de competências laborais que permitem, em consequência, a geração das condições materiais necessárias para o aumento da qualidade de vida. Não podemos dizer que isso significa “equanimidade entre segmentos sociais”. Igualmente, não podemos afirmar que os conflitos culturais têm relação direta com a escolarização: as diferenças culturais existem antes e para além da homogeneização pretendida pela escolarização. Ainda que o aumento da escolaridade pretenda um aumento dos níveis de compreensão acerca da diversidade cultural e, dessa maneira, resulte em uma ampliação do espectro de tolerância, não existe uma condição automática e necessária de correspondência entre uma coisa e outra. FONTE: Disponível em: <http://ebooks.pucrs.br/edipucrs/enade/pedagogia2008.pdf>. Acesso em: 18 jul. 2016. LICENCIATURAS em foco 21 ------ [RESUMO DO TÓPICO 1] ------ Este tópico apresentou as seguintes reflexões: • Independente de questões relativas à etnicidade, ao gênero e à religiosidade, todo sujeito tem o direito à educação e ao respeito às suas diferenças. • Os desafios atuais da diversidade têm raízes no passado, por isso é uma questão de consciência coletiva. As pessoas não assumem que são preconceituosas. Contudo, estão predispostas a manter distância social de outros grupos. • A cultura não apenas é herança, mas uma construção coletiva em processo. • As multiculturas envolvem os problemas de governabilidade apresentados por qualquer sociedade na qual diferentes comunidades culturais convivem. • O processo de aculturação não significa abandono de uma cultura em detrimento a outra, mas o acolhimento da outra cultura como parte de seu contexto cultural. • A globalização envolve um contexto mundial com propósito de expandir a questão econômica, política, social, cultural e tecnológica. A comunicação tecnológica foi o alvo de toda essa expansão. • O multiculturalismo refere-se às estratégias e às políticas adotadas para governar ou administrar problemas de diversidade e multiplicidade gerados pelas sociedades multiculturais. LICENCIATURAS em foco 22 AUT OAT IVID ADE � 1- QUESTÃO ENADE PEDAGOGIA 2014 Da visão dos direitos humanos e do conceito de cidadania fundamentado no reconhecimento das diferenças e na participação dos sujeitos, decorre uma identificação dos mecanismos e processos de hierarquização que operam na regulação e produção de desigualdades. Essa problematização explicita os processos normativos de distinção dos alunos em ração de características intelectuais, físicas, culturais, sociais e linguísticas, estruturantes do modelo tradicional de educação escolar. BRASIL, MEC. Política nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, 2008, p. 6 (adaptado) As questões suscitadas no texto ratificam a necessidade de novas posturas docentes, de modo a atender a diversidade humanapresente na escola. Nesse sentido, no que diz respeito a seu fazer docente frente aos alunos, o professor deve I. desenvolver atividades que valorizem o conhecimento historicamente elaborado pela humanidade e aplicar avaliações criteriosas com o fim de aferir, em conceitos ou notas, o desempeno dos alunos. II. instigar ou compartilhar as informações e a busca pelo conhecimento de forma coletiva, por meio de relações respeitosas acerca dos diversos posicionamentos dos alunos, promovendo o acesso às inovações tecnológicas. III. planejar ações pedagógicas extraescolares, visando ao convívio com a diversidade; selecionar e organizar os grupos, a fim de evitar conflitos. IV. realizar práticas avaliativas que evidenciem as habilidades e competências dos alunos, instigando esforços individuais para que cada um possa melhorar o desempenho escolar. V. utilizar recursos didáticos diversificados, que busquem atender a necessidade de todos e de cada um dos alunos, valorizando o respeito individual e coletivo. LICENCIATURAS em foco 23 É correto apenas o que se afirma em A) I e III. B) II e V. C) II, III e IV. D) I, II, IV e V. (E) I, III, IV e V. FONTE: Disponível em: <http://download.inep.gov.br/educacao_superior/ enade/provas/2014/36_pedagogia.pdf> Acesso em: 4 jun. 2016. LICENCIATURAS em foco 24 LICENCIATURAS em foco 25 ------ [ TÓPICO 2 - EDUCAÇÃO INTERCULTURAL] ------ 1 INTRODUÇÃO A perspectiva intercultural surge da necessidade de dar um novo rumo ao que propõe o monoculturalismo, que defende a ideia do compartilhamento dos povos em uma mesma cultura e do multiculturalismo, a qual entende as diversas culturas, porém só as considera se forem necessárias à coletividade. Tanto o monoculturalismo quanto o multiculturalismo compartilham visões que, para os defensores da concepção intercultural, podem gerar mais exclusões. Nesse sentido, a perspectiva intercultural emerge da complexidade de atuar nos conflitos entre essas duas visões e promover relações das identidades sociais e suas diferenças, como também dar base para que estas relações sejam recíprocas e estabeleçam um grau de criticidade e solidariedade. Nessa esteira direcionaremos os debates a seguir, procurando entender as relações étnico-raciais. 2 EDUCAÇÃO PARA RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS A diversidade abrange um olhar sobre as diferenças e suas ressignificações na prática escolar. Sobre esse contexto, há muitas questões não resolvidas que trazem significativos problemas de ordem social, política e econômica, como, por exemplo, a discriminação racial, a xenofobia, a intolerância correlata, podendo gerar no ambiente escolar uma série de problemas, como o bullying, a violência verbal, a física, as dificuldades de aprendizagem, a baixa autoestima, os problemas de relacionamento, entre outros. Todavia, não é de hoje que vem se tentando conscientizar sobre os direitos humanos, sobretudo aos mais fragilizados. Lembrando a Resolução 1997/74, de 18 de abril de 1997, da Comissão de Direitos Humanos, a Resolução 52/111, de 12 de dezembro, da Assembleia Geral, e as subsequentes LICENCIATURAS em foco 26 resoluções daqueles órgãos concernentes à convocação da Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata e lembrando, também, as duas Conferências Mundiais de Combate ao Racismo e à Discriminação Racial, ocorridas em Genebra em 1978 e 1983, respectivamente; observando com grande preocupação que, a despeito dos esforços da comunidade internacional, os principais objetivos das três Décadas de Combate ao Racismo e à Discriminação Racial não foram alcançados e que um número incontável de seres humanos continuam, até o presente momento, a serem vítimas de várias formas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata (...) (BRASIL, 2001). A discriminação cultural e racial não é uma problemática atual, ela nos acompanha na história e, conforme historiadores, surgiu de interpretações deturpadas com a finalidade de manipular opinião e justificar a escravidão. Como é o caso da interpretação da teoria de Charles Darwin (1809-1882). (...) principalmente entre as nações europeias do final do século XIX e início do século XX, que recorreram às teorias evolucionistas para justificar a nova expropriação no continente africano, através do Imperialismo. Os indivíduos envolvidos nesse neocolonialismo carregaram o pensamento de Darwin com valores morais e passaram a associar as características físicas e intelectuais dos negros numa escala evolutiva, na qual estavam na base e os brancos no topo do processo evolutivo (TEIXEIRA, CAMPOS, GOELZER, 2014, s.p). O princípio da colonização africana e o descobrimento da América e do caminho para as Índias pelo Pacífico abriram margem para preconceitos de raça e cor. No Brasil, o sistema de escravidão enraizou uma cultura de discriminação de raças, que até hoje respinga na sociedade, mesmo após a abolição dos escravos. A Lei Áurea de 1888, em 13 de maio, limitou-se em apenas libertar os escravos, sem amparo e sem sustento, pois eles não tinham para onde ir e muito menos um trabalho, sendo que alguns até regressavam às grandes fazendas, pois não dispunham do básico para viver. LICENCIATURAS em foco 27 FIGURA 3 - ESCRAVOS LIBERTOS FONTE: Disponível em: <http://migre.me/u2wqn>. Acesso em: 25 jul. 2016. Percebam que a ausência de uma política que valorizasse o futuro dos negros escravos ocasionou sérios problemas, que se refletem até os dias atuais. Esses escravos não tinham para onde ir, passando assim a ocupar locais de risco, sofrendo fome, discriminação e violência. (...) após a assinatura da Lei Áurea, não houve uma orientação destinada a integrar os negros às novas regras de uma socie- dade baseada no trabalho assalariado. Esta é uma história de tragédias, descaso, preconceitos, injustiças e dor. Uma chaga que o Brasil carrega até os dias de hoje (MARINGONI, 2011, s.p). Hoje estamos colhendo os frutos da estrutura política de uma época em que os direitos humanos não estavam em pauta. O mais alarmante é que pesquisa desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em 2011, ressalta que a discriminação para com o negro aqui no Brasil é du plamente sofrida, por sua situação socioeconômica e por sua cor de pele. Se já não bastasse o preconceito da cor, ainda precisam conviver com o preconceito por sua situação econômica, fato este que só aumenta as desigualdades sociais no país. Estudo desenvolvido por Ciconello (2008) aponta que as desigualdades sociais partem principalmente da discriminação racial. LICENCIATURAS em foco 28 Essas desigualdades são resultado não somente da dis- criminação ocorrida no passado, mas também de um processo ativo de preconceitos e estereótipos raciais que legitimam, quotidianamente, procedimentos discrimina tórios (CICONELLO, 2008, p. 13). Você acredita que é possível erradicar a discrepância social aqui no Brasil? Algumas ações indicam que isso é possível. Essa cultura discriminatória vem sendo combatida não só aqui no Brasil, como em todo o mundo. Medidas estão sendo tomadas com o objetivo de resgatar valores e culturas perdidos por práticas discriminatórias; exemplo disso é a Lei n. 9.394, Art. 26-A, de 20 de dezembro de 1996. Nos estabelecimentos de Ensino Fundamental e Médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. § 1º O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil. § 2º Osconteúdos referentes à História e Cultura Afro -Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currí culo escolar, em es- pecial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras (BRASIL, 2003). Como você viu, há amparo na lei, que tenta, de alguma forma, trazer esses conhecimentos que fizeram parte um dia da vida de nossos antepassados, com o intuito de resgatar a cultura, pois é considerado um patrimônio da história mundial. A valorização desta cultura é uma questão de inclusão, de ética e compromisso com gerações castigadas pela discriminação. Por conta disso, há programas desenvolvidos pelo governo que tentam suprir essa “deficiência” nas escolas. O Programa Ética e Cidadania, construindo valores na escola e na sociedade, é um Programa de Desenvolvimento Profissional Continuado desenvolvido pelo MEC, que tem por objetivo criar subsídios para um trabalho voltado à democracia, à ética, à cidadania e à justiça. LICENCIATURAS em foco 29 Para isso, propõe a criação dos Fóruns Escolares de Ética e de Cidadania nas escolas, nos municípios e nos estados, e buscará instrumentalizar a ação dos profissionais da educação envolvidos em sua implementação nas escolas participantes, por meio de recursos didáticos e materiais pedagógicos adequados (BRASIL, 2007, p. 4). Esses programas defendem a reeducação de uma sociedade mais justa e democrática. No entanto, é preciso entender que os programas por si só não educam, muito menos alteram práticas discriminatórias. Somos nós, os envolvidos com a educação, em parceria com as políticas públicas, que acionamos os programas. Uma pesquisa relevante para este estudo, promovida pelo Ministério da Educação (MEC) por meio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetiza- ção e Diversidade (SACAD) e pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, é a Pesquisa Nacional “Diversidade na Escola Sumário Executivo”, que objetivou responder o que já se cogitava nas comunidades, a respeito da discriminação e sua relação com o desempenho escolar dos alunos. Os resultados demonstraram que nas escolas em que há práticas preconceituosas e discriminatórias há maior tendência para o baixo rendimento escolar. De acordo com Brasil (2009, p. 12): A literatura e experiências mostram que a mudança desse ambiente discriminatório marcadamente dissi mulado leva mui- tos e muitos anos, possivelmente até gerações. No entanto, é preciso iniciar e potencializar esse processo por meio de ações corajosas, envolvendo disseminação de informações (condição necessária, mas não suficiente para a promoção de mudanças), reali zação de ações específicas e pontuais, implementação de planos que visem à mudança de comportamento e, principalmen- te, a longo prazo, ações que promovam a mudança de atitudes dos agentes escolares em relação à percepção da diversidade. A partir dessa pesquisa, ponderamos sobre a responsabilidade da escola de reconhecer e valorizar os sujeitos negados, tornando possível o respeito às diferenças. Todavia, o desafio de articular currículos e conteúdos a uma prática para a diversidade pode parecer uma tarefa complexa para alguns professores. Nesse sentido, esclarece Candau (2011, p. 342): Esta tarefa passa por processos de diálogo entre diferentes LICENCIATURAS em foco 30 conhecimentos e saberes, a utilização de pluralidade de lingua- gens, estratégias pedagógicas e recursos didáticos, a promoção de dispositivos de diferenciação pedagógica e o combate a toda forma de preconceito e discriminação no contexto escolar. A inclusão como prática que valoriza a diversidade dos saberes é ainda uma conquista. Para alcançá-la é necessário alterar os currículos, capacitar os professores e todos os envolvidos com a educação, inclusive os pais e a comunidade, pois é preciso romper o preconceito instaurado na sociedade, e esse é um desafio de todos e para todos. Nesse contexto, uma das questões desenvolvida para o ENADE (Exame Nacional de Desempenho de Estudante) de 2014 para o curso de Pedagogia aborda o tema em discussão, a qual demonstra a preocupação do Estado em envolver no currículo da Educação Básica estudos sobre uma cultura bastante fragilizada. ENADE PEDAGOGIA 2014 A Educação Básica, por constituir um momento privilegiado em que a igualdade cruza com a equidade, tomou a si a finalização legal do atendimento a determinados grupos sociais, como pessoas portadoras de necessidades educacionais especiais e os afrodescendentes, que devem ser sujeitos de uma desconstrução de estereótipos, preconceitos e discriminações, tanto pelo papel do socializador da escola quanto pelo seu papel de ensino-aprendizagem do conhecimento científico. FONTE: CURY, C. R. J. A educação básica como direito. Caderno de Pesquisa, v. 38, n. 134, maio/ago. 2008, p. 300 (adaptado). O texto acima confirma o que preconiza a Lei nº 10.639/2003, a qual altera o art. 26 da Lei nº 9.394/1996 (LDB) no que se refere aos conteúdos curriculares para a Educação Básica. Tomando como referência o texto apresentado e o conteúdo da Lei nº 10.639/2003, avalie as afirmações a seguir: I. O ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena deve fazer parte do cotidiano das escolas de maneira articulada com as disciplinas ofertadas. LICENCIATURAS em foco 31 II. Os estabelecimentos de Ensino Fundamental e Médio, públicos e privados, conforme previsto na Lei nº 10.639/2003, devem priorizar o estudo da história e da cultura afro- brasileira e indígena na áreas de educação artística e geografia. III. No ensino de história e de cultura afro-brasileira e indígena devem ser incluídos, entre outros aspectos, conhecimentos relativos à cultura negra brasileira e ao papel do negro na formação da sociedade nacional. IV. No ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena deve-se destacar a contribuição dos negros nas áreas social, econômica e política de história do Brasil. É correto apenas o que se afirma em: A I. B II e IV. C I, II e III. D I, III e IV. E II, III e IV. Resposta correta: D FONTE: Disponível em: <http://download.inep.gov.br/educacao_superior/enade/provas/2014/36_ pedagogia.pdf>. Acesso em: 13 maio 2016. RESPOSTA COMENTADA PROVA ENADE: Acesse agora mesmo com seu smartphone através do QrCode e aproveite o vídeo da questão: LICENCIATURAS em foco 32 Conforme apontam as opções I, II e IV, podemos perceber que há um olhar atencioso por parte das políticas públicas em educação, no respeito à diversidade em seu conceito amplo. Essa preocupação faz surgir também novas leis e programas que atendem essa problemática abrigada de preconceitos, discriminações e agressões a um povo oprimido, seja por uma característica cultural, física, linguística ou de gênero. Constatado na Lei nº 13.005 do Art. 2º, inciso III, no qual estabelece a eliminação das desigualdades no âmbito educativo, promovendo a cidadania e a erradicação da discriminação. Consta também neste mesmo artigo, inciso X, a ascensão dos princípios na valorização aos direitos humanos, no que tange à diversidade e à sustentabilidade socioambiental. Na continuidade da análise da Lei, rege o artigo 7 que: § 4º Haverá regime de colaboração específico para a imple- mentação de modalidades de educação escolar que necessitem considerar territórios étnico-educacionais e a utilização de estra- tégias que levem em conta as identidades e as especificidades socioculturais e linguísticas de cada comunidade envolvida, assegurada a consulta prévia e informada a essa comunidade (BRASIL, 2014, p. 46) A preocupação também se estende à população isolada, como se confirma no Artigo 8, inciso II, no qual institui o atendimento às demandas específicas do povo do campo e dos grupos indígenas e quilombolas, assegurando o direito à educação e a diversidadecultural. Nesse sentido, a miscigenação humana vem sendo pauta de constantes debates e os conceitos sobre o assunto se ressignificam em função das ideias dos diferentes autores quanto à noção de raça e diferenças raciais. Pesquisas educacionais têm demonstrado quanta influência exerce a questão do preconceito entre gêneros e raças no desempenho escolar, bem como na formação da identidade. Diante dessa realidade, torna-se imprescindível o cuidado com a postura do profis sional da educação, em especial aquele que está diariamente com o aluno, colaborando (positivamente ou não) para a construção de sua identidade. Essa identidade implica uma relação com as diferenças. Práticas que valorizem a diversidade, com respeito à identidade de cada sujeito, representam um trabalho pautado numa concepção de valores humanos, que LICENCIATURAS em foco 33 prima pela cidadania, em busca do respeito às etnias e suas diferenças culturais; as diferenças sociais e econômicas. Portanto, não é suficiente falar do respeito se nas atitudes é manifestado o preconceito. O docente e todo o ambiente educativo precisam conscientizar-se para que a ação esteja coerente com o discurso. Nesse sentido, devemos compreender, segundo Mantoan (2003, p. 53): A escola, para muitos alunos, é o único espaço de acesso aos conhecimentos. É o lugar que vai proporcionar-lhes condições de se desenvolverem e de se tornarem cida dãos, alguém com uma identidade sociocultural que lhes conferirá oportunidades de ser e de viver dignamente. Nos Parâmetros Curriculares Nacionais consta que “para viver democrati- camente em uma sociedade plural, é preciso respeitar os diferentes grupos e culturas que a constituem” (BRASIL, 1997, p. 27). Os PCN trazem a seguinte informação a respeito da pluralidade cultural: A sociedade brasileira é formada não só por diferentes etnias, como por imigrantes de diferentes países. Além disso, as migra- ções colocam em contato grupos dife renciados. [...] O grande desafio da escola é investir na superação da discriminação e dar a conhecer a riqueza representada pela diversidade etnocultural que compõe o patrimônio sociocultural brasileiro, valorizando a traje tória particular dos grupos que compõem a sociedade. Nesse sentido, a escola deve ser local de diálogo, de apren- der a conviver, vivenciando a própria cultura e respeitando as diferentes formas de expressão cultural (BRASIL, 1997, p. 27). Conferimos também que a Lei nº 13.005, a qual aprova o novo PNE (Plano Nacional de Educação), prevê metas e estratégias para o período de 2014/24, que têm impacto no cumprimento de ações que envolvem a valorização da diversidade nos aspectos culturais, sociais, pautados nos direitos humanos. A partir daí, conforme consta na meta 7 deste mesmo plano, buscam a promoção da qualidade da educação, com avanço do andamento escolar e na aprendizagem, atingindo as consequentes médias nacionais para o Ideb: LICENCIATURAS em foco 34 QUADRO 4 - MÉDIAS NACIONAIS PARA O IDEB (META 7 DO PNE) IDEB 2015 2017 2019 2021 Anos iniciais do Ensino Fundamental 5,2 5,5 5,7 6,0 Anos finais do Ensino Fundamental 4,7 5,0 5,2 5,5 Ensino Médio 4,3 4,7 5,0 5,2 FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/pne-meta-7-691920. shtml>. Acesso em: 14 maio 2016 Para atingir tal meta, pontuou-se a necessidade de estabelecer estratégias, sendo que apresentaremos no decorrer deste tópico somente as que estão relacionadas à diversidade: 7.1) estabelecer e implantar, mediante pactuação interfederativa, diretrizes pedagógicas para a Educação Básica e a base nacional comum dos currículos, com direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos para cada ano do Ensino Funda- mental e Médio, respeitada a diversidade regional, estadual e local (OBSERVATÓRIO DO PNE, 2013, s.p., grifos nossos). Conforme destacamos na estratégia acima, há o reconhecimento de que para elevar os índices educativos é necessário o respeito à diversidade, seja ela regional, estadual ou local, pois a diferença de regiões ou mesmo municípios implica variações linguísticas, de contextos sociais e modos de vida diferenciados. Entretanto, é o fazer de cada professor em sua sala de aula que proverá essa ação em prol da qualidade e igualdade na educação. Cabendo ainda ao professor compreender que: A cultura de um povo envolve seus modos de viver, seus siste- mas de valores e crenças, seus instrumentos de trabalho, seus tipos de organização social, seja ela familiar, econômica, edu- LICENCIATURAS em foco 35 cacional, trabalhista, institucional, política ou religiosa, além de todas as dimensões éticas e estéticas, bem como seus modos de pensar e fazer (MORAES, 2010, p. 121). Para tanto, os projetos educacionais devem apresentar uma perspectiva inclusiva, que direcione o aprendiz a evoluir com a correspondência dos diferentes saberes e culturas. Conforme o Observatório do PNE (2013, s.p.), “desenvolver indicadores específicos de avaliação da qualidade da educação especial, bem como da qualidade da educação bilíngue para surdos”, é uma estratégia pautada nos direitos humanos, que defende a educação para todos. No vislumbre da qualidade, devemos ter em mente que o desafio é grande e necessita do apoio não somente do governo e atores educativos, mas dos docentes e comunidade envolvida. 7.13) garantir transporte gratuito para todos os estudantes da educação do campo na faixa etária da educação escolar obrigatória, mediante renovação e padronização integral da frota de veículos, de acordo com especificações definidas pelo Insti- tuto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia - INMETRO -, e financiamento compartilhado, com participação da União proporcional às necessidades dos entes federados, visando a reduzir a evasão escolar e o tempo médio de deslocamento a partir de cada situação local (OBSERVATÓRIO DO PNE, 2013, s.p., grifos nossos). Essa ação colabora para, além do acesso ao estudante do campo à educação, a valorização de uma cultura do campo, aproximando os contextos sociais, promovendo a diversidade como forma de aprendizagem e integração de culturas. Assim, segundo o Observatório do PNE (2013, s.p.), deve-se “desenvolver pesquisas de modelos alternativos de atendimento escolar para a população do campo que considerem as especificidades locais e as boas práticas nacionais e internacionais”. Ao reintegrar a população do campo, deve-se dispor de estratégias que valorizem o seu contexto, considerando as condições locais, com base numa perspectiva inclusiva. Todavia, é necessário aprender a aprender, tanto a população do campo quanto a urbana, numa relação intercultural. LICENCIATURAS em foco 36 É preciso colocar o conhecimento à disposição do maior nú- mero possível de pessoas, criando um ambiente que seja não só de comunicação, mas que também atue como ferramenta instigadora, que colabore para uma reflexão crítica, para o desenvolvimento da pesquisa, que facilite uma aprendizagem contínua, permanente e autônoma. (MORAES, 2010, p. 121). Trazer aos conteúdos escolares a cultura indígena e afro-brasileira é permitir o reconhecimento da nossa própria história, valorizando nosso passado, compreendendo nosso presente, buscando assim contribuir para uma sociedade inclusiva e mais humana. 7.25) garantir nos currículos escolares conteúdos sobre a his- tória e as culturas afro-brasileira e indígena e implementar ações educacionais, nos termos das Leis n. 10.639, de 9 de janeiro de 2003, e 11.645, de 10 de março de 2008, asseguran- do-se a implementação das respectivas diretrizes curriculares nacionais, por meio de ações colaborativas com fóruns de educação para a diversidade étnico-racial, conselhos escolares, equipes pedagógicas e a sociedade civil (OBSERVATÓRIODO PNE, 2013, s.p., grifos nossos). Nesse sentido, o combate à discriminação começa por uma educação consciente e crítica. Para tanto, é necessário o entendimento global de nossa história, que por muitos anos foi camuflada sutilmente pelos livros didáticos de uma época. Hoje, com a globalização tecnológica, a informação corre numa velocidade em tempo real. O que acontece neste instante o mundo recebe em questão de um estalar de dedos. É por isso que formar cidadãos críticos frente a essa nova era tecnológica é tão necessário quanto urgente, pois se antes conhecíamos a história pelos livros didáticos, pelo contexto, muitas vezes limitados do autor, hoje se conhece pelas mídias e, sendo assim, há muita informação distorcida, manipulada e questionável. 7.26) consolidar a educação escolar no campo de popula- ções tradicionais, de populações itinerantes e de comuni- dades indígenas e quilombolas, respeitando a articulação entre os ambientes escolares e comunitários e garantindo: o desenvolvimento sustentável e preservação da identidade cultural; a participação da comunidade na definição do mo- delo de organização pedagógica e de gestão das instituições, consideradas as práticas socioculturais e as formas particula- res de organização do tempo; a oferta bilíngue na educação infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, em língua materna das comunidades indígenas e em língua portuguesa; LICENCIATURAS em foco 37 a reestruturação e a aquisição de equipamentos; a oferta de programas para a formação inicial e continuada de profissio- nais da educação; e o atendimento em educação especial. (OBSERVATÓRIO DO PNE, 2013, s.p., grifos nossos). Implementar uma política de inclusão é muito mais que permitir o acesso aos sujeitos negados, é pensar e estruturar condições para que essa inclusão saia do papel e verdadeiramente se aplique. Para tanto, esta estratégia preconiza o respeito à rotina da população tanto do campo, quanto indígena e quilombolas, organizando situações de aprendizagem que se articulem junto às culturas dessas comunidades, desde a estruturação física até a pedagógica, atendendo assim à diversidade. 7.27) desenvolver currículos e propostas pedagógicas espe- cíficas para educação escolar para as escolas do campo e para as comunidades indígenas e quilombolas, incluindo os conteúdos culturais correspondentes às respectivas comunida- des e considerando o fortalecimento das práticas socioculturais e da língua materna de cada comunidade indígena, produzindo e disponibilizando materiais didáticos específicos, inclusive para os alunos com deficiência (OBSERVATÓRIO DO PNE, 2013, s.p., grifos nossos). Esta estratégia enfatiza uma educação sensível aos contextos de cada cultura, suas especificidades e demandas. Valoriza práticas que fortalecem a língua materna, que por muitos anos foi desvalorizada por conta de um sistema de currículo único e desarticulado da realidade. Hoje corre-se atrás dos prejuízos que um sistema educativo trouxe para comunidades mais fragilizadas. É preciso elevar a qualidade conforme a meta 7 estabelece, porém: As políticas e as estratégias adotadas voltadas para melhorias da qualidade educativa devem estar estritamente adaptadas ao contexto local, serem flexíveis no sentido de incorporar as mudanças necessárias requeridas pelo contexto e pela cultura local. A busca da qualidade educativa envolve a existência de processos que facilitem os mais diferentes diálogos, não apenas entre alunos, professores e comunidade escolar, mas também o diálogo do homem e da mulher com o seu contexto, com a sua realidade, com a cultura rica em sistemas simbólicos. É a qualidade do diálogo entre o sujeito e o seu mundo que o torna um sujeito histórico (MORAES, 2010, p.196). LICENCIATURAS em foco 38 Acompanhe a seguir a leitura complementar que trata dos desafios de uma educação intercultural, pautada nos direitos humanos: ------ [LEITURA COMPLEMENTAR] ------ EDUCAÇÃO INTERCULTURAL E DIREITOS HUMANOS: CONSTRUINDO CAMINHOS Estamos, como educadores, desafiados a promover processos de desconstrução e de desnaturalização de preconceitos e discriminações que impregnam, muitas vezes, com caráter difuso, fluido e sutil, as relações sociais e educacionais que configuram os contextos em que vivemos. A naturalização é um componente que faz em grande parte invisível e especialmente complexa esta problemática, que invade e povoa nossos imaginários individuais e sociais com relação aos diferentes grupos socioculturais. Trata-se de questionar esta realidade. Também é fundamental desvelar e questionar os sentidos de igualdade e diferença que permeiam os discursos educativos. Outro aspecto imprescindível é problematizar o caráter monocultural e o etnocentrismo que, explícita ou implicitamente, estão presentes na escola e impregnam os currículos escolares. Perguntar-nos pelos critérios utilizados para selecionar e justificar os conteúdos escolares. Desestabilizar a pretensa “universalidade” dos conhecimentos, valores e práticas que configuram as ações educativas e promover o diálogo entre diversos conhecimentos e saberes. Estamos desafiados também a reconhecer e a valorizar as diferenças culturais, os diversos saberes e práticas, e a afirmar sua relação com o direito à educação de todos. Reconstruir o que consideramos “comum” a todos e todas, garantindo que nele os diferentes sujeitos socioculturais se reconheçam, possibilitando assim que a igualdade se explicite nas diferenças que são assumidas como comum referência, rompendo dessa forma com o caráter monocultural da cultura escolar. Outro aspecto que consideramos fundamental se relaciona com o resgate dos processos de construção das identidades culturais, tanto no nível pessoal como coletivo. LICENCIATURAS em foco 39 Um elemento importante nesta perspectiva são as histórias de vida dos sujeitos e das diferentes comunidades socioculturais. É importante que se opere com um conceito dinâmico e histórico de cultura, capaz de integrar as raízes históricas e as novas configurações, evitando-se uma visão das culturas como universos fechados e em busca do “puro”, do “autêntico” e do “genuíno”, como uma essência preestabelecida e um dado que não está em contínuo movimento. Um último núcleo de desafios que gostaria de assinalar tem como eixo fundamental promover experiências de interação sistemática com os “outros”. Para sermos capazes de relativizar nossa própria maneira de situarmo-nos diante do mundo e atribuir-lhe sentido, é necessário que experimentemos uma intensa interação com diferentes modos de viver e se expressar. Não se trata de momentos pontuais, mas da capacidade de desenvolver projetos que suponham uma dinâmica sistemática de diálogo e construção conjunta entre diferentes pessoas e/ou grupos de diversas procedências sociais, étnicas, religiosas, culturais etc. Também estamos chamados a favorecer processos de “empoderamento”, tendo como ponto de partida liberar a possibilidade, o poder, a potência que cada pessoa tem para que possa ser sujeito de sua vida e ator social. O “empoderamento” tem também uma dimensão coletiva, apoia grupos sociais minoritários, discriminados, marginalizados etc., favorecendo sua organização e participação ativa em movimentos da sociedade civil. As ações afirmativas são estratégias que se situam nesta perspectiva. Visam a melhores condições de vida para os grupos marginalizados, à superação do racismo, da discriminação de gênero, de orientação sexual e religiosa, assim como das desigualdades sociais. FONTE: Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v33n118/v33n118a15.pdf> Acesso em: 5 jun. 2016. LICENCIATURAS em foco 40 DIC AS! Literatura afro-brasileira Literaturas que valorizam a diversidade étnica e cultural afro-brasileira e africana
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