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A finalidade desta disciplina é proporcionar a vocês, caros alunos, os instrumentos necessários para realizar pesquisas, oferecer diretrizes básicas de como se realiza um trabalho deste tipo, que métodos usamos para que nossa pesquisa tenha qualidade. Bem, questões metodológicas ocuparão boa parte de nosso trabalho, ao longo do curso. Porém, como caçadores de aventuras nas florestas do saber, antes de aprendermos como realizar nossas caçadas, devemos ter em mente o que pretendemos com a caçada. Ou seja, antes de estudar os métodos a serem usados na pesquisa, cumpre destinar um tempo para debater a escolha do tema.  
Cada um de vocês fará uma escolha a partir desta aula.
Depois de tomada esta decisão, o trabalho que virá a seguir será o de construção do Projeto de Pesquisa, e este será feito a partir desta escolha inicial.
Chegou o momento de cada um  parar tudo e se questionar: sobre que tema será a pesquisa a ser realizada? O caminho é pensar com calma, mas sem deixar para depois.
Não tome uma decisão precipitada, nem use o recurso de protelar a escolha, deixá-la para a semana que vem.  
O objetivo central desta aula é apresentar e propor uma reflexão sobre os aspectos que você precisa levar em conta a fim de fazer uma boa escolha de tema para o Projeto de Pesquisa. Mesmo que você já tenha em mente sobre o que pretende desenvolver em seu trabalho, aguarde o fim da aula, leia atentamente todo o nosso conteúdo, antes de fechar uma posição a respeito.
O Serviço Social é um campo de atuação profissional essencialmente prático. Disso, todos nós sabemos. A produção científica nesta área pode ser considerada como tendo uma vocação “natural” para a pesquisa prática, ou seja, para a produção de uma reflexão que tenha utilidade em alguma prática da lide dos profissionais da área. Ou, para a produção de pesquisas que proponham soluções para os graves problemas sociais que o país enfrenta na atualidade.
Este é um dado que já ajuda a demarcar o terreno dentro do qual será feita a escolha do tema. Contudo, é preciso estar atento ao fato de que este caráter eminentemente prático não afasta a importância da reflexão teórica. Por este motivo, na presente aula, antes de entrarmos no mérito da questão principal, que é a escolha e delimitação do tema da pesquisa, por parte de cada aluno, consideramos importante abordar os conceitos de “teoria” e “prática”, com o objetivo de verificar o quanto são complementares e se enriquecem mutuamente.
Contemplar e Agir
Vamos supor que, com o intuito de buscar esclarecimento acerca do conceito de “teoria”, o estudante fosse consultar um dicionário conceituado, o que leva a assinatura de Aurélio Buarque de Holanda. Vale lembrar que quase todas as palavras possuem mais de um significado, e os dicionários, em geral, se valem do recurso de apresentar um elenco de respostas, raramente uma só. Normalmente, tal sequência vem numerada, como acontece no “Aurélio”. Bem, ao buscar o verbete correspondente à palavra em questão, viriam como resposta os seguintes significados:
1 – Conhecimento especulativo meramente racional;
2 – Conjunto de princípios fundamentais duma arte ou ciência;
3– Doutrina ou sistema fundado nesses princípios;
4– Opiniões sistematizadas;  
5– Noções gerais, generalidades;
6– Suposição, hipótese;  
7– Utopia, quimera.
Para nós, será suficiente nos valermos dos dois primeiros conceitos, apenas. Lendo e interpretando o que nos diz o dicionário, vamos construindo o conceito moderno de “teoria” e também vamos colocar em debate a maneira como este conceito se relaciona com o de “prática”.
Quando a palavra “teoria” nasceu, na Antiga Grécia, ela ainda era bem o que sugere o nosso Aurélio, no primeiro conceito apresentado. Pedindo ajuda à etimologia, ciência que estuda a origem das palavras, podemos afirmar que, ao contrário do que possa parecer, o vocábulo não tem relação alguma com “Theo” (que é “Deus” em grego). Em vez disso, vem de “Thea” (algo a ser visto). Portanto, na origem da palavra, já se tinha claramente expresso o sentido de contemplação.
A compreensão deste fato somente se esclarece quando consideramos que na Antiga Grécia, todo o trabalho pesado era feito pelos escravos, o que dava aos cidadãos, ou seja, aos senhores, a chance de se dedicar a práticas que não demandassem esforço dos músculos, desde a mera contemplação da natureza até a filosofia e a arte.
Esta separação entre atividade braçal e intelectual foi deixada como incômoda herança pelos gregos e permeia a civilização ocidental até hoje. Está por trás de muitos preconceitos que causam tanto embaraço nos dias que vivemos. Algo que se manifesta de maneiras variadas e parece arraigado na mentalidade de grande parte da população. Por conta disso, ao ver um homem sem camisa e sujo de graxa entrar num ônibus, podemos perceber como as pessoas se encolhem em seus lugares, temerosas. Em contrapartida, não são raras as situações de bullyng sofridas por alunos que tiram notas altas nas escolas, qualificados como nerds.
Pois bem, outra consequência, para nós, desta antiga separação, se faz presente quando pensamos a relação entre “teoria” e “prática”. Para muitos, não existe muita relação entre elas, sendo possível fazer ciência apenas com uma. Esta confusão está na base de outra separação, a que se estabelece entre ciência “pura” e “aplicada”. Não é por outro motivo que fizemos questão de esclarecer bem este ponto. No campo do Serviço Social, pode acontecer de muitos partirem do princípio que o importante é agir, ou seja, aplicar seus conhecimentos para mudar a realidade. De tal modo que não haveria necessidade alguma de “contemplar”, ou seja, preocupar-se com questões teóricas. 
No entanto, é possível e preciso pensar a “teoria” de outro modo, para aproveitar toda a contribuição que ela pode nos trazer no enriquecimento de nossa produção como cientistas sociais.
A realidade não precisa de explicação para existir, mas a realidade “conhecida”, ou seja, a que é vivenciada pelo ser humano, acaba por ser interpretada, de um modo ou de outro. O papel da teoria é proporcionar aos homens instrumentos para seus exercícios de interpretação do real. Devido à própria complexidade dos fatos sociais é que se verifica a existência de diferentes correntes teóricas. O pesquisador deve conhecer a todas, por mais que se defina pela escolha de uma, preferencialmente. Como diz Pedro Demo, no interessante ensaio Pesquisa: princípio científico e educativo (São Paulo: Cortez, 2001), a teoria é a “retaguarda criativa do intérprete inspirado”, ou seja, é o conjunto de conhecimentos e explicações a que o cientista recorre para respaldar seus exercícios de interpretação e compreensão da realidade.
Com isso, veja-se o quão distante estamos do velho conceito de teoria como atividade meramente contemplativa.  
A este respeito, é interessante levar em conta o que diz o mesmo Pedro Demo na p. 27 de seu texto:
Teoria e prática detêm a mesma relevância científica e constituem no fundo um todo só. Uma não substitui a outra e cada qual tem sua lógica própria. Nos extremos, os vícios do teoricismo e do ativismo causam os mesmos males. Não se pode realizar prática criativa sem um retorno constante à teoria, bem como não se pode fecundar a teoria sem confronto com a prática.
Neste sentido, não cabe mais a velha separação entre a teoria e a prática. No processo de construção de uma pesquisa em qualquer ciência, particularmente em ciências sociais, a teoria e a prática se alimentam constantemente. Sim, porque toda pesquisa é construção. Se usarmos a metáfora da construção de uma casa, a teoria seria o saber acumulado por engenheiros e mestres de obra.
Sem este conhecimento, os elementos da vida prática, tijolos e cimento, seriam de pouca utilidade, e a construção não teria como ser feita. 
As teorias existem para ajudar, jamais para confundir. Elas se revelam instrumentos poderosos para uma compreensão mais clara do mundo ao redor, das contradições e desafios enfrentados pelos homens em seus processos de interação social.Futuros Profissionais: Somente assim teremos uma reflexão madura sobre o lugar dos futuros profissionais da área do Serviço Social no mundo em que vivemos. Somente modulando formação teórica com visão prática estaremos a salvo de ver a profissão como nada além de um conjunto de práticas assistencialistas, concebidas de modo acrítico e amadorístico. 
Ultrapassamos, assim, as limitações do primeiro significado registrado no dicionário e passamos a trabalhar somente com o segundo. Para que o trabalho na área do Serviço Social abandone o amadorismo e se enriqueça no diálogo com os desafios da sociedade, precisamos contar sempre com a reflexão teórica.
Serviço Social: Antes disso, mesmo, ajuda-nos a duvidar de certas “verdades” solidamente estabelecidas acerca de ciência. E a capacidade de duvidar pode vir a ser decisiva para que o aluno avance em sua pesquisa, alcançando níveis de compreensão mais elaborados sobre o tema que tem nas mãos.
Pesquisa: Uma das primeiras “verdades” a cair por terra é a divisão, já comentada, entre pesquisa “pura” e “participante”. Por um lado, como já vimos, pesquisa alguma pode ser apenas revestida de contornos práticos, sem o suporte de conceitos teóricos. Por outro, não existe nenhuma atividade científica capaz de se considerar neutra. Nem mesmo entre os físicos ou paleontólogos, que aparentemente lidam com aspectos da realidade que parecem bem distantes dos conflitos sociais.
O mais notório exemplo disso se deu na primeira metade do século XX, quando os estudos, supostamente de ciência “pura”, desenvolvidos por Einstein em torno da relatividade vieram a resultar no desenvolvimento dos primeiros artefatos nucleares que, uma vez lançados sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, causaram a morte de mais de duzentas mil pessoas. 
Outro exemplo: até o começo do século XX, as ciências sociais se regulavam por uma corrente teórica do século anterior, o positivismo, que buscava alicerçar os estudos sobre os fatos sociais em critérios herdados das ciências da natureza. Portanto, um dos fundamentos da reflexão científica estava na separação entre o sujeito (que pesquisa) e o objeto (que é pesquisado).
Porém, a entrada em cena de novas correntes de pensamento em ciências sociais, como a visão dialética desenvolvida pelos críticos sociais da Escola de Frankfurt, a partir dos idos de 1920, colocou em cheque o positivismo e levantou um véu de suspeitas sobre algumas certezas antes invioláveis. Particularmente, foi posta em dúvida a separação estanque entre sujeito e objeto. 
Afinal, o pesquisador também faz parte da sociedade que pesquisa. Neste caso, ele é ao mesmo tempo o sujeito e parte do objeto de seu esforço de reflexão teórica.
Veja como é preciso realizar uma reflexão teórica atualizada para não incorrer em erros.
No passado, os estudos realizados sobre as condições de vida da população de rua, por exemplo, eram feitos como se aquelas pessoas pertencessem a outra categoria de seres humanos. O pesquisador abstinha-se de perceber o quanto elas tinham em comum com ele, tendo em vista que as necessidades básicas de todos os seres humanos são as mesmas. Além disso, era incapaz de perceber que ele também estava envolvido na rede de injustiças sociais que obriga uma enorme parcela da população a viver sem teto.
Não que cada um de nós deva se sentir culpado pelas mazelas da sociedade. De nada adiantaria cultivar o sentimento de culpa, além do que seria injusto para nós, que estamos justamente procurando ajudar. Mas o que se tem a fazer é perceber os mecanismos de funcionamento desta sociedade, capaz de dar somente a alguns de nós o privilégio de cursar uma Universidade, enquanto milhares vivem sem as mínimas condições de uma existência decente.  
Um pesquisador do passado deixaria de fora a reflexão sobre as contradições sobre o capitalismo globalizado. Em vez disso, buscaria explicações nos próprios indivíduos vitimados por esta ordem social injusta e desigual, ou senão no meio em que viviam estes indivíduos. Com efeito, as explicações mais correntes, naquela época, eram de que a pobreza advinha do clima, das misturas de raças, da indolência do povo (ou seja, as pessoas eram culpadas de sua própria pobreza, que era algo que resultava da preguiça), entre outras explicações. Bem, com um pouco de reflexão crítica, percebemos que este tipo de cientista social, felizmente superado, só fazia contribuir para que a ordem social não se alterasse.
Naqueles tempos, não se concebia um Serviço Social motivado por ideais de construção de uma nova sociedade. Em vez disso, predominava a caridade, concebida como pura e simples esmola. Os assistentes sociais não se sentiam como seres humanos a quem o Estado ou entidades privadas pagavam para prestar auxílio a seres humanos que precisassem de auxílio. 
Em lugar disso, predominava a visão paternalista, que levava o profissional a se sentir um ser superior às pessoas a quem atendia. 
Conclui-se do que foi exposto que a prática profissional tem muito a ganhar com a reflexão teórica atualizada, que esteja sempre em busca de novas soluções para os problemas que vão surgindo.
Escolher e Delimitar: o Nascimento da Reflexão Sobre o Tema
Chegamos ao primeiro grande desafio do estudante que se encontra prestes a se iniciar nos caminhos da pesquisa: a escolha de um tema que ele possa assumir como seu, no sentido de merecer sua atenção e despertar seu interesse, a ponto de lhe motivar a elaborar um Projeto de Pesquisa. Ou seja, um tema que realmente desperte algo dentro de si.  
Em jogo, está muito mais do que simplesmente resolver sobre que assunto será o trabalho de conclusão de curso. O tema escolhido fica por merecer a dedicação que o futuro profissional da área de Serviço Social deve possuir para ter êxito em sua carreira. Vale dizer, desta forma, que todo o processo de elaboração do Projeto de Pesquisa é um treinamento para a vida. Até porque o bom profissional não é aquele que se julga “pronto” e nunca mais pega num livro depois que conclui a faculdade, mas sim o que reconhece a necessidade de se reciclar sempre.
Bem, existe sempre certa liberdade de escolha quando o estudante chega a esta etapa de sua trajetória. E o que parece ser um bem, pode ser também um desafio. Isso porque muitas vezes o estudante se depara com a constatação de que ele não foi preparado para realizar escolhas. Com efeito, nossa rede escolar, desde as séries iniciais, não nos prepara para o exercício da liberdade consciente e responsável. Tanto isto é verdade que verificamos, nas escolas de fundamental, a desordem tomar conta de tudo sempre que um professor mais audacioso resolve conceder aos alunos um quinhão maior de liberdade. Aliás, aquilo que se convenciona chamar de “bagunça” nada mais é do que um termômetro da incapacidade de nossos jovens em lidar com a liberdade de forma consciente. E isto decorre da pouca intimidade que eles têm com o exercício de escolhas próprias e conscientes.
Para nós, que já estamos na Universidade, vale dizer que a escolha é livre, dentro de alguns parâmetros que logo veremos, mas acarreta a necessidade de respondermos por ela. Ou seja, traz consigo a responsabilidade. Estamos diante do que Pedro Demo, em seu já referido ensaio, denomina “desafio de liberdade acadêmica”.
No decorrer do curso, no contato com todas as outras matérias que compõem a grade curricular, o estudante teve a oportunidade de ter contato com uma gama extraordinária de informações. A busca do conhecimento foi sendo alimentada por vários semestres. Vários exercícios propostos nos fóruns, como oportunidades para enriquecer a vivência crítica e a reflexão sobre os mais variados temas da área de Serviço Social. Vários tópicos apresentados como oportunidade para aprimorar a capacidade de reflexão crítica.
Um questionamento inicial se impõe: sobre qual tema trabalhar. Foram tantas as opções apresentadas que é algo normal que, num primeiro momento, o estudante fique indeciso. Mas a escolha não pode demorar, uma vez que há muito que fazer e não há tempoa perder. Proponho dois critérios básicos, para começo de conversa:
Dentre os muitos assuntos estudados ao longo do curso, escolha um que mais lhe motiva e agrada. Jamais faça um trabalho sobre algo que não lhe interessa muito, desperdiçando a oportunidade de pesquisar sobre algo que vai realmente dar a necessária motivação para que o trabalho tenha um rendimento favorável.
Desde o começo, é importante ter em mente que o tema escolhido vai exigir um certo nível de elaboração teórica, de modo a que o estudante-pesquisador se mostre capaz de caminhar com suas próprias pernas, ainda que se valha das contribuições de seu orientador. Como já vimos, no tópico anterior da presente aula, todos os temas, por mais que pareçam ligados apenas ao cotidiano, à realidade concreta, sempre possuem dimensões teóricas e práticas ao mesmo tempo.  
Tendo em vista o que foi exposto acima, tenha uma atenção especial para a questão do acesso ao material de pesquisa sobre o tema escolhido. Assim, algo que muito lhe interessa pode ser de difícil articulação, no plano do levantamento bibliográfico. Neste caso, pode se tratar de uma escolha que lhe trará problemas.
Esteja atento à delimitação do tema, para evitar que ele seja formulado de modo vago e impreciso. Um exemplo: “O atendimento aos menores infratores no Brasil”. Ao escolher um tema como este, deve-se levar em conta se ele não está formulado de modo excessivamente amplo, se não carece de uma delimitação mais adequada, a fim de se obter um tema mais acessível, mais viável.
Caso exista relativa abundância de material para pesquisa, esteja disposto a demonstrar a capacidade de trilhar um caminho próprio, ainda que supervisionado pelo professor/orientador. Um estudante prova estar preparado para a vida profissional na medida em que demonstra capacidade de construir uma compreensão sobre os assuntos estudados sem copiar, imitar, reproduzir. A aprendizagem se faz mais autêntica e plena quando resulta de esforço pessoal, do vivo interesse em conhecer. Acerca dos procedimentos de pesquisa, dos mecanismos a serem usados para se evitar a cópia, teremos oportunidade de falar em uma de nossas próximas aulas.
Eis aí uma tarefa delicada e que precisa de muito cuidado, para que o caminho a seguir se revele mais viável. No momento de dar conta desta delimitação, caro aluno, seja bem sincero. Para dar conta de toda a tarefa a que está se propondo, você está disposto a entrevistar menores infratores em todo o país?
Não é mais aceitável que sua proposta de trabalho se atenha aos limites da cidade em que você vive? Afinal, este é um problema social comum a todos os grandes centros urbanos do país. Eis aí como a sua delimitação já começa a ser feita, levando-se em conta uma questão simples de praticidade. Além do critério geográfico, a delimitação de um tema como este pode observar outros aspectos, tais como um recorte no tempo, ou a ênfase num determinado subgrupo. Assim, por exemplo, é possível imaginar uma pesquisa junto a menores infratores do Rio de Janeiro, dependentes de crack e, ainda, limitar a pesquisa ao ano de 2012. Disso resulta uma delimitação bem mais precisa, que já deixa mais claro os rumos a serem tomados no levantamento de dados para a pesquisa.
Outro exemplo, muito simples, que revela o quanto é importante uma adequada delimitação do tema. Imagine que você se disponha a fazer uma pesquisa sobre gravidez na adolescência. Trata-se de um tema excessivamente impreciso, amplo demais, ainda mais se pensamos em termos de um trabalho de graduação. Neste caso, além dos recursos de ordem geográfica e cronológica, a delimitação pode se valer de outros recursos, como seria o caso de optar por um enfoque apenas sobre as jovens que tenham sido vítimas de abuso sexual. Ou, então, jovens que tenham sido rejeitadas por suas famílias em razão da gravidez. Ou algum outro fator que determine uma redução no corpus da pesquisa.
Claro que você pode e deve considerar importante estudar o fenômeno da gravidez na adolescência, como um todo. Porém, não terá tempo de fazer uma pesquisa mais longa. Além disso, sem a delimitação terá que ler muito mais, dar conta de textos que comentem ou aprofundem a reflexão sobre os mais diversos desdobramentos do problema geral. Então, além da pesquisa tomar mais de seu tempo, ela também exigirá uma bagagem de conhecimentos bem maior. 
Enfim, cada um de nós pode desenvolver uma trajetória pessoal de construção do conhecimento, desenvolvendo o hábito de encontrar saídas para os desafios de sua própria pesquisa. Isso é praticar de modo efetivo a criatividade.
Tendo em mente estes aspectos essenciais, as opções são muitas. O grande problema, para o estudante, passa a ser não ficar muito perdido na escolha
De qualquer forma, em caso de dúvida, sempre existe a possibilidade de definir, como estratégia, que um tema será trabalhado agora, enquanto os outros ficarão guardados para mais adiante, como na pós-graduação, ou em algum artigo escrito para ser publicado numa revista especializada. 
Enfim, são tantas opções que o grande problema, para o estudante, passa a ser não ficar muito perdido na escolha. De qualquer forma, em caso de dúvida, sempre existe a possibilidade de definir, como estratégia, que um tema será trabalhado agora, enquanto os outros ficarão guardados para mais adiante, como na pós-graduação, ou em algum artigo escrito para ser publicado numa revista especializada.
A Pesquisa como Atividade de Criação
Antes de terminar esta aula sobre a escolha do tema de pesquisa, é preciso destacar a complexa implicação social que está por trás da atuação de um profissional do Serviço Social.
Esta problemática se revela importante na própria realização da pesquisa, e isso já desde o momento da escolha do tema. 
Por um lado, temos aquela atitude, típica do estudante bem-intencionado, que escolheu este curso tendo em vista sua predisposição a ajudar os desfavorecidos pela sociedade. Bem, isso pode ser feito, sem dúvida, mas é preciso alertar tais estudantes para certas armadilhas que se fazem presentes na realidade. Por outro lado, existe todo um discurso dominante, de que a ciência é neutra, ou seja, as pesquisas realizadas nas Universidades nada têm com os conflitos em curso na sociedade. Bem, este discurso de neutralidade é mais visível em outros campos do saber, como as exatas, por exemplo.
Mas não deixa de se fazer notar em certas posturas de autores que se debruçam sobre o estudo das técnicas de pesquisa. 
A vida social é um processo de permanente diálogo. As pessoas interagem socialmente, valendo-se dos mais variados discursos para se fazerem compreender, bem como para atingir mil outras finalidades: pedir, persuadir, contar, impor, testemunhar, entre outras. Fica claro que qualquer texto é uma tentativa de agir sobre os outros. Ou, melhor dizendo, qualquer texto é diálogo. Neste caso, podemos dizer que a nossa pesquisa é um diálogo que buscamos estabelecer com outras pessoas, tendo como temática os problemas da sociedade em que vivemos.
Neste sentido, pesquisar é sempre dialogar. O que significa que o estudante ouve e lê muito sobre a realidade, estuda os teóricos, mas chega o momento em que ele vai responder, produzindo o seu texto. Esta produção de conhecimento, cada um faz para si mesmo, na medida em que aprende fazendo, mas também faz para os outros, já que seu trabalho ficará arquivado e poderá servir de instrumento de estudo para outros estudantes, no futuro. Sem falar das oportunidades que você mesmo pode vir a ter de usar todo o seu trabalho ou parte dele em congressos e colóquios.
Mas existe outra dimensão do diálogo que é preciso comentar. Não se pode esquecer que nas relações sociais sempre se revelam presentes relações de poder. O profissional de Serviço Social precisa estar atento ao aspecto político que se apresenta em sua realidade, em seu trabalho cotidiano. Como, de resto, todos os demais estudantes, recém-saídos das Universidades, uma vez que todas as profissões têm algum tipo de inter-relação com os conflitos que sefazem presentes nas lutas pelo poder.
Chegamos a um aspecto importante, de que todos precisam tomar consciência, ao fazer pesquisa. Trata-se da existência de interesses sociais em jogo em tudo o que fazemos. Temos que ter conhecimento, por exemplo, de que muitas pesquisas científicas são feitas, não para se pensar em soluções para a vida em sociedade, mas para atender a grupos de pressão específicos. Assim, os laboratórios de química das Universidades podem se ver sob o jugo de interesses da indústria petroquímica, por exemplo. Do mesmo modo como desenvolver novos medicamentos, não só é boa notícia para os doentes, como também para os interesses da indústria farmacêutica.
Exemplos que damos para não recorrer a outros, mais sórdidos, como os voltados para a industrialização da morte e da destruição, que subjaz a toda pesquisa voltada para o enriquecimento da indústria bélica.
Neste ponto de nossas reflexões, os estudantes de Serviço Social talvez pensem que podem se sentir aliviados, mas não é bem assim. Nem toda pesquisa em ciências sociais se volta para finalidades de melhorar o convívio entre os seres humanos. Também há grupos de interesse que agem no sentido de garantir lucros. Basta ver o que o avanço tecnológico fez aos empregos numa categoria como a dos bancários, por exemplo.
Pois bem, há pesquisadores em áreas próximas à nossa, como a sociologia e a economia, cujos trabalhos contribuem para a formulação de políticas de substituição de mão de obra por engenhocas eletrônicas.
Isso para não falar na atuação de psicólogos e dos próprios assistentes sociais em práticas de apaziguamento de conflitos, tendo como horizonte, quase sempre, o interesse dos poderosos, em detrimento dos desvalidos.
Tendo em vista que vivemos numa sociedade extremamente desigual, fica claro que a escolha de um tema para a pesquisa dificilmente deixará de fora esta realidade. O estudante precisa, então, ter consciência de que não lhe cabe resolver os complexos problemas da sociedade brasileira deste início de século, mas existe sempre uma margem de participação. Afinal, elaborando a pesquisa, ele produz conhecimento, o que virá a permitir que esteja mais bem preparado para atuar socialmente, no futuro. E, a despeito das dificuldades e dos desafios, ele não deve desanimar.
Como afirma Pedro Demo (op. cit., p. 40), “pesquisar é que não se perdeu o senso pela alternativa, que a esperança é sempre maior que qualquer fracasso, que é sempre possível recomeçar”.
Concluímos esta aula com a constatação de que o simples ato de escolher um tema para uma pesquisa em Serviço Social, procedendo-se depois a um adequado processo de delimitação deste tema, já é um gesto social, no sentido de conter uma contribuição para o diálogo de que é feita a vida em sociedade. Gesto que se revela transformador na medida em que traz propostas concretas para a criação de uma sociedade ao menos mais suportável do que a atual.

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