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Tutela_Inhibitoria

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LUIZ GUILHERME MARINONI
TUTELA INHIBITORIA
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<tit>SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 
<sum c>Parte 1
<sum c1>A TUTELA INIBITÓRIA: UMA NOVA TUTELA JURISDICIONAL
<sum1>	1.	O processo civil clássico e a ausência de uma tutela jurisdicional realmente preventiva		
<sum1>	2.	A necessidade de um novo modelo processual		
<sum1>	3.	A tutela inibitória		
<sum2>	3.1	Considerações iniciais		
<sum2>	3.2	A tutela inibitória e a problemática do ilícito		
<sum2>	3.3	A inibitória tutela contra o ilícito		
<sum2>	3.4	A tutela inibitória e a questão da culpa		
<sum2>	3.5	Os diferentes escopos da tutela inibitória		
<sum2>	3.6	A cognição e a prova na ação inibitória		
<sum2>	3.7	A prova indiciária diante da ação inibitória		
<sum3>	3.7.1	Primeiras considerações 		
<sum3>	3.7.2	“Juízo-instrumental”, presunção, “juízo-resultado”, “juízo provisório” e “juízo-final”		
<sum3>	3.7.3	O controle da admissão da prova para a demonstração do
<sum3>fato indiciário		
<sum3>	3.7.4	A importância do senso comum para o raciocínio fundado a
<sum3>partir da prova indiciária		
<sum3>	3.7.5	A importância do senso comum para a formação do juízo apartir da presunção		
<sum2>	3.8	A necessidade de atuação concreta da norma e a importância da açãoinibitória		
<sum2>	3.9	A autonomia da ação inibitória		
<sum2>	3.10	A inaptidão do antigo art. 287 para garantir uma tutela jurisdicional adequada e a confusão que se instalou entre a tutela preventiva e a tutela cautelar. A dificuldade de se perceber, hoje, a relação entre a tutela das obrigações de fazer e de não fazer e a tutela inibitória		
<sum2>	3.11	A ação inibitória é corolário de um princípio geral de prevenção		
<sum2>	3.12	Direito à tutela inibitória, técnica processual e tutela jurisdicional inibitória		
<sum2>	3.13	O art. 461 como fundamento processual da tutela inibitória		
<sum2>	3.14	O art. 12, caput, do novo Código Civil 		
<sum2>	3.15	A tutela inibitória no plano coletivo		
<sum3>	3.15.1	Os arts. 11 da Lei da Ação Civil Pública e 84 do CDC. O sistema brasileiro de tutela coletiva ampara a tutela inibitória		
<sum3>	3.15.2	A problemática da tutela inibitória a partir do controle dos atos do Poder Público		
<sum3>	3.15.3	A tutela inibitória em caso de omissão do Poder Público		
<sum3>	3.15.4	A tutela coletiva do consumidor contra o uso de cláusulas gerais abusivas		
<sum2>	3.16	As técnicas processuais, presentes nos arts. 461, CPC, e 84, CDC, viabilizam a concessão de várias tutelas		
<sum2>	3.17	A razão para se falar em tutela inibitória		
<sum2>	3.18	A tutela inibitória negativa e a tutela inibitória positiva		
<sum2>	3.19	A multa e a tutela inibitória que impõe um fazer fungível		
<sum2>	3.20	A plasticidade da tutela inibitória e os limites para a imposição do fazer e do não fazer		
<sum3>	3.20.1	Breve observação inicial		
<sum3>	3.20.2	Os princípios do meio idôneo e da menor restrição possível como vetores para o adequado uso da tutela inibitória		
<sum2>	3.21	Tutela inibitória e tutela de remoção do ilícito		
<sum2>	3.22	A fungibilidade da tutela inibitória		
<sum3>	3.22.1	Breves observações sobre o princípio da congruência entre o pedido e a sentença		
<sum3>	3.22.2	Os arts. 461 do CPC e 84 do CDC como exceções ao princípio de que a sentença deve ficar adstrita ao pedido		
<sum3>	3.22.3	A sub-rogação de uma obrigação em outra para a obtenção da tutela específica ou do resultado prático equivalente ao do adimplemento		
<sum3>	3.22.4	O poder decisório do juiz e o princípio da efetividade		
<sum3>	3.22.5	O poder decisório do juiz e o princípio da necessidade		
<sum3>	3.22.6	A fungibilidade da tutela inibitória reafirma a idéia da fungibilidade da tutela de segurança, que sempre esteve na base da “tutela cautelar”	
<sum2>	3.23	O pedido de tutela inibitória e as violações de eficácia instantânea suscetíveis de repetição no tempo		
<sum2>	3.24	Tutela inibitória e cumulação de pedidos. A tutela antecipatória mediante o julgamento antecipado do pedido inibitório cumulado com pedido ressarcitório		
<sum2>	3.25	A importância da audiência preliminar à luz da experiência angloamericana do undertaking do réu		
<sum2>	3.26	A tutela inibitória antecipada		
<sum3>	3.26.1	Primeiras considerações		
<sum3>	3.26.2	A quebra da regra da nulla executio sine titulo		
<sum3>	3.26.3	A tutela inibitória antecipada na ação inibitória		
<sum4>	3.26.3.1	Fundamento e pressupostos da tutela inibitória antecipada na ação inibitória		
<sum4>	3.26.3.2	A prova e a tutela inibitória antecipada		
<sum4>	3.26.3.3	Momento da concessão da tutela inibitória antecipada		
<sum4>	3.26.3.4	Justificação prévia e tutela inibitória antecipada		
<sum4>	3.26.3.5	A tutela inibitória antecipada e o princípio da probabilidade. A questão da irreversibilidade		
<sum4>	3.26.3.6	A fungibilidade da tutela inibitória antecipada		
<sum4>	3.26.3.7	A possibilidade de modificação e de revogação da tutela inibitória antecipada		
<sum4>	3.26.3.8	Sobre a possibilidade de se manter eficaz a tutela inibitória antecipada no caso de sentença de improcedência		
<sum3>	3.26.4	A evidente distinção entre tutela inibitória antecipada e tutela cautelar		
<sum2>	3.27 A execução da tutela inibitória		
<sum3>	3.27.1	A tutela inibitória e a multa		
<sum4>	3.27.1.1	Primeiras observações		
<sum4>	3.27.1.2	Breve análise das medidas coercitivas em outros sistemas 		
<sum4>	3.27.1.3	A multa e a indenização pelo dano. A sua cumulabilidade		
<sum4>	3.27.1.4	Critérios para a imposição da multa		
<sum4>	3.27.1.5	A respeito do beneficiário da multa		
<sum4>	3.27.1.6	O momento a partir do qual a multa torna-se eficaz e o momento a partir do qual a multa pode ser cobrada		
<sum4>	3.27.1.7	A questão da modificação do valor da multa		
<sum3>	3.27.2	Outras medidas de execução		
<sum4>	3.27.2.1	A quebra do dogma da tipicidade das formas executivas		
<sum4>	3.27.2.2	O uso das medidas de coerção direta e de subrogação para a prestação da tutela inibitória		
<sum4>	3.27.2.3	A prisão como meio de coerção indireta		
<sum4>	3.27.2.4	Critérios que devem guiar a atividade executiva. A multa, a prisão, as medidas de coerção direta e as medidas de sub-rogação na prestação da tutela inibitória 		
<sum1>	4.	O delineamento da tutela inibitória em face das tutelas declaratória e cautelar e da condenação para o futuro		
<sum2>	4.1	Tutela inibitória e tutela declaratória		
<sum2>	4.2	Tutela inibitória e tutela cautelar		
<sum2>	4.3	Tutela inibitória e condenação para o futuro		
<sum c>	Parte 2
<sum c1>SENTENÇA E TUTELA INIBITÓRIA
<sum1>	1.	Considerações iniciais		
<sum1>	2.	O escopo repressivo da sentença condenatória		
<sum1>	3.	A sentença condenatória e a sua correlação com a execução forçada		
<sum1>	4.	As motivações culturais da sentença condenatória 		
<sum2>	4.1	O princípio nemo ad factum praecise cogi potest		
<sum3>	4.1.1	Observações prévias		
<sum3>	4.1.2	A tese que relaciona a diversidade de tratamento dado ao não-comparecimento em juízo com a diferente evolução do uso das medidas de coerção para garantir o adimplemento da sentença na Alemanha e na França		
<sum3>	4.1.3	O sistema feudal e o seu reflexo no uso dos meios de coerçãosobre a pessoa		
<sum3>	4.1.4	A preservação da autoridade do Estado como fundamento do uso das medidas de coerção		
<sum3>	4.1.5	O Código Napoleão e sua influência sobre o conceito de sentença condenatória		
<sum3>	4.1.6	A doutrina brasileira e os valores submersos no art. 920 do CC de 1916		
<sum2>	4.2	A concepção liberal de jurisdição como função meramente declaratória e o seu reflexo sobre o conceito de sentença condenatória		
<sum2>	4.3	A expansão do conceito de obrigação e a universalização da sentença condenatória 		
<sum1>	5.	A crise da sentença condenatória e a tentativa de reconstrução do seu conceito na Itália		
<sum2>	5.1As razões da tentativa de reconstrução do conceito de sentença condenatória na Itália		
<sum2>	5.2	A importância da leitura constitucional do direito de ação. O princípio constitucional da efetividade e o entendimento de que o direito à adequada tutela jurisdicional garante o direito às medidas coercitivas		
<sum2>	5.3	O valor do princípio chiovendiano de que o processo deve dar a quem tem um direito tudo aquilo e exatamente aquilo que tem o direito de obter		
<sum2>	5.4	A tese de Proto Pisani: uma tentativa de reformulação do conceito de condenação		
<sum2>	5.5	A crítica de Chiarloni		
<sum2>	5.6	A situação atual na doutrina italiana		
<sum2>	5.7	Propostas de modificação do Código de Processo Civil italiano		
<sum1>	6.	A doutrina brasileira e a natureza das sentenças dos arts. 287 e 461 do CPC brasileiro		
<sum1>	7.	A doutrina brasileira e a sentença mandamental		
<sum1>	8.	A natureza da sentença que se liga à coerção indireta		
<sum1>	9.	A sentença executiva, a tutela dos direitos reais e a tutela contra o ato contrário ao direito	
<sum1>	10. 	A Lei 11.232/05 e as sentenças condenatória, mandamental e executiva
<sum1>	11.	A inefetividade da sentença condenatória para a tutela dos direitos absolutos. A correlação entre a tutela inibitória e a estrutura do direito substancial: crítica
<sum1>	12.	A relativização do binômio direito/processo e a retomada do tema da “tutela dos direitos”		
<sum1>	13.	Classificação das sentenças e classificação das tutelas		
<sum1>	14.	Premissas para uma classificação das tutelas permeada pelo direito material		
<sum1>	15.	Esboço de uma classificação das tutelas aderente ao direito material		
<sum>CONCLUSÃO		
<sum>BIBLIOGRAFIA		
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<tit>INTRODUÇÃO
<texto>O movimento pelo “acesso à justiça” constitui a expressão de uma radical transformação do pensamento jurídico em um grande número de países.� A questão do “acesso” permitiu ver a ilusão do desejo de se pensar o direito processual à distância do direito substancial e da realidade social. Quebrou-se, por assim dizer, quando se descobriu que o processo não vinha servindo às pessoas, o “encanto”, ou a ilusão, de que o direito processual pudesse ser tratado como “ciência pura”, que se mantivesse eternamente distante do direito material e das vicissitudes dos homens de carne e osso.
A tomada de consciência de que o processo deve servir plenamente àqueles que, dentro do círculo social, podem envolver-se em conflitos – sejam empresários ou trabalhadores, ricos ou pobres –, fez com que o direito processual assumisse uma postura mais humana, ou mais preocupada com os problemas sociais, econômicos e psicológicos que gravitam ao redor de suas conceituações e construções técnicas.
Ao mesmo tempo em que o direito processual faz importantes laços com outras disciplinas, como a sociologia e a economia, redescobre-se, através de uma penosa e árdua constatação, a ineliminável relação entre o processo e o direito substancial. Afirma-se que o processo deve atender aos desígnios do direito material e estar atento à realidade social, pensando-se no que se denominou “efetividade do processo”.
A vertiginosa transformação da sociedade e o surgimento de novas relações jurídicas exigem que a técnica passe a ser manipulada de modo a permitir a adaptação do processo às novas realidades e à tutela das várias, e até então desconhecidas, situações de direito substancial.
Apesar dos avanços em termos de tutela coletiva, e mesmo de superação do procedimento ordinário, com a introdução no Código de Processo Civil da tutela antecipatória, há um ponto da mais alta importância que ainda é negligenciado pela doutrina. Trata-se da tutela preventiva, a única capaz de impedir que os direitos não patrimoniais sejam transformados em pecúnia, através de uma inconcebível expropriação de direitos fundamentais para a vida humana.
A importância da tutela preventiva pode ser percebida, em todas as sociedades modernas, a partir da necessidade de se conferir tutela jurisdicional adequada às novas situações jurídicas, freqüentemente de conteúdo não patrimonial ou prevalentemente não patrimonial, em que se concretizam os direitos fundamentais do cidadão.�
O sistema tradicional de tutela dos direitos, estruturado sobre o procedimento ordinário e as sentenças da classificação trinária, é absolutamente incapaz de permitir que os novos direitos sejam adequadamente tutelados. Esse modo de conceber a proteção dos direitos não levou em consideração a necessidade de tutela preventiva, nem obviamente os direitos que atualmente estão a exigir tal modalidade de tutela.
A questão, porém, não se resume apenas a buscar, em determinada norma, o fundamento para a tutela preventiva; é preciso remodelar alguns conceitos fundamentais da teoria do processo. A reformulação das categorias do processo é uma decorrência natural da evolução do tempo e de realidades que não mais se adaptam às conceituações pretéritas. Mais do que isso, o surgimento de novos conceitos é uma necessidade que advém da alteração dos valores e, portanto, da sensibilidade do doutrinador; a remodelação dos conceitos, em outras palavras, também é fruto da mudança dos valores que inspiram as criações teóricas.
A introdução do art. 461 no Código de Processo Civil, confere importante oportunidade para extrair do tecido normativo uma nova tutela jurisdicional, ou seja, uma tutela que seja efetivamente capaz de prevenir o ilícito. Essa tutela não só chama a atenção dos civilistas para o equívoco da unificação das categorias da ilicitude e da responsabilidade civil, que espelha a idéia, bastante difundida, de que a única tutela contra o ilícito é a de reparação do dano, mas também faz surgir, no plano do direito processual, uma tutela alternativa àquelas que sempre estiveram sob os cuidados dos processualistas.
A busca de uma tutela inibitória atípica, que atue nas formas individual e coletiva, exige laboriosa análise do perfil dogmático da tutela de prevenção do ilícito e de uma série de questões que gravitam em sua órbita, como, v.g., as da fungibilidade da tutela inibitória e de seu modo de execução.
A tutela inibitória, contudo, não só reafirma a superação do mito da ordinariedade, resultado da confusão entre a instrumentalidade do processo e sua pretendida neutralidade em relação ao direito material, como também deixa evidente a insuficiência da classificação trinária, já que as sentenças declaratória e condenatória, conforme ficará evidenciado mais tarde, são incapazes de permitir a prevenção do ilícito.
Como a tutela preventiva sempre foi prestada, embora na forma sumária, sob o manto protetor da tutela cautelar, não é possível deixar de lado o árduo problema da distinção entre a tutela inibitória e a tutela cautelar. Pensando-se o processo em termos de tutela dos direitos, é fácil perceber que a tutela jurisdicional, seja sumária ou final, não pode mais ser classificada com base em critérios processuais, mas sim de modo a dar conta de sua efetiva interligação com o plano do direito material. Esse modo de ver a tutela jurisdicional, ao responder à exigência de relativização do binômio direito/processo, permite não só distinguir a tutela preventiva da tutela cautelar, mas também classificar as tutelas finais a partir de seus pontos de contato, que devem demonstrar uma peculiar função da tutela jurisdicional em relação ao direito material.�
Trata-se, portanto, de procurar definir os fundamentos e os contornos de uma nova tutela jurisdicional,� e de analisar o impacto dessa tutela sobre a classificação tradicional das sentenças e das tutelas. É claro que tudo isso somente é possível porque o processo é pensado a partir de outro ângulo visual – pensar o processo em termos de “tutela dos direitos” é assumir nova postura perante o direito processual – capaz de romper com a ilusão de que as categorias do direito processual possam ser construídas ao redor de uma ação una e abstrata e, portanto, de um pólo metodológico que simplesmente ignorea necessidade de o processo ser manchado pelas tintas do direito material a que deve dar resposta.
Essa obra, ao pretender apresentar uma nova tutela jurisdicional, embora possa parecer ousada, é fundamental para a efetividade da tutela de direitos muito significativos na vida social. É por essa razão, deixe-se absolutamente claro, que aceitamos o risco de enfrentar um tema novo e extremamente difícil como o da tutela inibitória. Na verdade, não é possível viver sem riscos, até porque, como dizia Freud, para se fazer alguma coisa que valha a pena é preciso ser sem escrúpulos, expor-se, arriscar-se, trair-se, comportar-se como o artista que compra tintas com o dinheiro da casa e queima os móveis para que a modelo não sinta frio; sem algumas dessas ações criminosas, de fato, não se pode fazer nada direito.�
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<titpart>Parte 1
<titpart>A TUTELA INIBITÓRIA:
UMA NOVA TUTELA
<titpart>JURISDICIONAL
<tit>1
<tit1>O PROCESSO CIVIL CLÁSSICO
E A AUSÊNCIA DE UMA TUTELA
JURISDICIONAL REALMENTE PREVENTIVA
<texto>O procedimento de cognição plena e exauriente, complementado pelas três sentenças da classificação trinária, é absolutamente incapaz de propiciar uma tutela preventiva adequada.
<texto>Este modelo de “processo”, que pode ser chamado de “processo civil clássico”, além de refletir, sobre o plano metodológico, as exigências da escola sistemática,� baseadas na necessidade de isolar o processo do direito material, � espelha os valores do direito liberal, fundamentalmente a neutralidade do juiz, a autonomia da vontade, a não ingerência do Estado nas relações dos particulares e a incoercibilidade do facere.
<texto>O procedimento ordinário, caracterizado por ser um procedimento alheio ao que se passa no plano do direito material, é a maior prova de que o isolamento do processo não produziu bons resultados, haja vista a crescente preocupação com as chamadas tutelas jurisdicionais diferenciadas, � imprescindíveis para a proteção efetiva de determinadas situações de direito substancial e, portanto, alternativas à neutralidade imposta pela ordinariedade.
<texto>A tutela antecipatória, ao permitir o tratamento diferenciado dos direitos evidentes, de certa forma remediou o procedimento ordinário, dele expulsando a proibição de julgamento mediante verossimilhança, o qual certamente não seria do gosto de uma doutrina interessada em ver o juiz como a bouche de la loi. �
<texto>A existência de tutela antecipatória, entretanto, não basta para viabilizar a tutela preventiva, até porque a tutela antecipatória não tem nada a ver com a necessidade de prevenção do ilícito, mas sim com a necessidade de distribuição do ônus do tempo do processo.
<texto>Um dos grandes obstáculos para a tutela preventiva está presente na própria classificação trinária, já que nenhuma das sentenças desta classificação tem a virtude de propiciar a tutela preventiva.
<texto>A doutrina chiovendiana, ao tratar da ação declaratória, estava mais preocupada com uma exigência de construção sistemática do que com a eventual função preventiva que poderia ser exercida pela simples declaração, sabido que a ação declaratória constituiu-se em um importante elemento para a demonstração da autonomia da ação em relação ao direito substancial. �
<texto>Aliás, nem poderia ser de outra forma, pois a escola chiovendiana formou-se sob a influência de um modelo de Estado de matriz liberal, marcado por uma inegável acentuação dos valores da liberdade individual sobre os poderes de intervenção do Estado, o que se reflete nitidamente no conceito de sentença declaratória, compreendida como uma sentença que se limita a regular formalmente uma relação jurídica já determinada em seu conteúdo pela autonomia privada. �
<texto>A sentença declaratória, contudo, exatamente porque não determina um fazer ou um não fazer, é impotente para permitir a prevenção do ilícito e, principalmente, a tutela dos direitos não patrimoniais.
<texto>Não só a sentença declaratória, mas também a sentença condenatória, por definição correlacionada com a execução por sub-rogação, demonstram o valor que a doutrina processual clássica deu ao princípio da incoercibilidade do facere. É inegável que atrás do conceito de condenação esconde-se uma opção pela incoercibilidade do facere, o que é absolutamente compreensível quando se considera o ambiente cultural em que o conceito de sentença condenatória foi moldado. 
<texto>O conceito de condenação foi influenciado pelas doutrinas que inspiraram o Code Napoléon, pelo qual “toda obrigação de fazer ou não fazer resolve-se em perdas e danos e juros, em caso de descumprimento pelo devedor” (art. 1.142). 
<texto>A correlação da condenação com a execução por sub-rogação, além de expressar os valores liberais, revela que o sistema clássico de tutela dos direitos não foi pensado para permitir a tutela preventiva, ou ainda que a doutrina clássica não se preocupava com a tutela preventiva dos direitos, o que certamente tinha relação com a idéia de que a única tutela contra o ilícito constituía-se na reparação do dano. 
<texto>Note-se, aliás, que a tutela ressarcitória pelo equivalente, ao contrário da tutela preventiva, permite que a “tutela jurisdicional” seja pensada à distância do direito material. Na tutela ressarcitória, importando apenas a realização do direito de crédito que corresponde à lesão do direito, a técnica sub-rogatória tem condições de atuar de forma completamente independente da natureza do direito material tutelado, o que não acontece quando se pensa na tutela específica e, evidentemente, na tutela preventiva. �
<texto>Se a sentença declaratória não é hábil para permitir a prevenção, e se a sentença condenatória tem um nítido escopo repressivo, não há possibilidade de se encontrar, dentro da classificação trinária das sentenças, uma via adequada para a tutela dos direitos não patrimoniais, o que revela uma total incapacidade do processo civil clássico para lidar com as relações mais importantes da sociedade contemporânea.
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<tit>2
<tit1>A NECESSIDADE DE UM
NOVO MODELO PROCESSUAL 
<texto>Se o processo civil tradicional não é capaz de garantir de forma adequada os direitos, é preciso pensar, urgentemente, em um novo modelo processual.
<texto>O processo civil deve estar estruturado de modo a viabilizar a adequada tutela dos direitos. Neste sentido, não cabe confundir o modelo processual (vale dizer, os procedimentos) com a tutela que por eles deve ser prestada. Os procedimentos são diferentes exatamente pela razão de que devem se amoldar às diversas espécies de direitos que obrigam o cidadão a buscar o Judiciário. Os procedimentos variam de acordo com a cognição que lhes é inerente (procedimento ordinário de conhecimento, procedimento do mandado de segurança, procedimento cautelar etc.), por permitirem a aceleração dos atos processuais (procedimento ordinário, sumário etc.), por abrirem oportunidade à antecipação da tutela, e por trabalharem com sentenças e meios de execução diversificados.
<texto>É preciso compreender que o direito de ação não pode mais ser pensado como simples direito à sentença, mas sim como o direito ao modelo processual capaz de propiciar a tutela do direito afirmado em juízo. Se o cidadão deve buscar o Judiciário, e esse possui a obrigação de lhe prestar a efetiva tutela de seu direito, é evidente que, por meio da ação, o direito afirmado deve encontrar caminho para que, quando reconhecido, possa ser efetivamente tutelado. Portanto, o exercício do direito de ação não se exaure com a apresentação da petição inicial, mas apenas no momento em que o processo é finalizado, inclusive, se necessário, com a prática dos meios de execução. Entretanto, e como é lógico, o direito de ação existirá ainda que o direito material não seja reconhecido. A sentença de improcedência, ao negar a tutela do direito, presta tutela jurisdicional. Mas quando se olha para uma técnica processual que reconhece o direito afirmado (sentença de procedência ou decisão que antecipa a tutela), passaa ser correto falar nas várias tutelas dos direitos, ou melhor, nas diferentes tutelas que as diversas situações de direito material exigem (tutela inibitória etc.).
<texto>A necessidade de tutela preventiva exige a estruturação de um procedimento autônomo e que desemboque em uma sentença que possa impedir a prática, a repetição ou a continuação do ilícito. Além disso, a tutela de prevenção do ilícito requer um procedimento estruturado com técnica antecipatória, pois o direito que se visa proteger através da tutela preventiva tem, em regra, grande probabilidade de ser lesado no curso do processo. De outro modo, a tutela preventiva pode ser transformada em tutela ressarcitória, ou o direito em pecúnia, mediante uma injusta expropriação imposta pelo próprio tempo que o Estado exige para tutelar o direito que ele mesmo consagra.
<texto>Ademais, é necessário compreender, para a efetividade da tutela preventiva, quais são os seus pressupostos (mediante a distinção entre ato contrário ao direito e dano), evitando-se que o procedimento a ela referente seja povoado por questões impertinentes.
<texto>Um procedimento desse tipo é absolutamente imprescindível em um ordenamento jurídico que se empenha em dar efetividade aos direitos que consagra, especialmente aos direitos não patrimoniais, os quais evidentemente não podem ser tutelados de forma adequada através de procedimentos que finalizam nas sentenças da classificação trinária.
<texto>A imprescindibilidade de um novo modelo processual, caracterizado pela possibilidade de antecipação da tutela e de sentença que não se enquadre na classificação trinária, é o reflexo da tomada de consciência de que os direitos precisam ser tutelados de forma preventiva, especialmente porque a nossa própria Constituição Federal, fundada na dignidade da pessoa humana (art. 1.º, III), não só garante uma série de direitos não patrimoniais, como afirma expressamente o direito de acesso à justiça diante de “ameaça a direito” (art. 5.º, XXXV). Pesa, portanto, sobre a doutrina processual, a grave e importante incumbência de elaborar, teoricamente, um modelo de tutela jurisdicional adequado aos valores do tempo presente.
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<tit>3
<tit1>A TUTELA INIBITÓRIA
<s>SUMÁRIO: 3.1 Considerações iniciais – 3.2 A tutela inibitória e a problemática do ilícito – 3.3 A inibitória tutela contra o ilícito – 3.4 A tutela inibitória e a questão da culpa – 3.5 Os diferentes escopos da tutela inibitória – 3.6 A cognição e a prova na ação inibitória – 3.7 A prova indiciária diante da ação inibitória: 3.7.1 Primeiras considerações; 3.7.2 “Juízo-instrumental”, presunção, “juízo-resultado”, “juízo-provisório” e “juízo-final”; 3.7.3 O controle da admissão da prova para a demonstração do fato indiciário; 3.7.4 A importância do senso comum para o raciocínio fundado a partir da prova indiciária; 3.7.5 A importância do senso comum para a formação do juízo a partir da presunção – 3.8 A necessidade de atuação concreta da norma e a importância da ação inibitória – 3.9 A autonomia da ação inibitória – 3.10 A inaptidão do antigo art. 287 para garantir uma tutela jurisdicional adequada e a confusão que se instalou entre a tutela preventiva e a tutela cautelar. A dificuldade de se perceber, hoje, a relação entre a tutela das obrigações de fazer e de não fazer e a tutela inibitória – 3.11 A ação inibitória é corolário de um princípio geral de prevenção – 3.12 Direito à tutela inibitória, técnica processual e tutela jurisdicional inibitória – 3.13 O art. 461 como fundamento processual da tutela inibitória – 3.14 O art. 12, caput, do novo Código Civil – 3.15 A tutela inibitória no plano coletivo –3.15.1 Os arts. 11 da Lei da Ação Civil Pública e 84 do CDC. O sistema brasileiro de tutela coletiva ampara a tutela inibitória – 3.15.2 A problemática da tutela inibitória a partir do controle dos atos do Poder Público – 3.15.3 A tutela inibitória em caso de omissão do Poder Público – 3.15.4 A tutela coletiva do consumidor contra o uso de cláusulas gerais abusivas – 3.16 As técnicas processuais, presentes nos arts. 461, CPC, e 84, CDC, viabilizam a concessão de várias tutelas – 3.17 A razão para se falar em tutela inibitória – 3.18 A tutela inibitória negativa e a tutela inibitória positiva – 3.19 A multa e a tutela inibitória que impõe um fazer fungível – 3.20 A plasticidade da tutela inibitória e os limites para a imposição do fazer e do não fazer: 3.20.1 Breve observação inicial – 3.20.2 Os princípios do meio idôneo e da menor restrição possível como vetores para o adequado uso da tutela inibitória – 3.21 Tutela inibitória e tutela de remoção do ilícito – 3.22 A fungibilidade da tutela inibitória: 3.22.1 Breves observações sobre o princípio da congruência entre o pedido e a sentença; 3.22.2 Os arts. 461 do CPC e 84 do CDC como exceções ao princípio de que a sentença deve ficar adstrita ao pedido; 3.22.3 A sub-rogação de uma obrigação em outra para a obtenção da tutela específica ou do resultado prático equivalente ao do adimplemento; 3.22.4 O poder decisório do juiz e o princípio da efetividade; 3.22.5 O poder decisório do juiz e o princípio da necessidade; 3.22.6 A fungibilidade da tutela inibitória reafirma a idéia da fungibilidade da tutela de segurança, que sempre esteve na base da “tutela cautelar” – 3.23 O pedido de tutela inibitória e as violações de eficácia instantânea suscetíveis de repetição no tempo – 3.24 Tutela inibitória e cumulação de pedidos. A tutela antecipatória mediante o julgamento antecipado de pedido inibitório cumulado com pedido ressarcitório – 3.25 A importância da audiência preliminar à luz da experiência anglo-americana do undertaking do réu – 3.26 A tutela inibitória antecipada: 3.26.1 Primeiras considerações; 3.26.2 A quebra da regra da nulla executio sine titulo; 3.26.3 A tutela inibitória antecipada na ação inibitória; 3.26.4 A evidente distinção entre tutela inibitória antecipada e tutela cautelar – 3.27 A execução da tutela inibitória: 3.27.1 A tutela inibitória e a multa – 3.27.2 Outras medidas de execução.
<a>3.1	Considerações iniciais
<texto>Não há no direito brasileiro qualquer incursão teórica voltada a estabelecer uma tutela jurisdicional preventiva atípica que possa ser prestada através do processo de conhecimento. Contudo, se os cidadãos devem ter a sua disposição instrumentos processuais adequados para a tutela de seus direitos, é necessário que seja elaborada uma tutela jurisdicional idônea à prevenção do ilícito.
<texto>Tal tutela, a nosso ver, pode ser denominada de inibitória, à semelhança do que ocorre no direito italiano, onde existem tentativas – embora reduzidas – de se pôr em relevo uma tutela inibitória atípica.� Anote-se, desde logo, que o direito italiano, da mesma forma que o nosso, conhece hipóteses típicas de tutela inibitória, mas há na doutrina italiana uma séria dúvida acerca da existência de uma tutela inibitória atípica.
<texto>Ainda que o direito italiano viva a dúvida da atipicidade da inibitória, a doutrina tem posto em destaque os pontos comuns das inibitórias típicas, o que consubstancia um importante trabalho, à medida que define os contornos da tutela inibitória, conferindo segurança aos operadores jurídicos no uso do instrumento adequado a prevenir o ilícito. �
<texto>O estudo da inibitória, no direito brasileiro, � deve ter por meta construir os seus próprios elementos – e não apenas evidenciar a necessidade da prevenção do ilícito –, permitindo que se vislumbre com nitidez sua fisionomia em face das outras formas de tutela, como a tutela cautelar.
<texto>A tutela inibitória, configurando-se como tutela preventiva, visa a prevenir o ilícito, culminando por apresentar-se, assim, como uma tutela anterior à sua prática, e não como uma tutela voltada para o passado, como a tradicional tutela ressarcitória.
<texto>Quando se pensa em tutela inibitória, imagina-se uma tutela que tem por fim impedir a prática, a continuação ou a repetição do ilícito, e não uma tutela dirigida à reparação do dano. Portanto, o problema datutela inibitória é a prevenção da prática, da continuação ou da repetição do ilícito, enquanto o da tutela ressarcitória é saber quem deve suportar o custo do dano, independentemente do fato de o dano ressarcível ter sido produzido ou não com culpa. �
<texto>Se não é possível confundir tutela inibitória com tutela ressarcitória é porque a tutela inibitória não é uma tutela contra o dano, não exigindo, portanto, os mesmos pressupostos da tutela ressarcitória.
<texto>Como já se pode perceber, a configuração de uma tutela genuinamente preventiva implica a quebra do dogma – de origem romana – de que a única e verdadeira tutela contra o ilícito é a de reparação do dano ou a tutela ressarcitória, ainda que na forma específica. �
<texto>A confusão entre ilícito e dano é o reflexo de um árduo processo de evolução histórica que culminou por fazer pensar – através da suposição de que o bem juridicamente protegido é a mercadoria, isto é, a res dotada de valor de troca – que a tutela privada do bem é o ressarcimento do equivalente ao valor econômico da lesão. � A identificação de ilícito e dano não deixa luz para a doutrina enxergar outras formas de tutela contra o ilícito; não é por outra razão, aliás, que o grande exemplo de tutela inibitória no direito brasileiro está no interdito proibitório, a refletir valores liberais clássicos e privatísticos.
<texto>A unificação da categoria da ilicitude com a da responsabilidade civil, fruto da idéia – que é resultado de uma visão “mercificante” dos direitos – de que a única tutela contra o ilícito consiste na reparação do dano, ainda está presente na doutrina do direito civil brasileiro. Anote-se, apenas como exemplo, a seguinte passagem da obra de Orlando Gomes: “Não interessa ao Direito Civil a atividade ilícita de que não resulte prejuízo. Por isso, o dano integra-se na própria estrutura do ilícito civil. Não é de boa lógica, seguramente, introduzir a função no conceito. Talvez fosse preferível dizer que a produção do dano é, antes, um requisito da responsabilidade, do que do ato ilícito. Seria este simplesmente a conduta contra jus, numa palavra, a injúria, fosse qual fosse a conseqüência. Mas, em verdade, o Direito perderia seu sentido prático se tivesse de ater-se a conceitos puros. O ilícito civil só adquire substantividade se é fato danoso”. �
<texto>Compreendendo-se que a tutela jurisdicional contra o ilícito não se destina, necessariamente, a reparar o dano, abre-se oportunidade à construção de uma tutela inibitória atípica, destinada a operar em face dos diversos casos conflitivos concretos que dela careçam. �
<texto>A tutela inibitória é uma tutela específica, pois objetiva conservar a integridade do direito, assumindo importância não apenas porque alguns direitos não podem ser reparados e outros não podem ser adequadamente tutelados através da técnica ressarcitória, mas também porque é melhor prevenir do que ressarcir, o que equivale a dizer que no confronto entre a tutela preventiva e a tutela ressarcitória deve-se dar preferência à primeira. �
<texto>A tutela ressarcitória, na maioria das vezes, substitui o direito originário por um direito de crédito equivalente ao valor do dano verificado e, nesse sentido, tem por escopo apenas garantir a integridade patrimonial dos direitos; já a inibitória, que não tem qualquer caráter sub-rogatório, destina-se a garantir a integridade do direito em si. �
<texto>A tutela inibitória é caracterizada por ser voltada para o futuro, � independentemente de estar sendo dirigida a impedir a prática, a continuação ou a repetição do ilícito. Note-se, com efeito, que a inibitória, ainda que empenhada apenas em fazer cessar o ilícito ou a impedir a sua repetição, não perde a sua natureza preventiva, pois não tem por fim reintegrar ou reparar o direito violado.
<texto>Falamos em “tutela” inibitória porque entendemos que o sistema de tutela dos direitos deve deixar de ser pensado em torno da ação una e abstrata e passar a ser compreendido em termos de “tutela”, ou melhor, a partir dos resultados que a tutela jurisdicional proporciona aos consumidores do serviço jurisdicional. Deixe-se claro, portanto, que a expressão tutela nada tem a ver com o fato de o resultado perseguido pelo autor ser obtido através de uma tutela que não é de cognição exauriente, mas de cognição sumária, como as tutelas antecipatória e cautelar.
<texto>A tutela inibitória é requerida via ação inibitória, que constitui ação de cognição exauriente. Nada impede, contudo, que a tutela inibitória seja concedida antecipadamente, no curso da ação inibitória, como tutela antecipatória. Ao contrário, considerada a natureza da inibitória, é fácil perceber que em grande número de casos apenas a inibitória antecipada poderá corresponder ao que se espera da tutela preventiva.
<texto>A inibitória funciona, basicamente, através de uma decisão ou sentença capaz de impedir a prática, a repetição ou a continuação do ilícito, o que permite identificar o fundamento normativo-processual desta tutela nos arts. 461 do CPC e 84 do CDC.
<texto>Perceba-se que no direito brasileiro, ao contrário do que ocorre no direito italiano, não há qualquer dificuldade para se conceber a inibitória como tutela atípica. A grande dificuldade de se admitir a atipicidade da inibitória na Itália advém do fato de o direito italiano não consagrar a atipicidade de uma sentença que possa impor um fazer ou um não fazer sob pena de multa. No Brasil não há este problema, uma vez que os arts. 461 do CPC e 84 do CDC - que tratam das obrigações de fazer e de não-fazer – abrem oportunidade às sentenças mandamental e executiva, sem qualquer alusão a uma específica situação de direito substancial. Em outros termos, a tutela inibitória pode ser postulada diante de qualquer tipo de direito, e não apenas em face de situações de direito material expressamente previstas na lei.
<texto>Aliás, o fundamento maior da inibitória, ou seja, a base de uma tutela preventiva geral, encontra-se – como será melhor explicado mais tarde – na própria Constituição Federal, precisamente no art. 5.º, XXXV, que estabelece que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, e exatamente por isto não há como pensar que a inibitória somente pode servir a certos direitos.
<a>3.2	A tutela inibitória e a problemática do ilícito
<texto>Uma das mais importantes conquistas da doutrina italiana mais recente está na distinção – elaborada a partir de uma revisão do conceito de ilícito – entre ato ilícito e fato danoso. �
<texto>A necessidade de uma tutela antecedente ao dano, de conteúdo nitidamente preventivo, levou os estudiosos a tentar explicar o fundamento e a finalidade desse tipo de tutela. Se a tutela não visa a reparar o dano, qual seria o seu fundamento e escopo? Esta pergunta foi respondida, no curso da evolução da doutrina, de várias formas.
<texto>Afirmou-se, em uma doutrina elaborada há bastante tempo, que a “ação” (física), em alguns casos, pode não resultar em um evento danoso; lembrou-se, ainda, que podem ser praticados atos preparatórios voltados a uma finalidade sem que a ação seja praticada e que, também, uma ação pode ser apenas anunciada como um propósito, sem que qualquer ato seja praticado. Muito embora não verificado o dano ou mesmo praticada a ação, entendeu-se que a prática da ação, dos atos preparatórios ou o simples anúncio da ação como conteúdo de um propósito, não poderiam deixar de ter significado. Foi aí que surgiu a distinção, realizada no interior da categoria da ilicitude civil, entre o “ilícito de perigo” e o “ilícito de lesão”. �
<texto>Essa distinção, que foi feita por Candian, parece ser uma das tentativas iniciais de se explicar a diferença entre a tutela preventiva e a tutela ressarcitória, a primeira voltada contra o ilícito de perigo e a segunda dirigida contra o ilícito de lesão. �
<texto>Candian, ao mencionar uma série de casos que configurariam exemplos de tutela contra o ilícito de perigo, agrupa em uma mesma categoria a tutelacautelar e a tutela inibitória, realizando uma sensível ampliação da noção tradicional de ato conservativo. � Porém, transparece da doutrina de Candian uma preocupação em evitar o dano e não o ato contrário ao direito; quando Candian fala em ilícito de perigo, como categoria contraposta à de ilícito de lesão, fica claro que o ilícito de perigo diz respeito a um perigo de dano. É evidente, portanto, que a elaboração de Candian não pode ser aceita como adequada à explicação da tutela preventiva, � já que marcada por uma preocupação em evitar o dano e não o ato contrário ao direito. �
<texto>Lodovico Barassi, um outro conhecido civilista italiano, tratando da “prevenzione del fatto danoso”, pergunta se é admitida, no direito italiano, uma ação destinada “a prevenir as lesões jurídicas”. Segundo ele, uma ação desse tipo objetiva fazer cessar um estado atual de coisas que necessariamente deve conduzir a uma futura lesão; uma ação dirigida sobretudo a obter que uma pessoa desista de um determinado comportamento, ou mesmo o modifique. �
<texto>Ao descrever alguns casos que constituiriam exemplos de tutela preventiva, alerta Barassi que as situações às quais as ações preventivas fariam referência constituiriam o ilícito de perigo, que se distinguiria, assim, do ilícito de lesão. �
<texto>Barassi deixa transparecer com toda nitidez que a tutela preventiva é voltada a prevenir o dano, o que não o impede, portanto, de aderir à terminologia utilizada por Candian, e de falar de “ilícito de perigo” e de “ilícito de lesão”. A tutela dirigida a fazer cessar uma atividade ilícita (ilícito de perigo) teria natureza preventiva porque destinada a impedir um futuro dano.
<texto>Segundo Barassi, a tutela preventiva pode ser utilizada para impedir a continuação de um estado atual de coisas que já provocou um dano, mas que ainda pode provocar outro, e mesmo para impedir a continuação de um estado atual de coisas que, ainda que não tenha causado algum dano, provavelmente pode ocasioná-lo. �
<texto>A posição de Barassi merece a mesma crítica que foi endereçada à doutrina de Candian. Barassi, ao falar em ilícito de perigo, alude a um estado atual de coisas (uma atividade ilícita continuativa) que pode causar dano. A tutela contra o ilícito de perigo, portanto, seria uma tutela contra o perigo de dano.
<texto>Um dos temas que certamente motivou a doutrina italiana a estabelecer a distinção entre ilícito e dano foi, sem dúvida, o da tutela contra a concorrência desleal. Para que se compreenda a razão pela qual a doutrina foi obrigada a estudar o ilícito com vistas a melhor entender essa tutela, é necessário perceber a própria estrutura normativa da tutela contra a concorrência desleal, que fez surgir, na realidade, diversas espécies de tutelas voltadas à proteção do empresário. �
<texto>O Código Civil italiano, ao tratar do assunto, além de estabelecer quais são os atos que configuram concorrência desleal, prevê três espécies de tutela: a tutela inibitória, a tutela reintegratória e a tutela ressarcitória.
<texto>Afirma o art. 2.599 que a sentença que declara a existência de atos de concorrência desleal inibe a sua continuação e confere as providências necessárias a fim de que sejam eliminados os seus efeitos. O art. 2.600, complementando o leque da tutela jurisdicional contra a concorrência desleal, dispõe que, se os atos são praticados com dolo ou culpa, o seu autor fica obrigado a ressarcir o dano.
<texto>O art. 2.599, ao disciplinar a tutela inibitória e a tutela que tem por fim remover os efeitos dos atos praticados, não fala em culpa ou dolo, enquanto o art. 2.600, ao disciplinar a reparação do dano, exige a culpa ou o dolo.
<texto>O art. 2.043 do CC italiano afirma que qualquer fato doloso ou culposo, que ocasione a outrem um dano injusto, obriga ao ressarcimento do dano. Uma vez que a tutela contra a concorrência desleal, de lado a própria tutela ressarcitória, não requer dano, culpa ou dolo, tornou-se necessária a separação das tutelas inibitória e reintegratória contra a concorrência desleal da tutela contra o dano (por ela produzido), que até então era vista como a única tutela contra o ilícito.
<texto>Parte da doutrina, ainda ligada à idéia de que o ilícito requer o dano, chegou a propor uma dicotomia dos atos de concorrência desleal, os quais, quando culposos e danosos, ficariam enquadrados no conceito de ato ilícito, e em hipótese diversa classificados de modo totalmente autônomo. �
<texto>Uma outra parte da doutrina, porém, tentou distanciar conceitualmente o ilícito que abre ensejo para as tutelas inibitória e reintegratória contra a concorrência desleal do ilícito tal como vinha sendo traçado, ou seja, do ilícito que requer necessariamente o dano.
<texto>Esta doutrina estabelece algumas premissas que são fundamentais dentro do esforço de revisão do conceito de ilícito. Afirmou-se, basicamente, que o art. 2.043 do CC italiano não descreve o ilícito – como supunha a doutrina mais antiga –, mas apenas configura a responsabilidade pelo dano. Deduziu-se, nesta linha, que a tutela ressarcitória não é a única forma de tutela contra o ilícito� e que a culpa é uma condição (geralmente) necessária para o ressarcimento do dano, mas não para a ilicitude do ato. �
<texto>Para evidenciar que o dano não é elemento constitutivo do ilícito, argumentou-se que, quando se diz que não há ilícito sem dano, identifica-se o ato contra ius com aquela que é a sua normal conseqüência, e isto ocorreria apenas porque o dano é o sintoma sensível da violação da norma. A confusão entre ilícito e dano seria o reflexo do fato de que o dano é a prova da violação e, ainda, do aspecto de que entre o ato ilícito e o dano subsiste freqüentemente uma contextualidade cronológica que torna difícil a distinção dos fenômenos, ainda que no plano lógico. �
<texto>Bonasi Benucci distinguiu perigo e dano, argumentando que o dano é uma conseqüência normal da periculosidade do ilícito e de sua capacidade de provocar dano. O perigo, nesta concepção, é elemento constitutivo do ilícito (o ilícito é sempre de perigo), enquanto o dano, por ser uma conseqüência meramente eventual da violação, é um elemento extrínseco a sua fattispecie constitutiva. �
<texto>Note-se que esta elaboração doutrinária difere daquela construída por Candian, � já que a concepção de Benucci não fala em ilícito de perigo e ilícito de lesão, mas apenas em ilícito que guarda em si, necessariamente, o perigo de dano. Há uma unidade conceitual para o ilícito, que seria, em poucas palavras, o ato contra ius que pode causar dano. �
<texto>Bonasi Benucci, ao inserir na constituição do ilícito o perigo, refere-se ao perigo como uma “potencialidade danosa”, evidenciando, assim, que a tutela contra o ilícito – que seria diferente da tutela contra o dano – é uma tutela contra a probabilidade do dano. �
<texto>Note-se, porém, que se o dano é uma conseqüência meramente eventual e não necessária do ilícito, a tutela inibitória não deve ser compreendida como uma tutela contra a probabilidade do dano, mas sim como uma tutela contra o perigo da prática, da repetição ou da continuação do ilícito, compreendido como ato contrário ao direito que prescinde da configuração do dano. �
<a>3.3	A inibitória tutela contra o ilícito
<texto>Imaginou-se por muito tempo que a lei, por obrigar quem comete um dano a indenizar, não diferenciasse ilícito de dano, ou melhor, considerasse o dano como elemento essencial e necessário da fattispecie constitutiva do ilícito. �
<texto>Entretanto, o dano não é uma conseqüência necessária do ato ilícito. O dano é requisito indispensável para o surgimento da obrigação de ressarcir, mas não para a constituição do ilícito. �
<texto>É óbvio que o dano não pode estar entre os pressupostos da inibitória. Sendo a inibitória uma tutela voltada para o futuro e genuinamente preventiva, é evidente que o dano não lhe diz respeito.
<texto>Na realidade, se o dano não é elemento constitutivo do ilícito, podendo este último existir independentemente do primeiro,não há razão para não se admitir uma tutela que leve em consideração apenas o ilícito, deixando de lado o dano. Da mesma forma que se pode pedir a cessação de um ilícito sem aludir a dano, é possível requerer que um ilícito não seja praticado sem a demonstração de um dano futuro.
<texto>A moderna doutrina italiana, ao tratar do tema, deixa claro que a tutela inibitória tem por fim prevenir o ilícito e não o dano. � Frignani� e Rapisarda, � que possuem as principais obras a respeito da tutela inibitória na Itália, não vacilam em afirmar que a inibitória prescinde totalmente dos possíveis efeitos concretos do ato ou da atividade ilícita, e que a sua dependência deve ficar circunscrita unicamente à possibilidade do ato contrário ao direito (ilícito). �
<texto>A distinção entre ilícito e dano abriu as portas para a doutrina esclarecer que a tutela preventiva objetiva impedir a prática, a continuação ou a repetição do ilícito. A diferenciação entre ilícito e dano não só evidencia que a tutela ressarcitória não é a única tutela contra o ilícito, como também permite a configuração de uma tutela genuinamente preventiva, que nada tem a ver com a probabilidade do dano, mas apenas com a probabilidade do ato contrário ao direito (ilícito).
<texto>É certo que a probabilidade do ilícito é, com freqüência, a probabilidade do próprio dano, já que muitas vezes é impossível separar, cronologicamente, o ilícito e o dano. Contudo, o que se quer deixar claro é que para a obtenção da tutela inibitória não é necessária a demonstração de um dano futuro, embora ele possa ser invocado, em determinados casos, até mesmo para se estabelecer com mais evidência a necessidade da inibitória.
<texto>Estas considerações não são apenas relevantes para o delineamento dogmático da tutela inibitória, mas também para a sua efetiva e adequada aplicação prática.
<a>3.4	A tutela inibitória e a questão da culpa
<texto>Supunha-se, exatamente porque se fazia uma identificação entre ilícito e dano, que o elemento psicológico (dolo ou culpa) fosse absolutamente necessário para a configuração do próprio ilícito.
<texto>Se o ilícito é compreendido através do ponto de vista da responsabilidade civil, torna-se natural não só a confusão entre ilícito e dano, mas também a exigência da culpa (ou do dolo) � como componente do ilícito. �
<texto>Entretanto, dentro da noção de ilícito antes delineada, que se afasta da idéia de dano, não há razão para se cogitar de culpa ou de dolo. De lado a responsabilidade objetiva, o ato do homem é fonte da obrigação de ressarcir porque é culposo ou doloso; tais elementos são relacionados com a responsabilidade pelo dano. �
<texto>O próprio Barassi, ainda que ligando a tutela inibitória à probabilidade de dano, percebeu que “la colpa è imposta per il risarcimento del danno attuale, non per la sua prevenzione”. �
<texto>A tutela inibitória não pune quem pode praticar o ilícito, mas apenas impede que o ilícito seja praticado. Se alguém, ainda que sem culpa, � está na iminência de praticar um ilícito, é cabível a ação inibitória. �
<texto>É importante sublinhar que os tribunais brasileiros têm compreendido tal situação, chegando a afirmar expressamente, algumas vezes, que a sentença “cominatória” prescinde da culpa e do dolo.
<texto>O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ao analisar um caso em que parentes de uma pessoa já falecida pediam indenização e a cessação da veiculação de um filme cinematográfico que atentaria contra o direito à imagem e à honra, determinou que os réus se abstivessem definitivamente de exibir o filme e condenou-os ao pagamento de ressarcimento por danos morais.� Para inibir novas veiculações do filme, impôs multa.
<texto>Na ementa do acórdão, o Tribunal frisou que a indenização por danos morais não deveria tomar por base o valor da multa, que tem “função inibidora e não de ressarcimento”, � devendo ser apurada em liquidação por arbitramento. O que importa, neste julgado, é que o Tribunal, além de ter falado em função inibidora da multa, ou seja, no uso da multa como meio de prevenção da repetição do ilícito, deixou claro que o ressarcimento e, portanto, o dano, não guardam qualquer relação com o valor da multa e, por conseqüência, com a função preventiva. O valor da multa, ao contrário do valor do ressarcimento, não tem nada a ver com o dano, mas apenas com a sua função inibidora e preventiva, que obviamente prescinde do dano e da culpa.
<texto>Outro julgado, emanado do Tribunal de Justiça de São Paulo, é ainda mais expressivo, pois afirma literalmente que é irrelevante, para efeito de tutela da marca, “a existência de dolo ou culpa de comerciante que utiliza em seu nome comercial marca registrada de outrem”. � Não há dúvida, de fato, de que o titular de marca comercial devidamente registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial não precisa demonstrar culpa ou dolo para requerer que o réu seja inibido a deixar de utilizar a sua marca.
<texto>O dano e a culpa não integram a demanda preventiva, o que significa dizer que não fazem parte da cognição do juiz e que, assim, estão obviamente fora da atividade probatória relacionada à inibitória. Na perspectiva da cognição, afasta-se, para a obtenção da inibitória, qualquer necessidade de demonstração de dano e de culpa.
<a>3.5	Os diferentes escopos da tutela inibitória
<texto>Importa, para a tutela inibitória, o ilícito que pode ser praticado, prosseguir ou repetir-se. � Não tem qualquer relevância o ato ilícito que já foi praticado e cuja repetição ou continuação não se teme.
<texto>A tutela inibitória (para impedir a continuação ou a repetição do ilícito) chegou a ser postulada, no direito brasileiro, sob o rótulo de “ação cominatória”, ainda que jamais tenha sido prestada de forma efetiva e adequada.
<texto>Não era incomum, de fato, antes de 1994, o uso da ação cominatória para obrigar alguém a deixar de usar um nome ou uma marca comercial. � Esta tutela, atualmente, pode ser requerida a partir do art. 461 do CPC, em vista do art. 207 da nova Lei da Propriedade Industrial (Lei 9.279, de 14.05.1996), que afirma claramente que, “independentemente da ação criminal, o prejudicado poderá intentar as ações cíveis que considerar cabíveis, na forma do Código de Processo Civil”.
<texto>A ação cominatória também foi utilizada em nome dos direitos da personalidade, como se demonstrou no item anterior. Lembre-se, ainda, que o revogado art. 275, II, j, do CPC, previa ação cominatória para impedir o uso nocivo da propriedade, podendo ser mencionada, por exemplo, decisão que afirmou que “a cominatória é o meio idôneo para fazer cessar a perturbação do sossego dos vizinhos provocada por ruidosos bailes em localidade residencial”. �
<texto>Note-se, com efeito, que a ação cominatória sempre foi utilizada para impedir a continuação ou a repetição do ilícito. Esta ação era denominada de cominatória em razão de admitir a cominação da multa para obrigar alguém a fazer ou a não fazer alguma coisa. Tal ação, entretanto, como será melhor explicado mais adiante, nunca foi capaz de permitir uma tutela jurisdicional efetiva.
<texto>É errado supor, de qualquer forma, que a antiga ação cominatória não tinha conteúdo preventivo. A tutela que supõe um ilícito já praticado, mas tem por meta impedir a sua continuação ou repetição, é voltada para o futuro, tendo um fim nitidamente preventivo e não repressivo. � Em outras palavras, a relação da inibitória com um ilícito já praticado não compromete a sua natureza, que é tão preventiva quanto a da tutela que objetiva impedir a prática de um ato sem que antes algum ilícito já tenha sido praticado.
<texto>O problema, aliás, no que diz respeito aos escopos da inibitória, é justamente saber se é possível o uso desta tutela para prevenir tout court o ilícito, ou seja, se a inibitória pode servir para prevenir o ilícito ainda que nenhum ilícito já tenha sido praticado.
<texto>Lodovico Barassi afirmou que a “tutela puramente preventiva”, “certamente la più energica”, seria também“la più preoccupante, come è di tutte le prevenzioni che possono eccessivamente limitare l’umana autonomia”. � A doutrina italiana mais moderna, � entretanto, não se rende ao velho argumento de que a inibitória pode colocar em risco a liberdade do homem.
<texto>A idéia de que a tutela inibitória encontra obstáculo na liberdade do homem guarda raízes em princípios próprios do direito liberal clássico, os quais não podem servir para inspirar uma doutrina que vive em um outro Estado, sob diversos valores e em uma diferente época. A tutela preventiva, como já foi dito, é fundamental para a efetividade de direitos muito importantes dentro do contexto do Estado atual.
<texto>No direito alemão, apesar do teor do § 1.004 do BGB, � que se refere expressamente a prejuízos ulteriores, admite-se o uso da inibitória na forma pura, isto é, não apenas para impedir a continuação ou a repetição do ilícito. O mesmo ocorre no direito anglo-americano, onde há a chamada quia timet injunction, � que abre oportunidade para uma tutela genuinamente preventiva. �
<texto>Seguindo-se o velho ditado de Coke, “preventive justice excelleth punishing justice”, admite-se, através da quia timet injunction, � a obtenção da injunction não só independentemente do dano, mas também de uma violação atual do direito. �
<texto>De acordo com Baker e Langan, o autor pode obter uma injunction ainda que a violação seja apenas temida ou represente uma ameaça. � Neste caso, o autor tem de provar a probabilidade da violação: “No one can obtain a quia timet order by merely saying ‘Timeo’”. � A tutela, nestas hipóteses, visa a impedir a prática do ilícito, pouco importando se algum ilícito foi anteriormente praticado. �
<texto>Por outro lado, afirma-se, no direito italiano, que a melhor definição legislativa de tutela inibitória está presente na Lei sobre Direito de Autor, � que assim dispõe no seu art. 156: “Quem tem razão para temer a violação de um direito de conteúdo econômico a si pertencente em virtude desta lei, ou mesmo deseja impedir a continuação ou a repetição de uma violação já ocorrida, pode agir em juízo para pedir que o seu direito seja declarado e inibida a violação ...”
<texto>Não é difícil compreender a razão pela qual a doutrina entende que esta é a melhor definição legislativa de inibitória. O art. 156 da Lei sobre Direito de Autor, ao afirmar que “chi ha ragione di temere la violazione” pode agir em Juízo, admite expressamente a tutela inibitória independentemente de um ilícito anterior, o que, aliás, é confirmado quando a própria norma acrescenta que a tutela também é cabível nos casos em que se pretende impedir “la continuazione o la ripetizione di una violazione già avvenuta”.
<texto>O que importa, porém, é justamente o fato de a doutrina entender que a melhor definição legislativa de inibitória é aquela que admite a tutela na forma pura, e não apenas para impedir a continuação ou a repetição do ilícito. Isto revela a sensibilidade da doutrina italiana mais moderna para a imprescindibilidade de uma tutela inibitória antecedente a qualquer ilícito.
<texto>No direito brasileiro, o Dec.-lei 7.903/45 dispunha, no art. 189, que “independentemente da ação criminal, o prejudicado poderá intentar ação para proibir ao infrator a prática do ato incriminado, com a cominação de pena pecuniária para o caso de transgressão do preceito”. � Esta norma, como se vê, admitia a propositura da ação civil para impedir a prática do ilícito, � não fazendo qualquer referência à necessidade de um ilícito já praticado. �
<texto>De qualquer forma, os exemplos mais legítimos de tutela inibitória pura no direito brasileiro estão no interdito proibitório e no mandado de segurança preventivo.
<texto>O art. 932 do CPC afirma que “o possuidor direto ou indireto, que tenha justo receio de ser molestado na posse, poderá impetrar ao juiz que o segure da turbação ou esbulho iminente, mediante mandado proibitório, em que se comine ao réu determinada pena pecuniária, caso transgrida o preceito”. A tutela é nitidamente preventiva, já que protege aquele que ainda não foi molestado na posse (tem justo receio de ser), ordenando, sob pena de multa, que o réu não pratique ato de turbação ou de esbulho. A tutela também pode ser concedida liminarmente, utilizando-se também a multa como forma de se garantir a integridade do direito.
<texto>A Lei 1.533/51, tratando do mandado de segurança, diz, no seu art. 1.o, que “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus, sempre que, ilegalmente ou com abuso do poder, alguém sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for ou sejam quais forem as funções que exerça”. O mandado de segurança, que sempre pode ser deferido liminarmente, pode ser concedido ainda que nenhuma violação tenha sido praticada. A norma, ao permitir que alguém, sem ter sofrido qualquer violação (apenas tendo justo receio de sofrê-la), possa obter uma tutela que impeça a autoridade coatora de praticar o ato, abre ensejo a uma tutela genuinamente preventiva.
<texto>Não apenas estas situações, mas todas aquelas – ainda que não tipificadas – que necessitam de uma tutela preventiva, ainda que nenhum ilícito anterior tenha sido praticado, abrem oportunidade à tutela inibitória na forma pura.
<texto>A tutela preventiva é imanente ao Estado de Direito e está garantida pelo art. 5.º, XXXV, da Constituição Federal, razão pela qual é completamente desnecessária uma expressa previsão infraconstitucional para a propositura da ação inibitória. Aliás, nem poderia ser de outra forma, pois não teria sentido admitir a tutela inibitória para a tutela da posse e da propriedade, ou apenas contra atos do poder público, deixando-se de lado os direitos não patrimoniais, especialmente os direitos da personalidade. �
<a>3.6	A cognição e a prova na ação inibitória
<texto>A partir do momento em que se faz a distinção entre dano e ilícito, deixando-se claro que este último, e não o primeiro, é pressuposto da ação inibitória, fica fácil concluir que o dano não constitui objeto da cognição do juiz nesta ação, e assim deve ficar longe da produção probatória.
<texto>Melhor explicando: não é necessária a alegação de probabilidade de dano, nem a sua prova. Porém, no caso em que não há como separar cronologicamente o ato ilícito e o dano, pois ambos podem acontecer no mesmo instante, a probabilidade de dano evidentemente deve ser afirmada e provada. Ou seja, se uma norma proíbe a prática de determinado ato ou atividade, e se esta violação é provável, bastará a sua alegação e demonstração, não sendo necessário afirmar e provar que, ao lado desta provável violação, ocorrerá um provável dano. Do ponto de vista probatório, é muito mais fácil provar a probabilidade da prática, repetição, ou continuação de ato contrário ao direito, do que a probabilidade de dano.
<texto>Na ação inibitória é necessário verificar não só a probabilidade da prática de ato, mas também se tal ato configura ilícito. Por isto, requer-se o confronto entre a descrição do ato temido e o direito.
<texto>É possível que o réu não negue que praticará o ato, mas afirme que este não terá a natureza ou a extensão do ato vedado pela regra legal. Neste caso, tratando-se de ação voltada a impedir a repetição ou a continuação do ilícito, basta verificar se o ato anteriormente praticado realmente enquadra-se na proibição legal. Mais difícil será a prova da ilicitude do ato quando ato “igual” não foi ainda praticado. Em tal hipótese deverá ser demonstrado que o ato que se pretende praticar é realmente vedado por norma legal, e assim deverá ser esclarecido o seguinte: o ato que será praticado se enquadra na moldura legal que o proíbe?
<texto>Nas situações em que se discute apenas a extensão e a natureza do ato que estaria sendo negado como ilícito, a prova não terá por fim demonstrar um fato que indique a probabilidade da prática de um ato futuro, mas sim evidenciar que o ato que se pretendepraticar é ilícito.
<texto>Problema diverso é o da prova da afirmação de que o ato (admitido como ilícito) será praticado, repetido ou continuará. Quanto ato anterior já foi praticado, da sua modalidade e natureza se pode inferir com grande aproximação a probabilidade da sua continuação ou repetição no futuro. � Com efeito, a grande dificuldade da ação inibitória está na produção da prova de que um ato será praticado, quando nenhum ilícito anterior foi cometido. Frignani admite que esta é a questão de fundo da ação inibitória (a qual pode ser denominada de inibitória “pura”), ou melhor, um obstáculo contornável para a admissibilidade desta modalidade de tutela. Afirma Frignani que a peculiaridade da inibitória “pura” consiste no fato de que a prova do perigo da prática do ilícito é mais difícil, ao passo que é extremamente árduo valorar ex ante a idoneidade dos meios utilizados como preparativos ao fim da prática do ilícito. �
<texto>Nesta espécie de ação inibitória, em que se teme a prática de ilícito, ainda que ilícito anterior não tenha sido praticado, o autor deverá alegar fatos que sejam suficientes para permitir ao juiz, raciocinando, formar um juízo acerca da alegação de que provavelmente será praticado um ilícito. Considerando-se apenas a demonstração da probabilidade do ato afirmado ilícito (a ilicitude do ato temido não é discutida), devem ser alegados fatos que, uma vez demonstrados, possam levar o juiz a concluir que provavelmente será praticada a violação do direito.
<texto>É fundamental, na ação inibitória, manejar de forma adequada os conceitos de fato indiciário, prova indiciária, raciocínio presuntivo, presunção e juízo. Tratando-se de ação inibitória, ou seja, de ação voltada para o futuro, não é possível desconsiderar as virtudes da denominada prova indiciária. Tal modalidade de prova, se pode ser considerada auxiliar importante em face das tradicionais ações repressivas, assume lugar de destaque e importância diante da ação inibitória.
<a>3.7	A prova indiciária diante da ação inibitória
<a1>3.7.1	Primeiras considerações
<texto>Não é rara a confusão entre fato indiciário, prova indiciária, raciocínio presuntivo, presunção e juízo.
<texto>O fato indiciário somente pode ser comparado com o fato principal. É que o fato indiciário, que também é chamado de indício, é, como o fato principal, um mero fato. Quando tal fato é alegado, deve-se demonstrar ao julgador que a sua prova será importante para a formação de um juízo de procedência.
<texto>O indício não é prova; a prova indiciária, como qualquer tipo de prova, recai sobre uma afirmação de fato. A particularidade da prova indiciária está em recair em um fato que é indiciário, isto é, em um indício.
<texto>Nesta linha, cabe distinguir fato indiciário, a prova destinada a demonstrá-lo – chamada de prova indiciária –, e o raciocínio presuntivo, que é uma forma por meio do qual o julgador raciocina para, a partir de um fato indiciário, chegar a uma presunção, que nada mais é do que a conclusão do raciocínio presuntivo. Melhor explicando: o juiz, a partir de uma alegação de fato (fato indiciário) e de sua prova, raciocina (de forma presuntiva) para chegar a uma conclusão (presunção).
<texto>Porém, a presunção não se confunde com o “juízo-final” (próprio da sentença), uma vez que pode haver, por exemplo, a presunção de que um ato será praticado, mas a prova de que tal ato não constituirá ilícito, quando o “juízo-final” e, portanto, a sentença, serão de improcedência.
<texto>É interessante perceber, por exemplo, que em determinado caso concreto podem ser alegados e provados três fatos indiciários, e realizados três raciocínios presuntivos que apontem para três presunções. A questão que pode ser colocada diz respeito a saber se, em tal caso, realmente é melhor falar de três presunções, ou de uma presunção que se forma a partir da prova dos três fatos indiciários. Parece melhor falar em três presunções, uma vez que cada prova de fato indiciário conduz a uma conclusão e a soma destas conclusões leva a outra, que é o “juízo-final”, próprio da sentença. Neste caso, pode-se dizer que uma determinada presunção não é suficiente para um juízo de procedência, mas que basta a soma desta presunção com uma outra para se ter uma sentença favorável ao autor.
<a1>3.7.2	“Juízo-instrumental”, presunção, “juízo-resultado”, “juízo-provisório” e “juízo-final”
<texto>O juízo constitui uma conclusão, e neste sentido a conclusão a que o juiz chega após ter exercido uma determinada atividade. Em outras palavras: para que o juiz forme um juízo, é preciso que ele raciocine, ou seja, é necessário um raciocínio.
<texto>O “juízo-final” é a parte final do raciocínio do julgador, em que se chega a um resultado sobre a pretensão do autor. Fala-se em “juízo-final” para distinguir o juízo acerca da pretensão do autor e aquele formado em relação a um pedido de tutela antecipatória (quando é possível falar em “juízo-provisório”). Neste último caso, como é óbvio, também há juízo, mas não é correto pensar em “juízo-final”.
<texto>Contudo, para a formação de um “juízo provisório” ou de um “juízo final”, que nada mais são do que espécies de “juízo-resultado” acerca da tutela pretendida, o magistrado deverá analisar, por exemplo, as provas produzidas e as presunções.
<texto>O juízo que o magistrado faz para deferir a produção de uma prova pericial (por exemplo), é um “juízo-instrumental”, uma vez que é realizado para viabilizar a adequada formação de outro juízo. Como a presunção também parte de uma prova, pode-se dizer que o “juízo-presunção” também depende de um “juízo-instrumental”, mas serve para a formação de um juízo maior, que é o “juízo-resultado”.
<texto>Com efeito, o “juízo-resultado” também pode exigir a análise de “juízos menores”, formados a partir de provas, ou seja, a apreciação das presunções.
<texto>Resumindo: o “juízo-resultado”, que pode basear-se na presunção, é o gênero do qual são espécies o “juízo-final” e o “juízo-provisório”, enquanto o “juízo instrumental” é aquele formado para se chegar a um dado que é instrumental à formação de outro juízo (“juízo-presunção ou juízo resultado”) .
<texto>Isto demonstra que a presunção não é prova, porém juízo que serve a elaboração do “juízo-resultado”.
<a1>3.7.3	O controle da admissão da prova para a demonstração do fato indiciário
<texto>Se a presunção é fundamental para a formação do “juízo-resultado” na ação inibitória, é importante verificar a distinção entre a questão da admissibilidade da prova destinada a demonstrar o fato indiciário e o problema da correta formação do juízo a partir da presunção.
<texto>É importante frisar que o fato indiciário não precisa ser alegado. Na ação inibitória basta a alegação de que se teme um provável ato ilícito. Não existe o ônus de o autor alegar os fatos que indicam que provavelmente será praticado o ilícito. Isto não quer dizer, evidentemente, que não seja aconselhável ao autor precisar os fatos que apontam para a probabilidade de o ilícito ser praticado. Deseja-se esclarecer, somente, que o autor pode requerer a produção da prova em relação a um fato meramente indiciário, ainda que ele não tenha sido oportunamente invocado ao juiz.
<texto>É necessário verificar se o fato que se pretende demonstrar por meio da prova indiciária é um fato pertinente e relevante para a definição do mérito. O fato indiciário é pertinente quando tem relação com o ato temido, ao passo que será relevante quando, uma vez demonstrado, for efetivamente capaz de evidenciar a probabilidade de o ato ser praticado, e assim influir no julgamento do mérito.
<texto>Verificando-se que de nada adianta provar o fato indiciário, uma vez que ele não tem relação alguma com o ato temido, o juiz deve indeferir a produção da prova indiciária. Se o fato probandum não pode decorrer do fato que se pretende demonstrar por meio da prova indiciária, essa logicamente deve ser indeferida. Porém, se o fato indiciário pode apontar para vários fatos, entre eles o fatoprobandum, a prova indiciária não pode ser indeferida. A presunção que poderá ser formada a partir desta prova é que merecerá menor credibilidade; o problema passa a ser de valoração da presunção para a formação do “juízo-resultado”, e não de admissão da prova.
<a1>3.7.4	A importância do senso comum para o raciocínio fundado a partir da prova indiciária
<texto>No raciocínio presuntivo o juiz parte de um fato indiciário para chegar ao fato probandum�. Como é óbvio, o juiz, não só ao raciocinar desta forma, mas também para valorar a credibilidade de uma prova e a sua idoneidade para demonstrar um fato, baseia-se em sua experiência, que deve ser entendida como a experiência do homem médio, que vive em determinada cultura, em certo momento histórico.
<texto>Nestes casos, o juiz socorre-se do senso comum, e particularmente no que interessa ao raciocínio que pode dar origem à presunção, ao partir de um fato indiciário para chegar ao fato principal, vale-se de conhecimentos que devem estar fundados naquilo que comumente ocorre na sociedade ou que possuem fontes idôneas e confiáveis.
<texto>Seria possível dizer que o juiz, em tais hipóteses, apóia-se em uma “regra de experiência”, que, de acordo com o art. 335 do CPC brasileiro, pode ser uma “regra de experiência comum” ou uma “regra de experiência técnica”.
<texto>É claro que, tratando-se de regra de experiência técnica, esta deve ser aquela que é própria ao homem comum. Em outras palavras, se o juiz é formado em engenharia civil ou medicina, por exemplo, ele não pode pretender formular concatenações com base em seus conhecimentos técnicos pessoais. É de lembrar que o juiz que vai apreciar eventual recurso pode não ter este mesmo conhecimento e que um conhecimento técnico pode ser discutível, vale dizer, não estar solidamente consagrado.
<a1>3.7.5	A importância do senso comum para a formação do juízo a partir da presunção
<texto>O juiz evidentemente raciocina para formar o seu juízo a partir de uma ou mais presunções. Neste caso, ele também se apóia no senso comum.
<texto>Como é óbvio, verificando-se que a demonstração do fato indiciário não foi realizada, não é possível estabelecer um raciocínio correto, através da presunção, para concluir-se no sentido da procedência da pretensão inibitória; o raciocínio judicial, neste caso, será falho, por tomar como premissa um fato que não foi efetivamente demonstrado.
<texto>Como já foi dito, não é preciso que o fato probandum seja a única conseqüência do fato indiciário para que seja possível a formação do juízo de procedência. Quando o fato indiciário, uma vez demonstrado, pode colaborar para demonstrar que provavelmente o ato temido será praticado, a prova indiciária evidentemente pode ser somada a outra presunção para formar um juízo de procedência.
<texto>É preciso que fique claro que não é necessária a soma de várias presunções para a formação do juízo de procedência; uma única presunção, dependendo do caso concreto, pode ser suficiente para formar a convicção do juiz a respeito da procedência do pedido. Porém, ao existir apenas uma presunção, esta deve ser capaz de formar um juízo de procedência que possa ser plenamente justificável; em outros termos, é possível dizer que, tratando-se de apenas uma presunção, o juiz deve valorá-la com extremo rigor. �
<a>3.8	A necessidade de atuação concreta da norma e a importância da ação inibitória
<texto>Quando a doutrina associava o ato contrário ao direito à responsabilidade civil e, mais do que isto, partia do pressuposto de que a lesão ao direito sempre poderia ser reparada pelo seu equivalente em pecúnia, o processo civil era estruturado para conferir ressarcimento em dinheiro.
<texto>Este modelo de processo, de marca nitidamente patrimonialista, estava preocupado com a repercussão danosa do ilícito. O ordenamento jurídico que admite um processo civil voltado apenas à reparação do dano, evidentemente não dá importância à violação da norma que não produz dano.
<texto>Quando o Estado assume novas preocupações sociais, e assim passam a importar a proteção do meio ambiente, da saúde, da educação e da posição do consumidor no mercado, além de um enfoque dos direitos da personalidade à luz da evolução das técnicas de comunicação, surgem normas que, objetivando realmente tutelar estas situações de direito substancial, passam a impor deveres, cientes de que a sua observância é fundamental para a consagração destes “novos direitos”.
<texto>Isto é obtido não só através de normas que consagram um não fazer, mas também por meio de normas que determinam uma ação positiva. Tais normas partem da premissa de que determinados atos devem ser vedados ou necessariamente praticados, pouco importando os efeitos concretos da sua violação, se danosos ou não. Na realidade, parte-se do pressuposto de que a violação da norma é causadora de prejuízo. Ou seja, a preocupação é com a simples observância da norma e não com o efeito concreto da sua violação, não mais importando a idéia que associava o ilícito à responsabilidade civil.
<texto>Tais normas objetivam conferir prevenção aos direitos, abrindo ensejo, quando inobservadas, a sanções. Estas, entretanto, também funcionam como estímulo para a não agressão dos direitos. Portanto, estas regras têm por fim tutelar os direitos, demonstrando que pode existir tutela inibitória fora do processo jurisdicional. Acontece que esta tutela pode exigir, para ser efetivamente prestada, a participação da jurisdição. Nestes casos, em que a função preventiva da norma é alcançada apenas na jurisdição, ou em que a tutela inibitória desejada pelo direito material somente pode ser obtida através da propositura da ação processual, há tutela jurisdicional inibitória.
<texto>Quando a tutela inibitória é prestada através da jurisdição, pouco importa se há ordem de não fazer ou de fazer, uma vez que a norma pode impor um não fazer ou um fazer com função preventiva, isto é, para dar tutela inibitória aos direitos. Importa deixar claro, assim, que a norma que impõe, com escopo preventivo, determinada conduta, abre oportunidade para ação inibitória em que o juiz pode ordenar um fazer. O objetivo desta ação é prestar a tutela inibitória não alcançada fora do processo, dando efetividade à norma de direito material.
<texto>Como é evidente, esta ação nada tem a ver com o dano, mas apenas com a norma, ou melhor, apenas com a necessidade de efetividade da norma. A norma que, por exemplo, proíbe a venda de produto com determinada substância, deve abrir oportunidade a uma ação processual destinada a atuá-la, não sendo correto pensar que não é possível, por meio do processo civil, inibir a venda de produto nocivo, porém somente condenar o infrator a indenizar o consumidor por eventual dano. Se o ordenamento jurídico dos dias de hoje deve proteger determinados bens mediante a imposição de certas condutas, e por esta razão são editadas normas de direito material, é necessário que o processo civil seja estruturado de modo a atuá-las.
<texto>Ora, se é evidente que a exposição à venda é, por si só, ato ilícito, pouco importando a sua conseqüência concreta, o processo civil não pode mais continuar a atrelar o ato contrário ao direito com o dano, sob pena de não poder dar resposta a situações como esta, em que é fundamental vedar um ato e não apenas reparar um dano. Nesta linha, é possível perceber, com maior nitidez, a importância da ação inibitória como instrumento destinado a tutelar contra o ato contrário ao direito.
<texto>A ação inibitória, mesmo quando individual – e não coletiva, ou seja, proposta por um dos legitimados à ação coletiva –, tem feição completamente diversa daquela que caracteriza a ação ressarcitória. Enquanto a ação ressarcitória pelo equivalente tem origem patrimonialista e individualista, a ação inibitória, ao contrário, mostra preocupação com os direitos não patrimoniais e com normas que estabelecem comportamentos fundamentais para o adequado desenvolvimento da vida social.
<texto>Na verdade, a possibilidade

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