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Unidade I POLÍTICA SOCIAL EM SAÚDE, EDUCAÇÃO E HABITAÇÃO Profa. Amarilis Tudella Introdução Nesta disciplina faremos uma revisão de alguns conceitos que se tornaram importantes para a compreensão das políticas sociais, sendo eles afeitos aos papéis adotados pelo Estado para a organização de tais ações. Vamos nos reaproximar das compreensões sobre as influências que o liberalismo, o bem-estar social e o neoliberalismo trouxeram e ainda trazem ao padrão adotado pelo Estado no desenvolvimento das políticas sociais. Estado pré-liberal: liberalismo Esses ideais foram pensados em um momento de declínio da sociedade feudal e de consolidação do sistema capitalista, ainda em seu estágio inicial. Trata-se, assim, dos estágios primitivos de acumulação capitalista, sendo necessário a partir de então um novo formato de Estado para dar suporte à organização econômica que se mostrava evidente (BEHRING; BOSCHETTI, 2010). Direitos civis a toda população e não apenas à aristocracia. Direitos sociais era de autoajuda (self-help). Maquiavel e Hobbes: Estado soberano (fase pré-liberal) Entendia que o Estado deveria atuar como um mediador civilizador, ou seja, deveria apenas atuar como um administrador: “O Príncipe”, escrito em 1513. A obra mais expressiva de Hobbes foi escrita em 1651: “Leviathan”. Caberia ao Estado disciplinar o que era aceito socialmente e o que deveria ser suprimido pelos indivíduos. O que deveria ser esperado como um comportamento aceitável para cada ser humano. John Locke (fase pré-liberal) Se contrapunha à monarquia absolutista e recomendava que o poder político estivesse diluído em mãos coletivas de homens, sendo então um poder partilhado entre Estado e a população (BEHRING; BOSCHETTI, 2010). Os homens deveriam, então, se unir em prol do poder político que provinha da posse da propriedade privada bem comum de toda a sociedade. Obra: “Dois Tratados sobre o Governo” Contraria o patriarcalismo que influenciava a vida em sociedade. Jean-Jacques Rousseau (fase pré-liberal) Obra: “Contrato Social”, de 1762. O autor entendia que a propriedade privada tinha o potencial de corromper os homens e de comprometer os seres humanos de maneira muito negativa. Estado era para perpetuar a desigualdade estabelecida entre os seres humanos. O contrato social estabelecido entre o Estado e a população em geral deveria o Estado representar os interesses de todos. A educação pública era necessária para requerer as necessidades comuns. Fase pré-liberal O desenvolvimento de uma dada sociedade dependia apenas e essencialmente do esforço empreendido pelos indivíduos, pelos seres humanos. O Estado, por sua vez, deveria funcionar apenas como um mediador, reprimindo desejos considerados nefastos ao desenvolvimento da sociedade e usando da coerção, sempre que necessário, para alcançar suas finalidades. Smith: seleção natural (ode ao capitalismo – Estado mínimo) O Estado teria pouca influência no bem-estar dos indivíduos. A partir do momento em que cada indivíduo busca alcançar seu bem-estar, ele estará, diretamente, colaborando para alcançar o bem-estar de toda a sociedade. Assim, o ser humano, nessa busca, estaria influenciando toda a sociedade para que também alcance o bem-estar e, para que isso ocorra, será por meio do trabalho. Quando o desenvolvimento não é alcançado, também é responsabilidade do indivíduo. Potencialidades do indivíduo. Smith O mercado deve regular a vida em sociedade. Cada indivíduo deve procurar atender as suas necessidades, maximizando o bem-estar coletivo. O Estado deveria atuar minimamente apenas para oferecer as bases necessárias para o amplo desenvolvimento do mercado e não há exploração pelo modo capitalista de produção. Malthus (crescimento geográfico levaria a falta de alimentos) Havia muitos pobres pelo mundo, mais do que seria possível e suportável para uma sociedade que desejasse se desenvolver. Para solucionar esse “problema”de excesso de pobreza, seria necessário que os pobres fossem vigiados e punidos. Recomendava ainda que os pobres fossem entregues à própria sorte, ou seja, o Estado não deveria desenvolver nenhuma ação para socorrer esses segmentos. Estado não deveria realizar qualquer intervenção para regular as questões afetas ao trabalho. David Ricardo Lei do Custo Comparativo, na qual o autor buscou demonstrar os benefícios que poderiam ser alcançados por meio do comércio internacional. Esse texto é conhecido por muitos teóricos como o primeiro tratado sobre o livre-comércio que, como vimos, é o argumento que alude ao princípio liberal. Liberalismo O predomínio do individualismo está relacionado ao entendimento de que cada indivíduo é responsável por escolher seus caminhos e encontrar os meios para atender as suas necessidades. Se cada indivíduo age de forma a atingir o bem-estar de toda a sociedade, o bem-estar individual torna possível que se alcance o bem-estar coletivo. Necessário que o mercado permaneça livre de regras, sobretudo daquelas estabelecidas pelo Estado. Seria a competitividade entre os diferentes capitalistas que iria conduzir o mercado, naturalmente. Pobreza: inerente à sociedade A pobreza é considerada algo natural, inerente à organização da sociedade. O Estado, por sua vez, não deve intervir na regulação econômica e tampouco na definição de serviços destinados à população pobre. As intervenções possíveis são apenas para casos de extrema emergência, admitindo ações residuais e pontuais. Interatividade Os direitos sociais em dado período da história econômica e política era de autoajuda (self-help). Isso compreende que: a) O Estado intervinha nas questões da pobreza de modo integral. b) O Estado era considerado o provedor de direitos sociais. c) A própria sociedade intervinha nas situações de pobreza. d) A pobreza era mínima e não precisava da intervenção do Estado. e) As alternativas “a” e “b” estão corretas. O Estado de bem-estar social Durante a década de 1920, o mundo assistiu ao declínio lento do liberalismo como doutrina econômica e política e sua substituição, gradativamente, pelo estado de bem-estar social ou welfare state, conforme ficou popularmente conhecida a crise capitalista, expressa, sobretudo, pela quebra da Bolsa de Nova Iorque - recessão. Iniciou-se um movimento em prol da intervenção estatal na regulação econômica e também junto às expressões da questão social. Bem-estar social: origem Grã-Bretanha Thomas Henry Marshall: seguros sociais pós-guerra. século XIX. Jens Alber: promulgação das primeiras leis dos pobres. século XIV. Flora e Heidenheimer: surgiu somente a partir do desenvolvimento do sistema capitalista. Ramesh Mishra: a partir da Segunda Guerra Mundial, em um estágio específico de desenvolvimento capitalista. Século XX: o Estado assumiu as funções de regulação econômica e também uma função social. Bem-estar social: direitos sociais O bem-estar social surgiu em países que tiveram suas práticas assentadas em ações que buscavam efetivar o direito social. Nesses países, a pobreza era compreendida como consequência do desenvolvimento do capitalismo em sua fase industrial. Nesses Estados também observamos o desenvolvimento de práticas junto aos desempregados e subempregados por meio de prestação de serviços sociais públicos (PEREIRA, 2011). Não houve um modelo hegemônico para todo o mundo. Teóricos Marshall, Beveridge, Titmuss, Townsend e Atlle: todos teóricos extremamente relevantesno sentido de oferecer sustentação ao welfare state. Socialistas fabianos: Grã-Bretanha. Keynes: recomendava a intervenção estatal para reativar a produção econômica até então estagnada pela crise e o pleno emprego. Não era vista como direito, mas como alternativa necessária à superação da crise capitalista. Beveridge: reforma da seguridade social britânica e a adoção dos serviços sociais universais. O neoliberalismo Nada mais do que uma revisão do liberalismo, porém, sob novas bases, haja vista o desenvolvimento econômico, social e político experimentado pelo mundo na década de 1970 (contexto de sua expansão) e totalmente diferenciado do vivenciado no século XIX. A grande expressão do surgimento desse ideal foi o livro “O Caminho da Servidão”, escrito por Friedrich Hayek. Na ocasião, Hayek aprimorou um ataque ao estado de bem-estar social que vinha sendo organizado com base nos pensamentos de Keynes e outros teóricos. O neoliberalismo Sociedade de Mont Pelerin, que funcionava como uma organização contrária ao welfare state. Década de 1970 ao colapso do chamado “socialismo real” vinculado na época à extinta União Soviética e a alguns países do leste europeu e à expansão a elevadas proporções de outra grande crise capitalista. O Estado vinha intervindo excessivamente junto ao mercado, buscando controlar o comércio e também a vida dos indivíduos. O neoliberalismo Outro evento importante no sentido de firmar o neoliberalismo no mundo aconteceu no ano de 1989, em Washington. Foi uma reunião em que estiveram presentes líderes das principais economias do mundo e representantes do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento. Thatcher promoveu um amplo programa de privatizações das empresas públicas que poderiam oferecer lucro à iniciativa privada, dentre os quais a habitação até então predominantemente estatal. Netto (1995) ainda sumaria outras expressões sociais geradas a partir do neoliberalismo Xenofobia, particularismo e hostilidade étnica: afetos à indisposição de determinados povos com outros de culturas e vivências diferentes. Acontece um apartheid social fundado em parâmetros preconceituosos, tais como religião, região de moradia ou procedência e etnia, dentre outros. Fernandes (1995) exemplifica, citando os movimentos racistas e chauvinistas que se ampliaram na década de 1990 na Europa. O Estado brasileiro O Estado passa a ser visto como burocrático e ineficiente. Já o mercado passa a ser sinônimo de eficiência, eficácia e qualidade dos serviços prestados. “[...] uma tendência à reversão de padrões universais de proteção social estabelecidos com a emergência, em diversos países no pós-guerra, dos estados de bem-estar social. Em função da crise fiscal destes, avolumaram-se pressões para a particularização de benefícios sociais.” (FERNANDES, 1995, p. 56) O Estado brasileiro Os argumentos neoliberais não se esgotam nas privatizações, no desmonte do parque industrial nacional dos países e na desuniversalização dos serviços sociais. Antes, o receituário neoliberal ainda requer que o Estado coíba as formas possíveis de participação popular. O Estado brasileiro e a participação popular Há uma contraposição do neoliberalismo à democratização e às manifestações como os sindicatos, por exemplo. Recomenda-se que o Estado seja forte apenas no sentido de impedir essas organizações de trabalhadores, ou seja, nada que possa por freios à acumulação capitalista. Interatividade A sociedade de Mont Pelerin funcionava como uma organização contrária ao: a) Welfare state. b) Neoliberalismo. c) Capitalismo. d) Estado mínimo. e) Estado de bem-estar social. O neoliberalismo se mostra insuficiente Supremacia econômica do capitalismo, já que não há mais o controle estatal ou barreiras que impeçam a acumulação capitalista. No entanto, o tal crescimento econômico que move e orienta o neoliberalismo não foi alcançado. Todos os mecanismos instituídos pelos países neoliberais não se mostram suficientes para viabilizar o desenvolvimento econômico almejado. Aumento da pobreza 46% das pessoas que sobreviviam abaixo da linha da pobreza em 1990 correspondiam, na verdade, a 296 milhões de latino-americanos, ou seja, eram muitas as pessoas sacrificadas em prol da acumulação capitalista. Fernandes (1995) descreve esse fenômeno como sendo o agravamento das desigualdades, da exclusão e da segmentação social. O Estado brasileiro Desde a República Velha foram as ações organizadas pela caridade privada ou pela caridade da Igreja Católica e que tinham como finalidade apenas atender as expressões mais graves da questão social. Eram, portanto, ações orientadas a oferecer alimentação, medicamento e vestuário; acontecendo pontualmente, sem continuidade ou organização. O Estado brasileiro, por outro lado, manteve-se alheio às expressões da questão social que se tornavam latentes na realidade brasileira (BEHRING; BOSCHETTI, 2010). O Estado brasileiro: acumulação capitalista A delimitação em 1919 da Lei de Acidentes de Trabalho. No ano de 1920, foi o Código de Menores, o Ministério do Trabalho, em 1930, e da Carteira de Trabalho, ampliação das Caixas de Aposentadoria ou Pensão Social (Caps), a criação do sistema “S” posto por instituições como o Senai, que ofereciam formação para a classe trabalhadora. O Estado brasileiro Pobreza: a Legião Brasileira de Assistência (LBA) e o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), ambos criados no ano de 1942. Tivemos a expansão de algumas políticas sociais somente a partir da década de 1960, período que teve o acirramento da ditadura. Em 1988, definiu-se que o Estado brasileiro seria responsável por executar as políticas sociais de saúde, educação, Previdência Social e assistência social. Inaugura-se, a partir de então, uma nova ótica acerca dos problemas. O Estado brasileiro Fernando Collor: neoliberalismo, privatizações e descaso com as políticas sociais. Escândalo da LBA. Rosane Collor teve que pagar R$ 1,8 milhões por irregularidades na LBA. Ela realizou pagamentos superfaturados. A ex-primeira-dama Rosane Collor foi condenada em 1993 pelo Tribunal de Contas da União (TCU) a pagar multa por omissão em ato antieconômico quando esteve à frente da extinta Fundação Legião Brasileira de Assistência (LBA). O Estado brasileiro A política social de Itamar Franco e sintomática da adesão do Estado ao neoliberalismo. Fernando Henrique Cardoso investiu pesado em uma política de controle de gastos sociais, privatizou grande parte das empresas públicas rentáveis e desenvolveu uma série de intervenções para beneficiar o mercado capitalista brasileiro: Programa Comunidade. Solidária (voluntariado). O Estado brasileiro Lula desenvolveu uma prática em prol de políticas sociais de transferência de renda, buscando ampliá-las. Dilma Rousseff, por sua vez, segue a política social lulista, que tem no programa Bolsa Família seu carro-chefe. Diminuição de gastos sociais Mesmo com a Constituição apontando para uma direção, na prática, vemos o Estado restringindo gastos sociais cada vez mais. Temos um estado de mal-estar social. Interatividade No âmbito da ______ , vimos que nesse momento tivemos uma ampliação considerável da ______ , o que resultava em uma elevação também das expressões da ___________ . Preencha as lacunas: a) Questão social, população, pobreza. b) Constituição de 1988, população, questão social. c) Questão social, política social, cidadania.d) Política social, cidadania, equidade social. e) Nenhuma das alternativas anteriores está correta. Resumindo Questão social No âmbito da questão social, vimos que nesse momento tivemos uma ampliação considerável da população, o que resultava em uma elevação também das expressões da pobreza. Desigualdade social Behring e Boschetti (2010) nos informam que nesse estágio tínhamos um capitalismo já consolidado, respaldado em um extenso parque industriário nacional. No entanto, a situação de desigualdade social permanecia a mesma, já que o sistema produtivo que a gerava não era suprimido no país. O Estado brasileiro, assim como em outros momentos, apenas buscava oferecer tudo o que fosse necessário para o desenvolvimento capitalista. Neoliberalismo para sempre? Ainda não sabemos a direção que seguiremos no nosso país. Há como prever se o neoliberalismo conseguirá um novo fôlego ou se tanta insatisfação irá motivar a mudança? Não há como saber, mas, como já dissemos, precisamos de argumentos fortes contra esse ideal que está impregnado em nosso Estado e na nossa vida como um todo. Neoliberalismo em muitos países Partindo da adesão ao neoliberalismo, tivemos a diminuição dos gastos na área social e consequentemente uma retração do Estado no desenvolvimento das políticas sociais. Também tivemos, em muitos países, a consolidação de práticas antidemocráticas e ainda a manutenção de um nível de desemprego, resultando na piora das condições de vida para a classe popular. Bem-estar social e o Brasil No Brasil, no entanto, o liberalismo perdurou até meados da década de 1980. Somente a partir de então tivemos ações que figuram como uma espécie de estado de bem-estar social – dizemos “uma espécie” porque não tivemos, no Brasil, um estado de bem-estar social como no modelo europeu. Neoliberalismo e a Constituição de 1988 Já no que diz respeito ao neoliberalismo, vimos que essa doutrina teórica chegou ao país na década de 1990, apenas alguns anos depois da criação da Constituição de 1988. O primeiro presidente que tentou adequar o país a tais ideais foi Collor, porém foi somente a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso que esses ideais chegaram as últimas proporções. Neoliberalismo e as políticas sociais No entanto, constatamos que ainda temos atualmente a tácita aceitação do Estado aos princípios neoliberais, resultando em políticas sociais fragmentárias e pontuais e na perda, paulatina, dos direitos sociais universais, conforme preconiza a Constituição de 1988. Interatividade Dizemos que no Brasil tivemos uma espécie de estado de bem-estar social. Por que dizemos “uma espécie”? I. Não cumpriu seu papel como estado de bem-estar social. II. As ações das políticas sociais foram fragmentadas e pontuais. III. Cumpriu as determinações legais da Constituição de 1988. Escolha a alternativa correta: a) I b) I e II c) II e III d) III e) I e III ATÉ A PRÓXIMA!
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