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As relações entre Estado e sociedade: “novas” formas da gestão social no Brasil Ademir Alves da Silva Gestão Social Profª Sônia Regina Nozabielli e Luzia Baierl Curso de Serviço Social Unifesp - Campus BS Gestão social • A lei n. 8.662/93, que regulamenta a profissão de assistente social, estabelece em seu artigo 4° as competências do assistente social. Tais competências desenham a figura do gestor de políticas sociais. Propósito do texto • Indagar sobre a gestão social no contexto da reforma do Estado, que se realiza sobre a perspectiva de favorecimento do mercado. • Contexto marcado pelas medidas de privatização, de redução da intervenção estatal ou de implantação de formas híbridas de gestão social. • Observa tendência de complementaridade e de mixagem das ações do Estado, da sociedade civil e do mercado – fomenta ações privadas na seguridade social. GESTÃO SOCIAL • ÊNFASE década de 1990 de implantação da estratégia neoliberal no mundo todo, a partir das diretrizes do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial. • No Brasil apelo ao chamado terceiro setor, ao voluntariado, às organizações da sociedade civil e ao próprio mercado • Público não necessariamente estatal Gestão social [...] “entendo a gestão social como um conjunto de estratégias voltadas à reprodução da vida social no âmbito privilegiado dos serviços- embora não se limite a eles – na esfera do consumo social, não se submetendo à lógica mercantil. A gestão social ocupa-se, portanto, da ampliação do acesso à riqueza social – material e imaterial -, na forma de fruição de bens, recursos e serviço, entendida como direito social, sob valores democráticos como equidade, universalidade e justiça social” (Silva, 2010, p. 32) Seguridade social • Lócus de processamento e mediação das contradições relacionadas às formas de geração, apropriação e distribuição de riquezas. • É relação social. Oculta/revela os embates em torno do acesso aos bens, recursos e serviços socialmente produzidos. Fundo público • Constituído por mecanismos de captação, arrecadação, gestão e alocação. • Representa parcela do excedente econômico apropriada pelo Estado na forma de contribuições e impostos e que retorna para a sociedade na forma de programas e serviços sociais. Empenho dos governos e técnicos em equacionar a gestão da SS na esfera orçamentária... • Não elude/evita a natureza sociopolítica. • Interpelação aos sujeitos individuais para que cuidem da própria segurança; • O apelo genérico à solidariedade no âmbito da sociedade civil; • A retórica em torno da responsabilidade social da empresa-cidadã, • Concorrem para postergar a gestão coletiva das condições de existência social sob critérios mais justos de repartição da riqueza social. A questão da responsabilidade pela gestão social • Dever do Estado? • Problema individual a ser equacionado no mercado? • Filantropia empresarial? • Solidariedade da sociedade civil? Expressa-se por bipolaridades (sujeito individual x pacto social/Estado) – campo denso de luta social e recoberto por uma manto ideológico cheio de promessas de equidade que contribui para reproduzir a desigualdade social. “Novas” formas de gestão social no Brasil - 1990 • REFORMA DO ESTADO = deslocamentos do Estado para a sociedade; do estatal para o privado. • Articulam-se argumentos e ações em favor da Reforma do Estado. • Gestão social estatal, acusada de perdulária/gastadora e incompetente, vai dando lugar a novas formas de pensar e equacionar necessidades sociais – aparecem alternativas de gestão social fora do Estado. “Novas” formas de gestão social • Preocupação de estabelecer um marco legal e regulador (compatível com a proposta de Reforma do Estado) das ações entre Estado e organizações da sociedade civil prestadoras de serviços sociais. • 1998 e 1999 – leis voltadas para 3 modalidades de organizações: OS, OF, OSCIP. Novo marco legal e regulador compatível com a Reforma do Estado HIBRIDISMO NAS RELAÇÕES ENTRE PÚBLICO E PRIVADO • Organizações sociais – contrato de gestão – estratégia de privatização (repasse R$ a instituições privadas, contratação de servidores sem concurso, desobrigação de cumprir a Lei de licitações...) • Organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP) = chamado terceiro setor (noção imprecisa e polissemica – termo de parceria (OG pode escolher a OSCIP por concurso), pode adquirir imóvel, remunerar dirigentes...) • Organizações filantrópicas – características: assistencial, beneficente, sem fins lucrativos de utilidade pública – isenção de contribuição para a seguridade social. Nova Lei nov/2009 – altera requisição/concessão/competências para análise. Novo marco legal e regulador compatível com a Reforma do Estado • Cidadania empresarial – responsabilidade social corporativa; comportamento empresarial socialmente responsável... • Nova filantropia empresarial – meta: agregar valor ao negócio para obter vantagens: uma imagem, um sentimento, uma ideia, uma atitude, um comportamento que, associados a produtos ou marca, sejam reconhecidos como economicamente corretos (certificados de qualidade, selos verdes, empresa amiga da criança). Novo marco legal e regulador compatível com a Reforma do Estado • Voluntariado – ressurge, profissionalizado. • Vínculo voluntário, não empregatício e sem remuneração, não dispensam todavia, a exigência de um perfil profissional. • Não se pretende impedir que pessoas sejam voluntárias – trata-se de desvelar e criticar o apelo ao voluntariado – apelo moral, politicamente orientado, de modo a erodir o potencial de crítica, contestação e transformação de projetos societários. Discurso da concertação • O marco legal do terceiro setor, da filantropia e das organizações sociais, estabelece uma esfera em que as ações do Estado mesclam-se com as ações de instituições privadas. • Os apelos à solidariedade da sociedade, à responsabilidade social das empresas e às famílias estimulam o protagonismo de variados sujeitos na busca de novas formas de gestão social frente ao esvaziamento das funções de produtor, gestor e prestador de serviços do Estado, progressivamente reduzido às funções de regulador e financiador da seguridade social. • Instaura-se um hibridismo nas relações entre o estatal e o privado, em favor da gestão progressivamente privatizada. Relações entre Estado e Sociedade Marco legal e regulador Formas de gestão social no Brasil De quem é a responsabilidade pela gestão social? - Estado? - Problema individual a ser resolvido no mercado? - Filantropia empresarial? - Solidariedade da sociedade civil? - Terceiro Setor? - Voluntariado? Contexto: Reforma do Estado Tendências: Complementaridade Mixagem Fomento as ações privadas na área da seguridade social Alternativas de gestão social fora do Estado Deslocamento do estatal para o privado Privatização Redução da intervenção estatal Implementação de formas híbridas de gestão (combinação de ação estatal com a de organismos privados Ações entre Estado e organizações da sociedade civil prestadoras de serviços sociais Te rc e ir o S et o r C id ad an ia e m p re sa ri al V o lu n ta ri ad o INCENTIVOS Reforma do Estado e gestão social • Quando se fala em “reforma do Estado”, pensa-se imediatamente em reforma da gestão e do aparato administrativo, focando-se muitomais a dimensão instrumental do Estado do que sua dimensão ético- política. A própria ideia de Estado perdeu clareza. • Reforma do Estado significou desestatização – em nome da eficiência, da produtividade e da qualidade, a produção estatal de determinados bens e serviços (inclusive das PS) é transferidas para agentes do setor privado. • Reforma concentrada na diminuição do tamanho e das funções do Estado e na valorização do mercado e expansão de formas não- estatais de organização. • Agenda reformadora ajudou a que se criassem focos de incentivo para atualização do modelo burocrático, o aumento do controle social e incorporação de mecanismos de participação e de descentralização à gestão das políticas sociais. Necessário e urgente • Converter o Estado em moderno, ágil e transparente instrumento de justiça social. • Exigência da democratização – fortalecer a sociedade civil (arena contraditória, disputas por projetos de sociedade) = ampliar oportunidades e mecanismos de exercício do poder pelo acesso à informação, pela organização, pela participação política do país e pelas inúmeras expressões da luta social. Gestão das políticas sociais: municipalização ou desobrigação? FATORES QUE FAVORECEM/DIFICULTAM A MUNICIPALIZAÇÃO: 1. Cultura autoritária e centralista – retarda e constrange o pacto federativo (ordem imperial, ditadura = marca a história política nacional). Gestão das políticas sociais: Municipalização ou desobrigação? 2. CF/1988 – consolidou o pacto federativo – diretrizes: descentralização, municipalização e participação popular. Requer qualificar o espaço da relação federativa – negociação e pactuação em meio a inovação conceitual e tecnológica. • Modelo de gestão social com base no tripé “CPF” – possibilidade de avanços na democratização das decisões e das ações locais + decisões importantes tomadas no governo federal, por meio de MP, a maioria dos cidadãos fica de fora = participação popular não passa de retórica? Gestão das políticas sociais: municipalização ou desobrigação? • Plano econômico – Município não pode equacionar em seu âmbito, o problema do desemprego. • Plano das políticas sociais – Município é incapaz de conter os efeitos de cortes de investimentos previstos no orçamento da União. • Plano dos recursos – Há estados e municípios dependentes das transferências federais, o que não favorece a autonomia dos níveis de governo. • Plano fiscal – Lei de responsabilidade fiscal = “beco sem saída” para governantes locais = cerco fechado a autonomia e gastos públicos de estados e municípios/interfere na autonomia desses entes. Intenção real: manter as unidades federativas reféns da política de Brasília que fixa parâmetros de metas fiscais para governos subnacionais e concentra na União a gestão macroeconômica. Gestão das políticas sociais: municipalização ou desobrigação? 3. Maioria dos municípios não dispõe de condições e de recursos, especialmente financeiros para sua autonomia. • Saúde – maioria das cidades – prefeiturização = desloca responsabilidades sem o devido repasse de recursos. • Educação – municipalização – estado se desobriga das responsabilidades, 2º as orientações do Banco Mundial e FMI. Transferência não considera a capacidade dos municípios = agravamento de déficit de ensino que já não era de boa qualidade. • Assistência social – Pós CF/1988, LOAS, PNAS – marco de significativas mudanças (conceitual, organizacional, gerencial e operacional). Projeto inconcluso. Municipalização: • Tem representado a transferência para os governos municipais de programas articulados na esfera federal e estadual, sob exigências de contrapartida orçamentária. • Recursos carimbados/vinculados a prioridades decididas em outra instância – retiram dos municípios a decisão quanto à alocação dos recursos transferidos. • Dissonância com descentralização e autonomia dos entes. Relação entre as esferas pública e privada • Experiência de SP 2002- 2003 – esforço de implantação de uma política de assistência social baseada na recuperação do papel do Estado – sua missão de financiador, regulador, provedor e gestor. • Necessário: relação com as redes – incorporá-las à política pública sob critérios públicos, tendo como instrumento de avaliação de projetos a audiência pública, para responderem por serviços de interesse público, sob a gestão do poder público. Evidências • Municipalização – processo marcado pelas tensões entre as três esferas de governo – pode conter avanços e retrocessos no campo das políticas sociais. De um lado: • Proximidade entre cidadãos e políticas públicas • Incentivo à participação popular • Presença da sociedade junto aos representantes do governo nos conselhos • Autonomia dos municípios • Fortalecimento do poder local Evidências De outro lado: • Municipalização como estratégia dos governos estadual e federal que dissimula a desobrigação do poder público com as políticas sociais e a redução da presença do Estado em favor do mercado e da transferência de responsabilidades para sociedade civil. Evidências • Iniciativas de organização e mobilização da sociedade favorece a democratização + não substitui a responsabilidade do Estado no campo da seguridade social. • Mercado – reproduz a desigualdade social; é seletivo e excludente. Não tem a pretensão de ser portador da justiça social. Municipalização – outros 2 deslocamentos 1. Descentralização – fortalece a autonomia da esfera local, com a partilha de poder das esferas federal e estadual com as comunidades locais = democratiza. 2. Desconcentração – deslocamento de serviços, atividades e objetos de decisão. Delega atribuições + centraliza decisões. Desconcentração é necessária + não é suficiente ao processo de descentralização. Municipalização • Processo permanente de luta política em torno do fortalecimento do poder local nas dimensões legal, administrativa, financeira, fiscal e política. Continua a impor-se como: • Estratégia de luta contra a cultura autoritária e centralista em favor do fortalecimento do pacto federativo. • Arena de questionamento do modelo de desenvolvimento e do sentido de Reforma do Estado. • Resistência dos municípios à tendência de desobrigação das esferas estadual e federal. Referencia • SILVA, Ademir Alves da. A gestão da seguridade social brasileira: entre a política pública e o mercado. São Paulo: Cortez, 2004. p.137-185.
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