Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Introdução à Problemática Ambiental U416. 51 Autores: Profa. Ivete Maria Soares Ramirez Ramirez Prof. Fernando de Paiva Santos Colaboradores: Prof. Francisco Alves da Silva Prof. Vinícius Albuquerque Profa. Ivy Judensnaider Introdução à Problemática Ambiental Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Professores conteudistas: Ivete Maria Soares Ramirez Ramirez/ Fernando de Paiva Santo Ivete Maria Soares Ramirez Ramirez Cursou bacharelado e licenciatura em Ciências Sociais e Geografia pela Universidade de São Paulo (USP). É pós‑graduada em Jornalismo Científico pelo Laboratório de Estudos Avançados de Jornalismo Científico da Universidade de Campinas (Labjor/Unicamp). Além disso, é mestranda em Educação e cursou as disciplinas Qualidade de Vida em Sociedades Complexas, Sustentabilidade e Políticas Públicas, Desenvolvimento, Meio Ambiente e Mudanças Ambientais Globais em nível de pós‑graduação stricto senso no Nepam/Unicamp como aluna especial do programa de doutorado. É autora de material didático do Ensino Médio e professora de Geografia do curso pré‑vestibular e do Ensino Médio do Sistema de Ensino Objetivo. Escreveu o livro Tiwanaku: um olhar sobre os Andes, editado pela Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP como proposta de mestrado. Atualmente, realiza trabalho de assessoria de coordenação do Ensino Médio no Departamento de Programação Geral (DPG) do Colégio Objetivo em São Paulo e em outros estados do Brasil. Participa de aulas online na TV Web Objetivo e faz comentários sobre exames vestibulares e Enem, além de ministrar encontros pedagógicos para professores do Ensino Médio do Sistema Objetivo de Ensino. Coordena também o curso de Licenciatura em Geografia, na modalidade de ensino a distância da Universidade Paulista (UNIP). Fernando de Paiva Santos É pós‑graduado em Gestão e Organização Escolar pelo Instituto AVM e licenciado em Biologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Também é graduando em Saúde Pública pela USP. Em 2008, cursou as disciplinas de Epistemologia da Ciência e do Ensino; Metodologia do Trabalho Científico; Política e Organização do Ensino Brasileiro; Didática do Ensino Superior e História da Educação Brasileira em nível de pós‑graduação no Instituto Federal de Ensino Tecnológico de São Paulo (Cefet/SP). Desenvolve estágio no Departamento de Ciências Biológicas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) como crédito necessário para o curso de mestrado em Ornitologia pela Unifesp. É professor de Biologia do Ensino Médio do Colégio Objetivo e do curso pré‑vestibular do Sistema Objetivo. Ministra encontros pedagógicos para professores de Biologia do Sistema de Ensino Objetivo em São Paulo e em outros estados brasileiros. Foi professor de Ciências do Ensino Fundamental e Médio na rede municipal de ensino (PMSP) de 2002 até 2014. É professor do curso de Licenciatura em Geografia, na modalidade de ensino a distância na UNIP. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) R173i Ramirez, Ivete Maria Soares Ramirez. Introdução à problemática ambiental. / Ivete Maria Soares Ramirez Ramirez, Fernando de Paiva Santos. – São Paulo: Editora Sol, 2014. 112 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XIX, n. 2‑078/14, ISSN 1517‑9230. 1. Problemática ambiental. 2. Saúde pública. 3. Mudanças ambientais. I. Santos, Fernando de Paiva. II. Título. CDU 577.4 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Prof. Dr. Yugo Okida Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona‑Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Souza Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Giovanna Oliveira Amanda Casale Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Sumário Introdução à problemática ambiental APRESENTAçãO ......................................................................................................................................................7 INTRODUçãO ...........................................................................................................................................................8 Unidade I 1 A TRANSIçãO DO NOMADISMO AO SEDENTARISMO ...................................................................... 11 1.1 O modelo primitivo de ocupação do espaço ............................................................................ 11 1.2 A relação homem–meio ambiente na Idade Média ............................................................... 15 2 O MODO DE PRODUçãO ECONôMICO E A REVOLUçãO INDUSTRIAL ...................................... 20 2.1 Evolução histórica ................................................................................................................................ 20 3 OS CONFLITOS MUNDIAIS E AS MUDANçAS AMBIENTAIS ............................................................ 28 3.1 O que é o terrorismo? ......................................................................................................................... 37 3.1.1 Guerra ao Terrorismo ............................................................................................................................ 37 3.2 As fronteiras extremas ambientais e sociais ............................................................................. 39 4 A PREOCUPAçãO COM A PROBLEMáTICA AMBIENTAL E OS PROJETOS AMBIENTAIS ....... 43 Unidade II 5 SAúDE PúBLICA E QUALIDADE DE VIDA ............................................................................................... 56 5.1 O meio ambiente e o bem‑estar .................................................................................................... 56 5.1.1 A qualidade de vida e a questão ambiental ................................................................................. 56 6 A CIêNCIA, A SOCIEDADE E A CULTURA EMERGENTE ...................................................................... 63 6.1 Evolução e Mudança Cultural ......................................................................................................... 65 6.2 Mudanças ambientais e a saúde pública .................................................................................... 67 6.2.1 Dengue ........................................................................................................................................................ 76 6.2.2 Febre amarela silvestre ......................................................................................................................... 76 6.2.3 Riscos químicos .......................................................................................................................................77 6.2.4 Malária ........................................................................................................................................................ 77 6.3 Mudanças de clima, mudanças de vida ...................................................................................... 79 6.3.1 Os efeitos El Niño e La Niña ............................................................................................................... 83 6.3.2 Trajetórias típicas dos ciclones tropicais ....................................................................................... 83 6.3.3 Europa resfriada ...................................................................................................................................... 85 6.3.4 Ilha de calor .............................................................................................................................................. 86 6.3.5 Inversão térmica ...................................................................................................................................... 86 7 O MODELO DE DESENVOLVIMENTO E O CUSTO AMBIENTAL ......................................................... 86 8 O DESTINO BIOLóGICO DO HOMEM ........................................................................................................ 89 8.1 Métodos, realidade e interpretação ambiental ........................................................................ 91 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 7 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 APReSentAção Partindo‑se do princípio de que a problemática ambiental no contexto histórico descreve a transição do modo de vida dos grupos humanos e de que a sociedade humana é um subsistema global, interagindo com ele e dele dependendo para sobreviver, trabalharemos a questão ambiental dentro de um contexto histórico, assumindo que a associação dos grupos humanos com o meio ambiente depende do nível cultural e civilizatório, do nível tecnológico, dos padrões éticos e da velocidade com que as mudanças são empreendidas. Do homem primitivo à Idade Média e até as grandes guerras mundiais, muitas mudanças ocorreram na relação homem–meio ambiente, bem como a problemática ambiental e os projetos ambientalistas propostos na atualidade. O modo de produção foi sendo alterado, bem como a organização do espaço, o que contribuiu para o progresso econômico, embora simultaneamente comprometesse a questão ambiental. A partir de uma abordagem histórica, realizaremos uma análise ambiental, estabelecendo uma linha cronológica do tempo, relacionando os principais problemas e seus impactos nas sociedades humanas. Buscaremos uma avaliação da qualidade de vida, saúde pública, meio ambiente e bem‑estar da população humana, principalmente após a Revolução Industrial. Desta forma, visamos construir um panorama do complexo sistema no qual nossa espécie está inserida, detectando também o custo ambiental do nosso desenvolvimento e traçando o destino biológico do homem. Sabemos que existe uma crise ecológica historicamente determinada pela relação sociedade– ambiente, a qual pode ser observada na sua contemporaneidade pelos problemas gerados. Houve uma mudança decorrente da maior percepção internacional da crise por parte da sociedade civil e dos gestores ambientais sobre as razões que teriam levado às alterações. Nesse sentido, foi elaborada a concepção de desenvolvimento sustentável e de seus respectivos indicadores. Assim, em 1973 surgiu o termo ecodesenvolvimento como alternativa à concepção de desenvolvimento, termo este que passa a ser articulado por Ignacy Sachs integrando educação, participação, preservação de recursos naturais e satisfação de necessidades básicas. Para muitos autores, a relação entre desenvolvimento e meio ambiente é considerada um ponto central na compreensão dos problemas ecológicos, sendo o conceito de desenvolvimento sustentável uma nova maneira de a sociedade se relacionar com seu ambiente, garantindo sua própria existência e a do meio no qual vive. Por outro lado, a formulação de um conceito definitivo para desenvolvimento sustentável gera controvérsias e distintas interpretações, sem que se atinja um consenso, principalmente no que concerne aos índices de emissão de poluentes, da eliminação de desperdícios ou de redução dos índices de pobreza e desigualdade social. 8 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 O modo de produção capitalista, na sua fase atual, está mudando sua forma de organização de exploração para exclusão. Essa situação pode ser observada pelo aprofundamento da desigualdade, da pobreza e da miséria em amplas áreas do mundo. Pretendemos discutir em nossa disciplina também as questões relativas à identidade: Quem sou eu? Como me relaciono com os outros? Qual é a ética necessária para chegarmos a uma melhor qualidade de vida? O mundo globalizado apresenta‑se com novos desafios, novos problemas, novos riscos e uma situação de mal‑estar. Fala‑se em xenofobia, apartheid social e espacial, autodestruição em termos de perdas ambientais, superexploração dos espaços, dominação e subjugação dos pobres aos ricos, perda de qualidade de vida e deterioração dos padrões culturais. Então surge o questionamento que procuramos elucidar, sobre qual o modelo de desenvolvimento adequado para manter uma satisfatória qualidade de vida sem que haja um grande custo ambiental: qual será o destino biológico do homem? A disciplina Introdução à Problemática Ambiental fará, portanto, uma revisão dos problemas dentro do contexto histórico dos grupos humanos, do modelo primitivo à relação homem–ambiente na Idade Média, seguindo para o modo de produção capitalista do Mercantilismo à Revolução Industrial. Também falaremos a respeito das mudanças ambientais decorrentes dos conflitos mundiais: 1a e 2a Guerras, a Guerra Fria, do Vietnam e das Coreias. Abordaremos também as mudanças empreendidas desde a ordem bipolar à nova ordem mundial. Questionaremos, ainda, a sobrevivência na cidade, a sustentabilidade e a qualidade de vida, bem como as mudanças ambientais, a saúde pública e as mudanças de clima, mudanças de vida. IntRodução Durante milênios, o homem foi caçador, perseguia suas presas seguindo suas pegadas por ambientes distintos – lama, mata etc. – aprendendo a farejar, a registrar e a classificar suas pistas (ramos quebrados, dejetos, pelos, odores que lhe permitiam alcançar sua presa etc.). Na obra Mitos, Emblemas, Sinais – Morfologia e História (1985, p. 152), Carlo Ginzburg afirma o seguinte: Decifrar ou ler pistas dos animais são metáforas. Sentimo‑nos tentados a tomá‑las ao pé da letra, como a condensação verbal de um processo histórico que levou, num espaço de tempo talvez “muito longo”, à invenção da escrita. A mesma conexão é formulada sob a forma de mito etiológico em vários povos e suas lendas. 9 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Nossa proposta nesta obra é encontrar pistas atuais que nos permitam caracterizar a marca deixada pela natureza nos distintos modos de organização da vida de lugares e de seus habitantes, bem como o que essas pessoas imprimiram nesses lugares, como o transformaram de acordo com seu modo de vida. Aqui temos um trabalho que pode ser realizado de forma interdisciplinar e contextualizada entre distintos campos do conhecimento e no qual cabe ao historiador iniciar o processo de reunir fatos e identificar grupos humanos a partir de seus conhecimentos diretos ou indiretos. Os dados obtidos, porsua vez, podem ser complementados pela Antropologia, Arqueologia, Geografia, Biologia, Economia entre outras áreas do conhecimento. Sabemos que cada sociedade observa a necessidade de distinguir os seus componentes; mas os modos de enfrentar essa necessidade variam conforme os tempos e os lugares, seu modo de produção, as características do lugar de vivência, entre outros fatores incluindo‑se o ordenamento territorial e político. Assim, temos também uma preocupação histórica sobre a temática ambiental diante da realidade do cotidiano de cada um dos grupos humanos, que reproduzem, na sua vivência, a apropriação de recursos naturais, o uso do solo para sua alimentação, a criação animal, a obtenção de matérias‑primas para transformação, o uso da água para dessedentação animal e humana, suas próprias condições de saúde orgânica, a salubridade ambiental, a qualidade atmosférica, entre outras condições que poderíamos mencionar. Devemos lembrar que o ser humano difere de outras espécies pelo seu grande poder de alterar os ecossistemas, no sentido de torná‑los melhores ou piores para sua sobrevivência. Contudo, o que tem ocorrido, infelizmente, é a ênfase em transformá‑los de maneira cada vez mais comprometedora. Apesar disso, a conscientização desse fato tem sido ampliada, bem como as discussões acerca dessa problemática, embora nem sempre os problemas sejam realmente solucionados. O que ocorre é uma questão de escala econômica na trajetória das alterações ambientais no Planeta, uma vez que as atividades alteradoras acontecem de forma regionalizada. O sistema físico global é afetado pelas alterações em distintos níveis, como o comprometimento do sistema marinho, que desencadeia outras mudanças, ou ainda as alterações provocadas pela emissão de CO 2 no solo e que comprometem a diversidade biótica. Os desastres e degradações podem migrar para outras áreas em decorrência das ações humanas e promover impactos físicos. Propomos, por isso, uma análise dos efeitos decorrentes das ações humanas no comportamento dos ambientes naturais. Não podemos ignorar em nossa obra o fato de que as mudanças ambientais globais estão relacionadas às noções de espaço, paisagem, recursos naturais disponíveis, tipo de organização social e política e que envolvem também a subjetividade, sendo que esta última, por sua vez, é composta por identidade, espiritualidade, projetos pessoais e projetos coletivos. Todos esses elementos somados resultam nos sintomas sociais e em seus signos de manifestação, que, por sua vez, envolvem a qualidade de vida e o risco de viver na era da globalização. 10 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Dessa forma, questionaremos quais são as consequências do modo de viver na sociedade moderna, da revolução tecnológica, dos avanços científicos, da rapidez possibilitada pela informação. O modo de viver mudou; a sociedade está cada vez mais complexa, os relacionamentos interpessoais cada vez mais difíceis. Como afirmou o professor Milton Santos (2011), em sua obra Por uma outra globalização, é preciso perceber três espécies de globalização, se quisermos escapar à crença de que este mundo, assim como nos é apresentado, é a única opção verdadeira. Dessa forma, é necessário entender que há o mundo tal como nos fazem vê‑lo, com a globalização como fábula, o mundo como ele é, com a globalização como perversidade, e o mundo como ele pode ser, o da outra globalização. Essa será a proposta de análise que norteará nossa disciplina. 11 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental Unidade I 1 A tRAnSIção do noMAdISMo Ao SedentARISMo 1.1 o modelo primitivo de ocupação do espaço Na história da humanidade, os problemas ambientais surgiram desde o início da interação do homem com o meio ambiente – logo, desde que o homem existe. A espécie Homo sapiens apareceu na Terra há mais ou menos 195 mil anos, contudo seu desenvolvimento se deu principalmente nos últimos dez mil anos, quando formou sociedades organizadas. Elas foram se adaptando aos lugares e, ao mesmo tempo, tronando‑se cada vez mais vulneráveis, expondo‑se aos riscos e desastres ambientais. Isso comprometeu sua qualidade de vida, de saúde ambiental e mesmo sua cultura, conforme sua adequação aos distintos momentos históricos. Glaciações de Riss e de Worm (‑ 220.000 a ‑ 8.000) Descoberta do fogo (‑400.000 anos) condição de expansão do Homo ergaster rumo às regiões frias Os primeiros centros do gênero Homo Os centros de nascimento da escrita Australopithecus Aparecimento‑extinção (em número de anos) área de extensão Migração Sítio Homo habillis Homo ergaster Homo erectus* Homo neanderthalensis Homo sapiens Homo sapiens sapiens *Homo erectus e Homo ergaster parecem oriundos do mesmo ramo Homo. A simbolização escolhida aqui sugere uma hipótese de diferenciação mais clara. Figura 1 Enquanto o homem não estabelecia residência fixa em um determinado local, todos os resíduos que produzia eram abandonados onde se estabelecia temporariamente e, dessa forma, não interferiam em 12 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I sua vida. Essa fase de nomadismo, somada à pequena população humana da época (Período Paleolítico), não apresenta registros de problemas ambientais, uma vez que a interação homem–meio ambiente não resultava em transtornos significativos. Figura 2 – Pinturas rupestres No Período Paleolítico, ou Idade da Pedra Lascada, o homem, além de nômade, era coletor e caçador, pois não dominava técnicas de agricultura e de domesticação de animais. Além disso, também não entendia por completo o fogo e a manufatura de ferramentas. Com o tempo, passou a perceber que a carne assada era melhor para consumo do que a carne crua; que manter o fogo gerado por raio caído em árvores podia lhe aquecer e iluminar a noite e que sementes, ao cair das árvores ou serem abandonadas após o consumo de frutos, geravam novas plantas. Esses fatores iniciaram processos de modificação no homem e na sua maneira de viver. A partir desse momento, o ser humano começou a consumir alimentos assados, o que causou uma modificação em sua arcada dentária. Também aprendeu a manusear o fogo para manter‑se aquecido durante a noite e afastar predadores, além de fixar moradia onde os frutos geravam novas plantas. Dessa forma, iniciou o domínio da agricultura, eliminando a necessidade (até então constante) de coleta dos alimentos. Nesse momento, começou o processo de sedentarismo, que marcou o início da Revolução Neolítica que, estima‑se, tenha acontecido entre 10000 e 7000 a.C., dependendo do grupo humano ao qual nos referimos. Esse processo foi caracterizado pelas alterações nos costumes e habilidades do homem que passaria, então, ao que chamamos de Idade da Pedra Polida, em referência às ferramentas feitas com pedras polidas, ou Período Neolítico. Durante a revolução neolítica, o homem passou a cultivar alimentos de origem vegetal. Nascia, assim, a agricultura, que era uma atividade realizada principalmente pelas mulheres, enquanto os homens continuavam responsáveis pela caça. A atividade perdurava num determinado local até que o solo se esgotasse e o grupo fosse obrigado a mudar‑se novamente, procurando terra fértil. Encontrando‑a em locais onde não havia abrigo (cavernas), começava a construir pequenas moradias para ali fixar‑se. Com 13 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental o crescimentodas plantações, os homens passaram a ajudar na agricultura, o que reduziu a atividade de caça. Como dependiam de solo fértil, não é de se estranhar que as primeiras civilizações humanas tenham surgido justamente em áreas próximas às margens de rios, como na Mesopotâmia (rios Tigre e Eufrates), China (rios Yang‑tsé e Huang Ho) e Egito (rio Nilo). Os grupos humanos tinham, então, um novo desafio: vencer a força da natureza que periodicamente destruía as plantações com a cheia dos rios. A partir desse problema, novas tecnologias foram desenvolvidas, como a construção de diques e canais de irrigação, garantindo às plantações água e proteção. Dessa forma, o crescimento populacional foi inevitável. Com alimento abundante, o domínio do fogo, a domesticação de animais e a moradia a taxa de crescimento humano atingiu níveis altíssimos. O homem, assim, deixa a Pré‑história. E qual a relação entre essa temática e as questões ambientais? Imagine que, num primeiro momento, os grupos humanos se distribuíam em pequenos grupos nômades e, num segundo, passaram a concentrar‑se em grandes populações sedentárias. Isso com certeza fez com que fosse aumentada a produção de resíduos, o que marcaria o problema ambiental decorrente do consumo, ou seja, a produção de lixo. Enquanto nômades, os resíduos humanos eram basicamente carcaças de animais e restos de alimentos. Como o homem mudava de local constantemente, esses resíduos não se acumulavam em grandes volumes e também não significavam um problema para nossa espécie. Porém, quando as comunidades passaram ao sedentarismo, acumulando‑se em grandes grupos humanos, os resíduos começam a acumular‑se junto a essas civilizações. Isso fez com que o homem precisasse lidar com um problema que antes não o incomodava – o lixo. O que fazer com os restos da alimentação, fezes e também com os animais atraídos por esse lixo, como moscas e ratos? Eis o que passou a ser um dos principais problemas ambientais a serem administrados desde o início de nossa história até os dias de hoje: a falta de saneamento adequado. Somado a todo esse contexto, podemos citar também o desmatamento gerado pela abertura de áreas para agricultura e pecuária, assim como para extração de madeira para a construção de moradias para essas civilizações. Podemos, então, concluir que o surgimento das civilizações humanas data também o início dos problemas ambientais em nosso planeta. A evolução do homem ofereceu‑lhe condições físicas e intelectuais de entender quais eram suas necessidades e, a partir disso, interagir com a natureza de forma a explorá‑la em benefício de sua espécie. Mendonça (2005, p. 48) afirma que “alguns seres humanos se sentiram em condições de subjugar as florestas e os povos que as habitavam e fazer prevalecer seus modos de ser e fazer a vida”. Ainda sobre o tema do trabalho humano na natureza, Marx diz: 14 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I O trabalho é um processo entre o homem e a natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar‑se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida” (MARX apud ANTUNES, 2005, p. 36). Sendo assim, a partir da Revolução Neolítica, entendemos que o homem adquiriu capacidade de manipular o meio ambiente, criando condições à sua sobrevivência e à de seus pares. Com isso, vemos um quadro de impacto ambiental criado desde a Antiguidade que se estende até os dias atuais, com projeção nas gerações futuras. Um dos elementos mais explorados ao longo do tempo foi a madeira, que se tornou escassa durante o século V a.C. na Grécia. Os romanos, também antes de Cristo, reclamavam de poluição do ar, demonstrando o impacto que a civilização humana causa no meio ambiente desde tempos remotos. Ao longo da história, a relação do homem com a natureza foi sendo alterada de acordo com mudanças nas próprias relações humanas. Na Antiguidade, a sociedade era matriarcal e, sendo assim, tinha com a natureza uma relação integradora, na qual a exploração baseava‑se simplesmente na sobrevivência dos povos e a figura da natureza como mãe era comum, como se vê em artefatos simbolizando a natureza na forma de deusa mãe. Porém, nem todas as sociedades eram assim e, à medida que conflitos começaram a surgir, uma nova maneira de explorar a natureza também apareceu. As civilizações patriarcais que valorizavam o domínio expandiram‑se e a exploração e o domínio do meio natural tornaram‑se práticas comuns. Saía de cena, assim, o modelo coletivo e integrador para dar lugar ao modelo de domínio e subjugação. A grande mudança de sociedades matrísticas para patriarcais aconteceu quando a tecnologia disponível deixou de ser aplicada unicamente para a produção (agrícola e de artefatos) e passou efetivamente a ser utilizada para a fabricação de armas. Paulatinamente as sociedades se tornaram dominadoras. Surgiram os impérios. A ideia de dominação e apropriação da natureza e de outros povos foi se ampliando e difundindo pela região que hoje corresponde ao Oriente Médio e Europa (de onde importamos nosso modo de ser atual) (MENDONçA, 2005, p. 59). Essa separação entre natureza e homem (objeto e sujeito) passou a ser integrante do pensamento humano; apesar de focos de resistência como a Grécia, onde a concepção de que o homem era parte da physis ainda vigoravam. Nasce, assim, a ideia de que nós, humanos, não somos parte da natureza e de que interferir nela não nos traz quaisquer consequências. Assim, a natureza passou a ser um simples objeto de exploração para o ser humano. 15 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental observação Physis vem do verbo phyomai, que significa emergir, nascer, crescer: processo de nascimento. Esse conceito designa tudo aquilo que brota, cresce, surge, vem a ser. Physis não é paisagem ou oposição ao artificial, é tudo o que é vivo, a força originária criadora de todos os seres, responsável por seu surgimento, transformação e degeneração (CHAUÍ, 1994). A Grécia Antiga era detentora de diversas colônias no período anterior a Cristo que, em sua maioria, estavam localizadas em ilhas. A manutenção do império grego demandava muitos recursos e quando estes se esgotavam em um local os exploradores seguiam para outro. Essa manutenção se baseava no comércio e na pesca. Naturalmente, para tanto eram necessários muitos navios e, portanto, muita madeira. Como o território era muito seco e a extração muito grande, Aristóteles recomendou aos magistrados que cuidassem das florestas a fim de regular o uso da madeira. A madeira, aliás, também era importante no Império Romano. Segundo Perlin (1992), quando a madeira próxima a Roma acabou, os romanos avançaram em direção a outras regiões enviando os troncos através dos rios. Na Roma Antiga também divisamos outra prática pertinente ao impacto ambiental que os humanos causam na natureza – a reciclagem. No século I, romanos pobres recolhiam vidros quebrados da mesma forma que as pessoas recolhem atualmente latas de alumínio para reciclagem (MENDONçA, 2005). Braga (2006) relata que as primeiras reclamações sobre poluição do ar apareceram na mesma Roma, onde foram criados os aquedutos para abastecimento de água e o primeiro sistema de esgoto de que se tem notícia (a Cloaca Máxima). 1.2 A relação homem–meio ambiente na Idade Média A Idade Média cronologicamente caracteriza‑se como um período da história europeia com início na queda doImpério Romano Ocidental, em 476 d.C., e fim na queda do Império Bizantino de Constantinopla, em 1453 d.C. Ela pode ser dividida em Alta e Baixa Idade Média. A Alta Idade Média (séculos V a X) foi marcada por invasões de diversos povos sobre a Europa, que contribuíram para a formação do feudalismo; um sistema socioeconômico, político e cultural no qual os senhores feudais eram os donos da terra e os servos – camponeses – trabalhavam nas plantações. A nobreza era sustentada por impostos e a Igreja tinha um enorme poder. Essa sociedade era dividida em ordens sociais (clero, nobreza e servos) com suas funções delimitadas. Prevalecia, além disso, a imobilidade social. A economia era basicamente agrária e autossuficiente. A produção era feita para o consumo imediato e o excedente, quando existia, servia para o comércio. O trabalho era regulado pelas obrigações servis 16 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I entre senhor feudal e servos. Nesse ambiente, eram notáveis a desigualdade social, a pobreza e o alto índice de doenças. Foi uma época cheia de crises, decorrentes principalmente da alta mortalidade e da baixa expectativa de vida devidos ao grande número de doenças e à fome que assolava a maior parte da população – em especial os camponeses, que viviam em péssimas condições de vida e pagavam pesados impostos ao senhor feudal, ao rei, ao clero e à nobreza. Figura 3 Nesse momento histórico, a cultura era essencialmente teocêntrica e o poder político fazia uso da influência religiosa da Igreja Católica, que ditava o modo de pensar e as tradições da sociedade. A fé explicava desde os fenômenos naturais até a maneira de o homem se relacionar com o indivíduo e a natureza. No livro L’écologie et son historie, de 1993, Jean MarçDrouin cita Lynn White dizendo que, nesse período da Idade Média, estão os primeiros argumentos para o domínio do homem sobre a natureza. White concebe que a mentalidade que norteou, posteriormente, a Revolução Industrial é muito anterior à criação da máquina e afirma que a natureza é um recurso a ser explorado pelo homem. Segundo ele, os problemas ambientais têm sua gênese na teoria judaico‑cristã, por duas razões: • a distinção entre o homem (feito à imagem e semelhança de Deus) e o restante da criação, que não teria alma ou razão e, portanto, seria inferior; 17 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental • uma leitura fundamentalista de uma passagem do livro “Gênesis”, da Bíblia: “Deus os abençoou: ‘Frutificai, disse ele, e multiplicai‑vos, enchei a terra e submetei‑a. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra’” (BÍBLIA..., s.d., cap. 1, vers. 22, p. 3). A interpretação desse trecho teria sido a base histórica para o antropocentrismo e, por consequência, para a mudança na maneira de as pessoas de conceberem a natureza e de se relacionarem com ela. Para White (apud DROUIN, 1993) essas razões teriam levado os cristãos a uma indiferença com relação ao restante da criação que perdurou no mundo industrial. Ele conclui seu raciocínio dizendo que o desenvolvimento da ciência e de novas tecnologias não solucionará a crise ambiental, pois as ideias fundamentais da humanidade sobre a natureza é que precisam mudar. Seria necessário, então, abandonar a ideia de superioridade e a atitude antropocêntrica que nos tornam dispostos a usar nosso meio ambiente sem considerar os limites de suporte do planeta. Seguindo essa linha de raciocínio, podemos entender que, a partir de uma interpretação do texto bíblico, o homem, nesse momento histórico, passou a sentir‑se superior em relação ao restante da criação divina e, portanto, supôs‑se apto e respaldado a dominar, explorar e usufruir da natureza. Lembrete Os problemas ambientais surgiram desde o início da interação do homem com o meio ambiente, e mudanças culturais foram colaborando para a piora dessa relação. É preciso, contudo, entender que a passagem bíblica não expressa uma autorização divina para a exploração desmedida que sucede esse período da história. Não é dito em momento algum que o homem poderia apropriar‑se da natureza a ponto de destruí‑la e gerar condições comprometedoras da sobrevivência das espécies, incluindo nisso o próprio homem. Devemos ressaltar que a linguagem utilizada na época em que o “Gênesis” foi escrito não pode ser comparada aos padrões atuais. Segundo o livro bíblico, Deus criou o homem à sua imagem e semelhança e, portanto, não seria concebível que as atitudes da criação divina fossem “tiranas” em relação à natureza, uma vez que Deus representa bondade e amor. White (apud DROUIN, 1993) sugere adotarmos o pensamento de São Francisco de Assis como modelo para a relação homem–natureza. Para São Francisco, todas as criaturas deviam ser respeitadas e o domínio do homem devia ser limitado. Ele pregava que a tarefa dos homens era proteger e valorizar a natureza uma vez que são criação divina e auxiliares do Criador, além também de Suas criaturas. Na mesma obra, Jean MarçDrouin (1993) cita o biólogo Rene Jules Dubos, que se posiciona de maneira diferente de White. Dubos (apud DROUIN, 1993) argumenta que o judaísmo demonstra preocupação com a natureza, como podemos observar nos anos sabáticos, quando a terra deve ser deixada em descanso. Consta no livro “êxodo”: “Durante seis anos, semearás a terra e recolherás o produto. Mas, no 18 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I sétimo ano, a deixarás repousar em alqueive; os pobres de teu povo comerão o seu produto, e os animais selvagens comerão o resto. Farás o mesmo com a tua vinha e o teu olival” (BÍBLIA..., s.d., cap. 23, vers. 10–11, p. 3). ocidental latino‑americana Civilizações ameaçadas O possível “choque“ Civilização ortodoxa árabe‑muçulmana africana (e outras) budista e confuciana xintoísta hinduísta Figura 4 Dubos (apud DROUIN, 1993) embasa sua ideia citando o caso da China, que apresenta um percentual baixo de judeus e cristãos e tem um histórico considerável de degradação ambiental. Nesse país, a ausência da doutrina judaico‑cristã pode justificar a falta de preocupação com o meio ambiente. Assim, segundo o autor, não se pode creditar à tradição judaico‑cristã a responsabilidade pela origem do problema ambiental na Idade Média. Devemos ressaltar que a religiosidade faz parte da cultura de um povo e, dessa forma, influenciou a organização do espaço e, na prática, a apropriação e uso dos recursos. observação No Islã, a relação entre a humanidade e o meio ambiente é baseada no fato de que tudo na Terra adora Deus. Esse culto não é apenas prática 19 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental ritual, pois muda‑se para as ações, o que significa que faz parte da fé muçulmana não prejudicar o ambiente. Além disso, os seres humanos são responsáveis pelo bem‑estar e pela vida dos outros habitantes deste ambiente global. “Se ao menos houvesse, entre as gerações que vos precederam, alguns sensatos que proibissem a corrupção na Terra” (Alcorão 11:116 apud QURAN, 2003, p. 109). A Europa colonizadora em 1914 A: Alemanha F: França PB: Países Baixos GB: Grã‑Bretanha J: Japão P: Portugal DK: Dinamarca B: Bélgica E: Espanha US: Estados Unidos Colônia, protetorado ou zona de influência em 1914 Império sem colônia Potência não‑europeia e zona de influênciaColônias no século XVIIIData de independência América Latina Litígio territorial Figura 5 Embora durante a Idade Média a visão de mundo predominante fosse o teocentrismo, pode‑se dizer que, para os homens medievais, a função da natureza já era avaliada segundo padrões antropocêntricos. Ou seja, Deus teria criado a natureza para tornar possível a existência do homem e, assim, uma estaria subordinada à outra. Essa concepção abriu caminho para a ideia de que o homem podia se aproveitar da natureza para satisfazer seus interesses, inclusive econômicos. Dessa forma, embora a economia rural impedisse grandes desequilíbrios ecológicos, começaram a surgir diversos problemas ambientais, como o desflorestamento e a poluição do ar causada pela queima de carvão. Assim, quando a Europa passou por diversas modificações que deram início ao processo de desintegração do sistema feudal, na Baixa Idade Média 20 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I (séculos XI a XV), o capitalismo comercial encontrou terreno fértil. As trocas comerciais, antes muito reduzidas, começaram a crescer a partir do século XII. Com a intensificação do comércio, os povos europeus sentiram a necessidade de buscar em terras distantes metais preciosos, mercados, especiarias, matérias‑primas e terras. Assim, iniciaram uma expansão marítimo‑comercial que acabaria por se tornar essencial para a interligação de todo o Globo e para o processo de degradação ambiental europeu, uma vez que, para a construção das embarcações, grande quantidade de madeira e outros recursos minerais eram necessária. Mais do que isso, as Grandes Navegações possibilitaram uma acumulação de capital que seria condição básica para a Revolução Industrial que estava por vir no século XVIII. Saiba mais Uma leitura envolvente e agradável sobre a história da humanidade pode ser feita no livro: COIMBRA, D. Uma história do mundo. São Paulo: L&PM, 2012. 2 o Modo de PRodução econôMIco e A RevoLução InduStRIAL 2.1 evolução histórica A atividade industrial pode ser analisada por meio das fases que antecederam a caracterização moderna, nas quais a elaboração de matérias‑primas e sua posterior transformação em bens (produtos finais) eram realizadas de forma simples e por meio da mão de obra artesã, que era fundamental. Assim, temos as seguintes fases: Fase artesanal (até o século XV): • nenhuma divisão do trabalho; • uso de ferramentas; • menor produção; • produtos personificados; • força de trabalho: mãos do artesão. 21 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental Figura 6 Fase manufatureira (séculos XVI ao XVIII): • divisão primária do trabalho; • uso de máquinas simples; • quantidades maiores, mas trabalho ainda depende das mãos do artesão. Figura 7 Fase moderna (a partir da Revolução Industrial na Inglaterra, no séc. XVIII), em países europeus e nos EUA: • grande divisão do trabalho; • especialização do trabalhador; • máquinas modernas com uso de fontes de energia; 22 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I • produção em grandes quantidades e produtos estandardizados (padronizados, feitos em série e dos mesmos modelos); • indústria moderna: resultado da Revolução Industrial e da expansão do capitalismo. Figura 8 No século XV, o comércio era a principal atividade econômica na Europa. O impulso maior para isso ocorreu na Idade Média, com as Cruzadas e a consequente aproximação entre Ocidente e Oriente, constituindo a base de um novo sistema econômico, o qual substituiria o decadente modo de produção feudal. O desenvolvimento do comércio, por sua vez, fez surgir um grupo de indivíduos que intermediavam as relações entre produção e consumo, obtendo produtos negociáveis de comerciantes e revendendo com lucro esses produtos. Esses negociantes formaram a burguesia nessa fase embrionária do capitalismo. Essa fase de transição entre o modo de produção feudal e o capitalismo, já em sua fase industrial no século XVIII, é o mercantilismo, que surgiu, portanto, com o fortalecimento da burguesia mercantil e a centralização do poder em mãos do rei, em detrimento do poder dos senhores feudais. A economia mercantil, por sua vez, teve como consequência a expansão marítima de algumas monarquias europeias, a saber: Espanha, Portugal e Inglaterra, principalmente. Também teve destaque, nesse contexto, o monopólio da navegação no mar Mediterrâneo exercido pelos árabes e pelas cidades italianas de Gênova e Veneza. Outra decorrência desse comércio foi a anexação do Continente americano a fim de que pudessem ser exploradas suas riquezas (minerais e vegetais) em benefício das atividades comerciais da Europa ibérica. 23 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental Observamos que, desde esse período, a despreocupação com o ambiente e a biodiversidade, bem como com as questões relativas à saúde, ao saneamento básico e, consequentemente, à qualidade de vida, era flagrante. Dois séculos de amadurecimento foram necessários para que acontecessem as inovações técnicas (como o uso do vapor) associadas ao acúmulo de capitais e ao mercado em expansão, dinamizando a economia europeia. Estabelece‑se, portanto, uma nova etapa da produção econômica, fundamentada na indústria: a fase da Revolução Industrial, ocorrida na Inglaterra, em meados do século XVIII, representando muito mais do que uma simples mudança no sistema produtivo, no qual se observam mudanças na hierarquia social (então dividida em classes sociais) e na produção determinada pelo lucro e pelo interesse no capital. A insalubridade e as doenças, no entanto, proliferavam na Europa, somadas à falta de saneamento e de higiene; as cidades eram redutos de ratos, insetos, lixo. Também eram observadas cenas de poluição com a intensificação do uso do carvão mineral para geração de energia. Por outro lado, como obter recursos? A dinamização da produção, que deixa de ser manufatureira e passa a ser mecanizada (máquinas a vapor), que teve início na Inglaterra e se estendeu posteriormente a outros países europeus, fez crescerem, principalmente na Europa do século XIX, as necessidades de matérias–primas e novos mercados. As nações industrializadas necessitavam de fontes constantes e abundantes de matérias–primas para sua crescente atividade produtiva. Isso, somado à necessidade de aplicar o capital e ampliar a rentabilidade, levou as nações industrializadas a formar verdadeiros impérios em terras dos continentes africano e asiático. O imperialismo, resultante da concorrência entre as nações industrializadas da Europa e como parte da política neocolonialista, resultou no militarismo (através da dominação física do território), do nacionalismo (exaltação do sentimento nacional, apesar das diferenças de classes), no racismo (teoria da superioridade racial, étnica e religiosa) e na hierarquização das nações (que serviu de base para a Divisão Internacional do Trabalho – DIT). Devemos destacar que, nesses momentos históricos, continuava a despreocupação com temas ambientais e a saúde pública. A partir da segunda metade do século XVIII, com a Revolução Industrial, iniciou‑se um processo ininterrupto de produção coletiva em massa, geração de lucro e acúmulo de capital. Na Idade Média, já existiam comerciantes que podiam ser considerados capitalistas, embora não vivessem em um mundo capitalista. “Houve práticas capitalistas muito antes da existênciado capitalismo como sistema econômico” (KOSHIBA; PEREIRA, 2004, p. 228). Mas foi na Idade Moderna que produzir para vender e lucrar começou a se tornar a regra geral. Tendo ocorrido inicialmente na Inglaterra, no século XVIII, a industrialização foi almejada depois pela Alemanha, Estados Unidos, Japão e França, hoje considerados países centrais (KOSHIBA; PEREIRA, 2004). 24 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I Superior a 10.000 PIB por habitante em 2005, paridade de poder de compra (PPC) (em doláres) Entre 5.000 e 10.000 Inferior a 5.000 Sem dados disponíveis Figura 9 Vale lembrar que o capitalismo é uma construção histórica ao longo da existência do homem e não um comportamento inerente à sua existência. Durante a Idade Moderna, foram se desenvolvendo na Europa as condições necessárias para o capitalismo industrial. A expansão ultramarina e a colonização da América ampliaram o mercado europeu e abasteceram a Europa com riquezas que aceleraram a acumulação de capitais, que, por sua vez, preparou o surgimento do capitalismo. A classe burguesa, então, fortaleceu‑se e, inclusive, chegou ao poder na Inglaterra no século XVII, com a Revolução Puritana (KOSHIBA; PEREIRA, 2004). Ao contrário das sociedades antigas e medievais, a sociedade capitalista é comandada pelo mercado: a preocupação econômica toma conta das relações sociais, que são marcadas pela impessoalidade e concorrência. Todas as atividades são baseadas na dinâmica de compra e venda. “No capitalismo não se trabalha para viver, vive‑se para trabalhar. O trabalho converteu‑se num fim em si mesmo” (KOSHIBA; PEREIRA, 2004, p. 232). As revoluções liberais da Idade Moderna (principalmente a Revolução Inglesa, a Revolução Francesa e a Independência dos Estados Unidos da América) fizeram com que o capitalismo se estabelecesse 25 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental como sistema econômico predominante nos países da Europa ocidental e nos Estados Unidos. Elas construíram a base para o desenvolvimento capitalista no mundo contemporâneo. A Idade Contemporânea iniciou‑se com a Revolução Francesa (1789) e estende‑se até os dias de hoje. O capitalismo do mundo contemporâneo é um sistema econômico baseado na propriedade privada dos meios de produção e na propriedade intelectual, que tem como objetivo a obtenção de lucro através do risco do investimento. As decisões sobre os investimentos de capital são feitas pela iniciativa privada e a produção, a distribuição e os preços dos bens, serviços e recursos humanos são controlados pela força da oferta e da procura. Como continuidade desses fatos, resultou a concorrência entre as nações industrializadas, nas primeiras décadas do século XX, culminando nas duas grandes guerras, a saber: a primeira, de 1914 a 1918, e a segunda, de 1939 a 1945. Esses conflitos envolveram quase todo o Mundo, especialmente Inglaterra (atual Reino Unido da Grã‑Bretanha e Irlanda do Norte), França, Alemanha, Japão, Estados Unidos e União Soviética. Esses conflitos influenciaram não só a ordem mundial quanto a sua organização, assim como os aspectos sociais e os riscos ambientais. Neste contexto, observou‑se que a ciência e a tecnologia tornaram‑se cada vez mais desenvolvidas, buscando a melhoria da qualidade de vida dos seres humanos. No entanto, a desigualdade social foi se tornando cada vez mais presente no Planeta, constituindo um divisor dentro do modelo capitalista criado nos últimos séculos. O pessimismo na obra Vidas Desperdiçadas, de Baumann (2005), generaliza‑se, sai do plano individual e atinge a coletividade social. A evolução do capitalismo pressiona os âmbitos social e o subjetivo; torna‑se difícil superar as desigualdades com desdobramentos em termos ambientais. observação Karl Marx, já no século XIX, denunciava o caráter exclusivista da sociedade capitalista. Segundo ele, é impossível superar a desigualdade social no capitalismo, visto que a base desse sistema é o lucro e, portanto, a exploração do proletariado. A sociedade de consumo atual é caracterizada por profundas crises socioambientais e socioeconômicas, resultantes do ideal do progresso e do desenvolvimento tecnológico, da produção em massa de produtos muitas vezes supérfluos ou até mesmo nefastos à qualidade de vida, da degradação ambiental e da exploração dos elementos naturais em tal velocidade e intensidade que se torna impossível para a natureza se recompor na escala de tempo humana. Nas últimas décadas, muito se tem falado sobre os problemas ambientais que põem em risco a perpetuação da vida na Terra. Acordos com o objetivo de reduzir a poluição e outros problemas, como o aquecimento global e o buraco na camada de ozônio, têm sido discutidos em escala mundial. Entre eles, podemos destacar o Protocolo de Kyoto, que estabelece metas de redução de gases poluentes para os países industrializados. 26 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I observação A primeira grande produção em série aconteceu em uma fábrica de armas nos Estados Unidos, em 1800. “Mais tarde, no início do século XX, os americanos Frederick Taylor e depois Henry Ford elevaram os índices de produção num sistema cada vez mais rápido, preciso e em série. Estava criada a chamada linha de montagem” (KUPSTAS, 1997, p. 97). Quando falamos em modo de produção capitalista, pensamos em divisão internacional do trabalho (DIT). Observe as figuras a seguir, que ilustram a evolução na DIT em suas fases: Metais preciosos, especiarias, escravos etc. Colônias (exploração) Metrópoles (expansão marítima) Origem da DIT Manufaturas Colonialismo Figura 10 – Capitalismo comercial Produtos primários: agrícolas, minerais e fósseis. Colônias (exploração) Metrópoles (Revolução industrial) Consolidação da DIT Produtos industrializados Imperialismo Figura 11 – Capitalismo industrial e financeiro (até a Segunda Guerra Mundial) 27 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental Produtos primários: agrícolas, minerais e fósseis Países subdesenvolvidos não‑industrializadosPaíses desenvolvidos DIT clássica Produtos industrializados Capitais: investimentos e empréstimos (pouco) Produtos primários produtos industrialados Capitais: juros, royalties e lucros Produtos industrializados (em geral de tecnologia superior) Capitais: empréstimos, investimentos produtivos e especulativos, tecnologia Globalização Países subdesenvolvidos industrializadosPaíses desenvolvidos Nova DIT Figura 12 – Capitalismo financeiro (após a Segunda Guerra Mundial) Devemos ressaltar que a produção e o consumo, assim como as necessidades humanas, tornaram‑se cada vez mais internacionais e cosmopolitas. De acordo com o texto de Marshall Berman (1986, p. 89‑90), o âmbito dos desejos e reivindicações humanas se amplia muito além da capacidade das indústrias locais, que então entram em colapso. A escala de comunicações se torna mundial, o que faz emergir uma mass media tecnologicamente sofisticada. O capital se concentra cada vez mais nas mãos de poucos. Camponeses e artesãos independentes não podem competir com a produção de massa capitalista e são forçados a abandonar suas terras e fechar seus estabelecimentos. A produção se centraliza de maneira progressiva e se racionaliza em fábricas altamente automatizadas. O texto expressa as mudanças empreendidas no modo de produção capitalistae, consequentemente, suas repercussões nos aspectos sociais e organizacionais do espaço. Ele representa, ao mesmo tempo, a história do modelo de trabalho e das relações na organização da sociedade na produção de riquezas e de hábitos de consumo. Além disso, altera também as relações sociais de produção. 28 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I observação Segundo Harnecker (1974), relações sociais de produção são as relações que se estabelecem entre os proprietários dos meios de produção e os produtores diretos em um processo de produção determinado, relação que depende do tipo de relação de propriedade, posse, disposição ou usufruto que eles estabelecem com os meios de produção. Assim, são estabelecidos tipos de relação social de produção, a saber: • relação explorador–explorado: se estabelecem quando os proprietários dos meios de produção vivem do trabalho e dos produtores diretos; • relações de colaboração recíproca: se estabelecem quando existe uma propriedade social dos meios de produção e nenhum setor da sociedade vive da exploração de outro setor, como os membros de uma sociedade primitiva, na qual existe colaboração entre os membros. Segundo Marx, isso ocorre no modo de produção comunista (no sentido de comunidade). HARNECKER, M. Los conceptos elementales del materialismo histórico. Ed. Siglo veinteuno. Argentina editores, 1974. p. 43. Traduzido e adaptado. 3 oS conFLItoS MundIAIS e AS MudAnçAS AMbIentAIS Figura 13 – War, de Willian Gropper Muitos são os conflitos que ocorreram durante a história da Humanidade. Da Idade Antiga à Contemporânea, inúmeras foram as guerras travadas entre os povos por território, controle econômico, poder político e inúmeros outros motivos. Esses conflitos consumiram matérias‑primas em quantidades astronômicas, se somados todos os conflitos, e esse consumo desenfreado refletiu‑se no meio ambiente. O comprometimento ambiental deu‑se não só pelo uso de armas e pela implantação de minas terrestres, mas também pelo uso de produtos químicos. Além das guerras ou confrontos armados, 29 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental surgem disputas de ordem econômica através da industrialização com maior urbanização, do aumento do consumo e das decorrentes alterações ambientais. A partir dessa evolução, com a mudança do modo de habitar rural para o modo urbano, aparecem riscos locais e globais. Lembrete A sociedade de consumo atual é caracterizada por profundas crises socioambientais e socioeconômicas, resultantes do ideal do progresso e do desenvolvimento tecnológico em detrimento da conservação dos recursos naturais. Figura 14 – Equipamento militar em deslocamento durante a Segunda Guerra Mundial Assim, temos que as guerras, desde sempre, causaram numerosos impactos sobre distintos aspectos. Entre eles, podemos destacar os impactos ambientais como o lançamento de metais pesados no solo, na água e no ar através da destruição de estruturas militares e industriais, bombardeios, grande concentração e movimentação de veículos terrestres, marítimos e aéreos, além da imensa quantidade de mísseis lançados nas guerras modernas, que causam um impacto maior do que as da Antiguidade, nas quais o desmatamento era o principal impacto causado. 30 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I Figura 15 – Desmatamento ambiental durante a Segunda Guerra Mundial Fora isso, a modificação das paisagens naturais é algo considerável, junto com a perda da biodiversidade a curto e longo prazo. Essa perda normalmente torna‑se irreversível por conta da dificuldade de recuperação do ambiente, que ocorre de forma lenta ou sequer acontece, tornando o processo de recomposição da biodiversidade inviável. Figura 16 – Bombardeio Dessa forma, um exemplo de guerra atual que pode ser citado é a queima dos poços de petróleo no Iraque durante as guerras do Irã/Iraque e do Golfo, com a invasão do Kuwait pelas tropas de Saddan Husseim. Essa queima não gerou apenas o gás carbônico, mas uma série de outros gases poluentes e nocivos à saúde. Para o Efeito Estufa, não importa se o dióxido de carbono é lançado na atmosfera em um espaço curto ou longo de tempo. Já a poluição concentrada de monóxido de carbono e dos 31 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental óxidos de nitrogênio num curto espaço de tempo, que se combinam, é bastante prejudicial à saúde, pois causa prejuízos como a chuva ácida e a queda de oxigenação nos organismos vivos sendo, por isso, considerada um grave problema ambiental, visto que altamente comprometedor à biodiversidade. Análises afirmam que os reflexos da Guerra do Golfo para a saúde e o meio ambiente, assim como a destruição de fábricas de produtos químicos, biológicos e nucleares dispersando substâncias tóxicas no meio ambiente trouxeram efeitos comprometedores para a saúde humana, como sequelas para o sistema respiratório e carcinogênese. Outros estudos ainda demonstram que a utilização de armamentos contendo urânio empobrecido teria sido uma fonte de contaminação do meio ambiente, além de promover danos à saúde humana. Figura 17 – Poço de petróleo queimando O urânio empobrecido (U‑234) é um subproduto do urânio enriquecido (U‑238) utilizado nas usinas de energia nuclear e, portanto, abundante em países que empregam esse tipo de energia. Por ser um dos metais mais pesados que existe, ele é utilizado pela indústria bélica para produção de cabeças de balas, o que aumenta a capacidade de penetração dos projéteis, que passam a poder perfurar veículos militares blindados e paredes. O urânio empobrecido também é utilizado na fabricação de mísseis e no revestimento de tanques. Além de o peso do metal ser um atrativo bélico, ele também tem outra característica interessante: o material é pirofórico espontâneo, isto é, quando o projétil alcança seu objetivo, gera tanto calor que se inflama e explode. Assim, ao atingir o alvo, o urânio empobrecido queima e transforma‑se literalmente em poeira, oxida‑se e volatiza‑se em micropartículas radioativas, que podem ser inaladas, ingeridas, depositadas no solo e na água ou transportadas para muitos quilômetros de distância pelo ar. 32 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I Figura 18 – Ataque a Nagasaki Não é só no caso do Iraque que o homem utilizou armamento com urânio durante conflitos armados: na Sérvia, na Bósnia e em Kosovo, em 1999, 1995 e 1999, respectivamente, esse tipo de arma já foi utilizado. Isso sem contar as bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki, durante a Segunda Guerra Mundial, que também continham materiais radioativos em suas ogivas. Além de afetar a população civil que sofreu o bombardeio, o urânio também afeta os soldados, e sua poeira pode ser transportada por ventos, o que faz com que ele possa atingir muitos outros países. Outro armamento utilizado durante guerras que causou grande impacto ambiental foi o agente laranja, substância química desfolhante lançada nas florestas vietnamitas, em 1975, para facilitar a identificação de tropas inimigas em território asiático. Essa substância causa queda acelerada das folhas das árvores, contaminação do solo e água, além de graves danos à população humana, como câncer, síndromes neurológicas e problemas genéticos. Dessa forma, a transição da sociedade de um momentohistórico para outro, com modelos distintos socioeconômicos, dependentes do consumo e dos impactos das ações humanas no decorrer dos momentos históricos, só comprometeu as sociedades e os ambientes ou ecossistemas, tornando‑os mais vulneráveis. 33 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental Figura 19 – Guerra do Vietnã Testes nucleares são outro exemplo de dano capaz de gerar imenso prejuízo ambiental por motivos bélicos. Entre os locais escolhidos para esse tipo de teste, um dos mais conhecidos é o Atol de Mururoa, na Polinésia Francesa. Os incessantes testes realizados entre 1966 e 1996 pelo Governo Francês deixaram uma herança radioativa nas águas do Atol, diminuindo a biodiversidade e produzindo altos índices de radiação na região. Armamento nuclear A “cortina de ferro“ Crises ou conflitos Bloco soviético, país do Pacto de Varsóvia e outros aliados País ligado à URSS (cooperação militar) País parceiro e depois afastado Intervenção soviética Ação cubana Os Estados Unidos e seus aliados País ligado aos Estados Unidos O Plano Marshall “Contenção nuclear“ (1949‑89) Intervenção americana Figura 20 34 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I No período da Primeira Guerra Mundial, os soldados enfrentaram problemas de ordem climática relacionados à exposição às intempéries: sol, chuva, neve, lama, piolhos e ratos. A partir dessas condições, vieram as doenças – tifo, febre Quintana ou febre das trincheiras (transmitida por piolhos) – ou ainda ferimentos de tiros e efeitos de gases venenosos. Além de tudo isso, havia ainda problemas relacionados à gripe, dores de cabeça, febre alta, dificuldades para respirar e pneumonia. A gripe espanhola, por exemplo, tornou‑se mortal, atingindo num primeiro momento EUA, países europeus, além da Índia, sudeste asiático, Japão, China, países centro‑americanos e sul‑americanos. O contágio no Brasil deu‑se através de marinheiros que serviram na áfrica e aportaram no Nordeste por volta de 1918. Veja algumas doenças causadas por armas biológicas durante e após a Segunda Guerra Mundial: • Varíola – a respiração é comprometida, causada por um vírus transmitido pelo ar. Os sintomas são de gripe e o vírus se estabelece na garganta da pessoa infectada. • Ebola – doença transmissível, sem tratamento, com alta taxa de mortalidade, que pode chegar até 100%. • Peste bubônica – pode ter sido espalhada por bombas e por pulga infectada. O tratamento é feito por antibióticos. • Anthrax – contamina o ar, a água, o solo e os alimentos. Contamina os pulmões e deforma a pele. Apresenta sintomas de gripe e em poucos dias pode levar a óbito. • Botulismo – doença perigosa, o contágio ocorre por ingestão de alimento contaminado. Provoca paralisia, falta de ar e não tem tratamento efetivo determinado. • Bioterrorismo – liberação de produtos químicos ou agentes infecciosos que prejudicam a saúde e o meio ambiente. • Agente laranja – (Napalm) mistura dos herbicidas 2,4–D e 2,4,5–T. Criado pela empresa Monsanto, o agente laranja foi usado como agente desfolhante pelo exército dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã, nos anos 1960. Durante a guerra, ele foi utilizado sem a devida purificação, apresentando teores elevados de um subproduto cancerígeno resultante da síntese do 2,4,5–T, a dioxina tetraclorodibenzodioxina. Seu uso deixou graves sequelas na população vietnamita e nos soldados dos Estados Unidos. Esse desfolhante destruiu o ambiente natural e as pessoas expostas foram submetidas a muitos males, como câncer e síndromes neurológicas. Além disso, as gerações seguintes tiveram malformações congênitas. O objetivo inicial do seu uso era reduzir a densa floresta tropical e facilitar a circulação dos soldados estadunidenses, além de evitar que os norte‑vietnamitas e vietcongs a usassem como cobertura. O 35 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental desfolhante contribuiu também para dificultar a colheita de alimentos necessários à sobrevivência desses grupos. Tivemos, além disso, ainda na Segunda Guerra Mundial, o lançamento das bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki pelos Estados Unidos sob a ordem do então presidente Harry S. Truman, visando à rendição do império japonês. Os ataques às cidades de Hiroshima e Nagasaki, respectivamente nos dias 6 e 9 de agosto de 1945, pelas bombas “Little Boy” e “Fat Man”, provocaram sua destruição, com perdas humanas, materiais e ambientais. Historicamente, teriam sido os dois únicos ataques nos quais foram usadas armas nucleares. Saiba mais Procure os artigos: O ARSENAL de guerra. BBCBrasil. [s.d.]. Disponível em: <http://www. bbc.co.uk/portuguese/especial/1221_mff_bio/page8.shtml>. Acesso em: 16 jun. 2014. COMITê INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA. Armas químicas e biológicas. [s.d.]. Disponível em: <http://www.icrc.org/por/war‑and‑law/ weapons/chemical‑biological‑weapons/>. Acesso em: 16 jun. 2014. O período geopolítico posterior à Segunda Guerra foi conturbado pelo antagonismo declarado entre os Estados Unidos e a URSS, denominado Guerra Fria, quando houve uma ordem internacional bipolar. Com o término do conflito de 1945, foi criada a ONU (Organização das Nações Unidas) e um dos seus organismos foi a OMS (Organização Mundial da Saúde). Isso demonstra que havia uma preocupação maior, portanto, com as condições de vida mundiais, por isso foram estabelecidos programas de contenção de epidemias, campanhas de vacinação e medidas preventivas, notadamente em áreas pobres e emergentes. Além disso, ampliam‑se também as pesquisas para o setor saúde e surgiram novas tecnologias para diagnósticos e combate às doenças. Ao final do período da Guerra Fria, por volta dos anos 1990, com a queda do Muro de Berlim, a reunificação das Alemanhas e o desmembramento da URSS, temos uma nova geopolítica internacional, uma nova fase de organização econômica com o capitalismo globalizado ou a mundialização da economia. Nessa nova fase, a automação, a robotização e a informatização são acentuadas e, com elas, o desemprego e o aumento dos problemas sociais, com ênfase nos urbanos e nos problemas decorrentes desse novo modelo. Antes do final da Guerra Fria, a antiga URSS vivenciou um período de transformações e crises, culminando com a política do Presidente Mikhail Gorbatchev de mudanças com a Perestroika (proposta de reestruturação econômica) e a Glasnost (transparência de ideias – abertura política), as quais já não sustentavam a desarticulação do país e a sua ruptura. 36 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I A Nova Ordem Internacional caracteriza‑se por ser predominantemente econômica. Mais do que isso, ela se articula através de blocos econômicos e da reunião dos países no sentido de estabelecer as diretrizes a serem seguidas e o seu fortalecimento mútuo. Mas aí surge nosso questionamento, como ficam organizadas, dentro dessa nova ordem, a qualidade de vida e as questões ambientais? Como são tratados temas como vulnerabilidade e riscos dentro do contexto atual? observação Devemos destacar que a partir da crise de 1929, que se instaurou nos Estados Unidos devido à quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque, o Estado passou a intervir mais na economia das nações capitalistas com a finalidade de proteger os mercados internos de possíveis crises e promover o desenvolvimento econômico e social. O capitalismo entra, assim, numa fase financeira,monopolista, marcada pela internacionalização da economia (dirigida por empresas transnacionais ou multinacionais) e por uma nova divisão internacional do trabalho. David Harvey (s.d.) e Manuel Castells (apud REVISTA AMBIENTE & SOCIEDADE, 2003), apesar de terem muitos pontos em comum, divergem quanto ao poder que certos movimentos exercem no contexto da globalização. Para Harvey (s.d.), a globalização econômica está desencadeando ações sociais desordenadas incapazes de desenvolver força política transnacional coordenada que possa fazer frente às desvantagens da modernidade globalizada, o que é um impasse. Castells (ibidem), por sua vez, considera que localismos são de fato uma forma viável de resistência à hegemonia capitalista. A globalização da economia redefine as relações entre centro e periferia: o que a globalização denomina movimentos de invasão em verdade são transformações produzidas em termos nacionais e locais. É do interior dos países que não só a economia, mas também a cultura se mundializa (ORTIZ apud Martín–Barbero, 1999a). O que então está em jogo não é uma maior difusão de produtos, mas a rearticulação das relações entre países mediante uma descentralização que concentra o poder econômico e um deslocamento que mistura as culturas. A globalização trouxe consigo os riscos ambientais, sociais, de caráter geopolítico e ideológico. Internacionalmente, essa situação tornou‑se mais crítica com a ocorrência dos atentados de 11 de setembro aos Estados Unidos. Desse episódio surgiu uma guerra promovida pelo então presidente George W. Bush contra o terrorismo. Sua postura gerou animosidade com o mundo árabe, já abalado com os ataques ao Iraque e a Saddam Hussein, além da incursão ao Afeganistão pelas tropas estadunidenses. Podemos afirmar que essas medidas comprometeram pessoas e ambientes, promoveram perdas de distintas ordens e de mudanças comportamentais. 37 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental 3.1 o que é o terrorismo? 3.1.1 Guerra ao Terrorismo O atentado de 11 de setembro ao território dos Estados Unidos, praticamente implodindo as torres gêmeas, suscitou uma ação contrária do então presidente dos Estados Unidos George W. Bush e do primeiro‑ministro britânico Tony Blair: a chamada guerra ao terrorismo. Mas o que seria propriamente terrorismo? Encontramos algumas respostas por parte da estudiosa e professora de leis e política internacional Robin Theurkauf, esposa de Tom Theurkauf, uma das vítimas do World Trade Center. A professora Theurkauf (2003) afirma que antes sabíamos o que era guerra e que a diferenciávamos de uma situação de paz. As guerras aconteciam entre países que se opunham, com seus exércitos e respectivos comandos. Os Estados disputavam territórios e se opunham ideologicamente. As guerras eram previstas como se fossem respeitar as leis para que depois fossem feitos acordos e voltassem à situação de paz. Segundo Theurkauf (2003), isso mudou, pois o inimigo passou a se organizar em células articuladas, a esconder‑se, esperando o momento certo para atacar, geralmente para surpreender o suposto inimigo, para causar medo e disseminar o ódio e a violência, sem respeitar os direitos humanos internacionais. Os impulsos gerados a partir dessas premissas são terroristas. Eles proliferam em culturas submetidas a situações extremas: fome, pobreza, opressão, ignorância. Para acabar com o terrorismo é necessário promover o respeito pelos direitos humanos, satisfazer as necessidades básicas dos indivíduos e manter como prioridade das nações a segurança nacional. As famílias vitimadas pelo ato terrorista de 11 de setembro criaram uma organização militante chamada Peaceful Tomorrows, cuja missão é buscar respostas não violentas para o terrorismo e uma aproximação com as famílias afetadas por violência em outras áreas do mundo. Os militantes dessa organização acreditam que, ao conscientemente oferecer opções não violentas em sua busca por justiça, escolhem ao mesmo tempo poupar famílias inocentes do sofrimento que viveram – assim como romper o interminável ciclo de violência e retaliação gerado pela guerra. Saiba mais Visite o site da organização Peaceful Tomorrows no endereço: <www.peacefultomorrows.org> Segundo o linguista Noam Chomsky (apud THEURKAUF, 2003), de modo geral, as atrocidades que foram cometidas em 11 de setembro contra as torres gêmeas e o Pentágono deixaram uma amarga lembrança: as novas tecnologias que contemplam os países ricos já não lhes asseguram paz, muito menos segurança. Eles já não têm mais o monopólio da violência que tiveram em outros períodos 38 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I históricos. Desse modo, o terrorismo é temido em todo o mundo e pode ser visto como um retorno à barbárie. O potencial ameaçador será ignorado por aqueles a quem a história acostumou à imunidade, não importando os terríveis crimes que tenham praticado (apud THEURKAUF, 2003). O autor afirma ainda que o uso de formas coercitivas e intimidação a fim de suscitar o medo privam os povos de seu direito à autodeterminação, privando‑os de sua liberdade e independência. observação Como informa Moreira (2002), os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 aos Estados Unidos provocaram a abertura de uma discussão sobre os efeitos do terrorismo na globalização. O professor John Gray culpou a globalização pela ofensiva terrorista e previu o seu definhamento à semelhança do comunismo. Figura 21 39 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental Figura 22 – Obra de reconstrução do World Trade Center após ato terrorista de 11 de setembro Figura 23 3.2 As fronteiras extremas ambientais e sociais As fronteiras extremas de ordem ambiental, social e geopolítica representam no contexto da modernidade, situações de risco e vulnerabilidade, sofrimento social e saúde mental. Refletem situações geopolíticas e sociais com povos e governos envolvidos. A seguir apresentamos algumas dessas fronteiras. Podemos citar como exemplo de fronteira ambiental e social aquela existente entre Estados Unidos e México, onde há divisão caótica encontrada no lado mexicano (como na cidade de Tijuana) e um cenário 40 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Unidade I opressor, marcado pela vigilância a fim de coibir o tráfico ilícito de drogas para os Estados Unidos e de armas para os cartéis mexicanos. Outra fronteira característica na América Central é que fica entre Haiti e República Dominicana. Ela ressalta contrastes extremos da Ilha La Hispañuela. No Haiti, há as marcas das atrocidades de regimes ditatoriais anteriores ao fatídico terremoto que arrasou o país e exigiu a intervenção da ONU e do MINUSTAH (Missão de Estabilização do Haiti) e na República Dominicana há as florestas de pinheiros, áreas produtivas e outros fatores atraentes ao turismo. Figura 24 Outro exemplo seria o do Oriente Médio, envolvendo o próspero Estado de Israel, com suas áreas desérticas irrigadas, suas indústrias e grande potencial de defesa separado das áreas palestinas, desprovidas de condições satisfatórias sociais, econômicas e psicológicas, sempre atentas aos possíveis ataques ou investidas do país vizinho. 41 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 0 2/ 07 /1 4 Introdução à problemátIca ambIental Figura 25 Existe ainda uma área à qual pretendemos dar
Compartilhar