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Interpretação e Produção de Texto Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Ms. Elizabeth Maria Ziliotto Revisão Textual: Profa. Esp. Márcia Ota 5 Para um aproveitamento do curso, leia o material teórico atentamente antes de realizar as atividades. É importante também respeitar os prazos estabelecidos no cronograma. · identificar os fatores de textualidade; · empregar o processo de conectividade por coesão e coerência na leitura e produção textual. Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais • Que faz do texto um texto? • Mecanismos de Coesão e Coerência nos textos 6 Unidade: Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais Contextualização Circuito Fechado Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água. Escova, creme dental, água, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, água, cortina, sabonete, água fria, água quente, toalha. Creme para cabelo; pente. Cueca, camisa, abotoaduras, calça, meias, sapatos, gravata, paletó. Carteira, níqueis, documentos, caneta, chaves, lenço, relógio, maços de cigarros, caixa de fósforos. Jornal. Mesa, cadeiras, xícara e pires, prato, bule, talheres, guardanapos. Quadros. Pasta, carro. Cigarro, fósforo. Mesa e poltrona, cadeira, cinzeiro, papéis, telefone, agenda, copo com lápis, canetas, blocos de notas, espátula, pastas, caixas de entrada, de saída, vaso com plantas, quadros, papéis, cigarro, fósforo. Bandeja, xícara pequena. Cigarro e fósforo. Papéis, telefone, relatórios, cartas, notas, vales, cheques, memorandos, bilhetes, telefone, papéis. (Ricardo Ramos) http://www.portugues.com.br/redacao/textos-sem-coesao.html À primeira vista, tanto a imagem da corrente de roldanas, partida ao meio, com um dos elos, separado e sustentado por um balão, como o texto Circuito Fechado, de Ricardo Ramos parecem uma série de elementos soltos, sem relação, entretanto podem ser chamados de texto. Vamos entender o porquê disso! Numa leitura mais atenta, é possível observar que há uma articulação entre os elementos que compõem a figura ilustrativa e os do texto, ambos abrem esta unidade de estudo. No texto não verbal, ou seja, na ilustração, o formato dos elementos principais é o de uma corrente de roldanas, ligadas entre si, que normalmente integram engrenagens e mecanismos que permitem o funcionamento de uma máquina. O texto verbal é composto por substantivos selecionados e combinados, que revelam um significado implícito, aparentemente desconexo, mas facilmente identificado pelo leitor. A sequência das palavras ou frases justapostas retrata um mundo moderno que bem conhecemos, trata-se da rotina de um homem de negócios. Assim, apesar da estranheza provocada na primeira leitura, o texto é coerente, ou seja, faz sentido. A ligação entre os elementos que constituem um texto é um dos fatores de textualidade chamado de coesão. Se analisada como mecanismo de ligação entre partes, está relacionada com os conectivos que existem em um texto, mas é possível que um texto seja coerente sem apresentar elementos coesivos. Isso acontece porque a coerência textual está nos sentidos construídos pelo leitor que reconhece as relações propostas pelo autor. Nem sempre um texto precisa ser coeso ou apresentar vários conectivos, para ser classificado como um texto, entretanto é imprescindível que ele seja coerente, isto é, que apresente uma ideia lógica, fornecendo elementos que permitam e facilitem a compreensão do leitor. Nesta unidade, vamos estudar os diferentes mecanismos de conectividade que permitem que um texto seja assim considerado, vamos identificar quais são os fatores de textualidade e os recursos de conexão que constroem os significados e a comunicabilidade das ideias. 7 Que faz do texto um texto? Quando enunciamos ou discursamos, selecionamos e combinamos palavras, frases ou orações, apropriadas para formular uma mensagem que provoque uma resposta no ouvinte ou leitor. Por outro lado, o interlocutor compreende, interpreta e responde com postura ativa àquele enunciado, internamente por meio de seus pensamentos e conhecimentos ou, externamente, por meio de um novo enunciado oral ou escrito. Todo esse processo se dá pela interação social, ou seja, pela relação dialógica entre os sujeitos nas práticas sociais e por meio da linguagem constituída pelo verbal ou não verbal. Ao criarmos as mensagens de comunicação, escolhemos um formato, um modo de configurar o produto textual. A esse formato, chamamos de gênero, isto é, o conjunto de propriedades formais que delineiam o texto quanto ao tipo de construção que apresenta um conteúdo temático e um estilo. Os gêneros textuais são importantes instrumentos de transmissão de mensagens, são gerados a partir das nossas necessidades de comunicação nas interações e vivências. Cada esfera de ação humana comporta um repertório significativo dos gêneros textuais ou do discurso. O que importa nessa classificação é entender quais são os elementos, isto é, que condições específicas e finalidades conduzem à seleção e combinação dos elementos para a produção dos sentidos nas mais diversas formas de mensagens elaboradas. A palavra texto provém do latim textum, que significa “tecido, entrelaçamento”. Desse modo, a atividade de tecer nada mais é do que entrelaçar unidades e partes a fim de formar um todo inter-relacionado. Todo texto é produto e processo. O trabalho de tecelão do produtor de textos escritos consiste na tessitura do texto pela rede de relações que garante sua unidade (coesão e coerência). O resultado da ação de tecer deve ser uma sequência de elementos não contraditórios que se conectam entre si, e se apresenta gradativamente por meio de um movimento que combina ou alterna repetição e progressão. A escolha do tipo de texto depende da intenção de quem planeja, seleciona e combina os elementos, com objetivo de comunicar algo a alguém. Segundo Halliday e Hasan, a palavra texto é usada em linguística para referir-se a qualquer passagem, falada ou escrita, de qualquer tamanho, que realmente forma um todo unificado. Nós sabemos, como regra geral, quando alguma passagem de nossa própria língua constitui um texto ou não. Isto não significa que nunca possa haver alguma dúvida. A diferença entre um texto e uma coleção de frases desconexas é, em última análise, uma questão de grau, e sempre pode haver instâncias sobre as quais nós temos dúvidas. Mas isso não invalida a observação geral de que somos sensíveis à diferença entre o que é texto e o que não é (Cohesion in English, Londres: Longman, 1976). A Linguística textual define textualidade como conjunto de características que fazem com que um texto seja um texto e não apenas um amontoado de frases; e texto como unidade linguística concreta, não de forma, mas de significado, realizado por frases, em uma dada situação de interação comunicativa. Nesse sentido, três níveis devem ser considerados para a compreensão de um texto: o pragmático que se refere a seu funcionamento e atuação informacional e comunicativa, o semântico-conceitual, relativo à coerência e o formal, concernente à coesão. O texto, portanto, é um conjunto (coeso e coerente) de elementos, reunidos em dois planos, o do conteúdo, em que se apresenta a ideia, o significado, e o da expressão, que é o modo, a 8 Unidade: Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais forma de revelar, o significante. Esse processo de organização e produção descreve e explica o que o texto diz e como ele faz para dizer o que diz. O processo de leitura descreve e explica uma forma de ver a realidade com o objetivo de transmitir e defender uma determinada opinião. Esse importante aspecto permite que o texto seja um todo de sentido e não um amontoado de palavras e frases.Ler é compreender, analisar e interpretar os sentidos de um texto. Para realizarmos essas operações, precisamos conhecer os mecanismos de construção dos sentidos, observando, primeiramente, as relações dialógicas dadas, interna e externamente, em cada plano, o do conteúdo e o da expressão; e as relações entre um plano e outro. Além disso, consideremos as relações entre produtor e receptor envolvidos com o produto de representação e comunicação nessa busca de identificar os sentidos do texto de acordo com dada situação e contexto. A leitura e a produção de textos resultam das relações dialógicas entre produtor e receptor e entre cada plano que compõe a unidade para construir os sentidos das comunicações nas práticas sociais. A ilustração seguinte representa graficamente o conceito dialógico entre os planos da textualidade e as partes ou elementos envolvidos no processo de comunicação. Conteúdo = ideia (Signi�cado) Expressão = forma/modo (Signi�cante) Fonte: Adaptado de Ziliotto, 2009. A comunicabilidade e a significação do produto textual resultam de determinados fatores que asseguram sua unidade. É preciso que o enunciador tenha determinada intenção de comunicar algo - intencionalidade discursiva para transmitir significados entre interlocutores de uma dada situação (lugar social, período de tempo). Nesse sentido, o enunciador seleciona e combina os elementos de seu produto de comunicação (enunciado/discurso/texto) e, para garantir a compreensão da mensagem, e a aceitação/adesão do enunciatário, realiza o processo de elaboração dos sentidos pela manifestação linguística e pelos mecanismos de conectividade textual. Beaugrande & Dressler apresentam os sete princípios de textualidade que asseguram a unidade de sentido de um texto. Além dos dois mecanismos linguísticos e conceituais, a coesão e coerência, os outros cinco ligados ao aspecto pragmático (as relações entre produtor e receptor) do processo comunicativo são os fatores de textualidade que permitem a identificação de um texto (enunciado/discurso) como tal. 9 São em síntese: · intencionalidade: atitude de quem produz (fala ou escreve) o texto coesivo e coerente; · aceitabilidade: atitude do receptor diante da relevância ou utilidade de quem “lê” (vê ou escuta) o texto; · informatividade: grau de novidade do que trata o texto; · intertextualidade: diálogo entre textos (citação de si mesmo: interna ou do outro: externa; explícita ‘na íntegra’; implícita: parcial/modificada); · situacionalidade: fatores de relevância em dada situação comunicativa, contexto ou circunstâncias do texto; · conectividade: envolve a coesão: ligação gramatical entre os elementos selecionados e combinados para a configuração textual e a coerência: lógica de significados entre as partes que compõem um texto. O processo de conectividade refere-se às relações entre os elementos da: · microestrutura organizacional de um texto, ou seja, nas relações das palavras, frases e períodos; · macroestrutura: as ideias, os pensamentos. Dessa forma, a conectividade ocorre por: coesão e coerência. Os princípios de coerência e coesão são vistos como unidade de sentido e ligação das ideias do texto, respectivamente. Othon Garcia Marques, em Comunicação em prosa moderna, diz que coerência “é o que está junto ou ligado; consiste em ordenar e interligar as ideias de maneira clara e lógica e de acordo com um plano definido”. Maria da Graça Val, em Repensando a textualidade, afirma que a coesão “é a manifestação linguística da coerência; advém da maneira como os conceitos e relações subjacentes são expressos na superfície textual”. Segundo Leonor L. Fávero, os fatores de coesão dão conta da estruturação da sequência superficial do texto e os de coerência dão conta do processamento cognitivo do mesmo. Em síntese: a coesão é do nível microtextual (conjunto de frases conectadas por elementos léxico- gramaticais) e apresenta a ligação das ideias do texto; a coerência é do nível macrotextual (estrutura que identifica o significado global do objeto textual), responsável pela unidade de sentido do texto. Para Pensar Sobre os mecanismos de conectividade textual, vamos ouvir a música Ainda bem, de Marisa Monte e apreciar o vídeo que combina uma série de elementos verbais (linguísticos) e não verbais (sonoros da música e visuais nos movimentos e gestos da dança) para compor a unidade de sentido textual. Acesse o link a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=t7M89YJAPhM 10 Unidade: Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais Depois de desfrutar da apresentação, sugerimos que você selecione da letra da música e comente sobre um termo ou expressão que reúne em si o aspecto coesivo, em seguida, procure definir o que permite a coerência na estrutura ‘truncada’ do texto musical. Se quiser trocar ideias sobre a atividade proposta, vá até o Fórum de Discussão da unidade e publique sua resposta para trocar ideias com o grupo! Vamos lá? Ainda Bem Ainda bem Que agora encontrei você Eu realmente não sei O que eu fiz pra merecer Você Porque ninguém Dava nada por mim Quem dava, eu não tava a fim Até desacreditei De mim O meu coração Já estava acostumado Com a solidão Quem diria que a meu lado Você iria ficar Você veio pra ficar Você que me faz feliz Você que me faz cantar Assim O meu coração Já estava aposentado Sem nenhuma ilusão Tinha sido maltratado Tudo se transformou Agora você chegou Você que me faz feliz Você que me faz cantar Assim O meu coração Já estava acostumado Com a solidão Quem diria que a meu lado Você iria ficar Você veio pra ficar Você que me faz feliz Você que me faz cantar Assim O meu coração Já estava aposentado Sem nenhuma ilusão Tinha sido maltratado Tudo se transformou Agora você chegou Você que me faz feliz Você que me faz cantar Assim Ainda Bem Ainda bem 11 Mecanismos de Coesão e Coerência nos textos A coesão é o mecanismo de linguagem que nos permite interligar os elementos que formam a frase para que o sentido se construa. Pela coesão são realizadas as conexões gramaticais existentes entre as palavras, as frases e partes maiores do texto, ou seja, são as amarrações feitas pelos elementos gramaticais selecionados e combinados para garantir a unidade de sentido. Os elementos que marcam as relações coesivas entre as palavras da superfície do texto são: as preposições (ligam palavras entre si), os pronomes de modo geral (recuperam ou substituem substantivos), as conjunções (ligam orações), e os advérbios ou expressões adverbiais (indicam circunstâncias de tempo, lugar, modo, etc.). Assim, quando ligamos os determinantes dos nomes (artigos, adjetivos, numerais e pronomes) aos substantivos a que se referem, vamos concordá-los em gênero (masculino/feminino) e número (singular/plural). Isso ocorre com os artigos, adjetivos e pronomes que se ligam ao substantivo para determiná-lo, substituí-lo ou completá-lo. Podemos ainda fazer a coesão, isto é, a ligação entre o verbo e o sujeito. Nesse caso, realizamos a concordância verbal entre o verbo e o sujeito da frase, ou entre o verbo e seu complemento. Então, podemos identificar quem diz o que, para quem e sobre o quê. A coesão entendida como mecanismo de conexão entre as palavras permite que recuperemos as relações entre as palavras e avancemos nas informações sobre o que desejamos dizer. A coesão serve para: · referenciar: O professor pediu que fizéssemos o resumo do texto. · reforçar a ideia por repetição ou sinônimo: Ele nos alertou para evitar a cópia das palavras do autor ao fazer a síntese do texto. · resumir ou sintetizar: As palavras e frases copiadas, tudo deve ficar entre aspas. · repetir a ideia pela suspensão determo, indicada por uma vírgula, conhecido caso de elipse (suspensão ou omissão de termo): Meu resumo ocupou duas páginas, o dele, apenas uma. · sequenciar: Primeiro lemos o texto, depois selecionamos as palavras-chave. Veja o exemplo seguinte: O professor ponderou que nota é resposta ao mérito do aluno. Essa afirmativa levou a classe a se dedicar melhor aos estudos. A expressão destacada, essa afirmativa, recupera toda a frase anterior, o emprego do pronome demonstrativo essa se refere a algo que foi dito antes, e o substantivo afirmativa substitui a ponderação do professor sobre o assunto abordado. Palavras que referenciam adequadamente o conteúdo e conectores que recuperam, antecipam, expandem ou resumem dão unidade ao texto de forma coesiva. Vejamos mais um exemplo: Penso na lógica dos fatos, mas você acredita em milagres... Os pronomes retomam termos que já apareceram; a elipse (ocultamento/suspensão) evita repetições, a sinonímia pode levar a um sentido mais adequado sem repetir a mesma palavra, mas dando continuidade à ideia. 12 Unidade: Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais A coesão sequencial, marcada por conjunções e outros marcadores textuais dão progressão ao texto, observe: A mulher saiu de casa sem guarda-chuva. Embora tivesse observado que o céu estava carregado de nuvens, ainda assim não voltou para apanhar a proteção. Mas teve sorte, porque pouco tempo depois o sol apareceu e não caiu a tempestade que todos esperavam. Sobre coerência, podemos entender as relações lógicas entre as ideias, as frases, que expressam os sentidos do texto para comunicar algo a alguém. Pelo mecanismo da coerência, são realizadas as conexões no plano das ideias que conferem sentido a um texto, ou seja, que permitem a sequenciação e progressão das informações sobre o que deve ser expresso. Para que um texto seja coerente, o mecanismo da coerência textual pode ocorrer por: · Repetição: com desenvolvimento linear de elementos de recorrência, isto é, que recuperem a ideia apresentada. A sinonímia é um recurso indicado. Ex.: Reagan perdeu a batalha no Congresso. O presidente americano não tem tido grande sucesso ultimamente em suas negociações com o Parlamento. · Progressão: desenvolvimento por ampliação do sentido constantemente renovada, isto é, a cada segmento vão sendo apresentadas mais informações. Ex.: Havia um país onde todos eram ladrões. À noite, cada habitante saía, com a gazua e a lanterna, e ia arrombar a casa de um vizinho. Voltava de madrugada, carregado e encontrava a sua casa roubada. E assim todos viviam em paz e sem prejuízo, pois um roubava o outro, e este, um terceiro, e assim por diante, até que se chegava ao último que roubava o primeiro. [...] (Ítalo Calvino) · Não contradição: desenvolvimento sem introduzir elementos que contradigam o que já foi enunciado anteriormente. O texto coerente não pode ferir o princípio da não contradição. Os enunciados não devem apresentar uma ideia que se choque com outra. Ex.: (sem coerência) Eram cinco horas, porém não vou ler agora esse documento e já fomos dispensados do trabalho. Ex.: (coerente) São cinco horas. Não vou ler agora esse documento, pois já fomos dispensados do trabalho. · Relação: os fatos do mundo representado pelo texto devem estar relacionados com a realidade configurada. A visão de mundo (do emissor & receptor) deve ser defendida com determinação e lógica. Ex.: Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água. Escova, creme dental, água, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, água, cortina, sabonete, água fria, água quente, toalha. Creme para cabelo, pente. Cueca, camisa abotoaduras, calças, meias, sapatos, gravata, paletó. [...] Pasta, carro. Cigarro, fósforo. Mesa e poltrona, cadeira, cinzeiro, papéis, telefone, agenda, copo com lápis. [...] Bandeja, xícara pequena. Cigarro e fósforo. Papéis, telefone [...] (Ricardo Ramos) Os sinais de pontuação são considerados elementos de estilo, mas também operam como conectores para a sequência de frases e parágrafos que apresentam determinada seleção de palavras, que as recuperam, resumem ou antecipam informações do conteúdo informacional. Vejamos, por exemplo, o emprego da vírgula nas frases do seguinte diálogo, cujo uso ou não dela altera totalmente o sentido expresso: 13 - Gostei do tratamento com Cromoterapia, você conhece? - Esse não deve ser interessante! ou - Esse não, deve ser interessante! Além disso, há um importante fator de coerência proveniente do conhecimento de mundo do leitor e do seu domínio da língua. Muitas vezes, a compreensão de um texto pelo leitor competente salva da incompreensão muitos textos, principalmente os literários e os textos que usam e abusam das licenças poéticas (publicitários, por exemplo) para comunicar as ideias. Não contradições entre frases ou parágrafos, no encadeamento argumentativo, na progressão discursiva, nas amarrações de partes em finalizações e conclusões são aspectos conectores que asseguram a coerência na expressão das ideias a serem processadas cognitivamente pelo leitor. Em síntese, podemos dizer que um texto deve possuir coerência em três níveis: · do texto em si, ou seja, uma coerência interna expressa pelos conectores adequados; · do texto com a realidade, ou seja, uma coerência externa; · do texto com a proposta de comunicação a ser veiculada. Para ler uma anedota O moço foi pedir a mão da namorada em casamento. E o pai morrinha1 quis saber: - Você acha que tem condições de dar a ela a mesma vida que ela tem aqui? - Acho que sim. Eu também sou muito chato! (Ziraldo. As últimas anedotinhas do Bichinho da Maçã. São Paulo: Melhoramentos, 2000. p. 31.) Vejamos com quantas perguntas e respostas podemos desconstruir um texto para obter os sentidos dele. É evidente que não fazemos esse processo quando contamos ou ouvimos um texto, mas vamos fazer o exercício da desconstrução para perceber as possibilidades de relações entre os elementos que entram na construção de uma simples anedota, gênero oral, que revela crítica e bom humor. · Qual é a estrutura formal do texto? O texto contém três parágrafos, cinco períodos e nove orações (cada verbo ou locução verbal corresponde a uma oração). · Pra que serve o travessão? O travessão é um sinal gráfico usado para indicar a fala do personagem, a cada travessão, a fala de um interlocutor. · Como se chama a transcrição direta da fala do personagem? A transcrição direta da fala do personagem chama-se discurso direto. · Como se chama a transcrição indireta da fala do personagem, isto é, quando é o narrador 1 Morrinha: pessoa que se mostra desagradável, maçante. 14 Unidade: Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais que conta a fala do personagem? Nesse caso, na transcrição direta da fala do personagem, temos o discurso indireto. · Como ficaria a 1ª fala contada pelo narrador? A 1ª fala contada pelo narrador ficaria assim: E o pai morrinha quis saber se o moço tinha condições de dar a ela a mesma vida que ela tinha ali. · O que o pai quer dizer quando pergunta ao noivo se ele tem...? O pai, nesse caso, refere-se a condições materiais de oferecer: casa, dinheiro e fartura, etc. · O que o pai deve pensar sobre o rapaz, o noivo da filha? O pai deve pensar que o rapaz, provavelmente, é pobre. · A resposta do rapaz permite subentender que o pai da noiva é chato. Em que palavra se percebe isso? A palavra ‘morrinha’ caracteriza o pai, esse termo refere-se à pessoa que se mostra desagradável, maçante, por isso o subentendido. Para ler uma tirinha de Laerte Fonte: uol.com.br/laerte Na leitura da tirinha, podemos observar os recursos não verbais que o desenho caricatural (desenho que deforma ou ressalta as características do objeto representado)proporciona. Ao ler esse tipo de texto, a observação dos elementos não verbais é muito importante, pois eles são carregados de sentidos para a construção dos sentidos do texto. Começamos por destacar o uso da comicidade, para além dos recursos não verbais (aspectos visuais), na exploração do jogo de sentidos no emprego da dupla regência do verbo aspirar (transitivo direto/pede complemento sem preposição; transitivo indireto/pede complemento com preposição). Um sujeito usa o verbo com sentido de almejar, o outro usa o mesmo verbo com o sentido de sugar o ar ou de retirar a sujeira do local. As falas dos personagens apresentam- se coesas e coerentes linguisticamente falando. Podemos comentar com nosso conhecimento linguístico sobre a regência do verbo aspirar, bem como pelo conhecimento de mundo sobre 15 a experiência narrada no quadrinho. Nisso reside o sentido crítico fundamental da mensagem. Para completar a leitura, podemos considerar a visão de mundo de cada personagem, um deles tem aspirações de ascender rapidamente e acredita que isso possa ocorrer pelo simples fato de possuir/portar o diploma; o outro acredita que para subir na vida, é necessário começar mostrando a competência nos mínimos detalhes. Nesse sentido, vamos refletir sobre: Quem sabe mais sobre a vida, quem tem formação escolar ou a sabedoria de vida? Mais um exemplo de conexão ou desconexão no texto publicitário de uma embalagem de leite em pó. Reduit é leite puro e saboroso. Reduit é saudável, pois nele quase toda gordura é retirada, permanecendo as outras qualidades nutricionais. Reduit é bom para jovens, adultos e dietas de baixas calorias. Qual é o principal problema de coesão desse texto? O pronome ‘outras’ resume tudo o que vem antes e inclui o elemento gordura no grupo das qualidades nutricionais. Qual é a incoerência textual? Se o leite é saudável porque “quase toda gordura é retirada” e a gordura está no grupo das qualidades nutricionais, como o leite pode ser considerado saudável por ter pouca gordura? No exemplo apresentado, há dois tipos de incoerência: a externa (afirmar algo que entra em choque com o conhecido) a interna (negar uma afirmação que acabamos de fazer). As razões que violam a construção coerente do texto nesse sentido são: a falta de informação ou o repertório reduzido, a falta de domínio do enunciador para manter uma determinada visão de mundo. Texto com incoerência semântica ou argumentativa (contraria o conhecimento de mundo) No texto seguinte “Perfil de esportista”, podemos identificar um fragmento narrativo que viola a coerência do texto, identifique qual é e justifique por que isso acontece. Ricardo era um jovem que adorava a vida ao ar livre; isso sempre decepcionou os pais, pois, ao contrário do que eles queriam, o rapaz nunca teve o menor gosto pelas atividades intelectuais. Por toda parte de seu quarto, havia sinais disso: raquetes de tênis, prancha de surf, equipamento de alpinismo, skate e, em sua estante, ao lado das obras completas de Shakespeare (autor preferido de quem ele se tornara assíduo leitor), uma bola que guardava com carinho desde a infância. Como dizem, o quarto espelha as características de seu dono. (Fonte: FIORIN e SAVIOLI, Para entender o texto. São Paulo: Ática, 2000, p. 268.) Os sentidos implícitos nas intenções no enunciador Observemos o diálogo entre os jovens rapazes na entrada da faculdade. Um deles, parado em frente à relação de candidatos aprovados, pensa consigo: Puxa vida! depois de tanto esforço, consegui ingressar na universidade... Mal consigo acreditar... as pessoas precisam saber da novidade... Volta-se para o companheiro e diz: 16 Unidade: Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais - João, você vem comigo até a secretaria da faculdade pra eu me matricular? - Eu não sabia que você tinha passado no vestibular, Paulo! Dar opiniões ou transmitir informações por meio de ideias implícitas é introduzir dados que não aparecem expressos na superfície do texto, mas podem ser explicitados a partir de elementos inscritos nele e recuperados pela situação em que se passam. Os pressupostos, por exemplo, são um tipo de implícito dessa natureza, a informação nasce do próprio enunciado. Ao produzi-lo, o enunciador deixa marcas, pistas que permitem ao enunciatário (ouvinte ou leitor) deduzir o que está pressuposto. Quando a expressão é falada, fica mais fácil a identificação, pois junto do discurso, estão as expressões físicas: olhar, gestos, etc. Em Alice no país das maravilhas, fábula (narrativa que contraria a lógica do mundo real) de Lewis Carroll, o chapeleiro maluco pergunta à menina se queria MAIS chá e ela responde que não poderia querer MAIS, se ainda não havia tomado nenhuma xícara. Segundo o professor Fiorin, os pressupostos são condição de argumentação, portanto devem se apoiar em elementos verdadeiros para serem aceitos. Seu uso capta a adesão do leitor, pois o pressuposto é um dado evidente, indiscutível. No exemplo seguinte Ainda que tenha estudado muito, José não aprendeu. O posto é José não aprendeu. O pressuposto é José estudou muito. Outro tipo de efeito de dizer sem ter dito é o subentendido. Não tem a mesma relação de lógica no sentido estrito, mas seu sentido implícito depende da percepção de códigos sociais e culturais de conhecimento do ouvinte. São os subentendidos, as informações que ocorrem nos enunciados, mas sua percepção depende do contexto enunciativo (sociossituacional, conhecimento mútuo entre interlocutores, saberes, relações). Não vêm marcados linguisticamente. É base para a ironia em muitos casos. Vejamos o exemplo de um professor em viagem por Cuba a quem foi questionado: “Você aprecia Fidel Castro?” E ele respondeu: “Eu amo a minha pátria.” Fica subentendido por trás da afirmação que o professor não aprecia Castro. (GUIMARÃES, 2009, p. 65) Outro exemplo: “Você tem fogo?”- pergunta o transeunte que caminha pela rua com o cigarro na mão. Qual seria sua resposta? “Tenho” e não acenderia o cigarro. Na verdade, por trás da pergunta, vem ‘colada’ a ideia: “Acenda-me o cigarro, por favor?”. Como síntese do tema abordado, podemos dizer que todo texto, enunciado ou discurso existe porque alguém o produz para dizer algo para ser ouvido, lido, interpretado, criticado, discutido, enfim, para compor uma resposta de acordo com os sentidos apreendidos pela exploração dos recursos e domínio da linguagem, pela visão de mundo a respeito da forma adotada para a transmissão do evento comunicativo. Dentre os principais elementos para estabelecer as relações de sentido, temos os mecanismos de coesão e de coerência. O primeiro opera conexões entre os elementos gramaticais e semânticos no nível interno do texto. Já a coerência é o mecanismo responsável pelas relações entre as ideias e conceitos do texto. Podemos afirmar que um texto pode até não ser totalmente coeso, pode até não apresentar elementos de coesão caso de poemas, por exemplo, mas sem coerência o texto não existe. A 17 coerência violada pode comprometer não só a transmissão da mensagem, mas também levar a cabo uma relação de confiança entre produtor e consumidor, seja de determinado produto, seja nas relações humanas. A coesão textual é elemento facilitador para a compreensão do texto, mas é a coerência que lhe dá sentido. Há textos desprovidos de elementos de coesão, mas coerentes, bem como o inverso também se dá. Observemos os exemplos seguintes: Cidadezinha qualquer Casas entre bananeiras Mulheres entre laranjeiras Pomar amor cantar Um homem vai devagar. Um cachorro vai devagar. Um burro vai devagar. Devagar... as janelas olham. Êta vida besta, meu Deus. (ANDRADE, Carlos Drummond de.Poesia completa & prosa. 3ª ed. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1967.) Tanto o texto de abertura do telejornal como opoema de Drummond são estruturados a partir de enumerações, o que dispensa os elementos coesivos. No entanto, o sentido dos textos deve-se à coerência global, que decorre da situação de comunicação (telejornal) e do gênero textual (poesia). Já em: O time não jogou bem, mas perdeu, temos a conjunção mas funcionando como importante elemento coesivo para fazer a relação entre as duas orações. Entretanto, o texto é incoerente, pois não há relação de adversidade (oposição) entre o fato de o time não ter jogado bem e o de ter perdido. Vamos finalizar esta unidade com algumas considerações sobre intertextualidade, considerada um recurso linguístico em linguagens das mais variadas; elemento de constituição da textualidade coerente; estratégia de leitura e compreensão de textos; fenômeno da relação dialógica entre textos, de acordo com Bakhtin; técnica ou mecanismo de produção textual (estilização e paródia) e conhecimento de mundo. De acordo com Guimarães, as práticas intertextuais inscrevem o texto num campo intelectual já conhecido do leitor, com quem estabelecem uma espécie de convivência, pela utilização de material que remete a um “já escrito” que predetermina o texto e lhe assegura a previsibilidade, desde a simples reminiscência até a citação. Na publicidade e na literatura, é comum vermos o emprego da intertextualidade como relação referencial entre textos. Lembremos aqui tipos de intertexto exemplificados por algumas das “canções do exílio” da literatura brasileira, inspiradas na Canção do Exílio de Gonçalves Dias, Corrupção, criminalidade, violência, fome, guerras. O novo milênio começa mal! Texto de abertura de um grande telejornal. 18 Unidade: Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais de 1843. Podemos citar, entre elas, as paródias: o poema Migna Terra, de Juó Bananere (escrito na década de 1920 em “dialeto ítalo-paulista”), Canto de Regresso à Pátria, de Oswald de Andrade (1928), e Canção do Exílio Facilitada, de José Paulo Paes (1986). Eis alguns poemas para leitura e apreciação: Migna terra tê parmeras, Che ganta inzima o sabiá. As aves que stó aqui, Tambê tutto sabi gorgeá. (...) Os rios lá só maise grandi Dus rio di tuttas naçó; I os matto si perdi di vista, No meio da imensidó. Juó Bananere Minha terra tem macieiras da Califórnia onde cantam gaturamos de Veneza. Os poetas da minha terra são pretos que vivem em torres de ametista, os sargentos do exército são monistas, cubistas, os filósofos são polacos vendendo a prestações. A gente não pode dormir com os oradores e os pernilongos. Os sururus em família têm por testemunha a Gioconda. Eu morro sufocado em terra estrangeira. Nossas flores são mais bonitas nossas frutas mais gostosas mas custam cem mil réis a dúzia. Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade e ouvir um sabiá com certidão de idade! Murilo Mendes, de Poemas (1925-1931) 19 Material Complementar Para leitura e Aprofudamento Resumo do texto: Atividades e estratégias de processamento textual, capítulo II, A construção textual do sentido de Ingedore Villaça Koch. Disponível em: https://bb.cruzeirodosulvirtual.com.br/bbcswebdav/courses/backup_int_pro_ tex_grad_content/backup_int_pro_tex_grad_content/un_III/mat_comp/mat_comp1.pdf Para saber mais!! Acesse: 100 erros de português frequentes no mundo corporativo • http://exame.abril.com.br/carreira/noticias/100-erros-de-portugues-frequentes-no- mundo-corporativo/ De A a Z, confira os erros de português mais frequentes no universo corporativo, segundo especialistas consultados por EXAME.com São Paulo - Especialistas advertem: tropeçar no português pode prejudicar a sua carreira. Mas é certo também que há erros que saltam aos olhos e há aqueles que quase passam despercebidos. Por exemplo: 1- A/há Erro: Atuo no setor de controladoria a 15 anos. Forma correta: Atuo no setor de controladoria há 15 anos. Explicação: Para indicar tempo passado, usa-se o verbo haver. 2- A champanhe/ o champanhe Erro: Pegue a champanhe e vamos comemorar. Forma correta: Pegue o champanhe e vamos comemorar. Explicação: De acordo com o Dicionário Aurélio, a palavra “champanhe” provém do francês “champagne” e é um substantivo masculino, como defende a maioria dos gramáticos, explica Diogo Arrais, professor do Damásio Educacional. Outros Links úteis para acesso e consulta a conteúdos gramaticais: Educação no portal da UOL http://educacao.uol.com.br/disciplinas/portugues/crase-regras-de-uso-e-emprego.htm http://www.brasilescola.com/gramatica/ http://www.infoescola.com/portugues/concordancia-verbal/ http://www.infoescola.com/portugues/concordancia-nominal/ http://www.gramaticaonline.com.br/page.aspx?id=1 20 Unidade: Mecanismos de conectividade na construção dos sentidos textuais Referências FIORIN, José Luiz; PLATÃO, Francisco Savioli. Para entender o texto: leitura e redação. 16ª ed. São Paulo: Ática. GUIMARÃES, Elisa. Texto, discurso e ensino. São Paulo: Contexto, 2009. __________ . A articulação do texto. São Paulo: Ática, 1997. KOCH, Ingedore G. Villaça. O texto e a construção dos sentidos. 7ª ed. São Paulo: Contexto, 2003. VALENTE, André. Língua, linguística e literatura: uma integração para o ensino. Rio de Janeiro: EDUERJ,1998. 21 Anotações
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