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, _______________..a ~ Capitulo 3 Constituigao 3.1. Conceito Todo objeto passui uma constituigao a revelar a sua forma especifica e par ticular. Assim, diz-se que a bola e redonda; a cadeira emacia ou dura; a parede e lisa au aspera. Em verdade, ao analisarmos a constituigao do objeto, estamos, por igual, decompondo a sua estrutura, 0 seu ser. Este 0 sentido ampllssimo do vocabulo constituic;ao. Em sua acepgao juridica, todavia, a constituigao ea forma especifica e inimi tavel assumida pela entidade estatal, OU, como salienta Celso Ribeiro Bastcs, "e 0 conjunto de faIgas pollticas, economicas, ideo16gicas, etc.. que conforma a realida de social de determinado Estado, configurando a sua particular maneira de ser".l NaG obstante, teda conceituagao eperigosa e envolve aquele que se propoe a conceituar em urn mar de dificuldades, a que nao poderia ser diferente com relagao ao conceito de constituigao. A ideia de constitui,ao na qualidade de instrumento de ordena,ao do Estado apenas exterioriza uma face do fenomeno, porque, ao promoverem tal limitagao, os juristas revelam urn tinico aspeeto, sendo nociva a posigao, por quanto expressa uma reahdade desvinculada do contexto para 0 qual se dirige a norma constitucional. Objetivando alcangar a compreensao do dialetico termo, surgiram as acep goes sociologica, polltica e juridica, de que logo adiante, trataremos. 3.2. Concepc;:6es Sobre as Constituic;:6es 3.2.1. A Acepgao Sociol6gica2 de Constituigao A concepgao da constituigao como fato, antes que como norma propriamen te dita, e apanagio mais genuino daquilo que se convencionou chamar "sociolo gismo juridico", sendo " (... ) uma concepgao cientifica e uma atitude mental que de maneira mais ou menos intensa e extensa relativiza a politica, 0 Direito e a cultura a situag6es sociais".3 1 Ct. Curso de Direito Constitucional, Sao Paulo, p. 43. 2 Em estudos anteriores, criticamos a referEmcia a doutrina de LassaLie como "acepC;ao 'socio16gi ca'" de constituiC;ao (ver Curso Basieo de Direito Constitucional, Rio: Lumen Juris, tomo I, 2004). 3 Cf. Garcia-Pelayo, Derecho Constitucional Comparado, p. 46. 25 ADRIANO Realce Manoel Jorge e Silva Neto Para tal corrente, a genese do ordenamento juridico-constituciona] positivo deve ser buscada na realidade social, nos fatas que se desenvolvem e se enfor mam no meio sociaL FerdinFlnd Lassalle se tornou 0 expoente maior do "sociologismo" no campo do direito constitucional ao acentuar que os fatores reais de poder que imperam no seio de cada sociedade "( ... ) sao a for~a ativa e cficaz que informa todas as instituig6es juridicas da sociedade em questao, fazendo com que nao passam ser, em substfmcia, mais que tal e como S80".4 Portanto, seralegitimo 0 texto constitucional quando guardar corresponden cia ou consonEmcia com "os fatores reais de poder", sendo tais fat ores a consti tuigao real e efetiva, DaO passando a eonstitui<;:ao escrita de "uma folha de paper' quando deles dissociada. 5 Sera ilegitimo quando se distaneiar ou quando nao representar 0 efetivo poder social. o exercicio do poder e 0 instrumento real e a constituig8o 0 instrumento for mal, de acardo COIn a teoria. Na afamada canferencia de abril de 1862 na cidade de BerEm, cuja abjeto estava voltndo D. descoberta da ess€mcia da eonstituigao, Ferdinand Lassalle eri tieou 0 conceito reinante, sob 0 fundamento de que se oeupara - no caso, as defi nigoes juridicas formalS - muito mais com a tentativa de explicar 0 modo como se formavam e 0 que faziam as leis fundamentais, quando, em vez disso, deve· riam se deter, de sorte a delinear rt sua apar€mcia, no clemcnto essencial da cons tituiqao.6 Assim, empregando a sua investigag80 cientifica para desencobrir a subs tancia da lei fundamental, serviu-se Lassalle de atraente teoria sedimentada nos mencionados fatores reais de poder e, dirigindo 0 labor a iustificagclo de suas ideias, langa mao de interessante exemplo (conquanto remotamente factivel, como ele proprio afirma): oconido urn grande incendio, foram reduzidos a po todos as arquivos que cantinham as textos legais do Estada, 0 mesmo se sucedendo com as bibliotecas publicas e particulares. Sinistra, em suma, de tal dimensao que nao remanescera urn texto sequer para disciplinar as relagoes juridicas ocorren tes no seio da un~dade politica abalada com 0 infausto e hipotetico acontecimen 4 CL Ferdinand Lassalle, LQue es una Constitllci6n?, p 42. LassaUe afitma: .. (,J todo pals delle, y ha tenido siempre, en todos los momentos de su historia, Constitucion real y '.!erdadera. La espe· cinco de los tiempos madernos - hay bien en esta, y no olvidarlo, pues tiene mucha importancia -, no son las constituciones reales y o[octivOJs, 8ino1as Constituciones escritas, las hOJas de papel. En electa, en casi todos los Escados modemos vemos apuntar, en un determinado momenco de su his toria, la tendencia a darse una Constituci6n escrita, cuja misi6n en una haja de papel, todas las institucianes vigentes en el pais" (ob. cit" p. 59). 5 Idem, ibidem, 6 Podemos afirmar que a pensamento de Lassalle eessencialista. tendo em vista a sequiosa buscil. pela essencia da constituit;aa. Prise-se, a proposita, que essencialisma se trata de dautrina filo s6fica a canferir primado a essencia sabre a existencia. correspondendo a primeira ao mundo lOvisivel e imutavel, ao passo que esta ultima se identifica com 0 munno visivel e flutuantc {Platao). 26 ..........------------~- ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce r ----------------.... Cursa de Direito Constitucional to. Indaga Lassalle: poderia 0 legislador editar normatividade aD seu capricho, elaborando leis que melhar lhe conviessem, aD seu talante ou alvedrio?7 Canclui negativamente, e 0 faz mediante 0 reconhecimento acerca da exis t€mcia de determinados fatores de carater extranormativo que naD apenas enfor mam a constitui9ao como, tambem, vinculam a sua legitimidade aD fatD de estar em consonancia a "falha de papel" a constitui9ao real e efetiva (as fatores reais de poder). Expressa a constitui9ao real e efetiva as relay6es de poder predominantes em urn pais: 0 poder militar, representado pelo Exercito; 0 poder social, materia lizado nos latifundiarios; 0 poder economica, em virtude da influ€mcia da grande industria e do grande capital e, por derradeiro, 0 poder intelectual, urdido pela consciEmcia e cultura do povo. A respeito do sociologismo constitucional, oportuna e a remissao as ideias de Konrad Hesse: "Se as normas constitucionais nada mais expressam do que rela96es faticas em continua mudan9a, nao ha como deixar de reconhecer que a ciencia da Constituic;ao juridica constitui uma ciencia juridica na ausencia do direito (... )".8 3.2.2. 0 Sentido Politico de Carl Schmitt Ja 0 decisionismo politico promove distin9aO entre constituic;ao e lei consti tucional. Carl Schmitt apresenta quatm conceitos de constitui9ao: absoluto - consti tui9ao COmo urn todo unitario; relativo - constitui9ao como pluralidade de leis particulares; positivo - constitui9ao como decisao de conjunto sobre modo e forma da unidade politica; ideal - constitui9ao como resultado da identidade en tre 0 seu conteudo e as aspira96es dos grupos politicos dominantes. 9 De todos os conceitos articulados, 0 que se tornou mais conhecido foi a posi tivo, que promove a divisao entre constituig80 e lei constitucional. Constituic;ao e o produto da decisao politica fundamental, a estabelecer a forma de Estado, de governo, as orgaos do poder e os direitos e garantias constitucionais. Lei consti tucional par outro lado, diz respeito a materias que apenas formalmente SEW constitucionais, porquanto poderiamser tratadas pelo legislador ordinario. 10 Atem-se Carl Schmitt ao principio da exclusao, ou seja, toda materia que nao resulte da "decisao politica fundamental" promanada de urn poder consti tuinte e considerada lei constitucional. A sua teoria, apos analisar os conceitos absoluto (constitui9ao como urn todo unitario), relativo (constitui9ao como plura lidade de leis particulares), ideal (constitui9ao como fen6meno que corresponde as aspira9oes, ao ideal de urn povo). termina por apontar 0 conceito positivo de 7 Cf. Lassalle, ab. cit .. p. 42. 8 Cf. Kotuad Hesse, Escritas de Derecho Constitucional, p. 59. 9 Cf. Tearia de 1a Constitucion, pp. 29-62. 10 Idem, pp. 45~57. 27 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce Manoel Jorge e Silva Neto constituigao, representado pela decisao do conjunto sobre 0 modo e forma da eXist€mcia da unidade polltica. E de relevo ressaltar que a posic;ao de Schmitt contem inegaveis influencias do sociologismo juridico, nomeadamente quando afirma: "A Constituigao nao e, pais, coisa absoluta, porquanto nao surge de si mesma. 'I'ampouco vale em virtude de sua justiga normativa ou em Iazao de sua sistematica fechada. Nao se da a si mesma, senao que <3 dada par uma unidade politica concreta. Talvez seja possivel dizer que uma Constituigao se estabelece por si mesma sem que a raridade desta expressao se choque em seguida. Mas que uma Constituigao se de a si mesma e urn absurdo manifesto. A Constituigao vale em razao da vontO-de poHtica existente daquele que ada. Toda a especie de norma\=ao juridica, e tambem a normac;ao constitucional, pressupoe uma tal von tade como existente".11 3.2.3. A Concepc;ao Juridica de Hans Kelsen o Direito, por Dutro lado, nElD necessita reeoner a Politica, a Sociologia, de sorte a conceituar a eonstituir;ao, argumenta Hans Kelsen. 12 A conceitua\=B.o res trita a esfera puramente juridica e 0 bastante. Ao recorrer, de forma exclusiva, a dencia juridica, objetivando cxplicitar e conceituar a constltui\=8.o, Hans Kelsen admite dois pIanos distintos: 0 16gico-juridico e 0 juridico-positivo. 0 plano 16gi co-juridico 5e traduz na nornla suposta, hipotetica, a servir de fundamento 16gi co transcendental de validade da constituiyao juridico-positiva. 13 Kelsen assinala que "( ... ) a norma fundamental e a instauragao do fato fun damental da criagao juridica e pode, nestes termos, ser designada como Constitui<;ao no sentido l6gico-juridico, para a distinguir da Constituic;ao em sen tido juridico-positivo. Ela e 0 ponto de partida de urn processo: do processo do criayao do Direito positivo. Ela propria nao e uma norma posta, posta pelo costu me ou pelo ato de urn orqao juridico, nao e uma norma positiva, mas uma norma pressuposta, na medida em que a inst€mcia constituinte e considerada como a mais elevada autoridade e por isso nao pode ser havida corno recebendo 0 poder constituinte atraves de uma outra norma, posta por uma autoridade superior" .14 A norma posta (constituir;ao juridico-positiva), de existencia visivel, mate rial, encontra 0 seu fundamento de validade na norma hipoH~tica fundamental Grundnorm - (conslituigao 16gico-juridica), invisivel e imaterial, eompreendida no comando generico e naturalmente aceito consistente na obediEmeia a tudo quanta esta na constituiyaO. 1b 11 Idem, p. 46. 12 Cf. Teoria Pura do Duelto, p. 1. 13 CI. Kelsen, ob. cit .. pp. 223-224. 14 Cf. Kelseo, ob cit., p. ~LL 15 Cf. Kelsen, ob. cit., p. 225. Salienta: "Somente quando pressuponhamos esta norma fundamental referida a UInCl constitui(,<ao inteira310ntc determinada. qU~f dizer, sornente quaudo pressuponha 28 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce , Curso de Direito Constitucional E ainda Kelsen quem afirma estar a constitui9aO, no plano hierarquico das DOrmas juridicas, no mais elevado patamar do ordenamento positivo 85tatal, aD acentuar: "A Constituig8.o no sentido formal e urn certo documento solene, urn conjunto de Dormas juridicas que pode ser modificado apenas com a observan cia de prescrig6es especiais cuja proposito e tornar mais dificil a modificagao dessas Dormas" ,16 3.2.4. A Concepc;;ao de Constituic;;ao Total No eotaoto, como bern observa Gomes Canotilho, "a Constituigao naD deve ser estudada isoladamente. Pelo contraric, ela conexiona-se com outras catego rias politicas e conjuntos sociais (Estado, sistema politico, sistema juridica, orcte namento, instituigao) de relevante significado para a captagao do mundo circun dante/estruturante do politico. rsto aponta para a imprescindibilidade de algu mas ideias basicas sob essas categorias e conjuntos" .17 A plurissignificatividade do conceito de constituigao conduz it constatagao de que "todos os paises possuem, possuiram sempre, em todos os momentos da sua hist6ria, uma constituigao real e efetiva", consoante a teoria de Lassalle, 18 promanada de uma "decisao politica fundamental" (Carl Schmitt), servindo, a urn s6 tempo, de fundamento de validade normativa de todo 0 sistema (constituigao juridico-positiva) e fundamento l6gico-transcendental para validar a constituigao positiva, ja que assente e pacifica a obediencia incondicionada da sociedade a tudo quanto emana da constituigao, sendo ela norma suposta. hipotetica (cons tituigao l6gico-juridica).19 Nao por acaso, portanto, vern os autores tentando estabelecer urn conceito uno de constituigao. a sintetizar a conexao de sentido das normas constitucio nais com a realidade. Interessante formulagao e trazida por Canotilho aD caracterizar a constitui t;:ao como "estatuto juridico do politico" .20 Nao quer significar a proposta urn neo decisionisrno na teoria politica contemporanea. Revela, efetivamente, nao 0 "po- mas que nos devemos conduzir de acordo com esta Constituic;ao concretamente determinada, e que podemos interpretar 0 sentido subjetivo do ato constituinte e dos atos constitucionalmente pastas como sendo a seu sentida subjetivo, quer dizer, como normas jur(dlcas objetivamente vaUdas, e as relac;6es constituidas atraves destas normas como relac;6es juridicas." a fundamen· to ultimo de validade do sistema juridico, para Kelsen. naa e uma norma posta, mas um fato: a aceitac;ao dos comandos da constituic;ao juridica, A partir dai se avolumaram as crlticas a con cepC;ao juridica. Castanheira Neves, por exemplo, acentua que 0 positivismo termina par cons truir, como tlltima fundamento de validade, a eticacia de uma norma. E condui: "( ... ) como se urn 'mero fato' pudesse ser fundamento normativo" (cf. Digesta - Escritos acerca do direito, do pen samento juridico, da sua metodologia e outros, V. 2, p. 63). 16 Ct. Kelsen, Tharia Geral do Direlto e do Estado, p. 130. 17 Cf. Direito Constitucional, p. 39. 18 ab. cit., p. 38. 19 Cf. Hans Kelsen, Teoria Pura do Direito, cit., p. 225. 20 ab. cit., p. 39. 29 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce Manoel Jorge e Silva Neto Iltico" como reduzido ao Estado, "(... ) mas para conceber este como categoria explicativa e constitutiva da racionalizagao do politico, nas condig6es historicas, particulares e concretas, dos processos de transformagao polltica do ocidente europeu a partir do seculo XVI" .21 Dirley da Cunha Jr., apoiando-se no escolio de Meirelles Teixeira, aduz que "esse conceito de Constituigao total, se atentarmos, reune, numa perspectiva unitaria, aspectos economicos, sociologicos, juridicos e filosoficos. (... ) Constitui gao e urn conjunto de normas juridicas fundamentais, condicionadas pela cultu ra total, e ao mesmo tempo condicionantes desta, emanadas da vontade existen cial da unidade politica, e reguladoras da existencia, estrutura e fins do Estadoe do modo de exercicio e limites do poder politico" .22 3.3. Classificac;:ao das Constituic;:6es Sempre se constituiu em preocupagao dos pensadores ou dos teoricos do Estado 0 estudo dos principios e normas legais a estruturarem a organizagao da unidade polltica. Portanto, a concepgao de constituigao, tal como se formula atualmente, che gou a ser aventada pelos gregos e romanos. Aristoteles efetuou precisa distingao entre lei constitucional e disposig6es legislativas ordinarias, na medida em que aquela despontaria como "alma do Estado", na feliz expressao de Isocrates, au seja, 0 principia maior, imorredouro, sem 0 qual a estrutura politica nao subsistiria. Refletindo acerca das marcas indeleveis presentes na constituigao a diferencia·la das outras especies normati vas, a filosofo helena trouxe significativo contributo a teoria polltica ao assinalar as linhas essenciais da distingao dos poderes estatais que, modernamente, sob a influxo do pensamento liberal racionalista do seculo XVIII, foi desenvolvido pelo Barao de Montesquieu. Este, aditando-a, findau por conduir a respeito DaO apenas da imprescindibilidade da separagao de poderes para a sobrevivencia do Estado moderno, direcionado ao atingimento do Estado de Direito. Concluiu tam bern pela necessidade de estar garantida a separagao de poderes atraves da ins titucionalizagao de orgaos distintos e aut6nomos. Na Roma Antiga, muito embora, de inicio, a constituigao apresentasse aspecto mais consuetudinario, com a evolver desta civilizagao foram gradativa mente sendo retiradas as amarras que a vinculavam aos costumes, a que S8 logrou, em definitivo, mediante as constitutione emanadas dos Imperadores. A Idade Media, de outro ver, trouxe consigo a filosofia crista fundada no Direito Natural, relegando-se a plano secundario 0 Direito Publico (incluindo-se a teoria constitucional), notadamente porque "( ... ) 0 homem, como valor espiritual, se elevava diante do Estado (... )", sendo ainda "( ... ) imprescindivel que a proprio 21 22 Cf. Gomes Canotilho, ob. cit., p. 40. Cf. ControLe Judicial das Omissoes do Poder Publico, p. 31. 30 - ---- 4 • ~ Curso de Direito Constitucional Estado 5e organizasse de sorte a naa ferir as finalidades essenciais da pessoa humana".23 Partanto, observamos as diversos tipos de Estados, ao Iongo das eras, 5e adequando ao momento historico, as contingEmcias de cada sociedade. Nessa linha de compreensao, 5e concluimos existirem diversos tipos de Estados concebidos em razao de fatares que lhes moldaram a personalidade poli tica, irrecusavel sera reconhecer tambem a diversidade do instrumento fundador do Estado, e, por conseguinte, alcan~armos a classificagao das constituigoes. NaG ha na doutrina, em absoluto, uniformidade da classificagao; muito pel0 contrario, as autores dissentem sobremaneira quando 5e propoem a classificar as constituic;6es. James Bryce, buscando explicitar 0 regime constitucional norte-americano, discrimina as cartas politicas em diversas modalidades, discrepando substan cialmente conforme sejam elas costumeiras e escritas, flexiveis e rigidas. 24 Constituic;ao costumeira ou hist6rica e aquela concretizada por via de pro cesso constituinte protraido no tempo, representada por uma gama de costumes e usos que, amalgamados na habitualidade de sua pratica atraves dos tempos, redundam na fundamenta~aoda estrutura estatal. Inexiste, como vis to, materializac;ao atraves do texto escrito. Ja estas, as escritas, contrariamente, refletem 0 predominio da codifica~ao do direito sobre a norma consuetudinaria. Ao examinar a classifica~ao das constitui~6es em costumeiras e escritas, Bryce, verificando a dificuldade de distinguir urnas das outras, sugere os termos rigidez e flexibilidade constitucional (constituigoes rigidas e flexiveis).25 Rigida e a constituigao somente alteravel mediante a observancia de processo legislativo especial, diverso daquele estabelecido para criagao das demais especies norma tivas do sistema. Nao se deve confundir rigidez com imutabilidade constitucio nal, porque esta ultima conduziria ao engessamento absoluto do Estado e, inde fectivelmente, em face da existEmcia da constituigao imutavel, se opora a realida de. nlais fatica que juridica, da natural evolugao da sociedade. 0 que, decerto, desencadeara manifestagao constituinte originaria com a consequente ruptura institucional. Concernente aconstituigao flexivel, podemos dizer que os Estados que a adotam nao aceitam, de forma pura, 0 principio da hierarquia das leis, por que nao colocam a lex fundamentalis no vertice do sistema, e isto porque a cons tituigao flexivel pode ser modificada pelo simples processo legislativo comum. Bryce, no entanto, foi criticado por confundir constituigao costumeira com a flexivel, como tambem a escrita com a rigida. A advertencia ede McBain: "E habitual, desde que Bryce sugeriu os termos, distinguir-se constituig6es flexiveis e rigidas, condicionando a diferenga na faci lidade ou dificuldade com que as constituigoes podem ser temporaria ou perma· 23 Cf. Rosah Russomano, Li90es de Direito Constitucional, p. 49. 24 Ct. James Bryce, Constituciones flexibles y constituciones rigidas, pp. 19-34. 25 Idem, ibidem. 31 ADRIANO Realce I Manoel Jorge e Silva Neto nentemente alteradas. A distin9ao nao e, au pelo menos nao deveria ser, basea da no can~.ter escrito au nao escrito da constitui9aO" (tradu9aO nossa).26 A classifica9aO das constitui90es, como formulada, sob a 6tica da suprema cia constitucional, segundo Joseph Barthelemy e Paul Duez, perde importancia pratica porque a constitui9aO, seja ela costumeira au escrita, seja ela flexivel au rigida, retira de si mesma uma certa supremacia.27 Entre os constitucionalistas brasileiros nao ha tend€mcia Ii uniformidade da classifica9ao. Ainda assim, e possivel indicar classifica98.0 que contempla as criterios ado tados majoritariamente pela doutrina no Brasil, que sao as relativos ao conteudo, a forma, a origem, a estabilidade, ao modo de e1aboragao, a ideologia e a extensao. Ouanto ao conteudo, as constitui9oes podem ser materiais e formais. Materiais sao aquelas que disciplinam exclusivamente temas vinculados aorga , nizac;ao do Estado e aos direitos e garantias fundamentais. Formais sao as cons titui90es que inserem dispositivos que nao guardam rela9ao com a refer ida nucleo materialmente constitucional. Quanta a forma podem ser consideradas escritas e nao escritas. Escritas sao as constitui90es cuja disciplina da vida do Estado e inserida completamente em texto escrito. Nao escrita e a constituic;ao que se ampara nos costumes e na juris prud€mcia. Quanta a origem, podem ser populares e outorgadas. Populares sao as tex tos constitucionais elaborados mediante a participac;ao democri3tica do povo. Outorgadas, diferentemente, sao as impostas par urn ditador, monaIca ou mesmo grupo politico que se encontra no poder.28 Quanta aestabilidade, podem ser rigidas, super-rigidas, flexiveis e semi-rigi das. Rigidas sao as constitui9oes que preveem processa legislativo solene e rnais rigoroso para a modifica9aO de suas normas.29 a conceito de super-rigidez cons titucional e elaborado pela doutrina com base na ideia de que muitos textos constitucionais indicam a existencia de urn conteudo intangivel, imodificavel- as denominadas c1ausulas petreas.30 Flexiveis sao as modelos constitucionais cujo processa de altera9ao de suas normas e identico aquele previsto no sistema nor 26 ce. Howard Lee McBrain. The Living Constitution, p. 16. "It is customary also, since Lord Bryce suggested the terms, to distinguish between flexible and rigid constitutions, the difference depen ding upon the ease or difficulty with which constitutions may be temporarily or permanently alte red.The distinction is not, or at least should not be, based upon the written or unwritten charac ter of the constitution." 27 Cf. Traite de Droit Constitutionnel, p. 186. E0 seguinte 0 texto original: "La constitution, soit eJle coutummiere ou ecrite; soit eJle souple ou rigide, tire, tout d'abord, une certaine supremacie.".~ 28 A evolu9ao constitucional brasileira noticia a existencia de quatro Constitui90es outorgadas (1824, 1937, 1967 e 1969) e quatro populares (1891, 1934, 1946 e 1988). 29 A Constitui~ao de 1988 e rigida, conforme demonstram os §§ 1'>1 e 2'>1 do art. 60. 30 Cf. Alexandre de Moraes, Direito Coustitucional, p. 5. Revela 0 Autor que a Constitui9ao de 1988 pode ser considerada surper-rigida. Andre Ramos Tavares (cf. Curso de Direito Constitucional, p. 68) assinala, contudo, que a Constituit;:ao brasileira de 1988 seria exemplo de constitui~aosuper r[gida e rigida, concomitantemente. 32 ADRIANO Realce • ---------------_.... Curso de Direito Constitucional mativo para a elaboragao e alteragao das leis ordinarias. Semi-rigidas sao as que possuem, ao mesma tempo, dispositivos constitucionais alteraveis somente mediante processo mais dificil e rigoroso e Dutros cuja modificagao pade se ope rar da mesma forma admitida para as leis ordinarias. Quanta ao modo de elaboraq.3o, as constituigoes podem ser dogmaticas ou hist6ricas. Dogmaticas sao aquelas em que as regras de organiz8gao politica de urn pais sao expressamente inseridas em documento ofieial redigido com a abje tivo de determinar 0 cumprimento a todos. Hist6ricas sao as decorrentes dos usas, costumes e precedentes, do lento processo de evolugao hist6rica do siste ma constitucional. Quanto a ideologia, podem ser destacadas duas especies de constituic;6es: ortodoxas e ecleticas. Ortodoxas sao as elaboradas em atendimento a ideologia unica. Ecleticas sao as que resultam do embate ideologico existente quando da elaborac;ao do texto constitucional. Quanta a. extensao, podem ser sinteticas au analiticas. Sinteticos sao os sis temas constitucionais que se caracterizam por enundar principios gerais, res tringindo-se a discipIina da organizac;ao e limitac;ao do poder, cujo exemplo sem pre lembrado e a Constituigao dos Estados Unidos de 1787. Analiticos, de modo diverso, sao aqueles que empreendem disciplina minudente, promovendo trata mento em sede constitucional de temas que poderiam ser objeto de lei ordinaria. A doutrina estrangeira apresenta classificac;ao interessante que merece ser registrada. Canotilho, ao examinar a Constituic;ao portuguesa de 1976, esclarece que e unitextual, programatica ou dirigente e compromissoria. "Esta unitextualidade deriva, em larga medida, de dais factores: (1) nao~exist€mcia de 'leis de emenda' da Constituic;ao fora do texto constitucional, pais as alterac;6es resultantes das leis constitucionais de revisao 'serao inseridas no lugar proprio mediante substi· tuic;oes, supressoes e aditamentos necessarios' (Cm:: artigo 287Q/l); (2) nao-exis t€mcia de leis com valor constitucional ao lado da Constituic;ao, como acontece em alguns paises onde a disciplina de certas materias e feita atraves de leis com forc;a constitucional" .31 Atento a. transformac;ao do Estado e as acentuadas exi gencias que se the dirigem, ao formular a conceito de "constituic;ao dirigente", Canotilho articula duas indagac;oes verdadeiramente instigativas: "Deve uma constituic;ao conceber-se como 'estatuto organizat6rio', como simples 'instru menta de governo', definidor de compet€mcias e regulador de processos, ou, pelo contrario, deve aspirar a transformar-se num plano normativo·material global que determina tarefas, estabelece programas e define fins? Uma constituic;ao e uma lei do Estado e so do Estado ou e urn 'estatuto juridico do politico', urn 'plano global normativo' do Estado e da sociedade"?32 31 Cf. Direlto Constitucional e Teoria da Constitui<;:ao, p. 215. 32 Cf. Gomes Canotilho, ConstituiQao dirigente e vinculaQao do legislador. p. 12. 33 ADRIANO Realce ADRIANO Nota CF 88 liberal X social. const. cidadã.null Manoel Jorge e Silva New a carater programatico au dirigente da Constitui98.0 portuguesa de 1976 decorre da insen;:ao de numerosas normas-tarefa e normas-fim, que definem pro gramas de ayaO e de diretrizes de atua<;ao dirigidas ao Estado.33 A natureza com promiss6ria da constitui<;8.o se prende ao fato de que representa modelo norma tivo de compatibiIizac;ao de interesses antag6nicos. "Globalmente considerados, os compromissos constitucionais possibilitaram urn projecto constitucional que tern servido para resolver razoavelmente as probelmas suscitados pelo pluralis rno politico, pela complexida social e pela democracia conflitual" .34 Karl Loewenstein35 propoe a classificaC;ao das constituiqoes em originarias e derivadas, ideo16gico-programatic8g e vtilitarias. Constituic;ao originaria, segundo 0 autor, corresponde a "(... ) urn documento de governo que contem urn principia funcional novo, verdadeiramente criador, e portanto original, para 0 processa do poder politico e para a forrnac;ao da vontade estatal. A expressao constitui<;ao derivada (ou derivativa) designa urn tipo de constituic;ao que segue fundamentalmente as modelos constitucionais ou estran geiros, levando a cabo tao-somente uma adaptaqao as necessidades nacionais".36 Por outro lado, constituic;ao ideologico-programatica e aquela que se encon trn imprcgnada de certa diretriz ideologica, ao passo que a constituic;ao utilitaria nao se diferencia em muito de uma lista telef6nica, como aponta Loewenstein, tendo por conta a seu conteudo ideo16gico neutro.37 Com base nos criterios aqui relacionados, e correto coneluir que a Constitui gao brasileira de 1988 e formal, popular, rigida e super-rigida, concomitantemen te, escrita, ec1etica, analitica, dirigente e ideologico-programatica. 3.4. Objeto e Conteudo das Constitui90es Ao 10ngo da hist6ria observa-se a gradativa constitucionalizaC;EI.O de rnate rias tidas e havidas por relevantes dentro da organiza<;8.o estatal. A estruturaC;ao da unidade politica, a disciplina de investidura dos agentes politicos nos 6rgaos fundamentals do Estado, 0 modo como 6 adquirido 0 poder politico e a forma do seu exercicio, as direitos e garantias fundamentais do indi viduo, foram apenas algumas das rnaterias objeto de gradual positivac;ao. Para Karl Loewenstein a autenticidade de uma constituic;ao e medida pela disciplina e ordenac;ao de urn campo material minima, a saber: 1) tripartigao de 33 Idem. p. 217, E verdade que 0 Uustre constitucionallsta portugues. modificando entendimento anterior defendido na obra "Constituig5.o Dirigente e Vinculdgau du Legislador" (Coimbra, Coimbra Editora, 1994j, mitiga os efeitos do di£igismo constitucional ao assinalar que "hoje, em virtude da transformagao do papel do Estado, 0 programa constitucional assume mais 0 papel de legitimador da sociedade estatal do qne it flln9ao dirigente do contro politico" (cf. DireiLo Constitucional e Teoria da Cor.stituigao, pp. 217-218). 34 Idem, p. 219. 35 Cf. Teoria de 1a Constitllci6u. pp. 209-213. 36 Ob. cit., p. 209. 37 Ob. cit., p. 211. 34 ADRIANO Realce --- ~ -----------------r1 Curso de Direito Constitucional fungoes estatais, conferindo-as a orgaos distintos e autonomos, na forma da teo ria engendrada POI Montesquieu; 2) limitagao genericamente imposta aos "pede· res"38 do Estado mediante 0 estabelecimento de mecanismos de freios e contra pesos (checks and balances), au seja, contengao do poder pelo proprio poder; 3) mecanisme de proibig8.o de solugao autocratica de impasse institucional; 4) cria gEl.O de processo legislativQ especial para adaptar-se a constituigao a realidade social e politica cambiante, de sorte a evitar a ruptura institucional,e, por tim, 5) reconhecimento expresso das direitos lndividuais e das liberdades fundamentais como caTalario logico do reconhecimento da legitimidade da esfera de autodeter minagao individua1. 39 o aumento da constitucionalizagao de materias que ainda nao haviam side tratadas pela norma-vert ice gerou a distingao entre constituigao em sentido mate rial e constituigao em sentido formal, porque, de acordo com a doutrina, assuntos ou materias nao pertinentes a estrutura do Estado, it organizagao dos poderes, seu exercicio e aos direitos e garantias fundamentais do individuo somente podiam ser considerados constitucionais porque localizados na constituigao. A distingao doutrinaria carece de importancia pratica, porquanto nao convi vemos atualmente com discriminagao de qualquer especie com relagao a urn con tetido formal ou materialmente constitucional, como ocorrera na Constituigao do Imperio, ao indicar 0 art. 178: OlE so constitucional 0 que diz respeito aos limites e atribuig6es respectivos dos poderes politicos, e aos direitos politicos e indivi duais dos cidadaos; tudo que nao e constitucional pode ser alterado, sem as for malidades referidas, pelas legislaturas ordinarias." 3.5. Elementos das constituigoes Assenta a doutrina a classificagao de cinco categorias de elementos, em razao da sua natureza, fungao ou finalidade: a) normas constitucionais orgEmicas, tendentes a estruturagao do Estado e do Poder; b) normas constitucionais de limitagao ou limitativas correspondentes ao elenco de direitos e garantias funda mentais outorgadas ao individuo, nao apenas com escopo de limitar a atuagao do Estado em face daquele, mas tambE~m elemento direcionado a. limitagao do arbi trio ou autodeterminagao individual; c) normas de estabilizagEl.O constitucional, consagradoras de elementos criados para solver os conflitos constitucionais e para defender a constituigao; d) nornlas constitucionais de aplicabilidade, que sao aquelas reguladoras dos elementos formais conducentes a aplicabilidade das normas constitucionais, elementos de suma importancia para 0 estudo da eficacia dos preceitos da constituigao, e, por ultimo: e) normas constitucionais socio-ideologicas, reveladoras do compromisso das constituigoes contempora 38 A terminologia se encontra entre aspas porque entendernos que 0 poder, enquanto manifesta· 9ao objetiva do fen6meno politico, e sempre uno e indivisivel. 0 que pode ser fraClOnado para evitar-se 0 predominio do arbitrio sao as fun90es estatais. 39 Ob. cit., p. 53. 35 ADRIANO Nota executivo, legislativo e judiciário. -- Manoel Jorge e Silva Neto neas com a busca por uma sociedade menos desigual (normas de direito social), bern assim fixadoras do modelo economico a ser trilhado pelo Estado (normas de direito economico).40 40 Cf. Jose Manso da Silva, Aplicabilidade das Normas Constitucionais. p. 165. 36 , ----------~ Capitulo 4 Hist6ria do Constitucionalismo 4.1. Justificativa do Capitulo E necessaria apresentar as motivos justificadores da previsao de capitulo especifico para 0 estudo da hist6ria do constitucionalismo no contexto de uma Teoria da Constituigao. If: que, inegavelmente, as quest6es mais atuais e relacionadas, por exemplo, a interpretagao e a aplicabilidade das normas constitucionais naG podem ser bern compreendidas 5e naG torem enunciados as principais fatos hist6ricos res ponsaveis pela transforma<;:ao dos Estados 8, logicamente, dos modelos normati vo-constitucionais que sustentaram t3i8 ordenamentos. 4.2. 0 Surgimento da Prote<;:ao aos Direitos Fundamentais Se bern que 5e possa reconhecer 0 carater relativamente recente das previ soes legislativas tuteladoras dos chamados direitos fundamentais, ja na Idade Antiga se presencia alguma preocupac;:ao em torno aos direitos hoje consagrados nos mais diversos sistemas constitucionais. Jose Afonso da Silva exp6e que "( ... ) alguns antecedentes formais das declarac;:6es de direitos foram sendo elaborados, como 0 veto do tribuno da plebe contra a~6es injustas dos patricios em Roma, a Lei de Valerio Publicola proibin do penas corporais contra cidadaos em certas situa~6es ate culminar com 0 Interdicto in Romine Libero Exhibendo, remoto antecedente do habeas corpus moderno, que 0 Direito romano instituiu como prote~ao juridica da liberdade".l Na Idade Media, entretanto, houve consideravel avanc;:o em tema de prote c;:ao de alguns direitos fundamentais, especialmente na Inglaterra, decerto como conseqiiencia da limitac;:ao do poder monarquico e consolida~ao do parlamenta rismo como sistema de governo,2 a partir do desinteresse demonstrado pelo monarca pelos problemas da Coroa Inglesa, fazendo-se representar nas reuni6es do Magnum Concilium por urn conselheiro, surgindo, dai, presumivelmente, a figura do primeiro-ministro. E necessario apontar a importancia da Magna Charta Libertatum para 0 desenvolvimento dos direitos fundamentais. 1 Cf. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 150. 2 Nunca e demals recordar que: sistema de governo (parlamentarismo/presidenciahsmo) - forma de governo (republica/monarquia) - forma de Estado (federal/unitario/regional). 37 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Nota Inglaterra. Revolução de 1640. revolução gloriosa de 1688 (?). Monarquia constitucional. null ADRIANO Realce ADRIANO Nota 1215. Rei João. E não na Revolução Gloriosa. Manoel Jorge e Silva Neto No seculo XIII, precisamente no ana de 1215, a Rei Joao Sem-Terra firmou pacta com bispos e nobres ingleses, garantindo-Ihes alguns privilegios feudais. Se e certo que a Magna Charta efetivamente deixou a esmagadora maioria da populagao sem acesso aos direitos nela previstos, nao menos e que serviu como urn dos marcos para a consolidagao de importantes direitos e' garantias fundamentais, como e 0 caso do habeas corpus e do direito de propriedade. Todavia, como anota lnga Sarlet, mesmo antes da Magna Charta, ja existiam diversas documentos que buscavam consolidar a protegao a direitos fundamen tais, como foi a documento firmado por Afonso IX, em 1188, a Bula de Ouro da Hungria (1222), a Privilegia General autargada par Pedro JJI em 1283 e as Privi legias da Uniaa Araganesa (1286).3 Com a Revolugao Gloriosa, em 1688, Guilherme de Orange concedeu diver sas prerrogativas aos membros do Parlamento, sendo implementada, na ocasiao, nova concessao regia, denominada Bill ofRights. It natural que a mudanga no sistema de governo ingles tenha provocado a aparecimento de normas protetivas dos direitos fundamentais, notadamente por que, em seguida, a exerdcio da chefia de governo se transferira para a lider do Parlamento, que, par sua vez, carecia de apoio polftico dos seus pares eleitos ,• pelos cidadaos ingleses. Mas, convictamente, a constitucionahsmo, em sua moldura classica, surgiu com a Revolugao Francesa,4 fato politico e social que, pela sua relevancia, inclu sive para 0 exame historico que ora se empreende, merece analise a parte. 3 Cf. A eficacia dos direitos fundamentais, p. 48. 4 Santl Romano insiste, no entanto, que 0 fen6meno do constitucionaLismo tern origem inglesa e, portanto, e mais antigo do que a Revolu<;ao Ftancesa. Acentua que .oeste movimento e precisa mente aquele que, no que se refere a Europa, tinha par finalidade mtroduzir no continente uma ordenat;ao semelhante ~quela que ha seculos vigorava na lnglaterra, enquanta nos de rna is con tinentes a adoqao de semelhante ordenaqao se deu antes do que na Europa, ou depois, em segui da a varios acontecimentas. De sorte que se pode dizer que 0 direito constituclOnal dos Estadas Modernos resulta do direito constitucional ingles e das demais ardena<;oes, delemais au menos derivadas diretamente" (cf. "Principios de Direito Constltucianal Geral", pp. 42-43). 0 autor faz ainda interessantes observat;0es sabre a influencia do direito ingles. admitinda a beneficia do dueito constitucional consuetudinario: "0 processo historico, atraves do qual se farmou a Constituiqao inglesa, tern permitido uma caracteristica e feliz conciliaqao da monarquia com a aristacracia e a povo, nas epocas em que as outros Estados eram monarquias abso}utas, republi· cas aristocraticas au, exclusivamente, democracias. Enquanto a Corea foi muito prudente ao consentir a limitat;ao dos poderes reais atraves da participat;ao no governo das classes mais ele vadas e dos comuns, nao menos prudentes foram estas classes ao evitar a enfraquecimento do poder central que em outros Estados era conseqiiencia da falta de regulamentaqao da fort;a poli tica dos feudatarios e daquela tumultuosa e indisciPlinada classe popular (... )" (op. cit" pp. 45 46). Ernbora a processo de consolidat;ao do Estado Canstitucional passa ser reconduzido a expe rieucia lOglesa, como afirma Santi Romano, e correto dizer que foi a Revolut;ao Ftancesa, com a rationalization du pauvair (fenomeno a ser examinado adiante), que solidificou as bases do cons titUClOnalismo moderno, notadamente em faCe do art. 16 da Declarat;ao UniversaL dos Direitos do Homem e do Cidadao. 38 .......'------------_.._-- ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce io _ _ ...__4 Curso de Direito Constitucional 4.3. 0 Constitucionalismo Classico e a Revolugao Francesa Chama·se de constitucionalismo classico 0 movimento aconido na Revolugao Francesa de 1789, cuja marca indelevel e a proteg3.o dos direitos indi viduais contra a interferencia do Estado. Explica-se 0 fenomeno. A partir do final do sE?cula XV, COIn a politica unifica cionista ocorrida na Europa. os diversos Estados que ate entao se apresentavam com divisao espacial e politica bastante fragmentaria assumiram compleigao dis tinta, maxime em virtude da centralizagao do poder politico em maos do monar ca, que se posicionoll como exclusiva fonte irradiadora de decis6es. Nesta epoca, tambem conhecida como a "Era das Descobertas" houve 0I soerguimento dos Estados nacionais e a instalagao de modele economico volta do a acumulagao de oura e prata (metaIismo). Igualmente vigorava na cartilha economica deste periodo a busca obsessiva pelo equilibrio da balanga comercial mediante 0 aurnento das exportagoes. Enquanto os Estados nacionais - de modo especial Portugal e Espanha - se agigantavam com a sua politica economica mercantihsta, 0 caminho inverso se fazia em termos de garantia dos direitos dos individuos. Pouca ou nenhuma hberdade de expressao ou participagao politica; exagoes fiscais extorsivas e impostas ao alvedrio do suserano. Nao havia, em suma, exer dcio de hberdade e 0 Estado absolutista monarquico parecia ser a unica alterna tiva para a sociedade medieval. Todavia, esbog<lva-se 0 aparecimento de ideario que pregava rigorosamen te 0 contnirio dos postulados do Absolutismo Monarquico: 0 Iluminismo. Tratava-se de movimento filos6fico, igualmente conhecido como Esclareci mento, Ilustragao ou Seculo das Luzes, que toma lugar na Franga, Alemanha e Inglaterra no sEkulo XVIII, cuja caracteristica mais genuina era a defesa da racio nalidade critica contra a te, a superstig8.o e 0 dogma religioso. 5 Na Franga, as ideias iluministas transportadas para 0 contexto politico ense jaram 0 surgimento da rationalization du pouvoir, ou racionalizagao do poder, que significava simplesmente a necessidade de consolidagao dos direitos individuais e da tripartigao das fung6es estatais nas constituig6es. Por conseguinte, a genese do constitucionalismo classico esta atrelada ao irrefreavel impeto quanto apositivagao de direitos e garantias aptos asalvaguar da dos individuos quanta a intromissao ou arbitrio praticados pelo Estado. Nao se podera compreender a nogao do constitucionalismo daquela epoca se nao se atentar para 0 autentico motivo conducente a inclusao das liberdades publicas nos textos constitucionais: a preservagao da liberdade individual. Olema da Revolugao Francesa - "Liberdade. 19ualdade e Fraternidade" serviu de esteio a configuragao de Estado nao-interventor nos negocios indivi 5 Cf. Hilton Japiassu & Danilo Marcondes, Dicionario Basico de Filosofia, pp. 128-129. 39 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce --------------- Manoel Jorge e Silva Neto duais; sociedade politica mera espectadora do que se sucedia no torvelinho das relag6es sociais. Dentre os caracteres desse Estado, habitualrnente chamado de "liberal" ou "abstencionista", pode ser destacada a passividade no trato das desigualdades sociais que grassavam, ao ponto de a isonomia entao assegurada ser apenas a de contextura formal, ou seja, nao se investigava a respeito da existencia de desequiparagoes havidas entre os individuos que impusessem atuagao do Es tado no sentido de elimina-las ou, na pior das hip6teses, mitiga-Ias. Se bern que seja inegavel reconhecer 0 carater francamente liberal da De claragao F'rancesa, Mirkine-Guetzevitch esclarece que os direitos sociais nao eram estranhos a consciencia juridica dos homens da Revolugao F'rancesa, tanto que a concepgao social da Declarag800 e estabelecida de modo marcante no pro jeto apresentado por Maximilien Robespierre aSociedade dos Jacobinos a 21 de abril de 1793, cujo conteudo, dentre outros artigos, denotava a nitida preocupa 9800 com os direitos sociais.6 Thdavia, segundo ainda Guetzevitch, .. a Declaragao de 1793 nao seguiu 0 ousado projeto de Robespierre; mas ela estabeleceu ja alguns direitos sociais e em seu artigo lQ. dispoe: "0 fim da sociedade e a felicidade comum".7 4.3.1. a Constitucionalismo Classico e a Racionaliza<;;ao do Poder No altiplano do ideffiio absenteista caracteristico do pensamento predomi nante durante 0 "SEkulo das Luzes", resplandeceu, com intensa luminosidade, notadamente na F'ranga, 0 fenomeno da racionalization du pouvoir, ou, ern verna culo, racionalizag8oo do poder. Consistia sirnplesmente na tentativa de aferrar 0 exercicio do poder politico ao racionalismo que vicejava a epoca, determinando importantissimas conse qiiencias no plano constitucional, dentre as quais a tripartigao das fungoes do Estado e a consolidagao dos direitos individuais. Guetzevitch entende que racionalizagao do poder e, genericamente, a ten tativa de subnleter ao direito todo 0 conjunto da vida coletiva.8 6 Cf. Les Nouvelles Thndances du Droit Constitutionnel. pp. 86-87. Sao os seguintes os dispositivos, segundo 0 autor, que denotavam preocupac;:ao com os direitos sociais: art. 82 ("0 direito de pw priedade e limitado como os outros peta obrigayao de respeitar os direitos de outrem"); art. 11 ("a sociedade e obrigada a prover a subsistencia de todos os seus membros, seja lhes disponi· bilizando trabalbo, seja assegurando os meios de vida aqueles que estao impossiblitados de tra balhar"); art. 12 ("os socorros necessarios a indigencia constituem divida do rico para com 0 pobre; cabe a lei determinar como estas dlvida deve ser saldada"); art. 13 ("os cidadaos cuja renda nao exceder 0 necessario para sua subsistE!ncia sao dispensados de contribulr para as despesas publicas. as demais devem suporta-las progressivamente, segundo a extensao de sua fortuna") e art. 14 ("a sociedade deve favorecer com todo seu poder os progressos da razao publi ca e par a instrw;:ao ao alcance de todos os cidadaos"). 7 Idem, pp 87-88. 8 Idem, p. 8. Sao as palavras do constitucionalista europeu: "On assiste auprocessus de la ratio nalisation dll pOllvoir a1a tendance de soumettre au droit tout l'ensemble de 1a Vle collective". 40 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce • ----------------------... Curso de Direito Constttucional Em rigor, a referencia ao tema da triparti~ao das fungoes estatais deve cor responder a identica remissao as ideias de Montesquieu, cuja arcaboUl~o teorica sedimentou a contengao do poder pelo proprio poder. muito embora tal pensa mento igualmente possa ser encontrado na Grecia, com Ari5t6teles, quando divi diu tambsffi em tn?s as fungoes do Estado: deliberag8.o sabre assuntos de inte resse geral, organizagao de cargos e magistraturas e atos jUdiciais. 0 grande merito, todavia, da teoria de Montesquieu foi esclarecer que a divisao funcional seguir-se-ia a divisao organica, i5tO 8. eada fungao especifica do Estado para ser desempenhada por 6rgao distinto. A par disso, a racionalizag8.o do poder induzia a incorporagao dos direitos individuais cM.ssicos as constituigoes modernas, fato determinante de sua inclu sao no art. 16 da Declaragao Francesa de 1791: "Thute societe dans laquelle la garantie des droits n'est pas assuree, ni la separation des pouvoirs determinee, n'a point de constitution. 11 4.4. A Derrocada do Constitucionalismo Classico e 0 Surgimento do Constitucionalismo Social Amparado no pressuposto de que nao haveria razao para intervir nos nego cios individuais, 0 Estado liberal prosseguia forte na linha do absenteismo urdi do a partir e com fundamento no laisser faire laisser passer que Ie monde va de lui meme. E, diante de tal opgao ideologica, nao havia mesmo espago para a tentativa de reduzir as desigualdades sempre alimentadas pelo liberalismo economico. Para Adam Smith, constituia verdadeiro desproposito a intervengao do Es tado no dominio economico, porquanto a "mao invisivel" (invisible hand) se encarregaria de efetivar 0 natural equilibrio do sistema. Dizia ainda que 0 indivi duo, mesmo que procurasse 0 melhor proveito para 0 investimento do seu capi tal - iniciativa, de ordinario, segundo ele, presa a sentimentos individualistas e ego(sticos -, de modo natural 0 empreendimento findaria por satisfazer 0 interes se da coletividade.9 As premissas forjadas nos dominios da doutrina economica liberal nao se justificaram no plano da vida em sociedade, tanto que a consagragao da isono mia de compostura formal, aliada ao absenteismo que cingiu a fronte do Estado, trouxe como consequencia, irreprimivel, a eclosao de inumeros movimentos sociais, destacando-se as Revolug6es Mexicana de 1910 e a Russa de 1917, que contribuiram decisivamente para 0 aparecimento do fen6meno denominado de constitucionalismo social, com a nota peculiar da modificagao da postura do Estado em face dos individuos, ja, agora, amparado no principio da nao-neutra lidade, e destinado a intervir no dominio economico em ordem a consecugao de sociedade menos desiguaL 9 Cf. A Riqueza das Nac;6es, p. 48. 41 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ----- --- Manoel Jorge e Silva Neto Observa-se, contudo, que a resposta das camadas populares a acentuada explora~ao do trabalho humano nao foi imediata. Jose Augusto Rodrigues Pinto explica: "Ainda que se compreenda nao ter havido resposta social imediata a esse fato, e certo que ja nO meio do mesmo sEkulo (0 autor se refere ao seculo XVIII) 0 panorama das rela~oes entre openlrios e patroes mudara visivelmente, revelando-se a mudan~a, sobretudo, no clima de insatisfa~ao de perfil coletivo marcante, reprimida pela natural resist€mcia do capitalismo voltado para 0 lucro como meta exclusiva de sua atividade. A despeito da fermenta~ao crescente e dos primeiros sinais de violencia nos choques dos interesses antagonizados, a estrutura do Poder se conservou a margem dos acontecimentos, au por DaO lhe compreender a exata profundidade, ou por sonhar com a solu~ao do conflito nos limites internos das classes nele comprometidas de modo cada vez mais irrever sivel e abrangente".10 Frise-se que os principios de justi~a social, consolidados a partir do Manifesto Comunista de 1848, de Marx e Engels, nao foram apenas responsaveis pela surgimento dos modelos economicos socialistas; pelo contrario, ate nas eco nomias assentadas sobre 0 regime de livre mercado 58 tornou impositiva a incor pora9ao dos direitos sociais nas constitui90es contemporaneas. E que passou a reinar predominantemente a ideia segundo a qual deveria 0 Estado buscar a legi tima9ao garantindo os direitos sociais, nem que fosse para remete-Ios ao plano de promessa a ser descumprida apas. Mas persiste a relevancia dos direitos sociais, razao por que, doravante, tra taremos do tema com a indica~ao do conceito, classifica9ao e fundamentos, importancia, evolu93o e constitucionalismo social no Brasil. 4.5. Fundamentos do Constitucionalismo Social Para compreendermos os fundamentos do constitucionalismo social, deve mos, antes de mais nada, ter em mente ser a constitui~ao nao apenas a norma que se posiciona no ponto mais elevado do sistema juridico de urn pais, mas a intera~ao de fatores de ordem social, politica e economica. A constitui9ao e 0 resultado do dialetico processo de enformagao do Estado. o constitucionalismo social, como parte integrante da grande maioria das constitui90es contemporaneas, nao poderia, em absoluto, se postar infenso a tal constata~ao. Georges Ripert salienta incisivamente que "la democratie moderne assure la protection des faibles avec d'autant plus de complaisance que les {aibles sont en foit Ie plus nombreux" - com 0 que acentua a natureza protetiva e tutelar do Estado na democracia moderna ao assegurar a prote~ao aos mais fracas e nume rosos. l1 10 Cf. Curso de Direito Individual do T'rabalho, p. 29. 11 Cf. Le Regime Democratique et Ie Droit Civil Modeme. p. 121. 42 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce .. -------- ...._ ....<1 Curso de Direito Constitucional Numa perspectiva historica, analisando-se as diversos sistemas econ6micos desencadeadores do desenvolvimento da civilizac;ao traduziveis no feudalismo, no mercantilismo e no capitalismo, nos sentimos inteiramente Ii vontade para afirmar que, dentre todos, 0 que mais mUdangas provocou (nao apenas de oIdem estrutural da sociedade, mas sobretudo de "temperamento" ideologico) foi 0 sis tema capitalista de produgao, lapidado pela Revolue;:ao Tecnica,12 notadamente se atinarmos para 0 fato de que se naa tratava mais de assentar 0 sistema de dominac;ao na vassalagem e suserania (feudalismo) ou no comercio de rnercado rias para acumulagao de reserva em auro (mercantilismo), mas sim na mais-valia, exploragao do trabalho pelo capital (capitalismo), cUja resposta veio a tona quase de imediato atraves do Socialismo, quer 0 Utopico, defendido por Saint Simon, Charles Fourier e Proudhon, quer 0 Cientifico, criado pelos alemaes Karl Marx e Friedrich Engels, restando por concluir estarem, todos, indistintamente, adequa dos ao conceito de modele politico de dominagao, porquanto, como bern acentua Max Weber, "( ... ) 0 Estado consiste em uma relagao de dominagao do homern sobre 0 homern, fundada no instrumento da violEmcia legitima (isto e, da violEm cia considerada como legitima). 0 Estado so pode existir, portanto, sob condigao de que os homens dominados se submetam a autoridade continuadamente rei vindicada pelos dominadores" .13 o fundamento - a parte a digressao no tocante a teoria do pensamento politico contemporaneo - para 0 emergir do fenomeno denominado constitu cionalismo social, ou seja, a inscrigao dos direitos sociais em sentidoamplis simo nas constituig6es, esta na razao direta do recrudescimento da questao social, na inflorescencia de movimentos populares, mesmo porque, se a explo ragao desenfreada do homem pelo homem no apogeu do sistema capitalista confere, por assim dizer, uma n6doa negra indelevel a historia da humanida de, traz a baila, como lenitivo, circunstancia provocadora de mudanga de estrutura. A Revolugao Russa de 1917 ressoava como grave advertencia aqueles que, desavisada ou imprudentemente, insistiam na persecugao do modelo liberal. o receio quanto ao eclodir de movimentos identificadores da insatisfagao popular, conlo a revolugao sovietica, alcangou niveis tao significativos que a introdugao dos elementos s6cio-ideo16gicos nas constituigoes nElO portava direta relagao com a maior ou menor proporgao de democratisme de urn determinado pais. 0 surgimento de novos elementos sociais nao correspondia, tao-sornente, ao resultado da interferencia e participagao de setores socialistas da sociedade nas assernbleias constituintes, porquanto ate mesmo nas constituigoes redigidas com inexpressiva atuagao de tal ideologia, se evidenciava, de fato, a inser9ao dos direitos sociais, e, nesse passo, explicaval 0 fenomeno atraves da preocupagao 12 Preferimos a termo ao conhecido "Revolu~ao Industrial", pais que nao induz it significatividade e it. amplitude do fenomeno ocorrido na epoca. 13 Cf. Ciemcia e Polltica - Duas Voca90es, Sao Paulo, p. 67. 43 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce Manoel Jorge e Silva Neto causada aos constituintes pela ameac;a social e pelos efeitos devastadores da experiencia russa. 14 Como dito, pairava sobre as sociedades a ameac;a da conflitualidade objeti va,15 sendo premente a utilizac;ao das Declarac;6es de Direito de sorte a diminuir au tornar controlaveis os conflitos que tivessem por movel a melhoria das "con dic;oes materiais de exist€mcia" da classe trabalhadora, para utilizar expressao consagrada par Karl Marx. Certamente, iniciou-se a inserc;ao dos elementos s6cio-ideologicos nas constituic;6es em virtude das graves ocorrencias do inicio do seculo XX, mas podemos afirmar - sem receio quanta a cometimento de equivocos - estar 0 feno meno da constitucionalizac;ao dos direitos sociais arraigado as Declarac;6es Modernas, desenhado como imorredouro simbolo a autenticar as vicissitudes do passado, a reclamar a efetivac;ao das normas sociais no presente, conduzindo, indefectivelmente, a almejada estabilidade social para a futuro. Destarte, 0 fenomeno da positivac;a.o constitucional dos elementos s6cio ideologicos tern par causa eficiente a propria questa.o social, porquanto floresceu o capitalismo em regime de concentrac;ao dos meios de produc;a.o e tambem da insidiosa realidade do trabalho encarado como mercadoria, al8m da adversidade de condic;6es ern que era prestado - como retrata fielmente Emile 201a em seu Germinal -, lugubre quadro a que a Estado liberal nao-intervencionista burgues assistia impassivel.. A irresignac;8.o quanto a persistir tal realidade determinou nao apenas a criagao do Direito do Trabalho, caracterizado como "urn conjunto de regras juri dicas de natureza tutelar e compensatoria, visando a permitir, tanto quanta pos sivel, a realizac;ao do fundamento moral (... )" ,16 mas tambem a luta dos trabalha dores para 0 reconhecimento das normas tutelares do trabalho (higidez e salubri dade do meio ambiente de trabalho, salario minimo, ferias, limitac;ao da jornada diaria, etc.) em nivel constitucional. Portanto, avista do expendido, podemos sintetizar dizendo que 0 constitu cionalismo social tern fundamentos de natureza sociologica, politica e juridica. Sob 0 prisma sociologico, ressaItam-se os movimentos sociais contestadores da estrutura vigente, cUjo exemplo mais marcante e a Revoluc;ao Socialista Sovietica. Ao examinarmos 0 aspecto politico da introdugao das normas de dire ito social nas constituig6es, admitlmo-Io como resultado da decisao levada ao fim e ao cabo pelas forgas politicas predominantes a epoca da manifestagao consti tuinte. 14 Cf. B. Mirkine-Guetzevitch. Les nouvelles tendances du droit constitutJ'onnel, pp. 39-40. 15 E1S que Lewis, defensor da escola sociologica dos conflitos. argumenta quanto A. permanencia do estado conflitual em qualquer meio, meSilla naqueles onde aparentemente nao seja presen ciado, 0 que configura a existencia dos conflitos subjetivos. 16 Cf. Orlando Teixeira da Costa, Direito Coletivo do Trabalho e Crise Econ6mica, p. 23 44 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce • e ,... Curso de Direito Constitucional a fundamento juridico e conducente a constatac;ao da necessidade de se introduzir na norma maior do sistema as elementos sociais como forma de expressar mais marcantemente 0 compromisso do Estado com a questao social, bern assim para impedir, inviabilizar ou dificultar sobremaneira a sua retirada por conveni€mcia do legislador ordinaria - patente e not6rio estar mais submetido a interferencia de interest groups (grupos de interesse) quando da enformagao do processo legislativQ respeitante a criar;ao das leis hierarquicamente inferiores a constituigao. No caso, poderia ser deduzida a inutilidade da inserc;8.o dos direitos sociais ou elementos s6cio-ideol6gicos nas constituir;oes como 6bice a atuagao dos gru· pos de interesse, porqueT com efeito, ate as pr6prias normas constitucionais, quer resultem do legislador constituinte originario, quer despontem como produ to do trabalho constituinte de segundo grau ou constituinte de compet€mcia deri vada, podem receber 0 influxo de tais segmentos organizados. A contestagao nao deixa de trazer urn aspecto relevantissimo atinente ao processo de elaboragao da constituigao pelo titular do poder constituinte (povo, ditador) ou de modificagao da lei fundamental pelo legislador derivado. Nao obstante, nao podemos esque cer que ha muito mais discussao e participagao da sociedade quando da feitura do texto fundador do Estado ou ainda na sua alteragao superveniente do que na eventualidade de alteragao de mera lei ordinaria ou complementar disciplinado ra de norma social. 4.6. Importancia do constitucionalismo social o Direito do 'frabalho, dominic normativo dotado de principiologia especifi ca, tern alargado sensivelmente 0 seu campo de atuagao a vista da sua crescen te importancia na politica e economia dos povos. Reflete, com efeito, 0 Direito do 'frabalho tres dimensoes traduziveis dos principios nucleares da constituigao de urn povo: a) a politico·juridica; b) a poli· tico-economica e, por tim; c) a politico-social, 0 que redunda em uma simbiose do Direito politico com 0 Direito laboral. Simbiose a S8 manifestar positivamente na constituigao ao optar 0 legislador constituinte originario pela elevagao dos prin cipios e institutos trabalhistas a natureza constitucional. 17 A introdugao das normas de direito social nas constituigoes, se nao forem remetidas ao plano da declaratividade e da retorica, revela 0 compromisso sole nemente assumido entre os detentores dos meios de produgao e da forga de tra balho no sentido de buscarem uma sociedade menos desigual, ao mesmo tempo dignificadora do trabalhador e vi8.vel a atividade empresarial como expressao da economia de mercado e da livre iniciativa. 17 Cf. E. Perez Botija, apud Mariano Tissembaum, "La Constitucionalizaci6n deL Derecho del Traba~ jo", in Tratado de Derecho del Trabajo, dirigido por Mario Deveali, pp. 177-178. 45 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce Manoel Jorge e Silva Neto o embate ideologico,18 longe de se constituir em empecilho a va]orizac;ao do trabalho e a livre iniciativa,e fato gerador de uma sociedade pluralista, democra¥ 18 Ha varios sentidos da palavra ideologia. Na teoria social norte-americana contemporanea, por exemplo, 0 termo ideologia vem sendo utilizado para designar opirri6es politicas conscientemen te formutadas (cf. Anthony de Crespigny e Jeremy Cronin, Ideologias Politicas, p. 9). Afirmam as autores mencionados que a palavra ideologia quando inauguralmente concebida portava cono ta~ao bern distinta da que hoje se formula. Ei'ora empregado a termo a epoca da Revolugao Francesa, pela vez primeira, par Destutt De Tracy, que a associou a busca de urn metoda, sendo que ideologie foi a nome dado par De 'Itacy ao metodo especffico que propunha como universal mente aplicavel. "A ideo]ogie, au ciencia das ideias, proporcionaria a verdadeira fundamento para todas as demais cillncias" (ob. cit., p. 6). Crespigny e Cronin aludem ainda ao sentido mais generico e popular da palavra ideoLogia, apontada como sistemas de crengas de grupos sociais, e, com efeito, tal concepgao foi disseminada a partir das obras de Karl Marx, muito embora nao tenha sido a mosofo alemao a primeira a reconhecer que os grupos sociais carregam conslgo uma particular compreensao da realidade, distinta dos demais (idem, ibidem). Esclarega-se que, ao nos referirrnos a embate ideologico, como flzemos no texto, associamos indicativamente a con cep~ao de Ideologia a de sistemas de cren~as de grupos sociais. Niio obstante, nao se esgotam nesse plano as incontaveis significa~6es da palavra ideologia. Karl Mannheim (cf. Ideologia y Utopia, p. 49) reconhece dois sentidos distintos e separados do termo ideologia, sendo urn particular e outra total. Ideologia, tomada em sua acepgao particular, segundo Mannheim, se revela atraves da desconfianga e do cepticismo do indivjduo com rela~ao as ideias do seu adversaIio, e, por Dutra giro, assumida ern seu sentido total, e sinonimo de con junto de ideias de uma epoca au de urn grupo historico-social concreto, "( ... ) par exemplo, de uma ciasse, quando estudarnos as caracteristicas e a composi~ao da total estrutura do espirito de nossa epoca au deste grupo" (idem, ibidem). Tercio Sampaio Ferraz Jr. (d. Teoria da Norma Juddica, pp. 155-157) clarifica que "ideologia e terrno equivoco, significando, ora falsa consciencia, ora tomada de posi~ao (filosofica, politica, pessoal, etc.), ora instrumento de analise critica (teoria da ideologia), ora instrumento de justifi cagao (pregrama de a~ao). Em nossa concepgao, funcionalizamos a conceito. Admitimo-lo como conceito axiologico, isto e, a lingl.lagem ideologica e tambem vaLorativa. So que, enquanto as valores em geral constituem prisrna, criteria de avaliagao de ag6es, a valoragao ideologica tern par ob]etivo imediato as pr6prios valores. Alem dis so, com qualidade pragmatica diferente. Enquanto as valares sao express6es dialogicas, reflexivas e instaveis, a valoragao ideologica e rigida e lirnitada. Ela atua no sentido de que a fun~ao seletiva do valor no contrale da a~ao se torna 'consciente'. Isto e, a valoragao ideologica e uma metacomunica~aoque estima as estima tivas, valora as proprias valora<;oes, seleciona as selegoes ao 'dizer' ao endere<;ado como este deve ve-tas". "A ideotogia, isto e, a avalia<;ao ideol6gica, atraves da qual podemos identificar a quaJidade imperatividade do sistema normative, sendo meta-comunicativa, constitui, portanto, per assim dizer, uma pauta de segundo grau, pressupondo a existencia das pr6prias normas. Ela calibra a sistema normativo na medida em que s6 par eta e possivel determinar, numa situa<;ao dada, que tipo de efetividade deve possuir ele, como urn todo, para que suas narmas constituam cadeias validas e, em consequencla, que tipo de autoridade deve seI assumida como legitima. Assim, par exemplo, maximas do tipo "ninguem deve perrnitir-se obter preveito de sua propria fraude ou brar vantagens de sua pr6pria transgressao" sao iospiradas em considera<;bes que tern sel.l fundamento em avalia<;ao ideol6gica, como as que afirmam a primado universal da ordem, da justi~a, enquanto valor social. podendo decidir, em conseqiiencia, sabre a validade e efetividade de testarneotos, contratos e outras atos juridicos, confirmando-lhes, alterando-lhes e suprimio do-Ihes a for<;a obrigatoria. Elas nao sao dirigidas diIetamente aos relatos das normas, mas aos seus cometimentos, tocando, par isso, imediatamente na rela<;ao entre editor e sujeito como meta complemental." It Tercio Sampaio Ferraz Jr., ainda, quem esclarece a respeito da possibilidade de distinguir-se eotre urn enunciado sobre a ideologia e urn enunciado ideol6gico, ao afirmar que "( .. ,) a distin<;ao 46 .. - • cd Curso de Direlto Constitucional tica, cuja apanagio rnais genuino e na multiplicidade das ideias alcan~ar a unici dade na solu~ao dos problemas nacionais. o constitucionalismo social esta fundamentalmente vinculado ao principia da nao-neutralidade. isto e, comprometimento da filosofia constitucional com os desfavorecidos, como soi oeorrer nas constitui~6es - como a nossa - que organi zam, de forma taxativa, as direitos sociais. a carater compromissorio e peculiar do estatuta fundador do Estado (se naD como obter-se a convergencia no uno dentro da multiplicidade ideo16gica?) e det maneira mais acentuada, presenciamos 0 acordo dos denominados "parceiros reais" nag normas constitucionais de direito social. Como aludimos anteriormente, habita 0 fundamento juridico do constitucio nalismo social na necessidade imperiosa de fazer residir na lei fundamental os direitos sociais, cujo escopo imediato e, sem duvida alguma. notabilizar tais nor mas, impedindo, por conseguinte, a sua altera~ao ou revoga~ao ao alvedrio do legislador infraconstitucional, e, por outro lado, 0 objetivo mediato e tragar as diretrizes de atua~ao legislativa e administrativa em absoluta consonancia com o programa escolhido pelo constituinte originario. A importElllcia pratica da coloca~ao de normas de natureza social na consti tuigao deriva do fato de produzirem contigua altera~ao no sistema normativo-tra balhista, de sinalizarem quanto a urn possivel "estado de inconstitucionalidade" do legislador - na hipotese de omissao legislativa inconstitucional- ou, ainda, ao vincularem a atua~ao de acordo com 0 programa constituinte. e possivel e tern ao menes urn valor operacional. Assim, em tese, urn enunciado sobre a ideblo· gia, nao importa seja ele mesmo ideo16gico, tern uma ideologia como seu objeto. Ja urn enuncia do ideologico nao fala de uma tdeologia, mas tern uma carga ideologica: emite, ideologicamen te, urn valor, au seja, urn simbolo de prefere!ncia para a90es indeterminadameute permanentes, uma formula integradora e sintetica para a representa9ao do consenso social. Muito embora, como reconhecemos, na pratica, essa distinr;ao seja imprecisa, poderiamos resumHa dizendo que, numa alusao a Hart (1961:99), urn enunciado sabre a ideologia manifesta urn ponto de vista exteruo, enquanto urn enunciado ideo!ogico manifesta urn ponto de vista interne. 0 primeiro e aquele que e emittdo par urn observador que, em tese, nao tern urn compromisso com a ideolo gia que menciona, ao passo que a segundo e emitido par urn observador que se compromete" (cf. Constitui9.3.0 de 1988: Legitimidade. Vige!ncia e Eficacia. Supremacia, p. 17). Questae de relevo a qual nao devemos tangenciar diz respeito a considera9ao de a ciencia do direito comportar au nao a ideologia. Para Hans Kelsen, a ci€!ncia do direito e ideologica enquanto em oposi9.3.0 ao mundo do ser au da natureza, sob a prisma 16gico transcendental, tendo em vista a sua afirmativa de que "somente quando se entenda 'ideoLogia' como oposir;ao areahdade dos fatos da ordem do ser, isto 12, quan do par ideologia se entenda tudo que nao seja realidade determinada por leicausal au uma des crir;ao desta realidade, eque a Direito, como norma - LstO e, como sentido de atos da ordem do ser causa!mente determinados mas diferente destes atos -, e uma ideologia" (ct. Teoria Pura do Direito, pp. 116-117). Cantudo, e tambem antiideol6gica, quando se nao refenr a valores e, nessa Iinha, conclui Kelsen: "( ... ) a ciencia tern, como conhecimento, a inten9.3.0 imanente de desvendar a seu objeto. A 'ideo logia', porem, encobre a realidade enquanto, com a intenr;ao de a conservar. de a defender, a obs curece au, cam a intenr;ao de a atacar, de a destruir e de a substituir par uma outra, a desfigu ra" (ob. cit., PP. 118-119). 47 Manael Jorge e Silva Neto 4.7. Evolugao Nao sao encontradas, senao muito raramente, disposig6es a respeito de nor mas protetivas do trabalhador nas constituig6es do seculo XIX e nas anteriores aos grandes movimentos populares no inicio do sEkulo XX. Iniludivelmente, a constitucionalizagao dos direitos sociais e nada mais nada menos que a pronta resposta dada pelos mantenedores da estrutura e da filosofia liberais a vista da possibilidade de modificagao abrupta do sistema vigente e de ruptura institucional. 19 Impende, nessa linha de compreensao, examinar 0 constitucionalismo social dentro de uma perspectiva hist6rico~evolutivo-constitucional,a fim de presen ciarmos as circunstancias autorizativas - ou determinantes - da incorparagao dos direitos sociais pelas constituic;:6es. 4.7.1. As Constituic;:6es Liberais dos Seculos XVIII e XIX Floriano Correa Vaz da Silva acentua que "sena uma esquematizac;:ao sim phsta a afirmac;:ao de que as constituic;:6es do SE3cUlo XIX foram todas puramente liberais e as constituic;:6es do seculo XX foram todas marcadamente sociais. Em quaisquer constituic;:6es, nas mais diversas epocas, podem ser encontrados e pesquisados dispositivos concernentes a ordem social e economica, clausulas que expllcita ou implicitamente definem 0 regime economico-social pretendido pelos constituintes. A pr6pria ausencia de cUmsulas sociais numa constituigao traduz a opc;:ao por determinado sistema, E esta aus€mcia, e claro, nao impede uma lenta construc;:ao jurisprudencial, nem emendas constitucionais, nem legis lac;:ao ordinaria - que irao, pouco a pouca, delinear dentro do sistema constitucio nal, uma serie de direitos sociais e trabalhistas, que passam a integrar 0 arcabou go economico-social do Pais".20 E sintomatica observar, ate mesmo em sede de legislac;:ao infraconstitucio nal, a intenc;:ao quanto ao preservar do ideallibero-individualista burgues, como ocorrera com 0 C6digo de Napoleao do seculo XIX, a garantir de forma absoluta o direito de propriedade como corolario 16gico do principio da nao-intervenc;:ao do Estado nos assuntos de ordem individual, Predominantemente, as Constituic;:6es do seculo XVIII, como a norte-ameri~ cana (1787) e a francesa de 1791. consagram 0 liberal-individualismo e nao dedi cam qualquer atenc;:ao aos direitos sociais, que somente viriam a integrar as Declarac;:6es de Direito posteriores a primeira decada do secul0 XX. 19 Na forma do que anunciamas anteriarmente, com suporte na lio:;:aa de Mirkine-Guetzevitch, naa hil. relao:;:aa direta au necessaria entre a insero:;:ao das normas de direito social nas canstituio:;:6es modernas e a interferimcia de segmentos "progressistas" da socledade. 20 Ct. Direito Constitucional do Trabalha, p, 35, 48 ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce ADRIANO Realce 10 « ... Curso de Direito Constitucional No entanto, no seculo XIX jil. notamos a convergencia, conquanto ainda tenue, no sentido de se dedicar 0 minima em termes de protec;ao aD trabalho, ou simplesmente adetar como principia constitucional tal modelo protetivo. Dentro do continente europeu devem ser destacadas a Constituic;ao france sa de 1848 e a Constituic;BO SUic;8 de 1874. Com efeito, na Revolugao Francesa (1789), a "droit au travail" au "direito ao trabalho" era comumente ouvido nas manifestac;:6es populares que desencadea ram urn dos mais importantes acontecimentos politicos do milenio, sendo assun~ to ensejactor de grande polemica e controversia na Assembleia Constituinte de 1848, restando par ser inscrito na Constituigiio frances a de 1848, ao lado de alguns direitos sociais, 0 que, de igual modo. oeonera corn a Constituig:ao sUlga de 1874, ao conduir: ''A Confederac;:ao tern 0 direito de estabelecer regras unifor mes sobre 0 trabalho das criangas nas fa-bricas, a duragao de trabalho imposta aos adultos e a protegao a dar aos operarios no exerdcio de trabalhos insalubres e perigosos" .21 Pierre Lavigne, invocando 0 pioneirismo da Constituic;ao francesa no tocan te a inserg:ao dos direitos sociais, assevera que "sao pela primeira vez definidos num texto solene e ampliados ao mesmo tempo que precisados: a feita sua liga gao com os textos politicos" ,22 Poram, as substanciais e radicais rnetamorfoses somente viriam no saculo XX, mais precisamente no primeiro quartel, com a eclosao da I Guerra Mundial (1914), da Revolugao Mexicana (1910) e da Revolugao Socialista Sovietica (1917). 4.7.2. As Constituic;6es do SEkula XX A idealizag8.o do direito como instrumento de conformagao social a recente dentro da teoria constitucional. A luz dos fatos hist6ricos marcantes ocorridos no inicio do saculo XX, as constituig6es foram gradativamente introduzindo principios de democracia social e economica, ensejando, nesse momento, de forma mais detida, a analise dos textos politicos mais importantes, aqueles causadores de maior impacto ideol6gico dentro da estrutura de poder vigente. 4.7.2.1. A Constituigao do Mexico de 1917 A Carta mexicana e a primeira constituig8.o politico-social do mundo, no dizer de Trueba-Urbina,23 que traz no seu bojo como expresseo maxima da supra constitucionalidade autogenerativa (complexo de fatores valorativos, sociol6gi 21 Cf. Floriano Correa Vaz da Silva, "Constitucionalismo Social", in Curso de Direito Constitucional do 'Irabalho, pp. 39-40. 22 Apud Floriano Correa Vaz da Silva, "Constitucionalismo", cit., p. 40. 23 CI. Alberto Tcueba-Urbina, Derecho Social Mexicano, p. 226. 49 ADRIANO Realce Manoel Jorge a Silva Nato cos, antropol6gicos e culturais a dlrecionar a manifestac;ao constituinte origina ria)24 a divida social e 0 compromisso quanto ao seu resgate. Daniel Moreno observa que "poucas vezes 0 pensamento juridico foi deve dor de fornla tao determinante da realidade social e das ideias postas em jogo, como no caso da mencionada Assembleia" - e, finalizando, salienta a respeito de despontar como causa fundamental a postura constituinte a deploravel situac;ao dos camponeses e operarios, que eram duramente explorados.25 Ao reconhecer 0 pioneirismo da Constituigao mexicana, assevera Loewenstein que, "como postulados expressamente formulados, los derechos fundamentales socioeconomicos no son abso1utamente nuevos: algunos de e11os, como el derecho al trabajo, fueran recogidos en 1a Constitucion francesa de 1793 y 1848. Pero es s610 en nuestro siglo, tras la primeira .v. en mayor grAdo todAvia, tras 1a segunda guor ra mundial, cuando se han convertido en e1 equipaje estandar del constitucionalis mo. F'ueron proclamados por primera vez, en la Constitucion mexicana de 1917, que con un alto saIto se Ahorro todo e1 camino para reil1izarlos: todas las riquezas naturales fueron nacionalizadas y e1 Estado asumio completamente, por 10 menos en e1 pape1, 1a responsabilidad social para garantizar una digna existencia a cada uno de sus dudadanos".2 6 A constatac;ao de Loewenstein e valida para atestar 0 comprometinlento do constituinte mexicano com 0 programa social do Estado, fato absolutamente nor mnl e esperado em virtude das deternlinantes sociais a, de modo impositivo,
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