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PASSO-A-PASSO HUMANÍSTICAS VOLUME 2- NOÇÕES DE CIÊNCIA POLÍTICA CONTEÚDO E ROTEIRO DE ESTUDOS DE ACORDO COM O EDITAL DO VI CONCURSO PARA O CARGO DE DEFENSOR PÚBLICO FEDERAL www.cursocliquejuris.com.br De acordo com o Edital nº 2, de 29.6.2017 Material elaborado pelo Curso Clique Juris Vedada a comercialização e compartilhamento 1 CPF Sumário Orientações Gerais .................................................................................... 2 PASSO-A-PASSO CIÊNCIA POLÍTICA ...................................................... 11 1. Origem e conceito ............................................................................... 12 2. Conceito de sociedade. ..................................................................... 16 3. Conceito de Estado. ............................................................................ 18 3.1. Acepções filosófica, jurídica e sociológica de Estado. ............. 19 3.2 Elementos constitutivos. .................................................................... 22 4. O povo ................................................................................................... 24 4.1. Conceito jurídico. .............................................................................. 26 4.2 Conceito político. .............................................................................. 27 4.3 Conceito sociológico. ....................................................................... 29 5 Conceito de nação. ............................................................................. 30 6 O poder do Estado ................................................................................ 33 6.1 Conceito. ............................................................................................. 34 6.2 Legitimidade do poder político. ..................................................... 36 6.3 A soberania. ........................................................................................ 40 7. Regime, formas e sistemas de governo. .......................................... 45 7.1 As origens da ordem política. .......................................................... 53 8. Democracia. ......................................................................................... 65 8.1 Democracia representativa e democracia deliberativa. ......... 67 8.2 Função política das ouvidorias externas, conferências e audiências públicas. ................................................................................ 76 9. Políticas públicas. ................................................................................. 85 9.1 Conceito e espécies. ........................................................................ 86 9.2 Fases: definição, implementação, monitoramento. ................... 96 10 Grupos de pressão. ........................................................................... 104 2 CPF Orientações Gerais Queridos alunos. É com grande satisfação que apresentamos a vocês o Passo- a-Passo – Humanísticas (PAP HUMANÍSTICAS). O material foi elaborado pelo professor Igor Peçanha Frota Vasconcellos, bacharel em Direito pela UFF, advogado e mestrando em Ciências Jurídicas e Sociais (PPGSD/UFF). No material apresentado selecionamos o que é fundamental para fazer a prova da DPU/CESPE no que tange às humanísticas que englobam três disciplinas do grupo IV do edital, a saber: (1) noções de ciência política; (2) noções de sociologia jurídica; e (3) filosofia do direito. São basicamente as disciplinas consideradas da área de Humanas, à exceção daquelas estritamente jurídicas. O que são as humanísticas (aonde vivem, o que comem)? É bem verdade que durante a faculdade costumamos não dar muita atenção para as matérias chamadas propedêuticas ou zetéticas (dois nomes que podem aparecer nas provas como sinônimos desse conjunto de disciplinas). Por aqui já fica uma primeira dica, no sentido de que a denominação propedêutica não é uma unanimidade porque refere-se à ideia de “conhecimentos mínimos” (ou “conhecimentos introdutórios”), e para muitos estudiosos dessas disciplinas, 3 CPF considerar que elas são apenas introdutórias e não centrais para o entendimento do direito já revela uma visão distanciada dos saberes críticos ou não dogmáticos. Assim, antes de entrar nos conteúdos propriamente ditos temos que dar dois passos: a) entender como abordar os temas que são essenciais para a prova; e b) aprender a diferença entre as disciplinas. O conteúdo do edital A maneira como o edital é construído, incluindo essas disciplinas na mesma lógica que as disciplinas jurídicas, amplia a dificuldade de estudo delas, uma vez que os temas são muito amplos e, ao contrário das disciplinas dogmáticas (opõe-se a zetéticas), não é habitual a produção de manuais sobre elas. Costumo dizer em sala de aula que poderia abordar cada tema do edital com pelo menos 10 autores diferentes e por um semestre inteiro num curso universitário. No que diz respeito à extensão do conteúdo podemos comparar com a Faculdade de Direito: já pensou de uma vez só (e pela primeira vez na vida) aprender todo o Direito Privado (que em muitas faculdades estudamos por dez períodos), com o agravante de que tanto na filosofia quanto nas ciências sociais (aqui incluídas a ciência política, a sociologia e alguns temas de antropologia que adentram o edital de sociologia) 4 CPF cada autor costuma cunhar seu próprio conceito sobre um assunto ou criar novos conceitos a partir de conceitos de autores pré-existentes, os quais não estão sistematizados em manuais e não há uma bibliografia-base para a prova o que seria o mais adequado para esse tipo de prova para essas disciplinas (como acontece na Defensoria de São Paulo, v.g.) Nesse sentido, fica uma segunda dica de que ao invés de se propor a decorar todos os conceitos específicos para as “categorias”1, autores e obras, busque organizar os seus estudos relacionando uns aos outros, porque o que a banca tentará fazer é confundir a ideia principal sobre aquele tema, tornando possível deduzir as questões que estão erradas ou certas quando se compreende como é o pensamento do autor ou em que contexto se mobiliza determinado conceito ou categoria. Um outro ponto importante a ser destacado novamente é ficar atento aos temas que atravessam as diferentes disciplinas, especialmente aqueles que estão no mesmo grupo das humanísticas (Constitucional, Direitos Humanos e Internacional). É bastante possível que nas questões discursivas 1Conceito muito importante para as ciências sociais, pois são os recursos explicativos utilizados para construir determinada teoria ou explicar uma determinada situação fática observada pelo cientista social – por exemplo, “trabalho” é uma categoria utilizada por Marx para explicar a sociedade capitalista. Ou ainda, “dominação” é uma categoria utilizada por Weber para explicar o estado e a sociedade burocrático-legal em que vivemos. 5 CPF os temas das humanísticas estejam articulados com temas dessa disciplina. Sobre as disciplinas que abordaremos a seguir, dentro das humanísticas temos “noções de sociologia jurídica” e “noções de ciência política”, ao passo que “filosofia do direito” não vem com essa ideia de conceitos introdutórios (a disciplina não é noções de Filosofia do Direito), o que pode implicar numa cobrança mais aprofundada dessa disciplina. Por fim, chamo a atenção para o momento político que vivemos, com “golpes”, “crises”, “impeachment”, reparem que todos os tópicos incluídos nos programas de humanísticas tem alguma relação com essa temática (direito e revolução em sociologia jurídica, as origens do poder político do estado em ciênciapolítica e desobediência civil em filosofia do direito, entre outros em que essa associação não é tão evidente, mas nos parece bastante claro que os examinadores estão com essa questão da legitimidade e da ruptura democrática em mente. Fiquemos atentos!) O que é o que é: Noções de Ciência Política (NCP), Noções de Sociologia Jurídica (NSJ) e Filosofia do Direito (FD)? Como diferenciar o objeto de estudos das nossas disciplinas? Distinguir as disciplinas é essencial e nos serve primordialmente para duas coisas, são elas: 1) organizar os conteúdos na nossa 6 CPF cabeça (como se fosse guardar o arquivo na pastinha certa), o que nos ajuda a aglutinar os assuntos em um mesmo grupo de conceitos e saber quais são mais facilmente associáveis a outros, ou não são possíveis de serem associados. Conhecer a organização temática da disciplina é mais um recurso que facilita o processo de associação de conteúdos e rememoração destes. Isto é, melhor que saber o conteúdo de uma disciplina é “saber de uma forma organizada”. 2) orientar a utilização dos conceitos e interpretação das questões, pois quando aprendemos a diferença entre as disciplinas fazemos associações que nos permitem recorrer aos conceitos, categorias e institutos mais adequados para compreender aquele contexto (no caso do concurso, a questão). As três disciplinas que estamos aprendendo juntos tem objetos distintos e, portanto, abordam os problemas colocados para elas de formas diferentes, muito embora esses objetos e reflexões se atravessem. A (I) Ciência Política (CP), dessa forma, preocupa-se com o estudo do poder e com o Estado (sua organização, divisão em poderes, etc.), uma vez que é neste que o poder é exercido “oficialmente” e com todas questões que daí decorrem: “soberania”, “território” e “povo”, “sistemas de governo”, “regimes de governo”, etc. Essa ciência, portanto, comumente 7 CPF estuda os partidos políticos, os sistemas eleitorais, as eleições, bem como os processos de governo. Há um sentido mais amplo do termo “política” - além do que estamos acostumados a utilizar ligado a política institucional- partidária – que pode ser simplificada na ideia de gestão da coletividade e das diferentes opiniões na sociedade (como saber qual prevalece, de que forma é legítimo que uma prevaleça sobre a outra, como chegar a consensos, consensos são necessários, não são necessários). Reitero: são sempre questões orientadas para como o poder é colocado e exercido na sociedade. Pois bem, se a CP está preocupada com o “poder” e o Estado, com que está majoritariamente preocupada a Filosofia do Direito? Existe uma ideia básica que aprendemos desde a escola de que a Filosofia é “amor à sabedoria” e como tal seu propósito seria o próprio exercício do pensamento. Desse modo, a (II) Filosofia do Direito tem por objetivo constituir um saber crítico (contrário à dogmática, portanto) sobre as construções jurídicas (sejam elas ideias ou práticas de atores do direito), buscando seus fundamentos, sua natureza, procurando entender suas estruturas. Outra importante dica é que para a Filosofia, ao contrário da Ciência Política e da Sociologia, o aspecto do “axiológico” (relativo ao valor) é deveras importante, de forma que para o conhecimento filosófico será importante questionar-se acerca 8 CPF do que seria justo, injusto, sobre as dimensões da moral no direito e vice-versa. Neste passo, quase todas (senão todas) as ciências modernas têm alguma âncora em alguma reflexão da filosofia grega - boa parte das grandes teorias explicativas do mundo (atomística na química, a física newtoniana, entre outras) constituíram-se a partir das concepções aristotélicas ou de outros filósofos gregos, ainda que para desconstituí-las. Por fim, vamos caracterizar a (III) Sociologia Jurídica como aquela ciência que está preocupada com a ordem social, isto é, preocupada com explicar a sociedade moderna. Como existimos enquanto sociedade, porque continuamos a viver juntos, reproduzindo comportamentos, hábitos, o quê de exterior (fora do campo da psicologia, por exemplo) é possível verificar que faz as sociedades, os grupos sociais existirem enquanto tais, o que o fundador da Sociologia enquanto disciplina, Émile Durkheim (“as regras do método sociológico”), chamou de “fato social”, por exemplo. A Sociologia Jurídica, portanto, vai preocupar-se com essas questões com relação ao mundo jurídico ou a respeito de qual é o papel que o Direito exerce nessa conformação social mais ampla. É essencial distinguir essa “ordem social” da “ordem jurídica”, definitivamente não se trata da mesma coisa. A referência ao conceito de “ordem pública” está relacionada ao Direito e ao campo normativo, preocupando-se com o que o Direito diz 9 CPF que é a ordem, com o cumprimento das leis ou não (ou com o que determinados agentes autorizados dizem que é o [des] respeito a elas). Por outro lado, a Sociologia preocupa-se com como se dá a reprodução das práticas sociais, como os atores/sujeitos sociais as interpretam e se adequam ou opõe- se a elas, como as compreendem, e ainda como são constituídas as ações desses sujeitos, como eles escolhem e orientam suas ações e reproduzem e/ou adaptam seu modo de vida. É claro que há muitas nuances em cada uma dessas disciplinas as quais vão, inclusive, depender de que linha de pensamento/pesquisa orienta as percepções que temos sobre cada um desses campo, mas por ora e para o nosso objetivo essas diferenciações permitem que possamos interpretar melhor as questões que nos sejam apresentadas na prova! Vamos ao edital Finalizando o começo, eu gostaria de lembrá-los que a maioria dos concorrentes não tem aptidão com essas matérias, não tem disposição para estudá-las e comumente deixam elas ao sabor da sorte ou as ignora, colocando na conta do que não vai ser marcado ou será chutado. Estudando adequadamente para elas você terá um diferencial e é isso que nós estamos propondo no CURSO CLIQUE JURIS: uma preparação 10 CPF adequada nessas disciplinas como vocês fariam em qualquer uma das outras. Como eu já disse no blog em outra oportunidade, o que esperamos, honestamente, é fazer diferença na preparação de vocês para que vocês façam diferença na vida de todas as pessoas que vão lhes encontrar nas defensorias da vida! Igor Peçanha Frota Vasconcellos 11 CPF PASSO-A-PASSO CIÊNCIA POLÍTICA Especificamente em relação ao tempo que se deve destinar ao estudo da disciplina Noções de Ciência Política, cujos principais aspectos de cada um dos pontos do Edital 02, de 29.6.2017, foram tratados adiante, orientamos que sejam destinadas, no mínimo, 7 horas de estudos, divididos da seguinte forma: Dia 1 - 2 horas de estudos. Páginas 11 a 44. Pontos 1 a 6. Dia 2 – 3 horas de estudos. Páginas 44 a 84. Pontos 7 e 8. Esse dia ficou um pouco mais longo que o de costume tendo em vista que há diversos pontos em que o aluno tem conhecimento prévio de diversos pontos, já estudados em Constitucional, por exemplo, o que vai acelerar a leitura do material (obviamente que a leitura não é dispensada nesses temas posto que a Ciência Política lhes dá uma leitura com contornos peculiares e que não podem passar sem serem vistos atentamente). Além disso, reputamos que o aluno leia do início ao fim certos temas, de modo a formar a compreensão acerca dos institutos. Dia 3 – 2 horas de estudos. Páginas 84 a 115. Pontos 9 e 10. 12 CPF CIÊNCIA POLÍTICA 1. Origem e conceito Então, pessoal, na parte introdutória já diferenciamos o objeto de estudo e reflexão da Ciência Política das outras disciplinas humanísticas, de modo que seremos um pouquinho mais econômicos nesse ponto[*voltem lá rapidinho*]. O que o examinador quer que saibamos acerca desse ponto são as ideias (e os autores) precursoras da Ciência Política (que estão ligadas ao campo que denominamos como “filosofia política2) e qual é o objeto de estudo da disciplina (do que se ocupam os cientistas políticos). Vamos fazer um caminho inverso aqui para facilitar, primeiro vamos recordar quais seriam os possíveis objetos de estudo para depois entender como se chegou a esse objeto, ou seja, quais foram os pensamentos percursores. Sobre o conceito de ciência política. Inicialmente, há uma grande divisão dentro da ciência política sobre se o seu objeto seria *o poder* ou *o estado*, como o próprio estado é o locus de exercício desse poder, como veremos a frente, não há uma grande implicação para nossa prova nessa diferença de modo que é 2Por isso vários autores são mencionados também no material de filosofia do direito, fiquem atentos ao cruzamento dessas informações, isto pode ser um ponto de cobrança, especialmente no que diz respeito as possíveis questões discursivas. 13 CPF possível que o examinador faça assertivas com ambos os conceitos, podendo ser as duas consideradas corretas. De todo modo podemos dizer que a ciência política é a aquela que estuda: A Política (partidos políticos, comportamentos eleitorais, eleições em geral sistemas políticos, outras organizações políticas e dos processos políticos). O Poder (por exemplo: as regras não explícitas dos processos sociais em que há transferência e exercício do poder - “jogos do poder” do gênero “house of cards”) Estrutura e processos do governo (por exemplo, entender as consequências de determinadas políticas públicas que, inclusive é item do nosso edital). Sobre a origem do pensamento sobre a política. No marco do nosso pensamento ocidental, há filósofos gregos que já se ocuparam do tema da política, podemos mencionar principalmente Platão (que era crítico da democracia) e Aristóteles, sendo o segundo considerado o grande percursor do que seria a ciência política, 14 CPF especialmente porque preocupou-se em delimitar que o objeto de estudo da política deveria ser a polis (cidade-estado grega), suas “instituições”, estrutura, forma como se constituiu e como era conduzida de maneira similar à qual atribuímos hoje a tarefa de estudar o Estado a Ciência Política, já que essa é nossa forma de organização política principal no ocidente. Segundo Aristóteles o governo deveria ser capaz de garantir o “bem-estar geral”. Já século XVI, Nicolau Maquiavel (1469-1527) e a sua obra dão origem à modernidade política. Importa contextualizar que ele é um autor do Renascimento que dentre outras coisas caracterizou-se por resgatar valores e ideias da antiguidade greco-romana, contrapondo-os à tradição medieval (ou adaptando), isso implicou em diversos campos da vida social como as artes, arquitetura, mas também a organização política e da sociedade. A preocupação de Maquiavel era a criação de um governo eficaz que unificasse e secularizasse a Itália, isto é, uma unificação em uma figura/instituição que não fosse a Igreja, e sim o soberano/príncipe. O autor defendia que um príncipe ou dirigente de governo sem preocupações morais ou éticas, portanto que não olha as sensibilidades para atingir os seus fins. A política para ele, era assim, a arte de governar, e o que ele explicitou em sua obra era como essa arte era feita na 15 CPF prática. Assim, coloca o Estado, o governo e a instituição estatal no centro de suas ideias (em sentidos amplos). Diz-se que a obra de Maquiavel foi inovadora porque foi escrita baseado em sua prática concreta como diplomata porque se diz que ele introduziu um método comparativo-histórico, elaborando comparações entre dirigentes da sua época e de épocas anteriores através de exemplos. Suas obras mais conhecidas são “O Príncipe” e “Discursos sobre a Primeira Década de Tito Livio”, cujo intuito era justamente as instituições de sua época com as da Antiguidade, em especial de Roma, procurando entender como surgem, mantem-se e extinguem-se os Estados. Em “Discursos Sobre a Primeira Década de Tito Lívio”, o autor estimula o debate sobre o conceito de liberdade e virtude cívica. Segundo Maquiavel, há uma necessidade de confiar ao povo a preservação da liberdade para garantir a participação deste na vida pública. Para que o povo funcione como guardião de seu território. Não há cidade forte sem povo e também não há cidade livre sem participação da maioria na vida política da cidade. Uma das maiores contribuições de Maquiavel às formulações de teóricos posteriores foi a intensa participação do povo nos negócios da cidade e dos possíveis choques que essa participação poderia causar. 16 CPF Esses são os principais paradigmas das origens do pensamento políticos, vamos conversar sobre outros autores como: a) os contratualistas (Hobbes, Locke e Rousseau) em outros pontos do programa, e ainda ressaltar b) Comte e seu positivismo que defendia que os fatos e fenômenos políticos deveriam ser observados com objetividade tal qual com as ciências naturais (voltaremos a ele em NSJ). 2. Conceito de sociedade. Para esses itens iniciais do edital que contemplam os pontos básicos da Ciência Política as indicações dos livros de Paulo Bonavides e Dalmo de Abre Dallari nunca são demais. Quem deseja e terá tempo para ler, deve ir a eles. De todo modo, objetivaremos os pontos do edital para otimizar nosso tempo e facilitar o processo de estudo. Ademais, considerando que teremos uma prova de sociologia juntamente com a de ciência política é pouco provável que este ponto seja cobrado. Há autores que asseveram ser impossível falar em sociedade, o adequado seria falar em “sociedades”, visto que aquela é composta de grupos de variadas espécies com diferentes graus de coesão. 17 CPF Isto é, para Talcot Parsons, é o termo mais genérico utilizado para designar o “todo complexo de relações do homem com seus semelhantes”. Como destaca Paulo Bonavides, há duas correntes de pensamento que se destacam nessa tarefa de formular uma concepção para sociedade. A primeira cunhada por Ferdinand Toennies (1855-1936), fundador da sociedade alemã de sociologia, que está calcada na diferenciação entre comunidade e sociedade – inclusive, esse foi o nome de um dos seus livros “Comunidade e Sociedade” (1887). Essa visão é chamada de mecanicista, uma vez que na compreensão do autor a sociedade é uma ruptura como o modo de viver natural que seria a comunidade, em harmonia com a natureza, ao passo que a sociedade seria derivada de um acordo de vontades organizando-se em Estados. A concepção organicista, ao contrário, a seu turno é “reunião de várias partes, que preenchem funções distintas e que, por sua ação combinada, concorrem para manter a vida do todo”, esta inspirada nas formulações gregas, a exemplo de Aristóteles (que já mencionamos no tópico anterior) que entendia o homem como um “animal gregário”, isto é, que se agrega, vive em conjunto, por isto a sociedade seria um grau mais avançado, superior de organização humana. 18 CPF Neste passo, a concepção organicista está mais próxima da ideia de sociedade trabalhada por Durkheim (estudaremos em Sociologia) que diferenciava as sociedades simples (como dotadas de uma solidariedade mecânica) e as sociedades complexas/modernas (como dotadas de uma solidariedade orgânica), em outras palavras. Por outro lado, na concepção mecanicista ocorre o contrário, pois oriundo da tradição pessimista alemã, a “modernidade” (saída da comunidade para a sociedade) é vista com reticências,enquanto que para Durkheim a sociedade é tão ou mais natural (já que tinha influencia positivista) do que a comunidade. 3. Conceito de Estado. A noção de Estado fundamentalmente guarda relação com a detenção/gestão do poder da/na sociedade (não à toa discute-se se o objeto da ciência política é o poder ou o Estado). A partir dessa consideração podemos discorrer sobre como esse conceito pode ser cobrado em nosso certame. Alguns autores associam o conceito as polis (cidade-estado gregas) e a respublica (coisa pública romana) compreendendo que o estado é a personificação do vínculo comunitário. 19 CPF O termo Estado faz referência a uma expressão latina que pode ser traduzida como algo próximo a “estar firme”, o que isto quer indicar uma situação de permanência daquela configuração político-social, ou seja, de um grupo que vive junto permanentemente. No pós-medievo, quem cunhou a expressão foi Maquiavel, já explorado no item 1, em sua obra o “O Príncipe” ao dizer que “todos os domínios que tem ou tem tido império sobre os homens” são Estados. Deste modo, o Estado é onde está a ordem política da sociedade e, por consequência, organização do domínio e do poder. Para Paulo Bonavides a definição de Estado proposta por Jellinek é irrepreensível, vamos conferir: "corporação de um povo, assentada num determinado território e dotada de um poder originário de mando." (in Ciência Política, 10ª ed. Malheiros, capítulo 3, item 7). 3.1. Acepções filosófica, jurídica e sociológica de Estado. Esse ponto é bem objetivo, por isso vamos buscar nos autores mais conhecidos como o Estado pode ser caracterizado em sua dimensão (ou abordagem) filosófica, jurídica e sociológica. 20 CPF Sobre a acepção filosófica do Estado. Com Paulo Bonavides, segundo Hegel (1770-1831) - considerado um dos mais importantes filósofos do Direito, o primeiro a escrever um livro e atribuir esse título -, o Estado seria a “realidade da ideia moral”, para ele o Estado é a síntese da contradição existente entre a família (privado) e a sociedade (público), podendo ainda ser considerado a “manifestação visível da divindade”, sendo o valor mais alto. De maneira geral a abordagem filosófica do Estado procura uma justificativa para existência do estado baseada na moral, nos valores, sendo criticada por as preocupações do plano concreto, da empiria em segundo plano com relação as ideias. Trabalhamos indiretamente algumas concepções de estado na disciplina de Filosofia do Direito, como a percepção de Hobbes e de Locke sobre o estado, as quais refletem diretamente na própria concepção de direito. Sobre a acepção jurídica do Estado. Deste ponto de vista, o Estado decorre do Direito, só existe normativamente e por isso deve ser estudado a partir das questões técnicas e formais, está destinado a realizar os fins jurídicos. 21 CPF Immanuel Kant asseverou que o Estado seria “a reunião de uma multidão de homens vivendo sobre as leis do Direito”. Paulo Bonavides destaca a percepção de Burdeau, segundo a qual, o Estado represente a “institucionalização do poder”, “o Estado se forma quando assenta numa instituição e não num homem, uma certa despersonalização ou generalização da sujeição do poder ao direito (BURDEAU). Assim, o Estado seria o laço político ou jurídico entre os indivíduos ao passo que a sociedade é composta por uma pluralidade de laços. Sobre a acepção sociológica do Estado. O Estado deve ser percebido de maneira realista, levando em conta os fatos concretos, deixando de lado os fatores abstratos, estes só importam em termos de como as pessoas se orientam a partir deles (o que é concreto, descritível). Assim, é a “organização social do poder de coerção” ou a organização da coação social” (...), em suma, “a sociedade como titular de um poder coercitivo, regulado e disciplinado” (JHERING). 22 CPF Em considerações sociológicas, importa mencionar Karl Marx que percebia o Estado como uma forma de organização do poder de uma classe sobre a outra, isto é, o Estado existe para manter o status quo que é a dominação da classe burguesa sobre o proletariado, sendo importante mencionar que para o autor tratava-se de um fenômeno histórico passageiro, oriundo da luta de classes (motor da história) na sociedade, desde que, da propriedade coletiva se passou a apropriação individual dos meios de produção. Outro autor que nos importa muito neste tema é Max Weber, quem estudaremos com mais detalhes na disciplina de Sociologia, para ele o Estado é “força”, pois caracteriza-se pela “racionalização do emprego da violência, fazendo-a “legítima”. Isto é, se houve uma forma de organização social que não disciplina meios coercitivos não há que se falar em Estado. 3.2 Elementos constitutivos. Os elementos constitutivos tradicionalmente são considerados: povo, território e soberania. Contudo, há divergências, para José Afonso da Silva os elementos constitutivos do Estado são: povo, território, poder e fins. 23 CPF Voltemos a já mencionada definição de estado dada por Jellinek, a saber: “o Estado é a corporação de um povo, assentada num determinado território e dotada de um poder originário de mando”. Como os outros elementos do estado estão em outros itens do edital é importante consignarmos uma definição de território que pode ser entendido como a base geográfica do poder ou o espaço onde o Estado exercita seu poder de império (soberania). No certame para Analista do TRT-8 a CESPE já cobrou esse tema, vamos conferir: Enunciado: A respeito dos elementos do Estado, assinale a opção correta. A) Povo, território e governo soberano são elementos indissociáveis do Estado [GABARITO CORRETO] B) O Estado é um ente despersonalizado. [ERRADO, pois o estado um ente personalizado, sendo considerado de direito público interno]3 3 CUIDADO: Se olharmos de uma perspectiva sociológica, poderíamos afirmar que o Estado significa uma despersonalização do poder que deixa de pertencer a uma pessoa em específico (porque é de uma família x ou y) e passa a ser exercido pela função determinadas por regras de direito. Então, é como se o poder deixasse de ser pessoalizado para ser do direito e de quem ele determina que pode exercê-lo. 24 CPF C) São elementos do Estado o Poder Legislativo, o Poder Judiciário e o Poder Executivo. [ERRADO, estamos a falar aqui dos três poderes do estado que guarda relação com a teoria de Montesquieu] D) Os elementos do Estado podem se dividir em presidencialista ou parlamentarista. [ERRADO, esses são os sistemas de governo que dizem respeito ao modo como se relacionam os poderes – ver item 7] E) A União, o estado, os municípios e o Distrito Federal são elementos do Estado brasileiro. [ERRADO, este são os entes federativos – VER ITEM 7] 4. O povo Na discussão a respeito dos elementos constitutivos do estado Léon Duguit (1859-1928) faz uma diferenciação entre os elementos de ordem formal e os elementos de ordem material, neste sentido os elementos de ordem formal estariam relacionados ao poder político que, para o mesmo autor, diz respeito ao domínio dos mais fortes sobre os mais fracos. Por outro lado, os de ordem material seriam, além do território, o elemento humano, ou seja, a somatória dos 25 CPF indivíduos humanos, podendo ser definida segundo: a) um critério geográfico-demográfico (população); b) um critério jurídico-político (povo); ou c) um critério político-cultural (nação). De modo que se pode deduzir a parte da teoria exposta que a noção de povo, inicialmente, está associada ao próprio vínculo com o Estado. Assim,povo e população são conceitos diferentes. População é uma noção quantitativa e que não presume um vínculo jurídico-político Estado (como dito: um critério geográfico-demográfico), portanto inclui apátridas ou estrangeiros. Vamos a uma questão inédita que elaboramos para ilustrar como esses conceitos poderiam ser abordados pela banca examinadora: Enunciado: Segundo Paulo Bonavides o conjunto de indivíduos que possuem entre si e com o Estado um vínculo jurídico-político, estando ou não dentro de seu território, denomina-se população. Gabarito: [ERRADO] Explicação: O conceito apresentado define a noção de povo, e não de população. 26 CPF ATENÇÃO à relação com o território, pois um integrante do povo (cidadão) não precisa estar necessariamente dentro do território no qual um determinado Estado exerce soberania para assim ser reconhecido. 4.1. Conceito jurídico. Segundo Paulo Bonavides povo, numa concepção jurídica, é “o conjunto de indivíduos vinculados pela cidadania a um determinado ordenamento jurídico. Fazem parte do povo tanto os que se acham no território como fora deste, no estrangeiro, mas presos a um determinado sistema de poder ou ordenamento normativo, pelo vínculo da cidadania. A cidadania é a prova de identidade que mostra a relação ou vínculo do indivíduo com o Estado. É mediante essa relação que uma pessoa constitui fração ou parte de um povo” (BONAVIDES). Assim, podemos exemplificar o conceito exposto pensando que uma pessoa é reconhecida como parte do povo brasileiro mesmo que more na França, por exemplo, podendo exercer todos os seus direitos de cidadania, inclusive votar, reconhecer autenticidade de documentos e assinaturas (através das embaixadas, etc.). 27 CPF 4.2 Conceito político. No que tange ao conceito político de povo podemos dizer que “é um conjunto humano sufragante, ou seja, que possui aquele vínculo político com o Estado com capacidade decisória, confunde-se, portanto, com seu corpo eleitoral. Capaz de participar do processo democrático. Dentro de um sistema variável de limitações que depende de cada país e de cada época (AFONSO ARINOS SOBRINHO). Essa noção de povo como sinônimo de corpo eleitoral está relacionada a um outro tema caro a ciência política que é da democracia, já que esta designava, na antiguidade ateniense, aqueles que estavam autorizados a votar, sendo demo um vocábulo etimologicamente relacionado a ideia de conjunto de pessoas que vivem juntos. Este conceito foi resgatado pela modernidade política no que diz respeito ao sufrágio, assim não caberia falar em povo na era medieval, sendo mais adequado falar em súditos. Em suma, nessa dimensão povo, em termos atuais, está relacionado a capacidade eleitoral, mas numa dimensão mais ampla está relacionada a ser governado pelas leis que ele mesmo impõe (ainda que indiretamente) ou ao menos consente. Neste sentido, é sempre oportuno lembrar que esta é uma ideia que consta expressamente na Constituição, seja 28 CPF em seu preâmbulo, seja positivada no parágrafo único do Art. 1º, a conferir: Preâmbulo: Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: 29 CPF (...) Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. 4.3 Conceito sociológico. Neste ponto cabe um alerta, que esse conceito sociológico não é definido desse modo pelos sociólogos, e sim diz respeito a maneira como os cientistas políticos ou os estudiosos da Teoria Geral do Estado se apropriam das explicações sociológicas. Por que isso é importante? Por conta daquela contextualização da questão que mencionamos na parte introdutória, não é sem razão que este ponto está incluído nessa disciplina e não na disciplina de Noções Sociologia Jurídica. Dito isto, o conceito sociológico de povo pode ser definido por critérios étnicos, culturais, relacionados ao pertencimento a um determinado lugar, determinada religião ou língua que identifique uma história em comum aquele agrupamento humano. Nas palavras de Paulo Bonavides: 30 CPF (...) toda continuidade do elemento humano projetado historicamente no decurso de várias gerações e dotado de valores e aspirações comuns. Compreende vivos e mortos, as gerações presentes e as gerações passadas, os que vivem e os que hão de viver. Em tempo, assevera ainda o professor que o povo deste ponto de vista pode ser confundido com a nação. Em outras palavras, numa concepção sociológica povo e nação são sinônimos. Por fim, cumpre destacar que nesta acepção é possível existir um povo sem território e mesmo sem o próprio Estado, a exemplo dos judeus antes da criação de Israel ou dos bascos que intentam a separação da Espanha até os dias atuais. 5 Conceito de nação. A ideia de nação está relacionada a “sentir-se parte” ou “um mesmo sentir”. Segundo, Maurice Hariou (1856-1929), considerado um dos fundadores do direito administrativo francês, o qual, diga-se de passagem, influenciou profundamente o nosso direito administrativo a nação: 31 CPF “É um grupo humano na qual os indivíduos se sentem mutuamente unidos, por laços tanto materiais como espirituais, bem como conscientes daquilo que os distingue dos indivíduos componentes de outros grupos nacionais” (grifamos). A precisão do critério explicitado pelo publicista francês está relacionado ao fato de que contempla a dimensão interna (sentem-se mutuamente unidos) e a dimensão externa (distinguem-se de outros grupos nacionais). É como uma espécie de identidade coletiva. Paulo Bonavides nos lembra de uma questão capciosa levantada por Ernesto Renan que pode nos ajudar a fixar esse conceito, qual seja: Como a Suíça — que tem três línguas, três religiões, e não sei quantas raças — é uma Nação, enquanto não o é, por exemplo, a Toscana, tão homogênea? Por que a Áustria é um Estado e não uma nação? A pergunta é precisa e não tem propriamente resposta exata, de modo que o simples fato de se ter um conjunto de pessoas dentro de um estado não identifica necessariamente uma nação (como a Áustria) e ao mesmo 32 CPF tempo uma nação pode ser composta por uma diversidade de línguas, religiões e “raças”. Assim, Paulo Bonavides propõe como resposta parcial, dizendo que “a nação existirá sempre que tivermos síntese espiritual ou psicológica, concentrando os sobreditos fatores [língua, religião, “raça” ou origem histórica], ainda que falte um ou outro dentre os mesmos”. Destaca também que dentre esses elementos considera a língua o de maior importância. A nação - soma e herança de valores - tem compromisso com a história, porque afirma em seu nome o presente e o passado, do mesmo passo que prepara o porvir, repartido este entre apreensões e esperanças, aspirações e sobressaltos. Dito de outro modo a nação revela uma consciência moral compartilhada que revela um “espírito nacional” associada a uma históriaem comum e uma continuidade simbólica no porvir. Como já dito dentro de um estado temos movimentos de grupos humanos que não se identificam como parte daquela nação, podemos mencionar a Guerra dos Farrapos ocorrida no Brasil e Guerra da Secessão americana que visava separar o Sul do Norte divididos por várias questões, dentre elas a abolição da escravatura em todo o território 33 CPF nacional (o filme 12 anos de escravidão retrata bem essa questão). Atualmente podemos relembrar a já mencionada luta dos povos pela independência perante a Espanha, seja dos catalães, seja dos bascos ambos localizados na fronteira com a França. Inclusive, para ilustrar esses conceitos, há um time de futebol que joga o campeonato espanhol, chamado Athletic de Bilbao que é do “país basco” e que só contrata jogadores que nasceram, cresceram ou tenham origem basca como uma forma de marcar a sua verdadeira identidade nacional que é basca. 6 O poder do Estado Inicialmente, cumpre lembrar o do se trata o poder, quem tem poder domina o outro, pode em nome do outro. Uma figura que pode nos ajudar a entender mais amplamente o que é poder é o direito potestativo que é o direito de poder interferir na esfera jurídica alheia sem que ela possa impedir, então, por exemplo, se um dos cônjuges deseja o divórcio o outro terá uma alteração na sua esfera jurídica passando a solteira independentemente de sua vontade. Neste sentido, o poder (na discussão do estado) deve ser entendido como faculdade de tomar decisões em nome da coletividade. 34 CPF 6.1 Conceito. Prosseguindo no raciocínio do tópico anterior na tarefa de conceituar o poder do estado, cumpre diferenciarmos: Poder de fato → notabilizado pelo exercício da força, do emprego dos meios violentos como algo habitual. Pode ser compreendido como qualquer prática que obriga alguém a fazer algo que não queira por meio da força (coação física, estupro), no que diz respeito a discussão do estado compreende-se que retira o caráter de legitimidade (sendo identificado com os regimes totalitários, ditaduras, etc.); e Poder de direito → utilizado como competência, como consentimento dos governados, portanto reconhecido como legítimo. Neste ponto, cumpre destacar a explicação weberiana sobre o poder do estado, pois se ele define o próprio estado como “monopólio legítimo da violência”, o que ele está a falar é que justamente é no estado (por variadas razões) é que se reconhece o exercício desse poder de forma legítima. 35 CPF Vamos lembrar duas questões CESPE que trabalham com conceitos relacionáveis a este ponto, a primeira nos oferece uma boa definição “cespiana” de poder, veja: [Concurso Ministério da Ciência e Tecnologia -Analista - CESPE 2012 ] Enunciado: Acerca dos conceitos e teorias relacionados à ciência política, julgue o item a seguir. No âmbito do domínio de um indivíduo sobre outro, conceitua-se poder como a relação entre dois sujeitos, dos quais um impõe ao outro a própria vontade e lhe determina seu comportamento [Gabarito: CERTO] Ainda neste item, outra questão cobrada, desta vez no concurso da DPU, que apesar de constar como sociologia refere-se ao poder e nos dá a dica de que os conceitos weberianos podem ser cobrados [aliás, aproveitando o ensejo, weber é um autor que os examinadores da área do direito – fica a dica], vamos a ela: [Concurso Defensoria Pública da União – Defensor Federal 2010/CESPE] 36 CPF Enunciado: A respeito das relações de poder e legitimação, julgue o próximo item. 196. A forma legítima de dominação carismática, de acordo com Max Weber, está baseada na designação do líder pela virtude da fé na validade do estatuto legal. [ERRADO, pois a dominação carismática está baseada na designação do líder por sua virtude pessoal intrínseca (ele tem qualidades que justificam o poder a ele ser entregue), tem a ver com o próprio líder e não com o estatuto legal, a “fé” depositada no estatuto legal refere-se à dominação que weber denominou racional-legal] 6.2 Legitimidade do poder político. Prosseguindo na mesma discussão, por que o estado em seus contornos modernos encerra a noção de despersonalização do poder? É preciso lembrar que o Estado- nação surge buscando unificar os poderes locais dos feudos, por questões de cunho político e econômico relacionados ao advento do Capitalismo (como por exemplo, unificação de moedas, sistemas métricos (peso, tamanho, etc.), possibilidade de circulação em um território maior sob as mesmas regras de comércio e tributação. 37 CPF Assim, o Estado Moderno europeu formou-se primeiro unificando os diversos poderes locais (com líderes/senhores feudais locais) em torno da figura de um grande senhor feudal/monarca/rei - um poder ligado diretamente a quem o exercia, relacionado a origem familiar/descendência aristocrática, etc. - para gradativamente afastar-se desse modelo pessoalizado de gestão do poder [despersonalização do poder], passando-o às instituições (um modelo burocratizado de gestão do poder)4. Em tese, portanto, um determinado representante do poder (representante do estado) é obedecido não porque ele é “fulano de tal” que é filho de “cicrano de tal” ou porque veio de “tão tão longe” (rs!), mas sim porque ele está investido de um determinado cargo, que, por sua vez, está ancorado num sistema legal-burocrático [legitimidade na esfera das instituições] (Max Weber). Isto é, quando obedecemos ou acatamos uma ordem de um representante do estado (seja ele policial, fiscal, juiz ou oficial de justiça) fazemos isso porque ele representa o Estado dentro de um estatuto de regras que 4Nunca é demais lembrar que esses processos não são lineares (acontecendo numa ordem cronológica precisa) e nem que sejam o que aconteceu especificamente, mas que essa é uma narrativa possível para explicar como as condições históricas conformaram o atual estado das coisas. Sempre se trata de uma forma de contar as coisas, ancorada em dados, fontes bibliográficas, é claro! 38 CPF diz o que ele pode e deve fazer (ou pelo menos deveria ser), e não porque ele é fulano ou beltrano. Em conclusão, o Estado de Direito é aquele que está submetido às próprias regras, as quais, em geral, são produzidas de forma racional e pública. Isto pode parecer trivial, mas pense que um monarca (ao menos num sentido amplo) poderia dispor das regras que ele próprio colocou (evidentemente que isto poderia enfraquecer sua legitimidade por questões de ordem política ou cultural, mas do ponto de vista do próprio sistema de regras em si, não). Isto o Estado, em tese, não pode fazer, ao menos não sem seguir os trâmites burocráticos-legais e mesmo assim com limitações, como por exemplo no caso das reformas as constituições. O conceito de autoridade também é importante para essa discussão, estando ligado a ideia de dominação em weber, pois: autoridade é o exercício desse poder coletivo (ou em nome da coletividade) pelo consentimento, uma autoridade é reconhecida enquanto tal, quanto mais consentimento mais legitimidade e quanto maior a legitimidade maior a autoridade. Essa autoridade não se refere unicamente as pessoas que a exercem mais ao próprio conteúdo do poder. Se antes somente o monarca podia autolimitar-se, agora só o estado em seus contornos e procedimentos pode autolimitar- 39 CPF se para algumas correntes de pensamento, para outras sempre haverá valores morais, de justiça que estão acima das leis. O Direito, pois, também sofre esse processo de legitimidade. O simples fato de algo ter previsão legal não significa dizer que seja socialmente consideradoalgo ao qual se deve render respeito e crer na justeza de suas prescrições, variando essa percepção de sociedade para sociedade (cultura para cultura). Como a legitimidade flutua com as transformações e anseios políticos de uma época, as leis podem por isso mesmo sofrer um processo de perda de legitimidade (ou mesmo nunca ter tido) por não representar os anseios e necessidades de uma época. Dentro da Teoria Constitucional e da dogmática do Direito Constitucional discutimos isso em termos de “mutação constitucional”, por exemplo. Assim, quaisquer crenças políticas que obtenham uma massa crítica suficiente podem retirar a sua aura de legitimidade das leis, criando assim novas leis (ou seja, algo pode ser legal sem ser legítimo). De forma inversa, ocorre que regimes ditatoriais buscam legitimar suas ações por meio da legalidade, por mais equivocadas que elas sejam. Em todo caso, o princípio da legitimidade prevê que sempre é possível haver o 40 CPF questionamento da suposta santidade das leis: ações legais podem ser consideradas ilegítimas, provocando assim o debate sobre a necessidade de sua reforma. Essa são conhecidas por leis iníquas. Recomendamos como leitura complementar a este tópico o Cap. 8 do livro “Ciência Política” de Paulo Bonavides (intitulado “legalidade e legitimidade do poder político do Estado) – especialmente a partir do item 5, “a consideração filosófica do problema da legitimidade”, ressaltando que ele dialoga também com o item 7.1 deste PAP-CP, bem como com temas que estão na parte de “noções de sociologia” – legitimidade em weber, principalmente. 6.3 A soberania. Temos a ideia de soberania como poder absoluto de governar em determinado território, inclusive fazendo as leis que serão vigentes ali. Essa questão que pode parecer num primeiro momento simples em demasia, ancora um profundo debate que envolve outros assuntos subjacentes como Colonialismo, exploração e dominação de um povo sobre outro. Se os Estados-Nação abrem mão de sua soberania em prol de um direito internacional, como ficam as relações de poder estabelecidas entre um e outro. É, inclusive, um tema que 41 CPF pode ser explorado de forma um pouco mais sofisticada na prova discursiva. Paulo Bonavides faz uma interessante provocação aos “internacionalistas” ao comentar a questão da soberania, confiram: “Os internacionalistas são homens que veem sempre com suspeição o princípio de soberania. Não apenas com suspeição, senão como se fora ele obstáculo a realização da comunidade internacional, a positivação do direito internacional, a passagem do direito internacional, de um direito de bases meramente contratuais, apoiado em princípios de direito natural, de fundamentos tão-somente éticos ou racionais, a um direito que coercitivamente se pudesse impor a todos os Estados”. Esse debate nos chama a atenção para a possibilidade de compreender a soberania em seu: Aspecto interno: o que importa é o império sobre o território e a população. Aspecto externo: representa a manifestação de poder perante outros Estados. 42 CPF A questão da “titularidade”/fundamentação da soberania também é importante para este ponto do certame. Em verdade, há dois debates o primeiro seria entre uma fundamentação teológica e fundamentação democrática. E o segundo, seria entre uma soberania popular (povo) e uma soberania nacional (da nação). Em resumo, a fundamentação teológica da soberania remete o poder do soberano a uma origem divina (ele próprio é uma espécie de Deus ou descendente de Deus) ou uma investidura providencial/divina, ou seja, ele é o soberano porque Deus o investiu assim. A fundamentação democrática pode ser atribuída ao povo soberano ou a nação que é concebida, nesse caso, como algo superior ao próprio povo, ligada a ideia de representação. Vamos entender um pouco melhor a história dessa questão. Bonavides ilustra bem a questão: São os monarcas na terra os executores irresistíveis unicamente perante Deus, jamais perante os homens. Quando Luís XIV, escrevendo suas memórias, expressa rigorosamente a mesma ideia de Luís XIV, num célebre edito, afirma que sua coroa não 43 CPF deriva de ninguém senão de Deus e que o direito de fazer as leis lhe compete com exclusividade, temos aí (...) a mais completa e acabada imagem de a “pura doutrina do direito divino” sobrenatural. A frase icônica “o Estado sou eu”, que apesar de atribuída a Luís XIV serve perfeitamente para representar a forma como era a soberania: um poder que não conhecia limites – apenas os limites auto impostos. A noção de soberania do Estado como se confundindo com o governante não mais garantia a legitimidade política. Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) foi quem construiu a noção de que a soberania não poderia ser representada, ou seja, delegada a um indivíduo em participar. A massa social, o “povo” acaba sendo sinônimo de “nação”, o importante nessa discussão é o aspecto quantitativo da soberania. Para ele, a soberania assume um caráter “popular ”, distanciando-se definitivamente das concepções centradas na figura do monarca. De todo modo, a versão democrática do conceito de soberania proposta por ele foi algo que inspirou o surgimento das democracias modernas como as conhecemos, nas quais um eleitor equivale a um voto válido, independentemente de nível sociais ou quais outras distinções que se possa fazer: o sufrágio universal. 44 CPF Outra versão do conceito de soberania, a soberania do tipo “nacionalista”, voltava-se para a própria noção de “nação”. A diferença mais marcante – comparativamente à soberania popular – é que a soberania nacionalista se realiza por meio de governantes eleitos para representar o poder social. Ou seja, para essa concepção, é perfeitamente possível uma nação se fazer representar, pois a soberania não é simplesmente a soma numérica do povo, mas algo maior, distinto, sendo uma síntese superior à soma de suas partes. Tal artifício retórico dota a ideia de “nação” como um espírito coletivo o qual os seus representantes estariam fazendo jus. Vejam a ideia de Rousseau expressa Constituição Francesa de 1791 (pós Revolução de 1789 - grande marco de queda do Antigo Regime do Estado Moderno), identificando a nação como o povo em sua totalidade: “a soberania é una, indivisível, inalienável e imprescritível. Pertence à nação; nenhuma seção do povo, nenhum indivíduo pode atribuir-se-lhe o exercício”. Podemos encontrar esses conceitos refletindo doutrinas jurídicas, tais como a de Ruy Barbosa que desde à sua época defendia a normatividade da Constituição como o respeito ao pacto político que ela representa, pois para ele: 45 CPF Não há, numa Constituição, cláusulas a que se deva atribuir meramente o valor moral de conselhos, avisos ou lições. Todas têm força imperativa de regras, ditadas pela soberania nacional ou popular aos seus órgãos. (Ruy Barbosa - Obras Completas de Rui Barbosa. V. 42, t. 1, 1915. p. 170) 7. Regime, formas e sistemas de governo. “Para começo de conversa” vamos classificar o Brasil nessas categorias que o item do edital apontou para não corrermos o risco de errarmos com isso. → Classificação do Brasil: Democracia, Republica, Presidencialista, Estado Federado ou Federação centrípeta. Sobre regimes de governo. Os regimes de governo também conhecidos como regimes políticos podem ser descritos como a forma de se reger uma nação, guarda relação com a maneira como o poder é distribuído, de maneira que se é entre todos chamamos Democracia e se de um ou de poucos (lembrem de regime militar) dá-se o nome de Autocracia (autoritarismo ou totalitarismo). 46 CPF Nestesentido, trata-se de um complexo estrutural de princípios e forças políticas que configuram determinada concepção do Estado e da sociedade, influenciando no respectivo ordenamento jurídico. Diz-se que a definição do regime de governo está relacionada ao equilíbrio entre duas forças fundamentais relacionadas ao poder do estado, seu aparato coercitivo e consentimento, remontando ao tópico sobre a legitimidade do poder político, bem como do poder do estado. Sobre os regimes autocráticos. O Totalitarismo significa “tudo ao Estado”. Na literatura mais tradicional os mais conhecidos são o Nazismo e o Fascismo, o que prevalece é a ideia de que O Estado se sobrepuja aos indivíduos. Suas principais características são 1) Forma autoritária de governo; 2) controle totalitário da vida privada; 3) partido único fascista que auxilia neste controle; e 4) discriminação arbitrária contra classes, grupos sociais, indivíduos, inclusive no acesso as funções burocráticas no corpo do Estado, o que gera ao final a substituição das classes dominantes tradicionais por novos estratos que governam sem a restrição dos valores da tradição. 47 CPF O Autoritarismo é um conceito brasileiro. Criado para falar dos “regimes nacionais autoritários” (relacionados ao período Vargas principalmente), pois segundo os autores que os estudavam haviam grandes mentes que pensavam o estado brasileiro à época defensores dessa prevalência do Estado sobre a sociedade em moldes bem específicos (que, principalmente, não se igualavam aos regimes nazifascistas). Para constar, importantes autores, como Azevedo Amaral em “O Estado autoritário e a realidade nacional” e Karl Lowenstein em “O Brasil sob Vargas”, diferenciam ainda fascismo, totalitarismo e autoritarismo. Sobre a diferença entre regimes e formas de governo. Dalmo de Abreu Dallari formas de governo e regimes políticos são expressões sinônimas, sendo este um ponto de divergência entre os autores. A melhor maneira de diferenciar para nossa prova é entender regime de governo como a maneira como efetivamente o governo é realizado, se de maneira concentrada (autocrática) ou de maneira distribuída (democrática), ao passo que as formas de governo devem ser entendidas a partir do reconhecimento oficial e legítimo do poder (monarquia, aristocracia, democracia). 48 CPF Uma dica: em geral os regimes de governo/políticos autocráticos, embora sejam autoritários retoricamente eles reivindicam estar exercendo o poder em nome do povo (estado novo getulista, ditadura militar, nazismo) ao passo que nas formas de governo o titular do poder soberano é reconhecidamente o rei (monarquia), ou um grupo (aristocracia). Sobre a evolução do debate sobre as formas de governo. As formas de governo estão relacionadas a titularidade do poder soberano. A sua primeira classificação foi proposta por Aristóteles, que dividiu em três possibilidades: 1) Monarquia: governo de um só, havendo uma hierarquia onde o ocupante do poder soberano tem predomínio permanente sobre os governados. 2) Aristocracia: governo de alguns, aqueles considerados os “melhores” (os mais inteligentes, os mais preparados), que diz respeito à capacidade intelectual e prática para a condução dos assuntos do Estado. Pode ser dizer que Platão seria um defensor de um governo aristocrático já que ele sustentava um governo onde “os sábios fossem reis”. 49 CPF 3) Democracia: governo da maioria, onde predomina os ideais de liberdade e igualdade, já que devido a essa configuração de exercício de poder, há um rodízio de ocupantes das posições decisórias do Estado. Vale lembrar que para Aristóteles esse critério de explicação não é qualitativo, uma vez que ele presume que todas essas formas de governo são “puras” no sentido de que visam o bem comum no momento em que passam priorizar seus negócios pessoais em detrimento contra o interesse do coletivo, passam as formas de governo impuras, a saber: 1) Tirania: é a conversão da monarquia desvirtuada para o interesse único e exclusivo do soberano. 2) Plutocracia ou oligarquia: é a conversão da aristocracia corrupta que se move no primeiro caso em interesse do dinheiro e no segundo de vantagens a um pequeno grupo (chamamos o período republicano brasileiro pré-Vargas de oligárquico pelo domínio dos coronéis locais sobre as ações políticas do estado). 3) Demagogia: é a conversão da democracia que destituída torna-se rude e despótica. 50 CPF Pode-se acrescer a classificação de Aristóteles o chamado governo misto, que é nada mais, nada menos do que a mistura dos critérios, sendo um exemplo antigo a respublica romana que a um só tempo tinha um imperador, um senado aristocrático e uma “câmara democrática” e um exemplo contemporâneo a Inglaterra que ainda é monarquia. A modernidade política, como já citamos, inaugura- se com Maquiavel e este identifica apenas duas formas de exercício do poder soberano (duas formas de governo, portanto) de maneira que a classificação das formas de governo para ele são: república (poder plural) e monarquia (poder singular) de modo que a primeira englobaria democracia e aristocracia. Na mesma linha de pensamento para Montesquieu (1689-1755) as formas de governo são: monarquia, república e despotismo (em “O Espírito das Leis”). Sendo o despotismo para ele o governo cuja natureza funda-se na ignorância ou na transgressão da lei e tem por princípio o medo no qual a relação entre governantes e governados são regidas por temor recíproco, onde há governo que teme o povo, há governo despótico. Sobre os sistemas de governo. Esses estão relacionados a organização interna do Estado, mais especificamente com o modo como interagem o 51 CPF Poder Executivo e o Poder Legislativo, já pressupondo a divisão de poderes de Montesquieu, em suas funções governamentais. São eles: O Presidencialismo e o Parlamentarismo. No presidencialismo, surgido com a independência estadunidense, é onde o princípio da separação de poderes ocorre de maneira mais clara, o governante, em regra, é eleito diretamente pelo povo/nação motivo pelo qual não precisa prestar contas políticas ao Congresso, podendo exercer todos os atos puramente de execução, e ainda o chefe do estado e o chefe de governo são a mesma pessoa, o presidente. Outras características “secundárias que em geral se verificam em regimes presidencialistas são: a) o poder de veto do presidente; b) o prazo determinado do mandato. Por sua vez, o Parlamentarismo é identificado, tido como um processo histórico de conformação do Estado, tendo como exemplo mais conhecido a Inglaterra, caracteriza-se por ter uma distinção entre o chefe de estado e o chefe de governo (chefe de estado é o monarca ao passo que o chefe de governo é escolhido pelo parlamento, esse escolhido pelo povo), a consequência disso neste caso o chefe de governo responde politicamente ao congresso, já que foi este que o colocou por lá – isto é um argumento para sustentar que não há separação de poderes clássica nesse 52 CPF sistema – e em geral não possui mandato determinado, sendo retirado do cargo ou por perda da maioria no congresso ou pelo voto de desconfiança. Sobre as formas de Estado. Definimos acima os conceitos que estão no item do edital, não obstante a forma de organização política do Estado também pode aparecer no certame, de modo que o poder político pode ser dividido entre "estados" (outros entes federados como é no nosso caso com os municípios) – estado federado ou federação - ou ser concentrado num único ente – estado unitário. Uma questão ilustrativa desse ponto do edital, embora da FFC, é a seguinte: [FCC/SEFAZ-SP/ Analista em Planejamento, Orçamentoe Finanças Públicas/2010] Enunciado - Considere: I. O Brasil é uma República, adotada desde 15 de novembro de 1889, consagrada na Constituição de 1891, e em todas as constituições subsequentes. II. O Brasil é uma federação composta pela União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios. 53 CPF Essas afirmações dizem respeito, técnica e respectivamente, às formas de a) regime político e governo. b) estado e de governo. c) governo e de estado. [GABARITO]. d) separação de poderes e de governo. e) estado e de regime político. 7.1 As origens da ordem política. ATENÇÃO! Esse é o único tema incluído no certame de 2017, e como é habitual no nosso conjunto de disciplinas, vários conceitos que poderiam ser abordados neste tópico já foram tratados em outro momento, vamos delinear uma ideia do que é ordem política e resgatar os conceitos e autores que podem ser abordados. Modernamente, muitas vezes a discussão a respeito do que seria o Direito, a Política e o Estado são de tal maneira implicadas que se confundem e parece ser impossível explicar sem mencionar o outro, dividem-se as teorias em propor ideias em torno das quais o Estado teria criado o Direito ou este é anterior a ele, em verdade originando-o. A questão é que no 54 CPF fundo deste debate está uma ideia de que há uma ordem política. Assim, com Nelson Saldanha, podemos compreender a ordem política como lugar genérico da vida pública, a ordem das coisas que não se acham no espaço privado e que incluem normas, valores e instituições. Isto é a ordem política. É a *politicidade* como dimensão da vida social significando a relação concreta com a dimensão pública do viver. Nesse sentido, como vimos, embora historicamente outras referências possam ser buscadas em geral é a polis grega que é atribuída o embrião dessa discussão, com Aristóteles que defendia que a política deveria estudar a polis (cidade-estado grega) – em todas as suas dimensões e “instituições”, devendo o governo preocupar-se com o bem- estar geral. Ressaltando, novamente com Nelson Saldanha, que a própria imagem moderna que se faz da polis é do lugar de integração de todas as dimensões da vida: familiar, religiosa, econômica e jurídica. Neste sentido, direito e estado podem estar contidos na noção de política (tudo aquilo referente a polis: estilo, instituições, valores). Além de Aristóteles, Sócrates Platão e Políbio (que pensou forma de 55 CPF governo dividia a fim de alcançar estabilidade) também são dignos de menção5. Seguindo-se temos os romanos que, incorporando várias concepções gregas acerca da vida pública, acrescem as ideias de res publica e civitas (da coisa do povo que é de todos e da cidadania, respectivamente). A este período sucede a era medieval que, diante da preponderante influência da Igreja nas relações sociais, é caracterizado por um grande eticismo teológico, ou seja, uma forte presença das questões morais ligadas a questões religiosas na condução das relações em sociedade. Sobre este período e as importantes concepções a respeito da política podemos mencionar os mais conhecidos São Tomás de Aquino, Santo Agostinho, e os menos “populares” Guilherme de Ockham e Marcílio de Pádua6. Marcante foi, portanto, a contribuição de Nicolau Maquiavel que ao tratar da política sem eticismo (sem discutir as ações do soberano/príncipe de um ponto de vista ético- moral) e sem teologia, produziu uma concepção sobre a ordem política baseada na descrição de como elas eram e preocupados com o governo, proteção do território, 5Para inventariar os autores mais importantes, além das provas de concurso, sigo a orientação contida em Curso de Ciência Política (organizado por Lier Pires de Almeida, Ricardo Guanabara, Vladimyr Lombardo da editora Campus/Elsevier), o qual recomendo por inteiro, especialmente para este tópico do edital o capítulo 1 que cuida mais atentamente desses pensadores antigos e medievais. 6Idem. 56 CPF comparando com outras experiências históricas. Em contraposição, pode-se mencionar a obra de Thomas More, Utopia, na qual ele descreve um “lugar perfeito” onde existe tolerância, os governantes zelam pelo bem do povo, existe igualdade e liberdade, prevalece sempre a paz. Segundo Nelson Saldanha, pode se entender que esses dois autores deram origem as duas grandes correntes do pensamento político moderno (ou melhor: as duas formas básicas de se pensar a política), de um lado Maquiavel inspirando um realismo preocupado com as razões do estado e de outro Thomas More com uma utopismo humanitário (que depois deram origem aos socialistas, chamados em seguida por Marx de “socialistas utópicos” ao passo que denominou sua própria teoria de socialismo científico – aqui a referência diz respeito aos fundamentos históricos, econômicos e sócias que o autor usou para criar seus conceitos). Após o autor de “O Príncipe”, podemos mencionar Jean Bodin (1530-1596) conhecido por conceituar a soberania, sendo de extrema importância, em termos de ciência política, para as noções de obrigação política e centralização do poder. Soberania para ele seria o “poder perpétuo e absoluto de uma República”. O “justo governo de várias famílias e do que lhes é comum, com poder soberano”, por sua vez, seria a 57 CPF definição de República. Então, a soberania também se expressaria no tempo na forma de uma monarquia hereditária. Preocupado com os diversos conflitos de seu tempo (religiosos, políticos e sociais), mas avido perseguidor de atitudes que considerava anticristãs. Sustentava que o poder soberano é ilimitado em relação as leis civis, mas é limitado em relação ao direito natural. A lei civil, portanto, deve ser inspirada na lei divina que é imutável e eterna, o soberano é, nesses termos, um súdito de Deus. Embora sustentasse que o soberano tem o poder de legislar sem os consentimentos dos súditos, ele também deveria atuar visando um bem comum, demonstrando com isso sua inspiração aristotélica. O autor francês escreveu “Método para a fácil compreensão da história” (1566), “Os seis livros da República” (1576) e “Disposição do direito universal” (1578), sustentando, entre outras coisas, que dentre as dimensões normativas da sociedade, a lei civil (existe ainda a lei moral e a familiar), a qual regula as relações entre várias famílias, seria a mais importante (ou seja, ideia que dará azo noção de prevalência normas de ordem pública, interesse público, etc.). 58 CPF Sobre os contratualistas (Hobbes, Locke e Rousseau) Sobre o que os contratualistas tem em comum, vejamos essa questão CESPE: [CESPE/ANTT/ Analista Administrativo/2013] Enunciado: Com relação ao Estado e sua evolução histórica, julgue o item seguinte. Segundo a perspectiva do contratualismo clássico, o contrato é a base da relação jurídica facultada aos membros que dele pactuam e por meio do qual se institui o Estado de natureza. [Gabarito: ERRADO, o contrato social não institui o estado de natureza, ele institui o Estado] Vamos a Hobbes que expressou sua preocupação com o que ele chamou de “guerra de todos contra todos” e com um homem que é “lobo do homem” não podemos esquecer que ele estava escrevendo numa Inglaterra no século XVII em plena guerra civil, isto é, seu pensamento está orientado em como governar para “estabilizar o caos” e garantir ao menos a vida das pessoas (segurança). 59 CPF Neste sentido, o “homem natural” ou do “estado de natureza” que Hobbes descreve não é um selvagem, e sim o mesmo que vive em sociedade. Nas palavras de Renato Janine Ribeiro: a natureza do homem que vive em sociedadenão muda conforme o tempo, ou a história, ou a vida social. [Para] Hobbes, como para a maior parte dos autores de antes do século XVIII, não existe história entendida como transformando os homens. Estes não mudam [em essência] (Os clássicos da Política, vol. 1) Assim, os homens naturalmente livres são tão iguais que nenhum tem plena certeza de que poderá triunfar ou sucumbir [não há “ordem social” ou ela é muito frágil num contexto de guerra civil, sobre quem manda, obedece, ganha, perde] perante o outro. Se não há, pois, um Estado controlando e reprimindo essas atitudes a atitude mais racional que os sujeitos podem adotar é precavidamente “atacar” o outro. Logo, a igualdade é um problema para Hobbes. Em linhas gerais o mesmo conceito pode ser aplicado a liberdade, para ele “liberdade é ausência de oposição” ou não ser impedido de fazer o que tem vontade de fazer. Isto é, ele trata a liberdade com algo quase físico e 60 CPF não como um valor como nós do século XX, desde a revolução francesa, aprendemos a entende-la. Assim, o “contrato social” [que é uma abstração explicativa, sempre é bom lembrar] em Hobbes fala que o indivíduo para proteger a própria vida renunciou ao seu direito de natureza – que é o fundamento jurídico da guerra generalizada de todos contra todos - dando poderes ao soberano para instaurar a paz, dar-lhe segurança. (dar condições de proteger sua própria vida, este o talvez o único direito natural reconhecido pelo autor Hobbes). Novamente nas palavras de Renato Janine Ribeiro: “Para montar o poder absoluto, Hobbes concebe um contrato diferente, sui generis. Observemos que o soberano não assina o contrato – este é firmado apenas pelos que vão se tornar seus súditos, não pelo beneficiário. Por uma razão simples: no momento do contrato não existe ainda soberano, que só surge devido ao contrato. Disso resulta que ele se conserva fora dos compromissos e isento de qualquer obrigação [esse pensamento servirá a fundamentar o absolutismo e para alguns 61 CPF autores a própria ideia de positivismo jurídico que seria o absolutismo do Estado] Cuidado! Outros contratualistas tratarão a igualdade e a liberdade como valores a serem protegidos o que pode confundir na hora da prova. Se de um lado, os escritos hobbesianos servem ao interesse do monarca absolutista, a “origem da ordem política” sugerida por Locke é interessante à classe burguesa em ascensão, dando origem ao pensamento liberal clássico. Assim, justamente em contraposição ao absolutismo na Inglaterra, para Locke definitivamente a liberdade é um valor, um dos direitos naturais do homem, junto com a vida e a propriedade privada, esta por sua vez é adquirida pelo trabalho, mas também pode ser protegida pelo contrato, isto é, o contrato é o instrumento por meio do qual é possível que um homem trabalhe para outro (e na sua propriedade) sem adquirir propriedade com relação as suas coisas. Vamos comentar algumas questões CESPE sobre a temática do ponto para articular os autores Hobbes e Locke e verificarmos qual é a tendência de cobrança. [CESPE/DPU/Defensor Público/2010] Enunciado: 62 CPF De acordo com a teoria política de John Locke, a propriedade já existe no estado de natureza e, sendo instituição anterior à sociedade, é direito natural do indivíduo, não podendo ser violado pelo Estado. [Gabarito: CERTO] Os pontos da questão que merecem destaque são: 1) Teoria Política de Locke (identificação do autor que já sabemos é pensador liberal clássico alinhado aos pensamentos da burguesia); 2) A propriedade já existe no estado de natureza (é um direito natural, portanto), sendo anterior a sociedade (esta firma-se quando os indivíduos livres fazem um contrato social, entregando uma parcela de sua liberdade ao Estado com finalidade de proteger esses direitos naturais; 3) De modo que o Estado em Locke deve ter poderes limitados, devendo ser consentido (vem aqui uma ideia de legitimidade) e regulado pelos indivíduos que são parte no contrato. Para Locke a supremacia em termos práticos é do parlamento que representa a vontade do povo. [CESPE -ANTT - Analista Administrativo 2013] Enunciado: Acerca de cidadania e de direitos humanos, julgue o item que se segue. 63 CPF Da perspectiva liberal, a legitimidade do Estado depende de sua capacidade de defender a prioridade dos direitos humanos, os quais estabelecem limites à vontade soberana do legislador político. [Gabarito: CERTO, vejam que aqui seria anacrônico falar que Locke dizia algo em termos de direitos humanos, mas se substituirmos direitos por direitos fundamentais seria preciso mencionar o autor. Destarte, esta perspectiva demonstra a herança do pensamento Lockiano nas culturas liberais até os dias atuais]. Nesse mesmo certame: [CESPE/ANTT/Analista Administrativo/2013] Enunciado: Com relação ao Estado e sua evolução histórica, julgue o item seguinte. A visão de Estado, no pensamento político de Locke, consiste na tríade que se estrutura, conforme o estado de natureza, passando pela constituição de sociedade civil, fundada no pacto ou contrato social e desemboca no Estado Absolutista. 64 CPF [Gabarito: ERRADO, pois Locke não defendia o Estado Absolutista, de maneira que a sociedade civil desemboca na Monarquia Parlamentarista] Nosso último autor é Rousseau (1712-1778), lembrando que já conversamos sobre ele no item 6.3 (soberania) onde vimos que ele defendia da ideia da soberania verdadeiramente popular, sustentando que noção de representação contrário logicamente o exercício do poder pelo povo, sendo suas ideias muito importantes para a Revolução Francesa (1789) e para “evolução” do direito ao sufrágio universal, motivo pelo qual também veremos no ponto 8 que para ele a democracia grega, em verdade era uma aristocracia democrática. Assim, como já comentamos, os contratualistas tem em comum a noção de um estado de natureza e de um contrato social, formando o Estado. Se Hobbes é associado ao Estado absolutista e Locke ao parlamento, Rousseau é a democracia. Na questão do estado de natureza Rousseau se aproxima de Locke, de modo que este considerava que o homem é bom em natureza (“o bom selvagem”), sendo corrompido pela sociedade, a qual é uma iniciativa 65 CPF empreendida pelos ricos para manter seus inimigos sob seu olhar, simulando a igualdade. Assim, para este, a passagem do estado de natureza ao Estado deve se dar como expressão da vontade geral de converter seus direitos naturais em direitos civis, de modo que na apreciação do sentido da propriedade ele se aproxima mais de Hobbes considerando-a um direito civil (e não um direito natural), e ainda geradora da desigualdade. Por fim cabe mencionar que Rousseau escreveu um importante livro sobre “pedagogia” chamado Emílio (ou “Da Educação”) sendo a educação parte integrante de suas ideias, pois para ele é por meio dela que os indivíduos se fazem iguais, sendo papel do Estado reduzir a desigualdade visando manter o interesse geral. 8. Democracia. Inicialmente, a democracia antiga tinha como traço fundamental a capacidade social de votar e ser votado. Essa é a noção elementar a partir do qual se constitui o que atualmente chamamos de cidadania. Consoante as instruções dos tópicos anteriores, a democracia é uma forma de governo que se baseia na vontade da maioria (é o “governo de todos” ou o “governo da maioria”), o que nem sempre significou a maioria no sentido quantitativo, mas aquele grupo ou camada social que estava autorizado a votar 66 CPF e ser votado. Na Grécia antiga, os demos, que eram as divisões setoriais votantes compostas por homens gregos após atingirem a
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