Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
TÓPICOS EM LIBRAS: SURDEZ E INCLUSÃO. AULA 01 -Diferença, inclusão e identidade na sociedade contemporânea. Começando a trabalhar Que tal começarmos esta disciplina já com uma parte prática? Muitas vezes os ouvintes acreditam que as palavras em LIBRAS são construídas letra a letra, mas isso não é bem verdade. Entretanto, para muitas palavras, especialmente nomes de pessoas e lugares, as letras do alfabeto compõem uma palavra da mesma maneira como ocorre em qualquer língua. Datilologia (alfanumérico) No vídeo ao lado, você assiste a um surdo sinalizando as letras do alfabeto manual da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Ao final, ele também irá sinalizar os números de 0 a 9. Aproveite para rever quantas vezes quiser, pois esse é o seu primeiro contato para pessoas ouvintes compreenderem o “bê-a-bá” da realidade sinalizante. Entendendo o cenário Faremos, nesta primeira aula, algumas considerações sobre inclusão, identidade e diferença, principalmente no âmbito dos estudos sobre surdez e língua de sinais. - Educação e sociedade: pode-se verificar ao longo da história, uma série de equívocos como considerar a pessoa surda um "deficiente mental" (em sentido pejorativo), obrigá-la a métodos educativos que visavam apagar as diferenças entre surdos e ouvintes (impondo assim, a língua e cultura oral), etc. - A surdez é considerada uma necessidade educativa especial. - Atualmente há uma obrigação do cumprimento das recentes políticas linguísticas e educacionais que visam a divulgação da Libras, da "cultura surda" e da implementação de estratégias para a inclusão da pessoa surda na sociedade. - LEI Nº 10.436: Lei de Libras, de 24/04/2002. --> DECRETO Nº 5.626: Decreto que a regulamenta, de 22/12/2005. - O termo "surdo-mudo" é errado: os surdos têm, salvo exceção, o aparelho fonador preservado; se aparentemente não falam, isso se deve a dificuldades impostas pela memória auditiva e pela não percepção do som que emitem. A crise de identidade Vamos começar, então, refletindo um pouco sobre a sociedade contemporânea e suas “novas” formas de relacionamento, construção de identidade e preservação da cultura; em especial, as influenciadas pela chamada globalização. Para tal, é necessário que se investiguem as relações entre língua, cultura e sociedade. A sociedade contemporânea reivindica uma revisão das próprias formas de se pensar a linguagem e o papel e lugar da(s) ciência(s) e política(s) que a tomam como objeto. Nesse sentido, a sociedade é convocada a enfrentar as constantes incompletudes, provocadas por um mundo globalizado, onde o global e o local se interpenetram, e as diferenças não se encaixam na “completude” (Bauman, 2005). Mundo moderno, comunicação e identidade As novas formas de relacionamento (através da internet, chat, etc.) e o intercâmbio cultural são significativamente mais velozes e dinâmicos que no passado. Além da internet, o celular é hoje um aparelho quase que indispensável à sobrevivência na sociedade urbana. Este aspecto atinge inclusive as pessoas surdas, cujo uso do celular é bastante freqüente, tendo tornado-se um excelente meio de comunicação para esse grupo social. Além disso, a própria disciplina que você está fazendo neste exato momento faz parte da evolução tecnológica que permite a comunicação a qualquer hora e em qualquer lugar, como você pode observar no vídeo ao lado. Através dessas novas relações, o local e o global passaram a se interpenetrar constantemente, dificultando sua identificação e tornando incoerente um conceito de identidade (linguística e cultural) que seja o mesmo para qualquer indivíduo; em outras palavras, uma identidade que não seja fluida, que seja comum a todos. Mas será que somos iguais? Atualmente, a sociedade experimenta certa insatisfação em relação às promessas da modernidade, entre elas, a de igualdade, de liberdade, de paz, etc. Tais promessas não foram cumpridas, o que tem colocado em evidência a fragilidade do mundo moderno e da contemporaneidade. Língua e identidade para os surdos Esse fenômeno da crise de identidade pode ser observado em vários setores da sociedade. Em relação aos surdos e às comunidades sinalizantes não é diferente. Após vários anos de total exclusão, e sub-julgamento a padrões culturais inerentes a uma vida tipicamente ouvinte, os surdos – conduzidos pelas pesquisas na área da linguística, da educação e outras – puderam reconhecer-se como seres dotados de uma língua. Suas comunidades linguísticas apresentam peculiaridades culturais a elas inerentes. Os surdos passam então a afirmar suas identidades com base, principalmente, em características linguísticas e culturais. Devido aos longos anos de uma experiência não favorável ao seu reconhecimento, foi necessária a criação de associações diversas, a produção de discurso de defesa e luta, entre outros, que garantissem esse espaço na sociedade. A exacerbação da liberdade da criação da identidade levou a conquistas, mas também a equívocos prejudiciais: - preconceito X preconceito: muitos surdos passaram a negar veementemente a possibilidade de aprendizado da língua portuguesa, uma vez que para muitos, isso significaria uma perda de sua "identidade surda". - ouvinte X surdo: não deve haver a subordinação entre ouvinte e surdo; não há uma comunidade melhor ou superior à outra. - surdez e língua portuguesa: é bom que o surdo autorize a si mesmo a escrever em português, sem medo de perder sua identidade. O surdo tem capacidade para aprender a língua portuguesa. - o surdo e a relação familiar: a maioria dos surdos possue uma família de ouvintes; não se pode propor que os surdos ignorem a existência de suas bases familiares, sejam elas quais forem. Surdez e identidade A identidade do surdo deve ser construída com base em suas capacidades, em suas peculiaridades linguístico-culturais. Por isso, alguns estudiosos referem-se aos surdos como sujeitos sinalizantes, usuários de Libras. A questão das identidades se faz, portanto, presente e não pode ser dissociada das experiências da sociedade contemporânea que vive o conflito inerente à fluidez dessas identidades. Atenção! Não podemos esquecer que cada surdo tem uma história de vida, que nem todos os surdos dominam a língua de sinais; alguns são oralizados e têm orgulho disso. Isso nos faz refletir sobre o que é ser diferente, e se há alguma coisa chamada “diferença”. AULA 02 - Especificidades da língua de sinais e os parâmetros que regem a formação de sinais e o uso da libras. O que você entende por gramática? Quando relembramos nossos tempos de colégio, nos vêm à mente as aulas de língua portuguesa e as “chatices” (pelo menos para a maioria) das regras gramaticais. Colocação pronominal, predicativo do sujeito, oração subordinada substantiva objetiva direta etc. Isso porque entendemos (ou nos foi assim ensinado) que a gramática reduz-se à idéia de “um livro em que se expõem as normas de uso de uma determinada língua”. Mas não é bem assim... Explicação Expandida. Sem maiores aprofundamentos, podemos entender gramática no contexto da capacidade linguística: todo ser humano é dotado de capacidade linguística. Em segundo lugar, há que se pensar em gramática como um sistema, mentalmente compartilhado entre os usuários de uma língua, cujo funcionamento e estrutura não dependem de uma educação formal para serem aprendidos. Isto equivale a dizer, por exemplo, que qualquer falante, mesmo alguém considerado analfabeto, possui uma gramática (um conjunto de regras em sua mente), a qual aprendeu no convívio com a sua comunidade linguística. E a língua de sinais? A língua de sinais, a exemplo de qualquer língua oral, tem uma gramática própria, constituída por um conjunto de regras presente na mente dos seus usuários.Poderemos ter a tendência a acreditar que a língua de sinais seja uma espécie de “língua oral sinalizada”. Em consequência disso, acabaremos acreditando que o léxico (dicionário mental), os aspectos sintáticos, semânticos, pragmáticos e quirológicos da LIBRAS constituem um emaranhado de sinais, aleatoriamente utilizados, que mais pareceriam uma língua oral mal falada. Atenção! Por isso, podemos afirmar que os surdos, como qualquer ouvinte, possuem uma língua, na medida em que, dotados desta capacidade linguística, decodificam logicamente o mundo, organizando-o em suas mentes, através dos recursos físicos e mentais dos quais dispõem. Assim, sua capacidade lingüística exterioriza-se, formando uma língua específica que, ao invés de sinais orais e auditivos, usa sinais espaciais e visuais, valendo-se do pleno funcionamento de sua visão, de suas mãos e do restante do corpo como um todo. Basta aprender os sinais que já estamos nos comunicando? Na LIBRAS, os níveis de descrição da língua são os já conhecidos sintático, semântico, pragmático. Em função da língua de sinais usar as mãos como principal canal de manifestação é o nível quirológico que diz respeito justamente ao aspecto manual em si. Atenção! A língua de sinais não é uma língua universal, conforme muitos pensam. Cada país tem a sua própria língua de sinais. Além disso, há variações regionais dentro de cada país. Assim, podemos citar: a ASL (American Sign Language), a LSF (língua de sinais francesa), a Língua de Sinais Urubu Kaapor (Maranhão, Brasil) etc. Começando a começar... Uma boa descrição da língua de sinais não pode ser feita, naturalmente, a partir da mesma lógica utilizada para a descrição de línguas orais. Afinal, a modalidade lingüística é totalmente diferente. No entanto, existem parâmetros que regem o uso da língua de sinais. Costuma-se apresentar cinco parâmetros que possibilitam entender a formação dos sinais e as bases para os seus usos durante a produção discursiva. Vamos conhecer esses parâmetros? Assim, percebeu-se que um sinal é produzido a partir da combinação de elementos espaciais, visuais e motores que determinam o lugar onde as mãos devem estar na hora da produção do sinal, como as mãos devem estar configuradas, para que direção elas devem estar apontando, se devem ou não estar se movimentando e como deve ser feito este movimento. Além disso, é preciso considerar a posição do corpo e a expressão facial que acompanham a produção desse sinal para que ele seja plenamente entendido em seu contexto de produção. Combinações que constituem os parâmetros da LIBRAS. - Expressão facial e/ou corporal: alguns sinais só podem ser diferenciados a partir da observação da expressão facial que acompanha a sua produção de acordo com o contexto discursivo. Ex.: algumas palavras e expressões podem ser parecidas ou iguais, como "triste" e "por exemplo". - Configuração das mãos: "formato" das mãos no momento da produção de sinais. Além do alfabeto manual, há mais de 40 "formatos" das mãos em LIBRAS. - Ponto de articulação: para o sinal ser compreendido, além da correta configuração das mãos, é preciso que ele seja feito no adequado ponto do espaço em relação ao corpo. Algumas palavras podem ter a mesma configuração e movimento, mas serem articuladas em pontos diferentes em relação ao corpo. - Movimento: pode haver um movimento específico ou nenhum tipo de movimento; podendo estabelecer diferenças semânticas e/ou gramaticais. É um parâmetro muito complexo. - Orientação: determinada direção para onde as palmas das mãos estão voltadas no momento da comunicação. Determina o uso sintático/semântico de alguns verbos. - Comentários: é necessário o desenvolvimento de habilidades para atingir fluência na língua de sinais, como: ampliação e intensificação quanto à consciência corporal. - Informação Linguística (IL): algumas palavras podem ser sinalizadas de forma diferente, dependendo de alguns aspectos (como a pessoa que sinaliza, por exemplo). É o caso da palavra MÃE que, se sinalizada por uma criança, terá um sinal; se sinalizada por um adulto, será outro. AULA 03 - Políticas linguísticas e educacionais. Inclusão ou preconceito? Parece oportuno pensar em que medida políticas (educacionais, linguísticas...), no afã de defender minorias linguísticas e preservar a língua, podem ser transformar em práticas sutis de preconceito. Afinal, políticas linguísticas e políticas de línguas, expressas em leis, projetos de lei e outros tipos documentos oficiais, refletem contextos sócio-históricos e servem não apenas como dado, mas também como pano de fundo para uma discussão sobre o preconceito no contexto brasileiro. Não é raro detectar, tanto nos discursos sobre o direito à diferença quanto naqueles que procuram proteger grupos sociais, atitudes preconceituosas e certa crença de estarem os seus propositores investidos de autoridade suficiente para avaliar o grau e intensidade do problema do outro. Uma atitude que implicitamente reforça aquelas idéias contra as quais o próprio grupo parece lutar. Perspectivas de política lingüística na sociedade Essas são questões que auxiliam a estudar políticas lingüísticas sob o ponto de vista das relações entre sujeito e sociedade na pós-modernidade. Daí, uma discussão sobre a dimensão ética das políticas. É preciso perceber que as políticas também nomeiam e categorizam indivíduos a partir de determinado ponto de vista. Pretende-se, na perspectiva das políticas linguísticas, uma ética que ultrapasse a idéia humanitária dos direitos humanos e dos direitos linguísticos e que permita superar o dualismo do sujeito-ético como vítima e sujeito ético como piedoso (cf. Chauí, 1999). Em outras palavras, a proposição de políticas linguísticas será eticamente efetiva se acompanhada de ações propositivas em torno do sujeito e da sociedade. Se, ao contrário, decorrer tão somente de consenso sobre a injustiça e preconceito, poderá representar apenas uma forma de “acalmar a consciência”. Muito mais uma forma de “redimir-se de pecados”, de autopunição do que de construir e de viver uma sociedade justa. Perspectivas de política lingüística na educação Em termos da atuação pedagógica, é bom pensar sobre a necessidade de se estabelecer um olhar sobre os aprendizes que ultrapasse qualquer tipo de hierarquização. Interessa reconhecer a existência de alunos, pesquisadores, sujeitos que não podem se eximir nem serem eximidos de suas responsabilidades, nem privados de seus direitos. Nesse sentido, deixa-se de lado a lógica de “atendimento ao aluno” e se passa à lógica e à dinâmica de extração e ampliação de suas potencialidades. Nesse contexto não existiria “o surdo”, “o deficiente”. O problema está em não nos deixarmos levar uma identificação do sujeito feita a partir de uma “deficiência”. Seria negar a surdez enquanto único fator preponderante para identificar um sujeito. O sujeito surdo não é constituído única e exclusivamente de sua surdez, enquanto fato físico. Há milhões de outras facetas nesse sujeito para as quais frequentemente não se busca olhar. AULA 04 – Cultura em comunidades sinalizantes. Cultura surda? A sociedade passou a ser apresentada, e continua paulatinamente a ser, à língua, aos hábitos, às diferenças e semelhanças com os ouvintes, às necessidades (educativas) especiais dos sujeitos surdos. Aqueles sujeitos que até então eram vistos como deficientes auditivos limitados em suas capacidades, passam a ser reconhecidos como sujeitos (surdos) complexos, com identidade própria e com um conjunto de hábitos, transmitidos principalmente através da sua língua, ao qual tem se convencionado chamar de “cultura surda”. Embora bastante recorrente, o termo “cultura surda” ainda é alvo de muita polêmica. Para além da dificuldade habitual de se definir o que é ou nãoé cultura, os sujeitos surdos estão, quer queiram ou não, inseridos em uma comunidade ouvinte e convivem com esses ouvintes, trocando experiências diariamente. Não há um país, estado, cidade ou mesmo bairro de surdos. O que se pode encontrar com facilidade são associações e instituições que constituem uma espécie de reduto das ditas “comunidades surdas”, embora essas comunidades não estejam restritas a esses ambientes, suas atividades e formas de interação. Cultura a partir da relação familiar Os sujeitos surdos são, em sua grande maioria, filhos de pais ouvintes. Situação que provoca, por maior a rejeição que tenha sofrido da família ou a falta de conhecimento sobre língua de sinais e surdez, algum tipo de interação com o que é conhecido como “cultura ouvinte”. Há também os casos em que pais surdos têm filhos ouvintes, o que pode provocar um redimensionamento de condutas e valores não no sentido de abandonar ou renegar a “cultura surda”, mas de estabelecer novas relações e interesses em relação à “cultura ouvinte”. Podem ser identificadas também famílias em que pais surdos têm filhos surdos e todos no núcleo daquela família são usuários e dominam LIBRAS como sendo sua língua materna. Percebe-se mesmo diferença no desempenho linguístico desses surdos, pois não sofreram tanta influência da língua oral (portuguesa) no processo de aquisição da língua de sinais. Vale lembrar que muitos surdos não têm acesso às associações de surdos nem mesmo à língua de sinais e ainda aprenderam a língua de sinais com o apoio da língua portuguesa escrita ou oral. Ensinar Libras ou ensinar a falar? Muitos surdos são oralizados. Em função do método educativo utilizado durante a sua formação (durante muitos anos optou-se pelo chamado Oralismo nas escolas especializadas), alguns surdos simplesmente não compartilham os mesmos hábitos dos surdos que dominam a língua de sinais. Tome nota! Sua identidade é construída a partir de outra realidade lingüística e cultural e, por vezes, podem chegar mesmo a sofrer certa discriminação dentro das ditas “comunidades surdas”. Para ampliar os conhecimentos a esse respeito, é interessante fazer a leitura do Manifesto dos Surdos Oralizados. Cultura surda ou cultura dos surdos? O termo "cultura surda" não possui uma definição exata, pela diversidade existente entre os surdos e outros fatores, é causa de polêmica. Pode haver até mesmo a diferença entre "cultura surda" e "cultura dos surdos". CULTURA SURDA - surge de maneira mais ou menos involuntária, apoiada pelas escolas especializadas da atualidade, mas que ultrapassam o espaço físico, abrangendo o social e imaginário, uma vez que se solidificou a partir da noção de LIBRAS (como língua igual à outra qualquer). CULTURA DOS SURDOS - surge como tendo sido criada pelas antigas instituições dos surdos que os isolavam e tentavam promover uma "higienização social". LIBRAS E OUTRAS LÍNGUAS DE SINAIS - no Brasil existem surdos que têm como língua materna outra língua de sinais, não a LIBRAS. SUJEITO SINALIZANTE (OU SINALIZANTE) - todos os que dominam a língua de sinais e sejam seus usuários assíduos. Colocando-se no lugar do outro... Bem da verdade, os sujeitos surdos sinalizantes possuem suas próprias estratégias de compartilhar hábitos, valores, a língua e suas variações em ambientes de todos os tipos, inclusive aqueles que seriam pensados como exclusivamente de ouvintes por pessoas que não têm conhecimento da “cultura surda”. A cultura surda no cotidiano Já pensou em como é a casa de uma pessoa surda? O que ela precisa fazer para saber se alguém está tocando a campainha da casa? E se o telefone estiver tocando? Será que surdos possuem um telefone? Será que dá para usar um despertador para não perder a hora para o trabalho? Quais as diferenças mais marcantes entre a “cultura surda” e a “cultura ouvinte”? O que seria considerado “falta de educação” para um também o seria para outro? AULA 05 - Aspectos sociolinguísticos da língua de sinais. Língua e linguagem. Antes mesmo de falarmos pela primeira vez já possuímos, portanto, um sistema mental através do qual estruturamos nosso pensamento, nosso conhecimento de mundo. Dessa forma, cada povo desenvolve uma língua específica possibilitada pelas infinitas combinações permitidas pelas regras desse sistema inato. Isso quer dizer que se uma criança nasce no Japão, a faculdade de aprender japonês é a mesma de uma criança que nasce no Brasil. Apenas cada criança irá desenvolver a língua específica do meio em que vive. Tome nota! Se buscarmos perguntar às pessoas mais próximas o que elas entendem por língua, poderemos encontrar uma variedade de respostas que apontam para visões diferenciadas de língua. Cientificamente, também diversas relações são estabelecidas. Língua e sociedade. Podemos, por isso, estabelecer várias perspectivas para descrever a linguagem que privilegiam alguns de seus aspectos, suas formas de manifestação etc. Podemos, por exemplo, pensar na língua como um meio de comunicação, como uma estrutura, como um valor social, entre outras formas. Explicação expandida. Nesta aula, ressaltamos os aspectos sociolinguísticos das línguas de sinais. Em outras palavras, fazemos referência às relações entre linguagem e sociedade que podem nos ajudar a entender as línguas (de sinais) como valores, produtos de um determinado grupo. Essas possíveis relações nos permitem levantar algumas questões. Aspectos sociolinguísticos. - VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: existe a variação histórica (palavras que ao longo do tempo mudam em sua forma escrita, por exemplo, como a antiga "pharmácia"), a variação regional, entre outros. A LIBRAS não é universal e nem homogênea, sendo assim existem manifestações diversas de acordo com a região, idade, sexo, tempo, status social e estilo. -> Apresenta variações como as outras línguas. - PADRONIZAÇÃO: toda a língua passa por um processo de padronização que diz respeito à escolha de uma das suas manifestações dialetais como sendo a representante de todas as outras formas. Isso se dá a partir de critérios sociopolíticos, econômicos e culturais. Esse processo é facilitado por instrumentos como dicionários, gramáticas, livros, etc. Por ex.: a variação da linguagem usada nos jornais, a linguagem formal. - FAMÍLIAS DE LÍNGUAS: existem vários tipos de línguas de sinais que apresentam semelhança entre si; a LIBRAS e derivada em parte da língua de sinais francesa. OBS.: a LIBRAS não é uma pura gestualização da língua portuguesa. - USUÁRIOS E MINORIAS LINGUÍSTICAS: Se considerarmos a modalidade linguística, a quantidade, os lugares, associações onde se reúnem etc. teremos uma comunidade linguística específica. Assim, dadas as relações estabelecidas com a maioria ouvinte, estas comunidades podem ser entendidas como uma minoria linguística. AULA 06: Algumas categorias gramaticais da libras: pronomes, advérbios, adjetivos. O sistema pronominal O sistema pronominal da língua brasileira de sinais, a exemplo do português, é formado por três pessoas do discurso. Dependendo da configuração de mãos utilizada e de direção para qual aponta no espaço, as pessoas do discurso podem ser especificadas. Podem aparecer tanto no singular quanto no plural. Pessoa do discurso Singular Plural Primeira pessoa Eu Nós Segunda pessoa Tu / Você Vós / Vocês Terceira pessoa Ele(a) Eles(as) Observação: Lembre-se que pessoa do discurso refere-se à forma pronominal cuja função é a de indicar: a) aquele que fala (emissor); b) para quem fala (destinatário); c) de quem se fala (não faz parte da interlocução). O sistema pronominal em LIBRAS: pronomes pessoais Em LIBRAS, o sujeito da ação pode apontar alternadamente para o interlocutor e para si próprio, mãos formando o número dois,para significar “nós dois”. Da mesma forma, pode-se especificar tanto a primeira quanto a segunda e terceiras pessoas em três pessoas, quatro pessoas, plural, etc. Nas frases em LIBRAS o sujeito pode ser omitido (no caso da primeira e da segunda pessoa) desde que o contexto possibilite identificá-lo. No caso da terceira pessoa, essa não será apontada se, mesmo estando presente, não for intenção de o usuário ressaltar a sua presença por motivos culturais como, por exemplo, isso ser ou não falta de educação. O sistema pronominal em LIBRAS: pronomes demonstrativos e advérbios de lugar Em termos de sinais utilizados, essas duas categorias não apresentam diferença, sendo possível diferenciá-las apenas a partir do contexto. As relações estabelecidas são as mesmas da norma padrão encontrada em boa parte das línguas orais, a saber: este/isto/aqui, esse/isso/aí, aquele/aquilo/lá. O sistema pronominal em LIBRAS: pronomes interrogativos Os pronomes como QUE e QUEM (que + pessoa ou quem) são utilizados no início ou final da frase, dependendo do contexto. QUANDO pode ser especificado em relação ao passado ou ao futuro, dependendo da direção do movimento da mão. O sistema pronominal em LIBRAS: pronomes possessivos Os possessivos não apresentam concordância de número (pelo menos não em relação ao objeto) e nem de gênero. Concordam sempre em relação à pessoa do discurso. Advérbios de tempo São utilizados como uma espécie de marca sintática para indicar o tempo verbal na frase. Em geral, ficam no início da frase. Adjetivos Não há concordância em relação ao gênero ou ao número. São fundamentais para a formação de classificadores descritivos, assumindo de maneira icônica a qualidade/forma de um objeto. São posicionados na frase logo após o substantivo. AULA 7: Princípios de estruturação de uma sentença em LIBRAS. Introdução. Muitas pessoas usam a voz para trabalhar, como a locutora do vídeo acima, mas o conhecimento gramatical é indispensável, mesmo para quem só usa a voz. Nesta aula, vamos estudar a construção de sentenças em LIBRAS. Você verá que as frases podem seguir ou não a ordem sujeito- verbo-objeto, usada na construção de frases em língua portuguesa. Quando as sentenças não são construídas pela construção SVO, elas obedecem a uma lógica não-linear. Ao longo desta aula, explicaremos melhor esse tema e veremos alguns recursos de construção de frases em LIBRAS. Estrutura de Sentenças. Para estudar a construção de frases em LIBRAS, é preciso pensar que esta linguagem se estrutura a partir de recursos espaciais e visuais, ou seja, se utiliza do espaço para dar coerência e coesão as palavras que formam a sentença. Em Libras, encontramos quatro tipos de frases: • Afirmativa • Negativa • Interrogativa • Exclamativa Entendendo o que é ordem na frase. As frases na língua portuguesa seguem a ordem SVO (sujeito-verbo-objeto). Em Libras, no entanto, as sentenças nem sempre seguem essa ordem, pois não seguem necessariamente uma sequência linear de idéias. Vejamos. Frase: “Todo professor brasileiro fala português”. Todo professor – Sujeito. Fala – verbo. Português – objeto. A frase acima segue o padrão SVO. Teoricamente, toda frase pronunciada por um falante tende a estra nessa ordem, ainda que ela possa estar invertida como “Um carro eu comprei ontem”. Nesse caso, temos uma organização tópico-comentário. A organização tópico-comentário é recorrente em LIBRAS. Ela consiste em colocar o tópico no início da frase, seguido de comentário. A frase “O macaco gosta de comer banana” em LIBRAS fica “Comer banana macaco gosta”, alterando a ordem SVO. É importante lembrar que a ordem SVO também é usada na LIBRAS. Esta ordem pode ser vista, sobretudo, quando são utilizados verbos com flexão, ou seja, aqueles que o uso revela facilmente o sujeito, como, por exemplo, os verbos perguntar e ajudar. Leitura Referências bibliográficas desta aula: BRITO, L. F. Por uma gramática da língua de sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1995. QUADROS, Ronice Müller & KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de sinais brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre: Artmed, 2004. AULA 8: Categorias gramaticais da libras: verbos e classificadores. Introdução. A comunicação vai muito além das palavras. Ela também é feita de expressões faciais e linguagem corporal, por exemplo. Até mesmo os pinguins têm mecanismos para se comunicarem, como pode ser visto no vídeo. Existem inúmeras semelhanças entre a linguagem oral, que usamos no dia a dia, e a linguagem de LIBRAS. No entanto, elas não são iguais. Nesta aula, vamos ver as principais diferenças entre estas duas formas de comunicação e expressão. Além disso, vamos aprender um pouco da estrutura verbal em LIBRAS. Veremos ainda como os classificadores e as expressões faciais complementam a comunicação na linguagem das LIBRAS. Estrutura de sentenças. Em LIBRAS, encontramos categorias gramaticais que também estão presentes nas línguas orais. Sendo assim, na língua dos sinais, encontraremos itens lexicais que podem ser classificados como verbo, advérbio, adjetivo e pronome. A categoria artigo, no entanto, recorrente em inúmeras línguas orais, não existe em LIBRAS. Embora o conceito atribuído às categorias gramaticais de LIBRAS seja semelhante ao das línguas orais, suas formas de classificação e de funcionamento são diferentes. Portanto, a LIBRAS não pode ser estudada tendo como base a Língua Portuguesa, já que sua gramática é independente da língua oral. A ordem dos sinais na construção de uma frase em LIBRAS obedece a regras próprias, que refletem a forma de o surdo processar suas idéias tendo como parâmetro a sua percepção visual-espacial da realidade. Tanto em LIBRAS quanto nas línguas orais, a ideia de verbo como ação pode ser mantida, assim como a de que é possível encontrar verbos que exigem ou não determinado tipo de concordância. Existem duas classificações: Direcionais – Verbos que tem concordância. A direção do movimento marca no ponto inicial o sujeito e no final o objeto. Não direcionais – Verbos que não tem concordância. Para estes existem duas subclasses: - Ancorados no corpo: são verbos que exigem proximidade em relação ao corpo. Os que melhor representam são os de estado cognitivo ou emotivo. A saber: gostar, odiar, pegar, falar. - Verbos que incorporam o objeto. Nestes alguns parâmetros se modificam para especificar as informações. A importância dos classificadores para a comunicação em LIBRAS. Definição dos classificadores – Um classificador é uma forma que estabelece um tipo de concordância em uma língua. Na LIBRAS, os classificadores são formas representadas por configurações de mão que, substituindo o nome que as precedem, podem vir junto aos verbos de movimento e de localização para classificar o sujeito ou o objeto que está ligado á ação do verbo. Classificadores como ícones – Em LIBRAS, são marcadores de concordância de gênero para pessoas, animais ou coisas. Eles são muito importantes, já que ajudam a construir a estrutura sintática por meio de recursos corporais. Muitos classificadores são icônicos. Às vezes, eles se referem ao objeto ou ser como um todo. Em outras, se referem somente a uma parte ou característica do ser. AULA 9: Compreensão de diálogos. Introdução. No vídeo, você assistiu a um caso em que uma pessoa surda salva a vida de uma que pode escutar (o ouvinte, no momento em que vai atravessar a rua, não ouve a buzina do carro por estar ouvindo uma música alta em seu ipod). A mensagem que o vídeo quer passar é: “não é porque uma pessoa não pode escutar que ela não enxerga”. Tal mensagem nos faz pensar que, muitas vezes, quando pensamos em deficientes auditivos, associamos sua imagem a pessoas limitadas, incapazes de realizar ações que nós ouvintesrealizamos. Eliminar o preconceito e entender que estas pessoas são capazes de viver em sociedade ainda é um longo caminho a percorrer. Que tal começar entendendo um pouco mais sobre sua forma de se comunicar? Veja os diálogos desta aula e teste a sua compreensão! AULA 10: Literatura em língua de sinais. Introdução. Pare para pensar. Você consegue se lembrar de manifestações artísticas, literárias e culturais produzidas especialmente para deficientes auditivos? Se a sua resposta for não, não se assuste. Apesar de existirem, elas são poucas. Assim como são raras as produções culturais feitas por deficientes auditivos. O vídeo que você assistiu traz um exemplo de uma apresentação feita por dançarinos que não podem ouvir (apresentação de um grupo chinês denominado Disabled People’s Performance Art Troupe, Alemanha, 2008). Ainda há um grande caminho a percorrer para que estas manifestações ganhem visibilidade na sociedade. Apesar disso, as novas tecnologias estão, cada vez mais, ajudando na propagação destas iniciativas artísticas. Vamos ver mais? Por que quase não existem manifestações artísticas para surdos? Isso se deve ao fato de a moiria das ações culturais ser baseada na oralidade, na fala. Um exemplo importante de iniciativa para aumentar a inclusão cultural deste nicho às manifestações artísticas é a Companhia de Teatro Mãos Livres, que luta para que as barreiras de comunicação sejam minimizadas através de espetáculos produzidos tanto para surdos como para a sociedade ouvinte. A Companhia de Teatro Mãos Livres surgiu em 2005, a partir de uma prática pedagógica desenvolvida dentro das salas de aula de escolas públicas regulares e especializadas cuja metodologia está fundamentada no aprendizado e desenvolvimento integral dos alunos surdos. Esta forma de ensino tem sua didática baseada nas linguagens artísticas como a música, o teatro e a dança, que funcionam como estímulos às relações interculturais. As novas tecnologias para surdos. As novas tecnologias permitiram que a informação fosse propagada de forma melhor e mais veloz. As comunidades surdas também se beneficiaram com as novas tecnologias. Além de recursos que ajudam a comunicação deste público com a sociedade ouvinte, as novas tecnologias também possibilitaram que produções de arte e literatura fossem acessadas por este nicho da sociedade. Veja um trecho de matéria de jornal sobre o assunto: “A invenção foi testada com sucesso em um bebê portador de deficiência. Ele recebeu o chip aos quatro meses de idade e depois de um ano e meio começou a ouvir e articular palavras. O instituto de Fisiologia Pavlov, em Moscou, anunciou a criação de um chip capaz de fazer com que surdos ouçam sons e aprendam a falar. Implantável no ouvido, ele tem um microgerador, um amplificador de impulsos elétricos e um microfone sem fios que pode dividir o sinal auditivo em frequências para posterior identificação. A invenção foi testada com sucesso em um bebê portador da deficiência. Ele recebeu o chip aos quatro meses de idade e depois de um ano e meio começou a ouvir e articular palavras. “O chip pode ser utilizado com eficácia para obter coordenação de movimentos em crianças com paralisia cerebral e outras doenças graves”, disse o diretor do projeto Yakov Altman.” Um ponto a ser pensado é até aonde as novas tecnologias irão ajudar a aumentar a inclusão de surdos na sociedade.
Compartilhar