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1) As Cidades e os Espaços Urbanos -Anthony Giddens

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Capítulo 18: As Cidades e os Espaços Urbanos 
As áreas residenciais que circundam Greenwich Vil-
lage no coração de Nova Iorque atingem alguns dos 
valores mais elevados em todos os Estados Unidos. 
As casas mais próximas são vendidas acima do 
milhão de dólares, enquanto os condomínios mais 
pequenos podem atingir o dobro daquele valor. 
O rendimento médio dos agregados familiares na 
região é superior a 65.000 dólares por ano. É um bair-
ro conhecido pela riqueza das suas ofertas culturais, 
incluindo lojas de livros em segunda mão, cafés, 
galerias de arte e teatros. Greenwich Village é, desde 
há muito, o 'bairro boémio* de Nova Iorque - o lar de 
gerações de intelectuais, artistas e escritores. Os seus 
habitantes pertencem predominantemente à classe 
média alta, aos empregados do sector terciário e aos 
estudantes. 
Contudo, existe um outro lado de Greenwich Vil-
lage. As ruas do bairro agitam-se e murmuram com 
uma actividade que está longe da afluência acima 
descrita. Pedintes, traficantes de drogas, vendedores 
de rua e sem-abrigo também fizeram de Greenwich 
Village a sua residência. Ao longo das últimas déca-
das, as pessoas das zonas de grande pobreza acharam 
que o 'passeio1 - a designação americana para 'pavi-
mento' - pode oferecer oportunidades para se viver. 
A vibrante vida de rua, o fluxo constante de pedestres 
e a mistura da riqueza e da pobreza formam um 
mosaico caótico no qual os nova-iorquinos margina-
lizados se podem integrar. Segundo o sociólogo Mit* 
chell Duneier, é um bairro que 'se oferece aos ricos e 
aos sem-abrigo, aos doutorados e aos que não têm 
escolarização, no mesmo passeio e ao mesmo tempo* 
(Duneier, 1999). 
Duneier estudou a vida dos passeios de Greenwich 
Village estudando a vida dos pobres, predominante-
mente homens negros, que ali trabalham e vivem (ver 
capítulo 20, 'Métodos de Investigação em Sociolo-
gia' , p. 654). Durante um período de 5 anos observou 
- e participou - a vida económica informal dos pas-
seios. Trabalhou ao lado de vendedores de revistas e 
livros, os Varredores de rua* que encontram merca-
doria no lixo e que a vendem nas ruas, e ao lado 
dos pedintes que pedem ao lado das caixas de multi-
banco. Testemunhou o modo como o cumprimento 
da lei nova-iorquina atingia os homens do passeio 
através de campanhas de 'qualidade de vida1 que 
procuravam reduzir os sinais de desordem social. Em 
*Sidewalk\ Duneier descreve um quadro complexo 
de vidas marcadas pelo uso e pelo vício das drogas, 
alcoolismo, senvabrigo, deficiências, iliteracia, sen-
tenças de prisão e racismo pernicioso. Também des-
creve a poderosa comunidade que existe no passeio -
os sistemas informais de auto-ajuda, suporte mútuo, 
apoio e sobrevivência. 
O passeio de Greenwich Village é um microcosmo 
dos fortes contrastes e desigualdades que caracteri-
zam as grandes cidades do mundo. A globalização e a 
disseminação da tecnologia de informação estão a 
intensificar os processos de urbanização arrastando 
grande número de pessoas para as cidades e aí con-
centrando a economia. Hoje, mais do que nunca, as 
cidades tornaram-se no cruzamento de desconcertante 
ordem de culturas, línguas e origens. Uma nova elite 
internacional cruza continentes, ligando uma rede de 
'cidades globais1. Nestas cidades globais, crescem 
sedes de multinacionais, sobre os bairros empobreci-
dos; os super-ricos e os que não têm direitos civis são 
'utilizadores* das mesmas cidades, mas as suas reali-
dades quotidianas não poderiam ser mais diferentes. 
De quem são as cidades? Por um lado, existe a 
cidade como uma 'zona de glamour u r b a n o ' - u m cir-
cuito estonteante de restaurantes e hotéis, edifícios de 
escritórios, aeroportos e teatros, frequentados pelos 
arquitectos e pelos administradores da nova econo-
mia global. Com a disseminação da globalização, 
esta população de 'utilizadores das cidades' conti» 
nuará a crescer na periferia do crescimento económi-
co cujas reivindicações à cidade são também legíti-
mas, mas muitas vezes menos bem vindas. Os imi-
grantes, os pobres e os desfavorecidos são uma pre-
sença crescente nos centros urbanos do mundo. Mais 
do que nunca, as grandes cidades do mundo albergam 
tanto grandes concentrações de poder e riqueza como 
desconcertantes situações de desigualdade e pobreza. 
A justaposição de vidas e meios de vida é crescente-
mente visível nas cidades em todo o mundo. 
A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 5 7 3 
Neste capítulo investigaremos o processo de 
urbanização que esteve na origem - e continua a 
moldar - das cidades modernas. Discutiremos em 
primeiro lugar o grande crescimento em número dos 
habitantes das cidades que teve lugar no último sécu-
lo e consideraremos algumas das principais teorias do 
urbanismo que se desenvolveram para compreender 
este processo- Em seguida, passaremos a comparar 
diferentes padrões de urbanização no mundo, anali-
sando primeiro a urbanização do ocidente utilizando 
exemplos dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, 
para depois analisar a urbanização no mundo em 
desenvolvimento. De forma não surpreendente, a 
globalização tem tido um impacto enorme nas cida-
des e teremos em consideração algumas das dimen-
sões deste processo no final deste capítulo. 
Características do Urbanismo Moderno 
Todas a sociedades industriais modernas são forte-
mente urbanizadas. As cidades mais povoadas dos 
países industrializados chegam a atingir os vinte e 
cinco milhões de habitantes e as conurbações urba-
nas - conjuntos de cidades formando vastas áreas 
construídas - podem ter muitos mais. A forma mais 
extrema da estrutura urbana actual é representada 
pelo que se designou como megalópolis, a "cidade 
das cidades". O termo teve origem na Grécia Antiga 
para designar a cidade-estado planeada para ser a 
inveja de todas as civilizações, mas o seu uso corren-
te tem pouca relação com esse sonho. Foi usado pela 
primeira vez nos tempos modernos para designar a 
faixa marítima do nordeste dos Estados Unidos, uma 
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Megalópolrs, também conhecida como Nova Iorque 
A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 574 
conurbaçào com cerca de 450 milhas desde o norte de 
Boston ao sul de Washington D.C. Nesta região 
vivem cerca de 40 milhões de pessoas, o que repre-
senta uma densidade populacional de mais de 700 
pessoas por milha quadrada. 
A Grã-Bretanha, a primeira sociedade a conhecer 
a industrialização, foi também o primeiro país a pas-
sar da ruralidade para um estado predominantemente 
urbano. Em 1800, bem menos de 20 por cento da 
população vivia em cidades ou vilas com mais de 
10 000 habitantes. Por volta de 1900, este valor tinha 
atingido os 74 por cento. Em Londres, a capital, 
viviam cerca de 1.1 milhões de pessoas em 1800 e, 
no início do século X X , a sua população tinha 
aumentado para mais de 7 milhões de habitantes. 
Nessa altura, Londres era, de longe, a maior cidade 
que alguma vez havia existido no mundo, um enorme 
centro industrial, comercial e financeiro no coração 
do império britânico, então ainda em expansão. 
A urbanização da maioria dos outros países euro-
peus e dos Estados Unidos efectuou-se um pouco 
mais tarde - mas em certos casos, assim que come-
çou, desenvolveu-se ainda mais rapidamente. Em 
1800, os Estados Unidos eram uma sociedade mais 
rural do que os principais países europeus da época. 
Menos de 10 por cento da população vivia em comu-
nidades com mais de 2500 habitantes. Hoje, fazem-
-no mais de três quartos dos americanos. Entre 1800 
e 1900, a população de Nova Iorque saltou de 60 000 
pessoas para 4.8 milhões! 
A urbanização no século X X é um processo glo-
bal, para o qual os países em desenvolvimento são 
cada vez mais arrastados (ver fig. 18.1). Antes de 
1900, quase todo o crescimento urbano tinha lugar no 
Ocidente. Houve umacerta expansão das cidades do 
Terceiro Mundo nos cinquenta anos seguintes, mas o 
período principal do seu crescimento ocorreu nos 
últimos cinquenta anos ou coisa parecida. Entre 1960 
e 1992, o número de habitantes urbanos no mundo 
aumentou cerca de 1.4 bilhões. Prevê-se que cresça 
cerca de mais um bilião nos próximos 15 anos. 
As populações urbanas estão a crescer a um ritmo 
muito mais rápido do que a totalidade da população 
mundial: 39 por cento da população mundial vivia 
em zonas urbanas em 1975; de acordo com estimati-
vas das Nações Unidas, prevê-se que este número 
seja de 50 por cento no ano 2000 e de 63 por cento 
em 2025. O Este e o Sul da Ásia contarão com cerca 
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Flg. 18.1 Urbanização das regiões do mundo por graus de desenvolvimento, 1975-1995 e projecções para 2015. 
Fontes-. NU, World Uffeanization prospecte. 1998; The UNESCO Courier, Junho de 1999. 
A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 575 
de metade da população mundial em 2025 e, por essa 
altura, as populações urbanas da África e da América 
do Sul irão ultrapassar as da Europa. 
O desenvolvimento das cidades modernas 
A expansão das cidades é uma consequência do 
aumento da população, bem como da migração de pes-
soas das zonas rurais, aldeias e vilas. Esta migração 
tinha frequentemente um carácter internacional, com 
as pessoas das áreas rurais a mudarem-se para as cida-
des de outros países. A imigração de grande número de 
europeus provenientes de zonas rurais pobres para os 
Estados Unidos é o exemplo mais óbvio, mas a migra-
ção nacional para as cidades também se estendeu entre 
países da própria Europa. Os camponeses e aldeãos 
mudaram-se para as cidades (tal como hoje acontece 
de forma maciça nos países em desenvolvimento) 
devido à falta de oportunidades nas zonas rurais e às 
vantagens e atractivos aparentes das cidades, onde as 
ruas eram 'pavimentadas a ouro' (empregos, riqueza, 
um leque amplo de bens e serviços). Desta forma, as 
cidades tornaram-se centros onde se concentrava o 
poder industrial e financeiro e, por vezes, os empresá-
rios criavam cidades novas a partir do nada. 
O desenvolvimento das cidades modernas teve um 
impacto enorme não apenas nos hábitos e formas do 
comportamento, como também nos padrões de pen-
samento e dos sentimentos. Desde o início dos gran-
des aglomerados urbanos, no século X V I I I , tem-se 
verificado uma polarização das opiniões sobre os 
efeitos das cidades na vida social - o que ainda hoje 
acontece. Alguns encaravam as cidades como repre-
sentantes da "virtude civilizada', a fonte do dinamis-
mo e da criatividade cultural. Para estes autores, as 
cidades maximizam as oportunidades de desenvolvi-
mento cultural e económico e proporcionam uma 
existência confortável e agradável. Outros estigmati-
zaram a cidade como um inferno cheio de fumo e de 
multidões agressivas e desconfiadas, carregada de 
crimes, violência e corrupção. 
A medida que as cidades cresciam em tamanho, 
muitas pessoas ficavam horrorizadas ao ver que as 
desigualdades e a pobreza urbana se pareciam inten-
sificar na mesma proporção. A extensão da pobreza 
urbana e as grandes diferenças entre os bairros da 
cidade foram dos principais factores que estiveram na 
origem dos primeiros estudos sociológicos sobre a 
vida urbana. Não constituiu surpresa o facto de os 
primeiros estudos sociológicos de relevo e das teorias 
sobre as condições urbanas modernas terem surgido 
em Chicago, uma cidade marcada por um extraordi-
nário grau de desenvolvimento e por desigualdades 
muito pronunciadas, que viu a sua população crescer 
para mais de 2 milhões de habitantes em 1900, quan-
do era quase desabitada até aos anos 30 do século 
X I X . 
Teorias do Urbanismo 
A Escola de C h i c a g o 
Alguns escritores ligados à Universidade de Chicago, 
entre os anos 1920 e 1940, em especial Robert Park, 
Ernest Burgess e Louis Wirth, desenvolveram ideias 
que foram durante muitos anos a principal base da 
teoria e da pesquisa em Sociologia Urbana. Merecem 
atenção especial dois conceitos desenvolvidos pela 
"Escola de Chicago'. Um é a chamada abordagem 
ecológica à análise urbana, o outro, a caracterização 
do urbanismo como um modo de vida, desenvolvido 
por Wirth (Park, 1952; Wirth, 1938). 
A Ecologia Urbano 
Ecologia é um termo oriundo da Física, é o estudo da 
adaptação de organismos vegetais e animais ao seu 
meio-ambiente. É este o sentido em que a 'ecologia' 
é utilizada no contexto de problemas de ambiente em 
geral, vide capítulo 19, Crescimento populacional e 
crise ecológica'. Na natureza, os organismos tendem 
a distribuir-se de forma sistemática pelo terreno de 
forma a conseguir-se o equilíbrio entre diferentes 
espécies. A Escola de Chicago acreditava que a 
implantação dos principais sítios urbanos e a distri-
buição de diferentes tipos de bairro nos mesmos 
podiam ser entendidos segundo princípios semelhan-
tes. As cidades não crescem ao acaso, mas de acordo 
com as características do meio-ambiente. As grandes 
áreas urbanas das sociedades modernas, por exem-
plo, tendem a desenvolver-se ao longo dos leitos dos 
rios, em planícies férteis ou na intersecção de rotas 
comerciais ou de vias ferroviárias. 
Segundo Park, "assim que uma cidade se estabele-
ce (...) torna-se, ao que parece, um grande mecanis-
mo de selecção que (...) escolhe infalivelmente de 
A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 576 
entre toda a população os indivíduos mais bem pre-
parados para viver numa determinada região ou 
meio" (Park, 1952, p. 79). As cidades organizam-se 
em 'áreas naturais* por meio de processos de compe-
tição, invasão e sucessão * os quais têm lugar na 
ecologia biológica. Se repararmos na ecologia de um 
lago no seu estado natural, vemos que a competição 
entre as várias espécies de peixes, insectos e outros 
organismos se faz de forma a alcançar um equilíbrio 
estável entre eles. Este equilíbrio é perturbado quan-
do há uma invasão' de novas espécies, que tentam 
fazer do lago o seu lar. Alguns dos organismos que 
costumavam proliferar na área central do lago são 
afastados para as margens, onde levam uma existên-
cia precária. As espécies invasoras tomam o seu lugar 
na parte central do lago. 
Os padrões de localização, movimento e relocali-
zação nas cidades, de acordo com o ponto de vista 
ecológico, assumem formas idênticas. Desenvolvem-
-se bairros diferentes a partir dos ajustamentos feitos 
pelos habitantes, à medida que lutam pela vida. Uma 
cidade pode ser representada como um mapa de áreas 
com características sociais distintas e que contrastam 
entre si. Nas fases iniciais do crescimento das cidades 
modernas, as indústrias congregam-se em locais ade-
quados às matérias-primas de que necessitam, locais 
próximos das linhas de abastecimento. A população 
reúne-se em volta destes locais de trabalho, que, à 
medida que cresce a população da cidade, se tomam 
cada vez mais diversificados. Os equipamentos urba-
nos desenvolvem-se e estes locais tomam-se mais 
atractivos, havendo uma maior competição pela sua 
aquisição. O valor da terra e os impostos sobre a pro-
priedade aumentam, o que torna difícil para as famí-
lias continuar a viver na zona central, excepto em 
condições de superlotação ou em habitações deca-
dentes com rendas baixas. O centro fica dominado 
pelos negócios e por espaços de entretenimento, 
enquanto os habitantes mais prósperos mudam para 
bairros novos na periferia da cidade. Este processo 
segue as rotas dos transportes, pois estes minimizam 
o tempo gasto na deslocação para o trabalho. As áreas 
espalhadas entre esses percursos desenvolvem-se 
mais lentamente. 
Podemosencarar as cidades como sendo formadas 
por círculos concêntricos, divididos em segmentos. 
No interior ficam as áreas centrais, que misturam a 
prosperidade das grandes empresas com a decadência 
dos edifícios de habitação. Para lá destas ficam bair-
ros antigos, que alojam trabalhadores manuais com 
empregos estáveis. U m pouco mais longe ficam os 
subúrbios, onde tendem a residir os grupos com ren-
dimentos mais elevados. Há processos de invasão e 
sucessão dentro dos segmentos dos círculos concên-
tricos. Assim, à medida que se deterioram os edifícios 
na área central ou próximo do centro, os grupos étni-
cos minoritários poderão começar a ocupá-los. Quan-
do isto acontece, a população preexistente começa a 
mudar-se, precipitando uma deslocação em massa 
para outros bairros ou subúrbios da cidade. 
Embora durante algum tempo a abordagem da 
ecologia urbana tenha caído em desgraça, foi mais 
tarde retomada e desenvolvida por vários autores, em 
especial por Amos Hawley (Hawley, 1950, 1968). 
Em vez de concentrar a sua atenção na competição 
por recursos escassos, tal como o tinham feito os seus 
antecessores, Hawley salienta a interdependência das 
diferentes áreas da cidade. A diferenciação - a espe-
cialização dos grupos e dos papéis ocupacionais - é a 
forma principal pela qual os seres humanos se adap-
tam ao seu meio ambiente. Os grupos dos quais mui-
tos outros dependem terão um papel dominante que 
se reflecte frequentemente na sua posição geográfica 
central. Os grupos económicos, por exemplo, como 
os bancos e as companhias de seguros, fornecem ser-
viços-chave para a comunidade e, por conseguinte, 
localizam-se normalmente nos centros das cidades. 
Hawley sublinha que as zonas que se desenvolvem 
em áreas urbanas surgem não só de relações de espa-
ço, mas também de tempo. O predomínio das activi-
dades económicas, por exemplo, exprime-se não só 
nos padrões de utilização do solo, como no ritmo das 
actividades quotidianas, sendo a hora de ponta um 
bom exemplo disso. A ordenação do tempo no quoti-
diano das pessoas reflecte a hierarquia dos bairros da 
cidade. 
A abordagem ecológica revelou-se importante 
tanto pela quantidade de investigação empírica que 
fomentou, como pelo seu valor como perspectiva teó-
rica. Houve muitos estudos globais sobre cidades e 
sobre bairros específicos, que foram estimulados pelo 
pensamento ecológico, que se preocupava, por exem-
plo, com os processos de 'invasão* e de 'sucessão' 
acima mencionados. No entanto, podem-lhe ser feitas 
várias críticas com toda a justiça. A perspectiva eco-
lógica tende a desvalorizar a importância da acção e 
A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 5 7 7 
do planeamento consciente na organização da cidade, 
encarando o desenvolvimento urbano como um pro-
cesso 'natural1. Os modelos de organização espacial 
elaborados por Park, Burgess e os seus colegas foram 
retirados da experiência americana; além de só se 
revelarem adequados a alguns tipos de cidades ame-
ricanas, são desadequados em relação às cidades da 
Europa, do Japão ou do Terceiro Mundo. 
O urbanismo como um modo de vida 
A tese de Wirth sobre o urbanismo como modo de 
vida preocupa-se menos com a diferenciação interna 
das cidades do que com o urbanismo como forma de 
existência social Wirth observa: 
O grau em que podemos considerar o mundo contempo-
râneo como 'urbano' não depende inteira ou exactamen-
te da proporção da população total que vive nas cidades. 
A influência que as cidades exercem sobre a vida social 
humana é maior do que o rácio da população urbana 
indica, pois a cidade é não só o local de habitação e de 
trabalho do homem moderno, como constitui o centro 
de fomento e de controlo da vida económica, política e 
cultural que levou as comunidades mais remotas do 
mundo para a sua órbita e transformou num cosmos 
lugares, pessoas e actividades diversas. (Wirth, 1938, 
p- 342) . 
Nas cidades, salienta Wirth, um grande número de 
pessoas vivem muito próximas umas das outras, sem 
se conhecerem pessoalmente - um contraste funda-
mental com as pequenas aldeias tradicionais. A maior 
parte dos contactos entre os habitantes da cidade são 
passageiros e parciais, e constituem meios para se 
atingirem objectivos, em vez de serem intrinseca-
mente gratificantes. Os contactos com os empregados 
de balcão das lojas, caixas de banco, viajantes ou 
revisores dos transportes são encontros passageiros, 
que valem não por si, mas pelo f im que têm em vista. 
Dado a população das áreas urbanas tender a ter 
grande mobilidade, as relações pessoais são relativa-
mente fracas. As pessoas estão envolvidas em activi-
dades e situações diferentes todos os dias - o 'ritmo 
de vida* é mais acelerado do que nas áreas rurais. 
A competição prevalece sobre a cooperação. Wirth 
aceita que a densidade da vida social nas cidades dá 
origem à formação de bairros com características dis-
tintas, alguns dos quais preservam as características 
de pequenas comunidades. Nas áreas de imigrantes, 
por exemplo, encontram-se formas de relacionamen-
to tradicional entre as famílias, pois a maioria conhe-
ce-se numa base pessoal. Não obstante, quanto mais 
essas áreas são absorvidas pelos padrões da vida cita-
dina, mais desapareceram estas características. 
As ideias de Wirth gozaram, merecidamente, de 
vasta aprovação. O carácter impessoal de muitos con-
tactos diários nas cidades modernas é inegável - e, 
até certo ponto, o mesmo acontece com a vida social 
em geral nas sociedades modernas. A teoria de Wirth 
é importante, porque reconhece que o urbanismo não 
é apenas parte da sociedade, mas exprime e influen-
cia a natureza do sistema social mais global. Os 
aspectos do modo de vida urbano são característicos 
da vida social das sociedades modernas no seu con-
junto e não só das actividades dos habitantes das 
grandes cidades. Não obstante, as ideias de Wirth têm 
limitações assinaláveis. Tal como a perspectiva eco-
lógica, com a qual tem muito em comum, a teoria de 
Wirth baseia-se principalmente em observações fei-
tas em cidades americanas, mas que são generaliza-
das ao urbanismo em toda a parte. O urbanismo não 
é a mesma coisa em todos os tempos e lugares. Como 
foi mencionado, por exemplo, as cidades antigas 
eram, em muitos aspectos, bastante diferentes das 
cidades das sociedades modernas. A vida da maioria 
das pessoas nas cidades antigas não era muito mais 
anónima ou impessoal do que a das que vivem em 
comunidades rurais. 
Wirth também exagera o carácter impessoal das 
cidades modernas. As comunidades onde existem 
laços de amizade ou de parentesco são mais correntes 
nas colectividades urbanas modernas do que supôs. 
Everett Hughes, um colega de Wirth na Universidade 
de Chicago, escreveu sobre ele o seguinte: 'Louis 
costumava dizer todas essas coisas sobre o carácter 
impessoal das cidades - mas, no entanto, ele próprio 
vivia com um clã de parentes e amigos numa base 
muito pessoal' (citado em Kasarda e Janowitz, 1974). 
Os grupos, como aqueles a quem Herbert Gans 
chama 'aldeãos urbanos*, são comuns nas cidades 
modernas (Gans, 1962). Os seus 'aldeãos urbanos' 
são os americanos de origem italiana que vivem num 
bairro no centro de Boston. Estas áreas de 'etnia 
branca* estão provavelmente a tornar-se menos signi-
ficativas nas cidades americanas do que antigamente, 
mas estão a ser substituídas por comunidades de 
A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 578 
novos imigrantes que se estabelecem no centro das 
cidades. 
Mais importante ainda, os bairros que envolvem 
laços de parentesco próximo e laços pessoais pare-
cem ser criodos muitas vezes pela vida na cidade. 
Não são apenas vestígios de um modo de vida ante-
rior que sobreviveu durante algum tempo na cidade. 
Claude Fisher formulou uma interpretação para 
explicar porque é que o urbanismo emlarga escala 
tem tendência para promover subculturas diversas, 
em vez de aglutinar toda a gente numa massa anóni-
ma. Segundo ele, os que vivem nas cidades podem 
colaborar com outras pessoas de origens ou interesses 
semelhantes para desenvolverem relações locais. 
Além disso, podem juntar-se a grupos religiosos, 
étnicos e políticos distintos e a outros grupos subcul-
turais. Uma cidade pequena ou vila não permite o 
desenvolvimento de tal diversidade subcultural (Fis-
her, 1984). Aqueles que formam comunidades étnicas 
nas cidades, por exemplo, podiam conhecer-se pouco 
ou nada nas suas terras de origem. Quando chegam, 
são atraídos para áreas onde vivem outras pessoas 
com origens linguísticas e culturais semelhantes, e 
assim se formam novas estruturas subcomunitárias. 
U m artista pode encontrar poucos artistas a quem se 
associar numa aldeia ou vila, mas, numa grande cida-
de, pelo contrário, pode-se juntar a uma subcultura 
artística e intelectual significativa. 
Uma grande cidade é um 'mundo de estranhos', 
mas, no entanto, apoia e origina relações pessoais. 
Não se trata de um paradoxo. Temos de dividir a 
experiência urbana entre a esfera pública dos encon-
tros com estranhos e o mundo mais privado da famí-
lia, dos amigos e colegas de trabalho. Pode ser difícil 
'conhecer pessoas' para alguém que acabe de chegar 
a uma grande cidade. Mas quem quer que vá viver 
para uma comunidade rural pequena, estabelecida, 
sente que a simpatia dos habitantes é apenas uma 
forma de gentileza pública - e que pode levar anos a 
ser-se aceite" Isto não acontece nas cidades. Tal 
como Edward Krupat comentou: 
O ovo urbano ... tem uma casca difícil de quebrar. Sem 
oportunidade ou ocasião para tomar a iniciativa, muitas 
pessoas que se vêem todos os dias no autocarro ou na 
estação ferroviária, num café, ou nos corredores do tra-
balho nunca passam de 'estranhos familiares' . Algumas 
pessoas também permanecem totalmente afastadas das 
outras, por lhes faltarem aptidões para o convívio social 
ou por não terem iniciativa. Não obstante, a verdade é 
que, devido à diversidade dos estranhos - cada um é um 
amigo potenciai - e à variedade dos estilos de vida e 
interesses na cidade, as pessoas conseguem penetrar no 
grupo. E. uma vez dentro de um grupo ou organização, 
as possibilidades para expandir as suas relações muhi-
p l icam-se .Como resultado, tudo indica que as oportuni-
dades positivas das cidades parecem superar frequente-
mente as forças constrangedoras, permitindo que as pes-
soas desenvolvam e mantenham relacionamentos muito 
satisfatórios. (Krupat, 1985, p. 36). 
As ideias de Wirth ainda mantêm uma certa vali-
dade, mas à luz de contribuições posteriores percebe-
-se que é excessivamente generalizador. As cidades 
modernas implicam frequentemente relações sociais 
impessoais e anónimas, mas são também fonte de 
diversidade e, por vezes, de intimidade. 
O urbanismo e o ambiente criado 
As teorias do urbanismo mais recentes salientam que 
o urbanismo não é um processo autónomo e que deve 
ser analisado em conjunto com os principais padrões 
da mudança política e económica. Os dois principais 
autores sobre a análise urbana na actualidade, David 
Harvey e Manuel Castells, foram fortemente influen-
ciados por Marx (Harvey, 1973,1982,1985; Castells, 
1977,1983) . 
Harvey: A restruturação do espaço 
O Urbanismo, realça Harvey, é uma das características 
do meio ambiente criado que a expansão do capita-
lismo industrial produziu. Nas sociedades tradicionais, 
a cidade e o campo eram claramente diferenciados. No 
mundo moderno, a indústria toma pouco clara a divi-
são entre a cidade e o campo. A agricultura mecaniza-
sse e é dirigida simplesmente de acordo com conside-
rações de preço e de lucro, tal como a actividade indus-
trial, e este processo reduz as diferenças nos modos de 
vida social das populações urbanas e rurais. 
No urbanismo moderno, salienta Harvey, o espaço 
é permanentemente reestruturado. O processo é 
determinado pelo local onde as grandes empresas 
decidem construir as suas fábricas, centros de inves-
tigação e desenvolvimento e outros; pelo controlo 
dos governos sobre os terrenos e a produção indus-
A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 5 7 9 
trial, e pelas actividades dos investidores privados 
que compram e vendem casas e propriedades. As 
empresas, por exemplo, avaliam continuamente as 
vantagens relativas de novas localizações, comparan-
do-as com as existentes. À medida que a produção se 
toma mais barata numa dada área do que noutra, ou 
que a empresa muda de um produto para outro, os 
escritórios e as fábricas são encerrados num dado 
local e abertos noutro. Nesse sentido, a uma dada 
altura, quando estão em jogo lucros consideráveis, 
pode existir uma grande actividade de construção de 
edifícios de escritórios no centro das grandes cidades. 
Uma vez concluídos os edifícios, e 'reconstruída' e 
modernizada a área central, os investidores vão em 
busca de oportunidades para a construção especulati-
va de futuros edifícios noutros locais. Muitas vezes o 
que é lucrativo num certo período não o é noutro, 
quando se altera o clima financeiro. 
As actividades dos compradores particulares de 
habitações são fortemente influenciáveis pelos inves-
timentos comerciais, bem como pelos juros dos 
empréstimos e pelos impostos estipulados pelos 
governos centrais e locais. Após a segunda guerra 
mundial, por exemplo, deu-se uma enorme expansão 
dos subúrbios nas principais cidades dos Estados 
Unidos. Em parte, isto deveu-se à discriminação étni-
ca e à tendência da população branca para se deslocar 
para longe dos centros das cidades. Contudo, argu-
menta Harvey, isto só foi possível porque o Governo 
decidiu conceder benefícios fiscais aos compradores 
de casas e às empresas de construção, bem como pela 
concessão de créditos especiais por parte das organi-
zações financeiras. Estas medidas foram a base da 
construção e compra de edifícios para a habitação nas 
periferias das cidades e promoveram, simultanea-
mente, a procura de produtos industriais como, por 
exemplo, os automóveis. Desde a década de 60, o 
crescimento e a prosperidade das cidades do sul da 
Grã-Bretanha estão directamente relacionados com o 
declínio das velhas indústrias no norte e a subse-
quente transferência do investimento para novas 
oportunidades industriais. 
Castells: urbanismo e movimentos sociais 
Tal como Harvey, Castells salienta que a forma espa-
cial de uma sociedade está intimamente relacionada 
com os mecanismos gerais do seu desenvolvimento. 
Para entender as cidades, temos de perceber os pro-
cessos através dos quais as formas espaciais são cria-
das e transformadas. A disposição e as características 
arquitectónicas das cidades e dos arredores expri-
mem lutas e conflitos entre os diferentes grupos da 
sociedade. Por outras palavras, os ambientes urbanos 
representam manifestações simbólicas e espaciais de 
forças sociais mais vastas, Os ananha-céus, por exem-
plo, podem ser construídos com objectivos lucrati-
vos, mas os edifícios gigantescos também 'simboli-
zam a força do dinheiro na cidade por meio da tecno-
logia e da autoconfiança e são as catedrais do perío-
do de desenvolvimento do capitalismo empresarial* 
(Castells, 1983, p. 103). 
Por contraste com os sociólogos da Escola de Chi-
cago, Castells vê a cidade não só como uma localiza-
ção distinta - a área urbana mas como parte inte-
gral de processos de consumo colectivo, o qual é por 
sua vez, uma dimensão inerente ao capitalismo 
industrial. As casas, escolas, serviços de transportes e 
complexos recreativos são formas pelas quais as pes-
soas 'consomem' os produtos da indústria moderna. 
O sistema fiscal influencia quem consegue comprar 
ou alugar e onde, e quem constrói e onde. As grandes 
empresas, bancos e companhias de seguros,que for-
necem o capital para os projectos de construção 
detêm bastante poder sobre estes processos. Mas os 
organismos governamentais também afectam directa-
mente muitos aspectos da vida citadina, ao construí-
rem estradas e habitações públicas, ao projectarem 
espaços verdes, etc. O aspecto físico das cidades é, 
portanto, um produto tanto das forças de mercado 
como do poder do governo. 
No entanto, a natureza do ambiente criado não 
resulta apenas das actividades dos ricos e poderosos. 
Castells sublinha a importância das lutas dos grupos 
desprivilegiados para alterarem as suas condições de 
vida. Os problemas urbanos estimulam múltiplos 
movimentos sociais, que se preocupam com a melho-
ria das condições habitacionais, protestam contra a 
poluição atmosférica, defendem os parques e espaços 
verdes e combatem os projectos de construção que 
alteram o meio ambiente de uma dada área. Castells 
estudou, por exemplo, as actividades de grupos 
homossexuais de São Francisco, que conseguiram 
reestruturar os bairros de acordo com os seus próprios 
valores culturais - permitindo o crescimento de mui-
tas organizações, clubes e bares de homossexuais - e 
adquirir uma posição proeminente na política local. 
5 8 0 A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 
Castells e Harvey enfatizam o facto de as cidades 
serem, na sua quase totalidade, ambientes artificiais, 
construídos peias próprias pessoas. N e m mesmo a 
maioria das zonas rurais escapa à influência da inter-
venção humana e da tecnologia moderna, pois a acti-
vidade humana remodelou e reordenou o mundo da 
natureza. Os alimentos não são produzidos para os 
habitantes locais, mas para mercados nacionais e 
internacionais e na agricultura mecanizada a terra é 
rigorosamente subdividida, submetida a usos espe-
cializados e ordenada, de acordo com padrões físicos 
que pouco têm a ver com as características naturais 
do meio ambiente. Aqueles que vivem em proprieda-
des agrícolas e nas zonas rurais mais isoladas estão 
económica, política e culturalmente ligados à socie-
dade mais ampla, por muito diferentes que sejam os 
seus modos de comportamento em relação aos dos 
habitantes das cidades. 
Avaliação 
As visões de Harvey e Castells têm sido profusamen-
te debatidas e o seu trabalho foi importante para a 
reorientação da análise urbana. Ao contrário da abor-
dagem ecológica, Harvey e Castells não colocaram a 
ênfase nos processos espaciais 'naturais', mas na 
forma como a terra e o ambiente criado são um refle-
xo dos sistemas do podei social e económico. Trata-
-se de uma mudança significativa. Não obstante, as 
ideias de Harvey e Castells são frequentemente apre-
sentadas de forma bastante abstracta, e não estimula-
ram uma tão grande variedade de pesquisas como o 
trabalho efectuado pela Escola de Chicago. 
De certa forma, os pontos de vista apresentados 
por Harveys e Castells e pelos sociólogos da Escola 
de Chicago complementam-se com utilidade e 
podem ser combinados de forma a dar uma imagem 
global do processo urbano. De facto, os contrastes 
entre as áreas da cidade, descritos pela Ecologia 
Urbana, existem, assim como o carácter impessoal, 
próprio da vida nas cidades, em geral. Não obstante, 
estes contrastes são mais variáveis do que os mem-
bros da Escola de Chicago pensavam, e são determi-
nados, antes do mais, pelas influências sociais e 
económicas analisadas por Harvey e Castells. John 
Logan e Harvey Molocht sugeriram uma abordagem 
que relaciona directamente as perspectivas de autores 
como Harvey e Castells com certos aspectos da pers-
pectiva ecológica (Logan e Molotch, 1987). Logan e 
Molocht estão de acordo com Harvey e Castells 
quanto ao facto de as características gerais do desen-
volvimento económico, que se estendem nacional e 
internacionalmente, afectarem a vida urbana de 
forma bastante directa. Mas, em sua opinião, estes 
factores económicos de longo alcance são 'filtrados* 
pela acção das organizações locais, incluindo as acti-
vidades económicas do bairro, dos bancos e dos orga-
nismos governamentais, em conjunto com as activi-
dades dos compradores particulares de casas. 
Os locais - terrenos e edifícios - são comprados e 
vendidos, de acordo com Logan e Molocht, exacta-
mente como quaisquer outros produtos nas socieda-
des modernas, mas os mercados que estruturam o 
ambiente das cidades são influenciados pela forma 
como os diferentes grupos de pessoas desejam utilU 
zar as propriedades que compram e vendem. Surgem 
muitas tensões e conflitos na sequência deste proces-
so - e estes são os factores principais da reestrutura-
ção dos bairros citadinos. 
Para Logan e Molocht, as grandes empresas finan-
ceiras e comerciais nas cidades modernas tentam 
intensificar constantemente o uso da terra em áreas 
específicas. Quanto mais o podem fazer, maiores são 
as oportunidades de especulação e construção lucra-
tiva de novos edifícios. Estas empresas preocupam-se 
pouco com os efeitos sociais e físicos das suas activi-
dades num dado bairro - não têm em consideração, 
por exemplo, o facto de residências antigas e atraen-
tes serem demolidas para dar lugar a grandes edifí-
cios de escritórios. Os processos de crescimento 
fomentados pelas grandes empresas envolvidas no 
sector do imobiliário colidem frequentemente com os 
interesses dos negócios locais e dos residentes que 
podem tentar resistir. As pessoas organizam-se em 
grupos locais para defenderem os seus interesses de 
residentes. Tais associações podem defender o 
aumento das áreas protegidas, impedir a construção 
de novos edifícios em zonas verdes ou em parques, 
ou exercer pressão para serem publicadas leis de 
arrendamento mais favoráveis. 
Tendências no desenvolvimento 
urbano Ocidental 
Nesta secção iremos considerar alguns dos principais 
padrões no desenvolvimento urbano ocidental no 
581 AS C I D A D E S E O S E S P A Ç O S U R B A N O S 
pós-guerra, utilizando os exemplos da Grã-Bretanha 
e dos Estados-Unidos. A atenção concentrar-se-á no 
aparecimento dos subúrbios e no declínio dos centros 
das cidades, no conflito urbano, nas crises financeiras 
e nas estratégias destinadas à renovação urbana. 
A suburbanização 
Alguns convertidos à vida nas grandes cidades olha-
ram com desdém para a grande expansão dos subúr-
bios, com as suas vivendas semi-separadas e os jar-
dins bem arranjados cobrindo as zonas limítrofes das 
cidades inglesas. Outros, como o poeta John Betje-
man, celebraram a excentricidade modesta da arqui-
tectura dos subúrbios e o impulso para combinar as 
oportunidades de emprego da cidade como um modo 
de vida em termos práticos com a propriedade do 
emprego e do cano e em termos de valores como a 
vida familiar tradicional. 
Muitos subúrbios em torno de Londres cresceram 
entre as duas guerras e aglomeraram-se entre as 
novas estradas e ligações efectuadas pelo metropoli-
tano que podiam trazer os habitantes dos subúrbios 
até ao centro. Nos Estados Unidos, o processo da 
suburbanização atingiu o seu apogeu nos anos 50 e 
60. Durante esse período, as zonas centrais das cida-
des tiveram uma taxa de crescimento de 10 por cento, 
enquanto a das áreas suburbanas foi de 48 por cento. 
A maioria do fluxo em direcção aos subúrbios envol-
veu famílias brancas. A imposição da integração 
racial nas escolas pode ser visto como um factor 
importante na decisão do abandono dos centros das 
cidades. A mudança para os subúrbios foi uma opção 
atractiva para as famílias que preferiam que os seus 
filhos frequentassem escolas só para brancos. Ainda 
hoje, os subúrbios americanos continuam a ser pre-
dominantemente brancos. Os grupos minoritários 
constituíam apenas 18 por cento do total da popula-
ção suburbana em 1990. Três em quatro afro-ameri-
canos continuam a viver nos centros das cidades, em 
comparação com um em cada quatro dos brancos. 
Amaioria dos residentes suburbanos negros vive em 
bairros de maioria negra em cidades-satélite da 
metrópole. 
Contudo, a dominação dos brancos nos subúrbios 
está a desaparecer à medida que cada vez mais mem-
bros das minorias raciais e étnicas deixam o centro 
das cidades. Entre 1980 e 1990 a população suburba-
Os habitantes dos subúrbios de Paris fazem as suas via-
gens diárias de carro para dentro e para fora dos subúrbios. 
na negra cresceu cerca de 34,4 por cento, os latinos 
cerca de 69 3 por cento e os asiáticos 125,9 por cento. 
E m contrapartida, a população suburbana branca só 
cresceu 9,2 por cento. Os membros das minorias étni-
cas mudaram-se para os subúrbios pelas mesmas 
razoes daqueles que antes os precederam: melhores 
condições de habitabilidade, escolas e amenidades. 
Tal como as pessoas que iniciaram o êxodo para os 
subúrbios nos anos 50 são, na sua maioria, trabalha-
dores da classe média. De acordo com o Presidente 
da Autoridade para a Habitação de Chicago, 4 a subur-
banização já não está relacionada com factores de 
raça, mas de classe. Ninguém quer ter por perto gente 
pobre, por causa de todos os problemas que acompa-
nham os pobres: escolas pobres, ruas inseguras, ban-
dos' (citado em DeWitt , 1994). 
582 A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 
Na Grã-Bretanha, a deslocação da população resi-
dencial das áreas centrais da cidade para os subúrbios 
e cidades-dormitôrio (aglomerados situados fora dos 
limites da cidade, habitados principalmente por pes-
soas que nela trabalham) ou para as aldeias nos anos 
70 e início dos anos 80 significou que a população da 
grande Londres baixou cerca de meio milhão naque-
le período. Ao mesmo tempo, muitas cidades mais 
pequenas cresceram rapidamente - por exemplo, 
Cambridge, Ipswich, Norwich, Oxford e Leicester. 
Nas cidades industriais do Norte, a rápida perda da 
indústria também afectou os centros das cidades, 
enquanto a população dos subúrbios e das cidades 
mais pequenas - e a deslocação para sudeste - se 
expandiu novamente durante o boom económico do 
final dos anos 90. 
A decadência dos centros das cidades 
A 'debandada para os subúrbios' teve consequências 
dramáticas na saúde e vitalidade tanto dos centros 
urbanos britânicos, como americanos. A decadência 
dos centros urbanos que marcou todas as grandes 
cidades americanas nas últimas décadas é uma con-
sequência directa do crescimento dos subúrbios. 
A deslocação dos grupos mais prósperos para fora 
das cidades implica uma perda de receitas provenien-
tes dos impostos locais. Dado que os que permane-
cem, ou os substituem, incluem muitos dos que 
vivem na pobreza, há poucas hipóteses de substituir 
essa fonte de rendimentos perdida. Se se aumentam 
os impostos nos centros das cidades, os grupos mais 
prósperos e os negócios ainda terão uma maior ten-
dência para se mudar para mais longe. 
Esta situação toma-se mais grave à medida que os 
edifícios nos centros das cidades se deterioram mais 
do que os dos subúrbios, e que o índice de criminali-
dade e a taxa do desemprego aumentam. Torna-se 
necessário, por conseguinte, aumentar as despesas 
com a segurança social, as escolas e a manutenção 
dos edifícios, a polícia e os bombeiros. Desenvolve-
-se um ciclo de deterioração, no qual quanto mais os 
subúrbios se expandem, maiores são os problemas 
dos centros citadinos. Em muitas áreas urbanas ame-
ricanas, o efeito tem sido terrível - especialmente nas 
cidades mais antigas como Nova Iorque, Boston ou 
Washington. E m certos bairros destas cidades, a dete-
rioração da propriedade é provavelmente mais grave 
do que em qualquer dos maiores centros urbanos dos 
outros países do mundo industrializado. Edifícios de 
apartamentos decadentes e edifícios ocupados e 
incendiados alternam com áreas desertas cobertas de 
lixo. 
Na Grã-Bretanha, a decadência do centro das cida-
des foi menos marcada do que nos Estados Unidos. 
No entanto, alguns centros urbanos, como, por exem-
plo, Liverpool, estão tão delapidados como alguns 
bairros das cidades americanas. Uma das razões para 
que tal acontecesse é que a crise financeira afectou 
muitos centros das cidades na Grã-Bretanha. A partir 
de finais da década de 70, as autoridades locais foram 
fortemente pressionadas para limitar os seus orça-
mentos e reduzir os serviços locais mesmo nas áreas 
urbanas mais degradadas. As autoridades tocais que 
excedessem os orçamentos estabelecidos pelo gover-
no nacional podiam ser penalizadas. Isto deu origem 
a conflitos intensos entre o governo e uma série de 
conselhos metropolitanos responsáveis por centros 
de cidade problemáticos quando não conseguiam 
cumprir os níveis orçamentais estabelecidos. A intro-
dução da Poli Tax pelo governo da Mrs. Thatcher 
afectou ainda mais as finanças das autarquias. Ape-
sar da Poli Tax ter sido finalmente abandonada em 
virtude da forte oposição, muitas autarquias urbanas 
ficaram com menos rendimentos e foram compeli-
das a fazer cortes em serviços tidos por todos como 
essenciais. 
O relatório da Igreja de Inglaterra sobre 1985, Fé 
na Cidade, descreve os centros citadinos em termos 
sombrios: 'Paredes cinzentas, ruas cobertas de lixo, 
janelas entaipadas, escritos nas paredes, ruínas e 
escombros, são tristemente aspectos normais dos dis-
tritos e paróquias de que nos ocupamos - as habita-
ções do centro são mais antigas do que as outras. 
Perto de um quarto das casas inglesas foram cons-
truídas antes de 1919, mas a proporção nos centros 
urbanos situa-se entre os 40 e os 60 por cento1 (Igre-
ja de Inglaterra, 1985, p. 18). 
Paul Harrison, ao descrever Hackney, uma das 
áreas administrativas mais pobres de Londres, retra-
tou uma atmosfera de desespero: 
As forças policiais enfrentam a tarefa virtualmente 
impossível de manter sob controlo a mistura explosiva 
que as dinâmicas da sociedade britânica criaram nos 
centros urbanos. Esta mistura, aquecida pela recessão e 
600 A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 
A morte de um sonho: prédios das autarquias em Londres, construídos como casas modernas 
para os habitantes, tornaram-se num fixo de descontentamento e de decadência urbana. 
por um elevado nível de desemprego, gera inevitavel-
mente um número elevado de crimes. Este facto obriga 
a polícia a estar mais presente e com maior número de 
efectivos do que em áreas com outras características, o 
que acarreta mais frequentemente contactos desagradá-
veis com as pessoas, tidas como suspeitos potenciais, e 
cria mais oportunidades de erro e abuso policial. (Harri-
son, 1983, p .369) 
O resultado é um círculo vicioso. Os mais despro-
vidos não só constituem as maiores vítimas do crime, 
como têm de lidar com uma presença da polícia 
muito maior. Por sua vez, um maior número deles 
dedica-se a actividades criminosas. Em áreas como 
Hackney, avisou Harrison, está a emergir 'uma socie-
dade barricada de autodefesa', marcada também por 
uma rápida erosão das liberdades civis'. 
Doenças sociais semelhantes afectam as grandes 
cidades, tanto nos Estados Unidos como na Grá-Bre-
tanha: abuso de drogas, crime e delinquência, desem-
prego, sem-abrigo, intolerância racial e étnica, exclu-
são social, serviços públicos insuficientes, escolas 
fracas e tensões entre o cumprimento da lei e os cida-
dãos. Por vezes, estas múltiplas desvantagens sobre-
pôem-se de tal forma que explodem sob a forma de 
conflitos e tumultos urbanos abertos. 
Conflito urbano 
Numa era da globalização, movimento e rápida 
mudança, as grandes cidades tomaram-se expressões 
concentradas e intensificadas dos problemas sociais 
que afligem a sociedade como um todo. Frequente-
mente, as falhas geológicas 'invisíveis' das cidades 
deram lugar ao equivalente a tremores de terra 
sociais. Tensões semelhantes sobem à superfície, por 
vezes de forma violenta, sob a forma detumultos, 
pilhagens e destruição generalizada. 
Foi o que aconteceu em Los Angeles, na Primave-
ra de 1992, quando eclodiram tumultos em vários 
locais da cidade. Henry Cisneros, secretário do 
Departamento de Habitação e Desenvolvimento 
Urbano, dirigiu-se à cidade para investigar em pri-
meira mão o que estava a acontecer: 
O que eu vi foi uma cidade com fumo por todo o lado. 
Cheirava a ferro e plástico queimados. O fumo era tão 
denso que ofuscava as luzes de um helicóptero que por 
584 A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 
ali sobrevoava. As sirenes disparavam com intervalos de 
poucos segundos, enquanto equipas de socorro munidas 
de extintores, protegidas pelos carros patrulha das auto-
-estradas da Califórnia - literalmente comboios de vinte 
veículos, os carros patrulha para protegerem os que 
combatiam o fogo - corriam de um fogo para outro ... 
Naquela quinta-feira à noite, Los Angeles era o verda-
deiro apocalipse urbano numa espécie de fumaça laran-
ja, um assalto a todos os sentidos, pessoas de olhos 
esbugalhados, tomadas de pânico somente com um som 
alto ao longe (Cisneros, 1993). 
Os conflitos urbanos também atingiram as cidades 
britânicas - em Brixton, em Broadwater Farm em 
Tottenham, a norte de Londres, onde um polícia foi 
assassinado, em Oxford, Bristol e outras cidades. 
Que causas motivam estas tensões e as múltiplas 
carências a culminar em formas abertas de conflito 
urbano? U m factor é certamente a pobreza; outro, é a 
divisão e o antagonismo étnico, em particular entre 
brancos e negros; um terceiro é o crime; um quarto é 
simplesmente a insegurança. Inseguranças e incerte-
zas emergem dos três primeiros factores, sejam os 
indivíduos afectados directamente ou não por eles. 
Tal como no Reino Unido, a pobreza nos Estados 
Unidos expandiu-se nas duas últimas décadas. Na 
primeira metade dos anos 90, a proporção da popula-
ção a viver abaixo do limiar da pobreza é a maior 
desde há um quarto de século. Em particular quando 
origina subclasses privadas, a pobreza separa largos 
segmentos da população da sociedade mais lata; mui-
tos dos grupos mais pobres concentram-se nos cen-
tros das cidades que se estão a degradar. O elemento 
espacial para a exclusão social é claramente perceptí-
vel neste caso. 
Renovação urbana 
Que abordagem deveriam desenvolver os governos 
locais, regionais e nacionais para enfrentar os com-
plexos problemas que afectam os centros das cida-
des? Como pode ser controlada a rápida expansão 
dos subúrbios para prevenir a erosão das áreas verdes 
e dos campos? Uma política de renovação urbana é 
particularmente desafiante porque exige acção simul-
tânea em múltiplas frentes. 
No Reino Unido, por exemplo, foram introduzidos 
um conjunto de esquemas nacionais - envolvendo, 
por exemplo, programas de subsídios para a reabili-
tação de casas pelos seus proprietários ou incentivos 
de impostos para atrair os negócios - para reavivar as 
fortunas dos centros das cidades. O programa do 
Governo Conservador, Acção paro as Cidades, de 
1998, por exemplo, valorizava mais o papel do inves-
timento privado e das forças do mercado para gerar 
desenvolvimento do que a intervenção estatal. Toda-
via, a resposta do capital privado revelou-se muito 
mais fraca do que o previsto. 
Os estudos realizados indicam que, para além do 
efeito propagandístico, dar incentivos e esperar que a 
iniciativa faça o resto, não é uma via eficiente para 
lidar com os problemas fundamentais da ordem 
social gerados pelos centros urbanos. H á um conjun-
to tão grande de circunstâncias opressivas nos centros 
das cidades, que a inversão dos processos de declínio 
é, em qualquer caso, extraordinariamente difícil. As 
investigações sobre a decadência do centro das cida-
des, tal como o relatório Scarman sobre os tumultos 
de Brixton, em 1981, chamou a atenção para o facto 
de não existir uma abordagem coordenada dos pro-
blemas dos centros urbanos (Scarman, 1982). Sem o 
aumento da despesa pública - que não é verosímil 
num futuro próximo - as possibilidades de uma 
melhoria radical são, na verdade, diminutas (Macgre-
gore Pimlott, 1991). 
E m direcção ao Renascimento Urbano: 
o relatório da Urban Task Force 
A renovação urbana não é apenas a recuperação das 
áreas dos centros da cidade, mas também o desenvol-
vimento sustentável das regiões em redor da cidade. 
As previsões do governo são as de que serão forma-
dos mais de 3.8 milhões de lares entre 1996 e 2021. 
O trânsito automóvel deverá crescer 1/3 nas duas pró-
ximas décadas; já a média de deslocações para os tra-
balhadores britânicos é 4 0 % mais elevada do que há 
20 anos atrás. U m em cada quatro residentes acredita 
que a sua área se degradou em anos recentes, enquan-
to apenas um em dez sente que melhorou (Urban 
Task Force, 1999). 
Confrontado com os desafios já existentes em 
áreas urbanas e suburbanas, como com a promessa de 
585 AS C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 
maior expansão nos próximos anos, o governo con-
verteu a Urban Task Force, sob a chefia do arquitec-
to e urbanista Lord Rogers, a fazer recomendações 
para melhorar a qualidade de vida nas zonas britâni-
cas urbanas e rurais. No relatório publicado em Junho 
de 1999, a Task Force desenhou mais de 100 reco-
mendações com a intenção de desenvolver um 
"renascimento urbano" na Grã-Bretanha. 'Desde a 
revolução industrial que perdemos a propriedade das 
nossas vilas e cidades, deixando que elas fossem 
estragadas por um design pobre, dispersão económi-
ca e polarização social', notou a Task Force. Segun-
do os autores do relatório, o início do século X X i 
apresenta três grandes oportunidades para a mudan-
ça. A revolução tecnológica produziu novas formas 
de tecnologia de informação e novos modos de trocar 
informação; a crescente ameaça ecológica despolo-
tou a necessidade de desenvolvimento sustentável; e 
uma transformação social alargada pode ser sentida 
num aumento da esperança de vida e o significado 
das escolhas de vida nas vidas profissionais e pes-
soais das pessoas. 
No seu relatório, a Task Force enfatizou muitos 
temas-chave essenciais para a protecção contra a ero-
são do campo e para a promoção de áreas urbanas 
saudáveis e vibrantes. Sem os seguintes princípios 
fundamentais, defendem os autores, existe um perigo 
real de que as cidades se fragmentem, de que as áreas 
rurais sejam engolidas e a poluição, o congestiona-
mento do trânsito e a degradação social se agravem. 
• Reciclagem da terra e dos edifícios - Sempre que 
possível, a construção de novas casas deveria ser 
feita em terras anteriormente urbanizadas, em vez 
de em locais verdes. O relatório assinalou que, 
actualmente, 1.3 milhões de edifícios residenciais 
e comerciais estavam vazios na Grã-Bretanha. 
O governo está a projectar 60% de novas casas 
antecipadas a serem construídas em locais 'reci-
clados' (ver abaixo). 
9 Melhorar o ambiente urbano - As áreas urbanas 
existentes têm de ser mais atractivas para que as 
pessoas decidam viver, trabalhar e socializar 
nelas. As áreas urbanas deveriam ajudar a desen-
volver um sentido de comunidade e de segurança 
pública. Os bairros devem estar mais bem ligados 
entre si para encorajar as pessoas a andarem a pé 
ou de bicicleta ou de transportes públicos. 
m Atingir a excelência na gestão das áreas locais -
U m renascimento urbano dependerá de uma forte 
liderança política local e de uma participação 
democrática alargada dos cidadãos. Os residentes 
deveriam ter um papel crescente nos processos de 
tomada de decisão. 
• Desenvolver a regeneração - Deveria ser dado 
maior poder às autoridades locais e responsabilida-
de para identificarem recursos direccionados para a 
regeneração de longo termo das áreas degradadas. 
Os fundos públicos deveriam ser utilizados de modo 
a atrair investimento privadoatravés do mercado. 
O relatório da Urban Task Force enfatizou que a 
renovação urbana não pode ser o produto apenas do 
esforço político. Pelo contrário, exige uma mudança 
da cultura, competências, crenças e valores pelos 
políticos, autoridades locais e cidadãos médios. 
A educação, o debate e a troca de informação serão 
cruciais em trazer uma 'renovação urbana* (1999). 
Gentrifícaçâo e i reciclagem urbanay 
A reciclagem urbana - a renovação de edifícios 
antigos para novos usos - tomou-se bastante comum 
nas grandes cidades. Esse processo faz parte, às 
vezes, de programas de planeamento, mas mais fre-
quentemente é o resultado da gentriflcaçao - a reno-
vação de edifícios em bairros degradados para serem 
utilizados por grupos com rendimentos mais eleva-
dos, ou para servirem para equipamentos dedicados a 
servi-los, como lojas e restaurantes. 
A gentrificação dos centros das cidades teve lugar 
nas principais cidades da Grã-Bretanha, Estados Uni-
dos e Canadá e parece continuar nos próximos anos. 
Uma das razões é económica e demográfica. Os 
jovens profissionais escolhem casar e iniciar as suas 
famílias mais tarde na vida. Porque as suas carreiras 
exigem muitas vezes longas horas em edifícios de 
escritórios no centro das cidades, a vida nos subúr-
bios toma-se mais um inconveniente do que uma 
vantagem. Os casais ricos sem filhos têm capacidade 
para pagar rendas elevadas em áreas centrais das 
cidades recuperadas e podem preferir construir esti-
los de vida em torno de opções culturais, culinárias e 
de entretenimento de elevada qualidade aí disponí-
veis. Os casais mais velhos cujos filhos deixaram a 
casa também podem ser tentados a regressar ao cen-
tro das cidades pelas mesmas razões. 
5 8 6 A S CIDADES E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 
Docklands: renovação urbana ou desastre urbano? 
O exemplo mais importante deste facto é represen-
tado pela renovação da área das Docas, em Lon-
dres. Estaremos perante um caso único de sucesso 
em matéria de regeneração urbana, ou diante de um 
desastre mais ou menos completo? Cada um destes 
pontos de vista tem os seus defensores, embora 
todos concordem com o facto de o progresso do pro-
cesso de rejuvenescimento das Docas ser menor do 
que o esperado pelos seus defensores, desde o 
momento e m que a economia entrou em recessão. 
A área das Docas ocupa cerca de oito milhas qua-
dradas e meia (1.360 hectares) do território Leste de 
Londres junto ao Tamisa, que deixou de ter funções 
económicas devido ao encerramento das Docas e 
ao declínio industrial; Procíamou-se que este pro-
cesso representava la maior área de renovação imo-
biliária da Europa Ocidental' e 'a maior oportunidade 
desde o Fogo de Londres'. 
As Docas estão próximas do distrito financeiro da 
City de Londres, mas também estão próximas das 
áreas pobres da classe trabalhadora no outro lado. 
A partir dos anos sessenta houve batalhas internas -
que prosseguem - acerca do futuro da área. Muitos 
habitantes ou vizinhos das Docas preferiam uma 
renovação levada a cabo através de projectos de 
desenvolvimento da comunidade, que protegesse os 
interesses dos residentes mais pobres. Entretanto, 
com a criação da Empresa de Desenvolvimento das 
Docas em 1981, a região tornou-se num elemento 
central da estratégia para encorajar a iniciativa priva-
da a desempenhar o papel principal no rejuvenesci-
mento urbano, que já mencionámos. 
Hoje em dia, a área é nítida e visivelmente dife» 
rente dos bairros empobrecidos que a ladeiam. 
Abundam os edifícios modernos, por vezes de uma 
arquitectura aventurosa. Converteram-se armazéns 
em apartamentos de luxo e construíram-se novos 
blocos. Ediftcou-se um grande complexo de escritó-
rios em Canary Wharf. Contudo, no meio do brilho, 
há edifícios degradados e terrenos abandonados. 
O espaço destinado a escritórios continua frequen-
temente vazio, o mesmo acontecendo a algumas 
das novas habitações que vieram a revelar-se inven-
dáveis aos preços estabelecidos. A zona das Docas 
possui algumas das habitações mais pobres do 
país, mas as pessoas que aí vivem pouco beneficia-
ram da construção à sua votta. Ofereceu-se um bom 
número de casas "acessíveis". Porém, só uma 
pequena proporção dos residentes locais, as queria 
comprar ou podia fà2ê-lo. Uma história única de 
sucesso na regeneração urbana ou um desastre 
mais ou menos completo? Cada uma das visões tem 
U m factor que promove a gentríficaçâo nos Esta-
dos Unidos é a queda das taxas de criminalidade. 
Desde 1991, a incidência do crime violento caiu uma 
média de 34% nas dez maiores cidades norte-ameri-
canas. Apesar da lei da 'tolerância zero* e das políti-
cas de ordem favorecidas por muitas cidades norte-
-americanas - de forma mais proeminente em Nova 
Iorque - terem sido severamente criticadas por serem 
racistas, arbitrárias e muito duras, produziram indu-
bitavelmente centros de cidades menos perigosos. 
Finalmente, o perfil económico da nova economia 
do conhecimento é muito favorável aos centros das 
cidades. Muitas empresas envolvidas na tecnologia, 
comunicações, publicidade e marketing, localizaram-
-se em distritos de negócios centrais. Um crescente 
número de empresas que se estão a expandir neste 
domínio escolhem implantar-se no centro das cidades 
em vez de nos subúrbios. Auto-estradas congestiona-
das e longas horas de viagem tornaram-se um modo de 
vida para muitos habitantes dos subúrbios; existem 
evidências que um crescente número de trabalhadores 
na nova economia pode escolher quebrar este padrão, 
vivendo e trabalhando nos centros das cidades. 
Em Londres, as Docklands foram um notável 
exemplo de 'reciclagem urbana' (ver caixa). Nos 
Estados Unidos, os construtores compram armazéns 
industriais em cidades, de Milwaukee a Filadélfia, e 
convertem-nos em caros lofts residenciais e estúdios. 
587 A S C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 
A criação de espaços públicos interessantes nos cen-
tros urbanos degradados de Baltimore a Pittsburgh 
foi anunciada como triunfo da renovação urbana. 
Contudo, é difícil conciliar a degradação que conti-
nua nos bairros a pouca distância destes centros revi-
talizados. 
Richard Senett, no seu livro acerca da história da 
cidade, The Conscience of the Eye (1993), argumen-
ta contra projectos de desenvolvimento como os das 
Docas e afirma que os urbanistas deveriam efectuar 
tentativas para preservar, o que designa como a 'cida-
de humana' ou para regressar à mesma. Os enormes 
edifícios impessoais em muitas cidades voltam as 
pessoas para si mesmas tomando-as distantes umas 
das outras. Mas as cidades podem voltar as pessoas 
para o exterior, colocando-as em contacto com uma 
variedade de culturas e de modos de vida. Devería-
mos tentar criar ruas que não se limitassem a ser 
seguras mas que fossem também 'cheias de vida', de 
um modo contrário ao que 'as artérias do tráfego, 
apesar de todo o seu movimento de veículos o não 
são9. A zona comercial suburbana com os seus pas-
seios e lojas uniformizados está tão distante da 'cida-
de humana' como a auto-estrada. Deveríamos inspi-
rar-nos nas áreas antigas das cidades, como as que se 
encontram em muitos centros das cidades italianas, 
que são à escala humana e misturam a diversidade 
com a elegância do seu desenho. 
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A S C Í D A O E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 5 8 9 
Urbanizaçao no mundo 
em desenvolvimento 
A população urbana mundial poderia atingir os 2.5 
biliões de pessoas em 2025. Segundo algumas esti-
mativas, 4 milhões destes habitantes urbanos serão 
residentes das cidades nos paísesem desenvolvimen-
to. Como mostra o mapa das 'megacidades* (vide 
figura 18.2), a maioria das 36 cidades projectadas 
para terem mais de 8 milhões de residentes em 2015 
localizam-se nos países em desenvolvimento.. 
Manuel Castells refere-se às megacidades como 
uma das principais características da urbanização do 
terceiro milénio (1996). Não se definem apenas pelo 
seu tamanho - apesar de ser uma vasta aglomeração 
de pessoas - mas também pelo seu papel como pon-
tos de ligação entre populações humanas enormes e a 
economia global. As megacidades são bolsas concen-
tradas de actividade através das quais fluem a políti-
ca, os media, as comunicações, as finanças e a pro-
dução. Segundo Castells, as cidades funcionam como 
imanes para os países ou regiões em que estão locali-
zadas. As pessoas são aiTastadas para as grandes 
regiões urbanas por vários motivos; nas megacidades 
estão tanto aqueles que conseguem perfurar no siste-
ma global, como os que não conseguem. Para além 
de servirem xomo nós na economia global as mega-
cidades também se tornam em 'depositários de todos 
os segmentos da população que lutam para sobrevi-
ver ' (1996: 404). 
Porque é que a taxa de crescimento urbano nas 
regiões menos desenvolvidas do mundo é muito mais 
elevada do que em qualquer outro lugar? Têm de ser 
tomados em conta dois factores em particular. Em 
primeiro lugar, as taxas de crescimento populacional 
são maiores nos países em desenvolvimento do que 
nas nações industrializadas (vide capítulo 19, 'Cres-
cimento populacional e crise ecológica*). O cresci-
mento urbano é estimulado pelas elevadas taxas de 
fertilidade entre as pessoas que já vivem nas cidades. 
E m segundo lugar, existe uma migração interna 
muito dessiminada das zonas rurais para as zonas 
urbanas - como no caso da megacidade em desen-
volvimento de Hong Kong - Guangdong acima men-
cionada. As pessoas são arrastadas para as cidades no 
mundo em desenvolvimento motivadas tanto porque 
os seus sistemas tradicionais de produção rural se 
desintegraram como porque as áreas urbanas ofere-
cem maiores oportunidades de trabalho. A pobreza 
rural impele muita gente a tentar a sua sorte na vida 
da cidade. Podem ter a intenção de migrarem para a 
cidade apenas por um curto período de tempo, que-
rendo regressar às suas aldeias depois de terem ganho 
dinheiro suficiente. Alguns regressam, mas a maioria 
é forçada a ficar, tendo, por um ou outro motivo, per-
dido a sua posição nas suas comunidades de origem. 
Desafios da urbanização no mundo 
em desenvolvimento 
Implicações económicas 
A medida que um número crescente de agricultores e 
trabalhadores desqualificados imigra para os centros 
urbanos, a economia formal luta, muitas vezes, para 
absorver este fluxo como força de trabalho. Na maio-
ria das cidades no mundo em desenvolvimento, é a 
economia informal que permite aos que não conse-
guem encontrar trabalho sobreviverem. Do trabalho 
ocasional nas fábricas às actividades de comércio de 
pequena escala, o sector informal não regulamentado 
oferece oportunidades de ganhar a vida aos trabalha-
dores pobres e sem formação. 
As oportunidades geradas pela economia informal 
são uma importante ajuda para milhares de famílias a 
sobreviverem em condições urbanas, mas também 
têm aspectos problemáticos. A economia informal 
não tem impostos e não é regulada. Também é menos 
produtiva do que a economia formal. Os países onde 
a actividade económica se concentra neste sector 
falham na recolha das muito necessárias receitas 
através dos impostos. O baixo nível de produtividade 
também afecta a economia em geral - o volume de 
PIB gerado pela actividade económica informal é 
muito mais baixo do que a percentagem da população 
envolvida no sector. 
A O C D E estima que serão necessários mil milhões 
de novos empregos até 2025 para sustentar os cresci-
mento estimado da população das cidades do mundo 
em crescimento. É pouco provável que todos estes 
empregos sejam criados na economia formal. Alguns 
analistas do desenvolvimento são da opinião de que 
deveria ser prestada atenção à formalização ou regu-
lação da economia informal, onde muito do 'excesso' 
da força de trabalho é provável que se concentre nos 
próximos anos. 
5 9 0 A S C I D A D E S E O S E S P A Ç O S U R B A N O S 
A construção de ume megacidade 
Na Ásia, está a formar-se presentemente um dos 
maiores aglomerados urbanos da história, numa 
área de 50.000 quilómetros quadrados que vão de 
Hong Kòng até à China, o Delta do Rio das Pérolas 
d Macau (vide figura 18.3). Apesar de a região não 
ter um nome formal ou estrutura administrativa, em 
1995 já tinha atingido tima população de 50 milhões 
de pessoas. Segundo Manuel Castells, perspectiva-
•se que venha a ser um dos centros industrias, de 
negócios e culturais mais significativos do século. 
Castells aponta vários factores que se inter-rela-
cíonam para ajudar a explicar a emergência desta 
enorme conurbaçãa Em primeiro lugar, a China 
está a passar por uma transformação económica e 
Hong Kong é um dos pontos nodais que liga a 
China à economia global. Em segundo lugar, o 
papel de Hong Kong como centro global, financeiro 
e de negócios, tem crescido à medida que a sua 
economia se está a afastar da produção de bens 
para a produção de serviços. Por fim, entre a segun-
da metade dos anos 60 e dos anos 90, os empre-
sários de Hong Kong Iniciaram um processo dramá-
tico de industrialização no Delta do Rio das Pérolas. 
Mais de 6 milhões de pessoas trabalhavam em 
20.000fábricas e em 10.000 empresas. O resultado 
destes processos sobrepostos foi o de uma 'explo-
são urbana sem precedentes1 (Castells, 1996). 
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Figure 18.3 A megacidade de Hong Kong-Guar>gdong 
Fontes: M.Castells, The Rise òf the Network Sodety, Blacfcwell, 1996. De J. Borja e M. Castells, Local and Global, Earthscan. 1997. 
591 AS C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 
Os desafios do ambiente 
A rápida expansão das áreas urbanas no mundo em 
desenvolvimento difere de forma dramática das cida-
des no mundo industrializado. Apesar de todas as 
cidades enfrentarem problemas ambientais, as dos 
países em desenvolvimento confrontam-se com ris-
cos particularmente severos. Poluição, falta de habi-
tação, saneamento inadequado e reservas de água 
pouco seguras são problemas crónicos para as cida-
des nos países menos desenvolvidos. 
O alojamento é um dos problemas mais agudos em 
muitas áreas urbanas. As cidades, como Calcutá e 
São Paulo, estão muito congestionadas; a taxa de imi-
gração interna é muito elevada para a oferta de habi-
tação existente. Os imigrantes aglomeram-se em 
zonas ocupadas que proliferam como cogumelos nas 
orlas das cidades. Nas áreas urbanas do Ocidente, os 
recém-chegados estabelecem-se normalmente perto 
dos centros das cidades, mas o inverso tende a acon-
tecer nos países em desenvolvimento, onde os emi-
grantes povoam o que tem sido designado como a 
'franja séptica' das áreas urbanas. Barracas feitas de 
fibra de cânhamo e juta ou de cartão, montam-se na 
periferia das cidades, onde quer que haja um pouco 
de espaço. 
Em São P^ulo, estima-se que houve uma quebra 
de 5.4 milhões de casas habitáveis em 1996. Alguns 
investigadores estimam que esta quebra se eleva aos 
20 milhões, se a definição de 'casas habitáveis' for 
interpretada de forma mais estrita. Desde 1980 o 
défice crónico da habitação em São Paulo produziu 
uma onda de 'ocupações* não oficiais de edifícios 
vazios. Grupos de famílias sem casa iniciaram 'ocu-
pações em massa' em hotéis abandonados, escritórios 
e edifícios do governo. Muitas famílias acreditam 
que é melhor partilhar uma cozinha e uma casa de 
banho com centenas de outras famílias do queviver 
nas ruas ou nas favelas, em bairros de lata improvi-
sados às portas da cidade. 
Os governos urbanos e regionais nos países menos 
desenvolvidos são muito pressionados para acompa-
nharem a procura em espiral de habitação. Em cida-
des como São Paulo, as autoridades de habitação e os 
governos locais discordam sobre como enfrentar o 
problema da habitação. Alguns argumentam que a 
estrada mais realizável é a de melhorar as condições 
nas favelas - fornecer electricidade e água corrente, 
pavimentar as ruas e atribuir endereços postais. 
Outros temem que os bairros de lata improvisados 
sejam fundamentalmente inabitáveis e deveriam ser 
demolidos para darem lugar a habitação própria para 
as famílias pobres. 
O congestionamento e o sobrede sen volvi mento 
nos centros das cidades deu lugar a sérios problemas 
ambientais em muitas áreas urbanas. A Cidade do 
México é disso um importante exemplo. Noventa e 
quatro por cento da Cidade do México consiste em 
áreas construídas, com apenas 6 por cento de terra 
náo construída. O número de 'espaços verdes' - par-
ques e espaços abertos de terra verde - é muito infe-
rior ao encontrado nas cidades norte-americanas ou 
europeias mais populosas. A poluição é o maior pro-
blema, originada principalmente pelos carros, auto-
carros e camiões que se amontoam nas ruas inade-
quadas das cidades, derivando o resto de poluentes 
industriais. Estima-se que viver na Cidade do Méxi -
co é o equivalente a fumar 40 cigarros por dia. Em 
Março de 1992 a poluição atingiu o maior nível. 
Onde um nível de ozono de cerca de menos 100 pon-
tos foi considerado 'satisfatório* para a saúde, naque-
le mês o nível subiu para os 398 pontos. O governo 
teve que obrigar algumas fábricas a fechar durante 
algum tempo, as escolas fecharam e 40 por cento de 
carros foram proibidos de circular na cidade. 
Efeitos sociais 
Muitas áreas urbanas nos países em desenvolvimento 
estão sobrelotadas e sem reservas. A pobreza está dis-
seminada e os serviços sociais existentes não conse-
guem ir ao encontro das necessidades de assistência 
médica, de aconselhamento do planeamento familiar, 
educação e formação. O desequilíbrio da distribuição 
das faixas etárias nos países em desenvolvimento 
ajuda às suas dificuldades económicas e sociais. 
Comparado com os países industrializados, um 
número muito maior da população no mundo em 
desenvolvimento tem idade inferior aos quinze anos. 
Uma população jovem necessita de apoios e de edu-
cação e, durante este período, os jovens não são 
membros economicamente produtivos. Mas muitos 
países em desenvolvimento têm falta de recursos que 
lhes permitam fornecer uma educação universal. 
Quando as suas famílias são pobres, muitas crianças 
têm de trabalhar a tempo inteiro ou têm de tentar 
5 9 2 A S C I D A D E S E O S E S P A Ç O S U R B A N O S 
A pobreza e a prosperidade que coexistem em cidades como o Rio de Janeiro são evidentes no ambiente construído e 
nas construções improvisadas. 
sobreviver nas ruas, mendigando o que poderem. 
Quando as crianças de rua crescem, muitas delas tor-
nam-se sem-abrigo ou desempregadas, ou ambas as 
coisas. 
O futuro da urbanização no mundo 
em desenvolvimento 
Ao considerar o objectivo dos desafios que enfrentam 
as áreas urbanas nos países em desenvolvimento, 
pode ser difícil perspectivar a mudança e o desenvol-
vimento. As condições de vida em muitas das maio-
res cidades do mundo parecem declinar mais nos pró-
ximos anos. Mas o quadro nâo é de todo negativo. 
Em primeiro lugar, apesar de, em muitos países, as 
taxas de natalidade continuarem elevadas, têm uma 
grande probabilidade de decrescerem nos próximos 
anos à medida que a urbanização aumenta. Este facto, 
por sua vez, concretizar-se-á num decréscimo gra-
dual na própria taxa de urbanização. Na África Oci-
dental, por exemplo, a taxa de urbanização deveria 
decair para 4,2 por cento por ano por volta de 2020, 
abaixo de uma taxa de crescimento anua) de 6 3 por 
cento nas últimas três décadas. 
E m segundo lugar, a globalização apresenta 
importantes oportunidades para as áreas urbanas nos 
países em desenvolvimento. Com a integração eco-
nómica, as cidades em torno do mundo podem entrar 
nos mercados internacionais, podem promover-se 
como locais para o investimento e desenvolvimento e 
podem criar ligações económicas através das frontei-
ras dos Estados-Nação. A globalização apresenta uma 
das aberturas mais dinâmicas para que os centros 
urbanos em crescimento se tornem em importantes 
forças no desenvolvimento económico e na inovação. 
De facto, muitas cidades no mundo em desenvolvi-
mento já se estão a juntar às listas das 'cidades glo-
bais* do mundo, como veremos brevemente. 
593 AS C I D A D E S E OS E S P A Ç O S U R B A N O S 
As cidades e a globalização 
Nos tempos pré-modernos, as cidades eram entidades 
autodelimitadas que se mantinham afastadas das 
áreas predominantemente rurais em que se localiza-
vam. Os sistemas rodoviários uniam, por vezes, as 
áreas urbanas mais importantes, mas viajar era uma 
actividade característica de mercadores, soldados e 
outros que precisavam de atravessar distâncias com 
alguma regularidade. A comunicação entre as cidades 
era limitada. No início do século X X I , o quadro é 
muito diferente. A globalização teve um efeito pro-
fundo nas cidades tornando-as mais interdependentes 
e encorajando a proliferação de ligações horizontais 
entre as cidades através das fronteiras nacionais. No 
presente, os laços físicos e virtuais entre as cidades 
abundam e estão a emergir redes globais de cidades. 
Algumas pessoas previram que a globalização e as 
novas tecnologias da comunicação poderão conduzir 
ao desaparecimento das cidades tal como as conhece-
mos. Isto acontece, porque muitas das funções tradi-
cionais das cidades podem agora ser desenvolvidas 
no ciber-espaço em vez de o serem nas densas e con-
gestionadas áreas urbanas. Por exemplo, os mercados 
financeiros tornaram-se electrónicos, o comércio 
eléctronico reduz a necessidade de tanto produtores 
como consumidores se sediarem no centro das cida-
des e as 'trocas electrónicas'permitem que um núme-
ro crescente de empregados trabalhem a partir de 
casa em vez de num edifício de escritórios. 
Contudo, até aí, estas previsões não se esgotaram. 
Em vez de conduzir ao desaparecimento das cidades, 
a globalização está a transformá-las em centros vitais 
na economia global. Os centros urbanos tornaram-se 
fundamentais na coordenação dos fluxos de informa-
ção, na gestão das actividades de negócio e em novos 
serviços e tecnologias inovadoras. Assistimos a uma 
dispersão e concentração simultâneas de actividade 
e poder num conjunto de cidades em torno do globo 
(Castells, 1996). 
As cidades globais 
O papel das cidades na nova ordem global tem atraí-
do a atenção dos sociólogos. A globalização é muitas 
vezes pensada em termos de dualidade entre o nível 
nacional e o global. Contudo, são as maiores cidades 
do mundo que compreendem os principais circuitos 
através dos quais ocorre a globalização (Sassen, 
1998). O funcionamento da nova economia global 
depende de um conjunto de localizações centrais com 
infraestruturas de informação desenvolvidas e com 
uma 'hiperconcentração* de serviços. É nestes locais 
que o 'trabalho* da globalização é efectuado e dirigi-
do. À medida que os negócios, a produção, a publici-
dade e o marketing assumem uma escala global, exis-
te uma enorme quantidade de actividade organizativa 
que tem de ser feita de modo a manter e a desenvol-
ver estas redes globais. 
Saskia Sassen foi uma das principais contribuidoras 
para o debate sobre as cidades e a globalização. Utili-
za o termo cidade global para se referir aos centros 
urbanos que são a sede de grandes empresas transna-
cionais e de uma superabundante oferta de serviços

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