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Bens_municipais_-_Thiago_Marrara

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Prévia do material em texto

BENS	MUNICIPAIS
regime	jurídico,	modalidades	e	exploração
	
Thiago	Marrara
Professor	de	direito	administrativo	e	urbanístico	da	Universidade	de	São	Paulo
(USP)	na	Faculdade	de	Direito	de	Ribeirão	Preto	(FDRP
	
	
1ª	EDIÇÃO	DIGITAL
Kindle	Digital	Publishing
	
Sobre	o	Autor
Thiago	Marrara
Professor	associado	de	direito	administrativo	e	urbanístico	da	USP.	Faculdade	de
Direito	de	Ribeirão	Preto	(FDRP).	Livre-docente.	Doutor	pela	Universidade	de
Munique	 (LMU).	 Advogado	 parecerista.	 Editor	 da	 Revista	 Digital	 de	 Direito
Administrativo.	Entre	outras	obras,	 publicou:	 “Bens	públicos,	 domínio	urbano,
infraestruturas”	 (Fórum);	 “tratado	 de	 direito	 administrativo,	 v.	 3:	 direito
administrativo	dos	bens	e	 restrições	estatais	à	propriedade”	 (em	coautoria	com
Luciano	 Ferraz,	 pela	 Revista	 dos	 Tribunais);	 “Planungsrechtliche	 Konflikte	 in
Bundesstaaten”	 (Dr.	 Kovac,	 Hamburgo);	 “Processo	 Administrativo:	 Lei	 n.
9.784/1999	comentada”	(Atlas),	além	de	ter	organizado	diversas	obras,	dentre	as
quais:	 “Princípios	 de	 direito	 administrativo”	 (Atlas);	 “Direito	 Administrativo:
transformações	e	tendências”	(Almedina)	e	“Controles	da	Administração	Pública
e	judicialização	de	políticas	públicas”	(Almedina).
https://usp-br.academia.edu/ThiagoMarraradeMatos
	Contato:	marrara@usp.br
	
	
	
	
	
	
	
FICHA	CATALOGRÁFICA
	
MARRARA,	 Thiago.	 Bens	 municipais:	 regime	 jurídico,	 modalidades	 e	 exploração,	 1ª	 edição	 digital.
Publicação	independente;	Kindle	Direct	Publishing,	2017.
	
Área	e	subáreas:	ciências	sociais	aplicadas,	direito	municipal,	direito	urbanístico,	direito	administrativo.
Palavras-chaves:	bens	públicos,	bens	municipais,	Municípios,	cidades.
	
Sumário
1										Introdução:	o	direito	dos	bens	municipais
2										A	teoria	dos	bens	estatais	na	atualidade:	aspectos	gerais
3										Bens	estatais	na	federação	brasileira
4										Bens	municipais	reservados
5										Aquisição	de	bens	municipais:	outras	modalidades
5.1						Desapropriação
5.2						Transferência	ou	doação	compulsória
5.3						Reversão	de	bens
5.4						Perdimento	de	bens
5.5						Consórcio	imobiliário
5.6						Compra	ordinária
5.7						Compra	por	preempção
5.8						Permuta
5.9						Dação	em	pagamento	e	adjudicação
5.10				Doações	puras	ou	condicionadas
5.11				Sucessão	testamentária
5.12				Usucapião
6										Escala	de	regimes	jurídicos,	bens	públicos	de	direito	e	de	fato
7										Regimes	jurídicos	dos	bens	municipais
7.1						Bens	municipais	públicos	afetados	(uso	comum	do	povo	e	uso	especial):
7.2						Bens	municipais	públicos	não	afetados	(dominicais)
7.3						Bens	municipais	privados	em	função	pública	(domínio	público	impróprio)
7.4						Bens	municipais	privados	sem	função	pública	(domínio	estatal	privado)
8										Domínio	urbano	ou	bens	com	função	urbanística
9										Uso	de	bens	municipais:	sistematização	teórica
10							Outorga	de	uso	de	bens	municipais:	mecanismos	administrativos
11							Outorga	de	uso	de	bens	municipais:	mecanismos	urbanísticos
11.1				O	direito	de	superfície
11.2				A	concessão	de	uso	para	fins	de	moradia
11.3				A	permissão	de	uso	para	fins	comerciais
12							Cobrança	pelo	uso	de	bens	municipais
12.1				Preços	de	uso
12.2				Taxas	de	polícia	e	de	serviço	público
12.3				Compensações	financeiras
13							Referências	bibliográficas
	
1									Introdução:	o	direito	dos	bens	municipais
A	teorização	e	o	domínio	prático	das	normas	componentes	do	 regime
jurídico	 dos	 bens	 municipais	 ganham	 acentuada	 importância	 na	 atualidade.
Dupla	é	a	causa	por	trás	desse	fenômeno.
De	 uma	 parte,	 a	 má-gestão	 patrimonial	 sujeita	 os	 administradores
públicos	 locais	 a	 inúmeras	 esferas	 de	 responsabilidade	 e	 a	 gravosas	 sanções.
Apenas	para	 ilustrar,	 a	Lei	de	 Improbidade	considera	 atos	 ilícitos,	 entre	outras
condutas	 relativas	 à	 administração	 patrimonial:	 perceber	 vantagem	 econômica,
direta	ou	 indireta,	para	facilitar	alienação,	permuta	ou	 locação	de	bem	público,
assim	 como	 utilizar,	 em	 obra	 ou	 serviço	 particular,	 veículos,	 máquinas,
equipamentos	 ou	 material	 estatal	 de	 qualquer	 natureza	 (art.	 9º,	 III	 e	 IV).
Igualmente	ilícitos	mostram-se	tanto	a	doação	a	pessoa	física	ou	jurídica	e	a	ente
despersonalizado,	 ainda	 que	 de	 fins	 educativos	 ou	 assistenciais,	 de	 bens	 do
patrimônio	público,	quanto	a	permissão	ou	a	facilitação	de	alienação,	permuta	ou
locação	de	bem	integrante	do	patrimônio	estatal	por	preço	 inferior	ao	mercado
(art.	 10,	 III	 e	 IV).	 Não	 bastasse	 isso,	 o	 Código	 Penal	 tipifica	 vários
comportamentos	 lesivos	 ao	patrimônio	 estatal,	 incluindo	o	peculato,	 ou	 seja,	 a
apropriação,	 pelo	 agente	 público,	 de	 dinheiro,	 valor	 ou	 qualquer	 outro	 bem
móvel	de	que	tem	a	posse	em	razão	do	cargo,	ou	seu	desvio,	em	proveito	próprio
ou	alheio.
De	 outra	 parte,	 além	 das	 inúmeras	 consequências	 jurídicas	 a	 que	 o
servidor	está	submetido	por	falhas	no	manejo	patrimonial,	cada	vez	mais	os	bens
municipais	se	tornam	um	tema	relevante	para	os	juristas	e	o	direito	em	virtude	de
seu	 crescente	 papel	 socioeconômico.	 Muitos	 bens	 municipais,	 sobretudo
imóveis,	 constituem	o	 aparato	 fundamental	 para	 a	 instalação	de	 infraestruturas
de	serviços	públicos	e	privados	essenciais	à	vida	urbana,	daí	porque	sua	gestão
passa	a	condicionar	o	exercício	de	liberdades,	direitos	fundamentais	e	princípios
da	 ordem	 econômica	 e	 a	 afetar	 o	 acesso	 a	 bens	 e	 serviços	 essenciais	 pelos
cidadãos.	Em	segundo	lugar,	a	boa	gestão	dos	bens	municipais	revela-se	capaz
de	fortalecer	o	sistema	urbano	por	meio	do	combate	às	desigualdades	presentes
nas	várias	partes	do	território	local	e,	ademais,	de	proporcionar	vultosas	receitas
financeiras	aos	Municípios,	de	maneira	a	viabilizar	inúmeras	políticas	públicas.
Em	 face	 dos	 dois	 fatores	 apontados	 e	 no	 intuito	 de	 contribuir	 com	 a
teorização	dos	bens	municipais	no	direito	positivo	brasileiro,	no	presente	estudo,
resgata-se	em	caráter	introdutório	a	teoria	dos	bens	estatais,	tomada	como	eixo
de	 análise	 mais	 abrangente	 que	 a	 tradicional	 teoria	 dos	 bens	 públicos.	 Em
seguida,	 diferenciam-se	 os	 bens	 estatais	 públicos	 e	 privados,	 aborda-se	 a
distinção	entre	bens	públicos	de	direito	e	bens	públicos	de	 fato	e	examina-se	a
sistematização	 dos	 regimes	 jurídicos	 dos	 bens	 a	 partir	 de	 uma	 proposta	 mais
complexa	 de	 escala	 de	 dominialidade,	 visando	 a	 extrapolar	 a	 apresentação
simplista	dos	regimes	baseada	na	separação	civilista	de	bens	públicos	e	privados
à	luz	de	um	puro	critério	de	titularidade	(visão	subjetivista).
Com	apoio	nesse	suporte	teórico,	analisam-se	os	bens	municipais,	suas
espécies,	formas	de	aquisição,	modalidades	de	uso	e	os	mecanismos	de	outorga
de	acordo	com	o	direito	administrativo	geral	e	o	direito	urbanístico.	Apontam-se
então	as	variadas	ferramentas	de	cobrança	de	uso	que	o	Poder	local	detém	à	sua
disposição	para	gerir	os	bens	municipais	de	modo	economicamente	vantajoso	e,
ao	 mesmo	 tempo,	 harmônico	 com	 os	 princípios	 da	 ordem	 econômica	 e	 os
direitos	 fundamentais	 do	 cidadão	 urbano.	 Ao	 longo	 dessa	 exposição,	 especial
destaque	será	conferido	ao	problema	de	instalação	de	infraestruturas	de	serviços
no	 domínio	 urbano	 municipal	 e	 às	 confusões	 que	 ocorrem	 em	 relação	 aos
diversos	tipos	de	receitas.
Ao	 final	 da	 exposição	 proposta,	 pretende-se	 ter	 logrado	 oferecer	 ao
público	 nada	mais	 que	 um	 panorama	 teórico	 inaugural	 acerca	 dos	 incontáveis
aspectos	jurídicos	que	circundam	o	interessantíssimo	tema	dos	bens	municipais.
Com	isso,	espera-se	suscitar	reflexões	que	inspirem	detalhamentos	teóricos	sobre
este	assunto	ainda	pouco	lembrado	na	doutrina	do	direito	público	pátrio.
2	 	 	 	 	 	 	 	 	A	teoria	dos	bens	estatais	na	atualidade:	aspectos
gerais
Acostumados	 às	 referências	 doutrináriasaos	 bens	 “públicos”,	muitos
leitores	decerto	estranharão	a	menção	frequente	aos	bens	estatais	no	 texto	a	se
desenrolar	 nas	 próximas	 linhas.	 A	 troca	 do	 adjetivo	 público	 pelo	 estatal	 é
proposital.	 Conquanto	 o	 Código	 Civil	 refira-se	 apenas	 aos	 bens	 públicos,	 a
categoria	 de	 todos	 os	 bens	 que	 se	 agregam	no	patrimônio	 do	Estado	 revela-se
muito	mais	extensa.	A	expressão	“bem	estatal”	serve	assim	para	designar	todo	e
qualquer	tipo	de	bem	do	Estado,	enquanto	"bem	público"	equivale	unicamente	a
uma	subcategoria	de	bem	estatal,	vinculada	a	pessoas	jurídicas	de	direito	público
interno	 e,	 em	 geral,	 submetida	 a	 um	 regime	 jurídico	 administrativo	 com
limitações	e	poderes	especiais	de	gestão	patrimonial.
Em	consonância	com	o	direito	interno,	o	Estado	fragmenta-se,	reparte-
se,	 divide-se	 em	 incontáveis	 entidades	 no	 intuito	 de	 executar	 com	 maior
eficiência	suas	funções	e	tutelar	os	interesses	públicos	primários	consagrados	no
texto	constitucional.	Ao	dividir-se,	ora	cria	entidades	com	personalidade	jurídica
de	direito	público	(como	as	autarquias,	as	associações	públicas,	os	Ministérios,
as	 Prefeituras	 etc.),	 ora	 se	 vale	 de	 pessoas	 jurídicas	 de	 direito	 privado,	 como
empresas,	associações,	fundações.
O	Estado	se	apresenta	ao	mundo	ora	como	ente	de	direito	público	ora
como	pessoa	de	direito	privado.	A	escolha	da	forma	jurídica	redunda	de	um	tipo
de	 discricionariedade	 administrativa	 que	 não	 se	 restringe	 à	 União.	 Estados	 da
federação	 e	Municípios	 também	 se	 valem	 de	 roupagem	 pública	 ou	 privada	 a
depender	 de	 um	 juízo	 de	 conveniência	 e	 da	 atividade	 que	 cada	 entidade
executará.	 Somente	 não	 se	 lhes	 confere	 o	 poder	 de	 inventar	 novos	 tipos	 de
pessoa	jurídica	pública	ou	privada,	pois	normas	do	gênero	pertencem	ao	direito
civil,	matéria	cuja	competência	legislativa	se	concentra	nas	mãos	do	Congresso
Nacional	com	exclusividade.
Considerando-se	 que	 nos	 três	 níveis	 da	 federação	 brasileira	 há
entidades	 estatais	 de	 direito	 público	 e	 de	 direito	 privado,	 o	 conjunto	maior	 de
bens	 que	 todas	 as	 entidades	 possuem	 forma	 a	 categoria	 dos	 “bens	 estatais”.
Dentro	 desse	 grupo	 patrimonial	 amplo,	 separam-se	 os	 bens	 estatais	 públicos,
conhecidos	 apenas	 como	 bens	 públicos,	 e	 os	 bens	 estatais	 privados,	 bloco
patrimonial	 não	 explicitado	 diretamente	 pelo	 direito	 positivo.	 O	 Estado,	 por
conseguinte,	possui	bens	públicos	e	privados,	cada	qual	em	regime	jurídico	mais
ou	menos	marcado	por	normas	de	direito	administrativo	e	que,	em	regra,	não	se
confundem	com	os	bens	não	estatais.
A	obsessão	do	direito	administrativo	tradicional	pelo	conceito	de	bens
públicos	e	seu	relativo	desprezo	pelos	bens	estatais	privados	não	se	deve	a	uma
falha	 doutrinária.	Grosso	 modo,	 isso	 se	 explica	 pela	 normatização	 da	 matéria
dada	pelo	Código	Civil	de	1916	e	pela	repetição	de	praticamente	 todas	as	suas
normas,	com	alguns	restritos	aprimoramentos,	no	Código	Civil	de	2002.
Ao	 disciplinar	 os	 bens	 de	 acordo	 com	 um	 critério	 subjetivo	 (ou	 de
titularidade),	 o	 Código	 Civil	 acabou	 por	 posicionar	 os	 bens	 públicos	 em	 uma
categoria	 contraposta	 aos	 bens	 privados.	 Veja-se	 o	 que	 dispõe	 o	 art.	 98:	 “são
públicos	 os	 bens	 do	 domínio	 nacional	 pertencentes	 às	 pessoas	 jurídicas	 de
direito	público	interno;	todos	os	outros	são	particulares,	seja	qual	for	a	pessoa	a
que	pertencerem”.
O	 erro	 comum	 de	 interpretação	 que	 se	 faz	 do	 presente	 dispositivo
consiste	 em	 confundir	 o	 Estado	 como	 um	 todo	 com	 as	 pessoas	 jurídicas	 de
direito	público	 interno	que	dele	participam.	Contudo,	o	que	 se	deve	 extrair	 do
artigo	transcrito	é	que	os	bens	públicos	abarcam	tão	somente	aqueles	móveis	e
imóveis	 inseridos	 no	 patrimônio	 de	 uma	 parcela	 das	 entidades	 estatais,	 quais
sejam,	as	que	adotam	personalidade	jurídica	de	direito	público.	Por	exclusão,	os
bens	de	outros	entes	estatais,	com	personalidade	jurídica	de	direito	privado,	são
particulares.	 Daí	 a	 razão	 para	 se	 falar	 de	 bens	 estatais	 públicos	 e	 estatais
particulares.	
Dentro	da	subcategoria	dos	estatais	públicos,	o	Código	Civil	procedeu
a	 uma	 segunda	 diferenciação,	 agora	 baseada	 no	 critério	 da	 afetação,	 da
vinculação	do	bem	a	um	determinado	uso	primário	(porém	não	necessariamente
exclusivo).	A	partir	daí,	apartam-se	os	bens	públicos	afetados,	incluindo	os	bens
de	 uso	 comum	 do	 povo	 e	 os	 bens	 de	 uso	 especial,	 e	 os	 bens	 públicos	 não
afetados,	batizados	de	bens	dominicais.
Os	 três	 tipos	 de	 bens	 estatais	 públicos	 se	 destacam	 por	 duas	marcas
principais:	 1)	 a	 vinculação	 ao	 patrimônio	 de	 uma	 pessoa	 jurídica	 de	 direito
público	 interno	 (titularidade	 pública)	 e	 2)	 a	 intensa	 sujeição	 a	 limitações	 e	 a
regras	protetivas	de	direito	administrativo	(regime	jurídico	público).	No	entanto,
há	que	se	afastar	a	ideia	de	que	exista	um	regime	jurídico	unificado	para	todos
eles.	Os	regimes	são	múltiplos,	incontáveis	e	variam	não	apenas	de	acordo	com	a
espécie	de	bem	público,	mas	conforme	seu	enquadramento	como	bem	afetado	ou
não	afetado.
Não	 constitui	 objetivo	 dessa	 exposição	 refazer	 uma	 teoria	 geral	 dos
bens	 estatais	 públicos,	 mas	 apenas	 oferecer	 as	 bases	 para	 a	 compreensão	 dos
bens	municipais	na	federação	brasileira.	Por	consequência,	a	título	introdutório,
basta	 frisar	 que	 os	 bens	 de	 uso	 comum	 do	 povo	 e	 os	 bens	 de	 uso	 especial
caracterizam-se:	1)	pela	afetação	a	um	uso	primário,	que	não	exclui	a	princípio
usos	secundários	que	com	ele	se	harmonizem;	2)	pela	regra	da	inalienabilidade
relativa,	ou	seja,	restrita	ao	comércio	privado,	mas	não	impeditiva	do	comércio
público;	3)	pela	regra	da	imprescritibilidade,	pela	qual	nenhum	deles	se	sujeita	à
prescrição	 aquisitiva	 (usucapião);	 4)	 pela	 regra	 da	 não	 oneração	 por	 garantias
reais	e	5)	pela	impenhorabilidade	judicial.
A	seu	turno,	os	bens	públicos	não	afetados,	que	se	circunscrevem	aos
dominicais,	singularizam-se:	1)	pela	ausência	de	afetação	a	certo	uso	primário,
razão	pela	qual	não	há	uma	prioridade	normativa	de	destinação;	2)	pela	regra	da
alienabilidade,	respeitados	requisitos	licitatórios	e	certas	vedações	de	aquisição;
[1]
	3)	pela	possibilidade	de	oneração	por	garantias	reais;	4)	pela	impossibilidade
de	aquisição	por	usucapião;
[2]
	5)	pela	impenhorabilidade	judicial	que	deriva	não
da	 afetação	 do	 bem,	 mas	 da	 existência	 de	 um	 regime	 de	 precatórios	 que
beneficia	seus	titulares,	pessoas	jurídicas	de	direito	público	interno.
[3]
3									Bens	estatais	na	federação	brasileira						
A	estruturação	da	federação	brasileira	a	partir	da	Constituição	de	1891
e	 sua	 posterior	 reconfiguração	 em	 uma	 estrutura	 política	 tripartite	 pela
Constituição	de	1988	ensejam	a	definição,	no	plano	normativo,	de	um	conjunto
mínimo	 de	 regras	 de	 divisão	 do	 patrimônio	 estatal	 no	 intuito	 de	 se	 evitarem
conflitos	entre	os	entes	políticos	e	de	se	viabilizar	em	suas	autonomias,	inclusive
para	 criação	 e	 execução	 de	 políticas	 públicas.	 Por	 esses	 e	 outros	 motivos,	 as
Constituições	 brasileiras	 sempre	 destacaram	 os	 bens	 da	 União	 e	 os	 bens	 dos
Estados	federados.
A	 Constituição	 da	 República	 de	 1988	 não	 fugiu	 à	 tradição.	 Nela
existem	dispositivos	que	apontam	e	repartem	os	bens	dos	entes	políticos.	Dentre
eles,	merecem	 destaque	 o	 art.	 20	 (referente	 aos	 bens	 da	União)
[4]
	 e	 o	 art.	 26
(relativo	 aos	 bens	 dos	Estados	 federados).
[5]
Há	 igualmente	 outras	 disposições
esparsas	que	apontam	o	patrimônio	dos	entes	políticos,	como	o	art.	176,	que	trata
das	 jazidas	 e	 dos	 potenciais	 de	 energia	 hidráulica,	 considerados	 bens	 federais
monopolizados.
Não	 obstante	 a	 Constituição	 de	 1988	 tenha	 adotado	 um	 sistema
federativo	tripartite,	conforme	o	qual	se	alçou	o	Municípioà	qualidade	de	ente
autônomo	 (art.	 1º	 e	 18),	 na	 realidade	 o	 legislador	 pouco	 modificou	 os
dispositivos	 relativos	 aos	bens	 reservados.	A	Carta	 abordou	de	modo	 explícito
somente	 os	 bens	 federais	 e	 estaduais,	 ignorando	 os	 municipais.	 Todavia,	 a
interpretação	 sistemática	 da	 Constituição	 e	 de	 outros	 diplomas	 atinentes	 à
matéria,	 como	 o	 Código	 Civil	 e	 a	 legislação	 especial,	 permite	 superar	 essa
lacuna.	 Permite,	 ademais,	 lançar	 afirmações	 iniciais	 relevantes	 a	 respeito	 do
arcabouço	normativo	da	matéria,	quais	sejam:
·	 	 	 	 	 	As	listagens	contidas	nos	art.	20	e	26	indicam	bens	reservados	da
União	e	dos	Estados.	Desse	modo,	há	que	se	interpretá-los	de	maneira
restritiva,	 pois	 as	 técnicas	 de	 monopolização	 artificial	 em	 favor	 do
Estado,	 como	medidas	de	 restrição	da	vida	 e	da	propriedade	privada,
não	aceitam	extensão	sem	respaldo	legal	explícito.
·						A	indicação	dos	bens	federais	e	estaduais	na	Constituição	não	obsta
que	 o	 patrimônio	 desses	 entes	 políticos	 englobe	 outras	 espécies	 de
bens.	 Os	 artigos	 constitucionais	 se	 referem	 unicamente	 aos	 bens
estratégicos	ao	país	e	de	sua	reserva	a	um	ou	outro	ente	político.
·	 	 	 	 	 	Por	conseguinte,	o	fato	de	a	Constituição	não	ter	enumerado	bens
dos	 Municípios	 de	 forma	 expressa	 não	 significa	 que	 o	 poder
constituinte	 tenha	 negado	 a	 existência	 de	 um	 patrimônio	 local
individualizado	e	sujeito	à	gestão	autônoma,	nem	que	 tenha	vedado	a
reserva	 de	 bens	 aos	 Municípios	 por	 determinação	 de	 normas
infraconstitucionais,	 como	 as	 existentes	 no	 Código	 Civil	 ou	 na
legislação	de	loteamentos.
·	 	 	 	 	 	A	Constituição,	por	fim,	não	qualifica	os	bens	listados	no	art.	20	e
26	como	bens	públicos,	mas	simplesmente	como	federais	e	estaduais.
Isso	reforça	a	tese	já	apontada,	pela	qual	se	deve	apartar	o	conceito	de
bens	estatais,	como	categoria	geral,	do	conceito	de	bens	públicos,	como
conjunto	 restrito	 aos	 bens	 de	 pessoas	 estatais	 com	 personalidade	 de
direito	público	interno.	Embora	os	bens	reservados	venham	a	ser	bens
públicos,	nada	impede	que	se	tornem	bens	privados	ao	ingressarem	no
patrimônio	de	entidades	estatais	de	direito	privado,	como	sociedades	de
economia	mista.	Igual	conclusão	vale	sem	reparos	ou	adaptações	para
os	 bens	 municipais,	 que	 serão	 públicos	 quando	 pertencentes	 às
entidades	 locais	 de	 direito	 público	 ou	 bens	 particulares,	 quando
pertencentes	 às	 entidades	 locais	 de	 direito	 privado.	 Isso	 revela	 que
“estatal”	e	“público”	não	correspondem	a	adjetivos	sinônimos	quando
se	ingressa	no	direito	administrativo	dos	bens.
.
4									Bens	municipais	reservados
Conquanto	 a	Constituição	 da	República	 silencie	 em	 relação	 aos	 bens
municipais,	é	inerente	a	qualquer	ente	autônomo	a	existência	de	um	patrimônio
individualizado	 minimamente	 necessário	 à	 sua	 sobrevivência	 autônoma	 na
federação	 e	 à	 execução	 de	 suas	 incumbências	 constitucionais,	 sobretudo	 a
execução	de	políticas	públicas.	Como	os	bens	municipais	representam	um	pilar
essencial	 da	 autonomia	 local,	 eles	 estão	 implícitos	 na	 estrutura	 federativa
tripartite	 ancorada	 no	 texto	 constitucional.	 Em	 outras	 palavras,	 a	 garantia
constitucional,	 ainda	 que	 não	 expressa,	 de	 um	 patrimônio	 mínimo	 configura
requisito	 essencial	 ao	 reconhecimento	 do	 Município	 como	 verdadeiro	 ente
político.		 	 	 	 	 	 	 	 	 	 	 	 	 	 	No	cotidiano	da	gestão	pública,	a	formação	do	patrimônio
municipal	 se	 opera	 de	 várias	 maneiras,	 a	 saber:	 1)	 por	 meio	 de	 instrumentos
negociais,	como	a	doação	e	a	compra	e	venda;	2)	pela	aplicação	de	instrumentos
típicos	de	direito	administrativo,	 como	a	desapropriação	ou	os	convênios;	 e	3)
por	 mecanismos	 de	 reserva	 patrimonial,	 não	 previstos	 de	 modo	 geral	 na
Constituição,	mas	consagrados	em	normas	legais	diversas.
A	 única	 situação	 em	 que	 a	 Constituição	 da	 República	 previu	 bem
reservado	 ao	Município	 se	 encontra	 no	 art.	 20,	 inciso	 IV,	 dispositivo	 que	 lhe
garante	 a	 propriedade	 de	 ilhas	 costeiras	 nas	 quais	 se	 incluam	 suas	 sedes
políticas,	com	exceção	das	áreas	necessárias	a	serviços	ou	a	unidades	ambientais
da	União.	Afora	essa	excepcionalíssima	previsão	constitucional,	 a	 consagração
de	 bens	municipais	 reservados	 resultará	 somente	 de	 dispositivos	 de	 hierarquia
legal,	dentre	os	quais	merecem	registro:
·						O	art.	22	da	Lei	n.	6.766/1979,	pelo	qual,	“desde	a	data	de	registro
do	 loteamento,	 passam	 a	 integrar	 o	 domínio	 do	Município,	 as	 vias	 e
praças,	 os	 espaços	 livres	 e	 as	 áreas	 destinadas	 a	 edifícios	 públicos	 e
outros	 equipamentos	 urbanos,	 constantes	 do	 projeto	 e	 do	 memorial
descritivo”.
·	 	 	 	 	 	O	 art.	 1.237	 do	 Código	 Civil,	 de	 acordo	 com	 o	 qual	 um	 bem
descoberto	cujo	proprietário	não	se	apresente	no	prazo	de	sessenta	dias
da	 divulgação	 da	 notícia	 na	 imprensa,	 ou	 do	 edital,	 será	 vendido	 em
hasta	 pública	 e	 do	 seu	 valor	 serão	 deduzidas	 as	 despesas	 e	 a
recompensa	 do	 descobridor,	 cabendo	 o	 valor	 remanescente	 ao
Município	 em	 que	 se	 deparou	 o	 objeto	 perdido.	 Ainda	 que	 não
explícito	 no	 Código,	 entende-se	 que	 o	 insucesso	 da	 venda	 em	 hasta
permitirá	a	manutenção	do	bem	no	patrimônio	 local,	 facultando-se	ao
Município,	aí	sim	por	disposição	expressa,	abandonar	a	coisa	em	favor
do	 descobridor	 caso	 seja	 ela	 de	 diminuto	 valor.	 Não	 bastasse	 isso,
como	já	se	defendeu	anteriormente,	afigura-se	igualmente	aceitável	que
o	Município	mantenha	o	bem	em	seu	patrimônio,	deixando	de	levá-lo	a
hasta	pública,	caso	o	interesse	público	e	o	princípio	da	eficiência	assim
o	 recomende.
[6]
Por	 interpretação	 negativa	 do	 Código	 Civil,	 igual
conclusão	 vale	 na	 hipótese	 de	 um	 bem	 descoberto	 de	 alto	 valor	 ser
levado	a	hasta	pública,	mas	não	se	lograr	sua	alienação.
·						O	art.	39,	parágrafo	único	do	Código	Civil,	de	acordo	com	o	qual	os
bens	 de	 heranças	 vacantes	 passam	 ao	 patrimônio	 municipal	 se	 o
ausente	 não	 regressar	 e	 nenhum	 interessado	 promover	 a	 sucessão
definitiva	no	prazo	de	dez	anos;	e
·	 	 	 	 	 	Os	 art.	 28	 a	 31	 do	 Estatuto	 da	Cidade,	 nos	 quais	 se	 reserva	 ao
Município	a	propriedade	do	solo	criado,	ou	seja,	do	direito	imaterial	de
construir	na	margem	de	edificação	existente	entre	o	coeficiente	básico
e	 o	 coeficiente	 máximo	 relativo	 ao	 terreno,	 desde	 que	 o	 direito
imaterial	de	construção	seja	criado	por	lei	local.	
Além	 dos	 mandamentos	 previstos	 em	 leis	 editadas	 pelo	 Congresso
Nacional,	nada	impede	que	os	Estados	da	federação,	por	disposições	contidas	em
suas	 Constituições	 ou	 em	 lei	 estadual,	 transfiram	 certos	 bens	 aos	Municípios,
como	parcela	de	suas	terras	devolutas.	Referida	medida	é	cabível,	desde	que	não
se	 repute	 um	 bem	 estadual	 reservado	 simultaneamente	 como	 um	 bem
monopolizado	 ou	 exclusivo	 do	 Estado.	 Afinal,	 há	 casos	 em	 que	 a	 reserva
constitucional	de	bens	representa	efetiva	monopolização	patrimonial.	Isso	ocorre
em	relação	a	águas	públicas,	não	por	disposição	expressa	em	norma,	mas	por	sua
própria	 natureza	 física	 e	 relevância	 social	 e	 econômica	 para	 a	 comunidade	 de
municípios	 inserida	em	cada	Estado.	Por	essa	 razão,	 seria	 inconstitucional	que
um	Estado	repassasse	a	titularidade	de	seu	domínio	hídrico	a	qualquer	ente	local.
5									Aquisição	de	bens	municipais:	outras	modalidades
Afora	 a	 aquisição	 forçosa	 de	 bens	 por	 transferência	 compulsória
prevista	 na	 Lei	 de	 Loteamentos	 ou	 por	 recebimento	 de	 bens	 descobertos	 e
pertencentes	a	heranças	vacantes,	o	direito	positivo	brasileiro	alberga	uma	série
de	outras	modalidades	de	aquisição	de	bens	pelos	Municípios.	Diversos	desses
mecanismos	são	típicos	do	direito	administrativo	e	baseiam-se	ora	no	poder	de
autoridade,	ora	no	poder	negocial.	Em	outros	casos,	a	 formaçãodo	patrimônio
municipal	se	dá	por	instrumentos	comuns	de	direito	privado.
Na	 lista	 a	 seguir,	 oferece-se	 um	 panorama	 primário	 das	 várias
modalidades	aquisitivas,	incluindo-se	institutos	de	direito	público	e	privado.
5.1									Desapropriação
No	direito	 positivo	 brasileiro,	 existem	 basicamente	 cinco	 espécies	 de
desapropriação.	As	duas	espécies	tradicionais	baseiam-se	em	interesses	públicos
primários,	 ou	 seja,	 em	 causas	 de	 utilidade	 pública,	 necessidade	 pública	 ou
interesse	social	e	impõem	ao	Estado	a	indenização	justa,	prévia	e	em	dinheiro	ao
proprietário	 afetado.	 Em	 adição,	 prevê	 o	 ordenamento	 três	 modalidades
sancionatórias:	 a	 desapropriação	 por	 descumprimento	 da	 função	 social	 da
propriedade	 rural,	 voltada	 para	 fins	 de	 reforma	 agrária;	 a	 desapropriação
sancionatória	urbana	decorrente	do	descumprimento	da	função	social	do	imóvel
urbano	e	a	desapropriação	confiscatória,	hoje	incidente	sobre	imóveis	rurais	ou
urbanos	com	a	finalidade	de	combater	o	 trabalho	escravo	ou	a	plantação	ilícita
de	 psicotrópicos.
[7]
	 Aos	 Municípios	 se	 autoriza	 empregar	 as	 desapropriações
tradicionais	e,	com	exclusividade,	a	desapropriação	sancionatória	urbana.	Nesse
último	caso,	a	desapropriação	depende	da	observância	prévia	de	dois	requisitos:
1)	o	descumprimento,	pelo	proprietário,	da	determinação	local	de	edificação	ou
de	parcelamento	compulsório	do	imóvel	e	2)	a	imposição	de	IPTU	progressivo
ao	 longo	 de,	 pelo	 menos,	 cinco	 anos,	 como	 forma	 de	 forçar	 a	 adequação	 da
propriedade	privada	à	determinação	de	edificação	ou	parcelamento	descumprida.
Somente	após	o	uso	desses	dois	instrumentos	urbanísticos	é	que	caberá	executar
a	 desapropriação	 sancionatória.	 Já	 as	 desapropriações	 para	 fins	 de	 reforma
agrária	e	a	confiscatória	para	combate	a	plantações	de	psicotrópicos	e	 trabalho
escravo	não	estão	 sob	competência	municipal,	 razão	pela	qual	não	configuram
meios	aptos	à	aquisição	de	bens	para	os	entes	locais.
5.2									Transferência	ou	doação	compulsória
Além	da	transferência	patrimonial	obrigatória	de	áreas	previstas	na	Lei
de	 Loteamentos	 e	 de	 bens	 descobertos,	 é	 possível	 enquadrar	 nessa	 categoria
todas	 as	 medidas	 jurídicas	 que	 gerem	 bens	 municipais,	 como	 eventuais
condicionantes	 em	 licenciamentos	 urbanísticos	 e	 ambientais	 (aqui,	 caso	 haja
competência	do	Município).	
5.3									Reversão	de	bens
Como	 modalidade	 especial	 de	 transferência	 compulsória	 de	 bens	 ao
Estado	desponta	a	 reversão.	Nos	 termos	do	art.	35,	§	2º	da	Lei	n.	8.987/1995,
uma	 vez	 extinta	 a	 concessão	 de	 serviço	 público	 ou	 de	 obra	 pública,	 “haverá
imediata	 assunção	 do	 serviço	 pelo	 poder	 concedente,	 procedendo-se	 aos
levantamentos,	 avaliações	 e	 liquidações	 necessários”.	 A	 assunção	 do	 serviço
pelo	Estado	supõe	o	recebimento	de	bens	essenciais	à	sua	continuidade,	ou	seja,
dos	 bens	 reversíveis.	 De	 acordo	 com	 a	 lei	 geral	 de	 concessões,	 o	 edital	 e	 o
contrato	 indicarão	 referido	 conjunto	 patrimonial,	 suas	 características	 e	 as
condições	em	que	será	posto	à	disposição	no	ato	de	extinção	da	concessão	(art.
18,	X	e	XI	e	art.	23,	X).	Na	prática,	os	reversíveis	abrangem	três	categorias	de
bens:	1)	aqueles	que	já	estavam	no	patrimônio	do	Estado,	vinculados	à	prestação
dos	 serviços	 e	 foram	 transferidos	 ao	 particular	 por	 força	 do	 instrumento
concessório;	 2)	 os	 bens	 provenientes	 do	 patrimônio	 do	 concessionário	 ou	 que
são	 por	 ele	 adquiridos	 ao	 longo	 do	 contrato	 e	 que,	 por	 sua	 relevância	 para	 a
continuidade,	passam	às	mãos	do	Estado	e	3)	os	bens	de	terceiros,	essenciais	ao
serviço.	 Nesse	 último	 caso,	 como	 preleciona	 Floriano	 de	 Azevedo	 Marques
Neto,
[8]
	 ao	 final	 da	 concessão,	 o	Poder	Público	 se	 substitui	 ao	 concessionário
nas	relações	obrigacionais	e	reais	que	ele	matinha	com	terceiros	proprietários	de
bens	 reversíveis.	 Para	 além	 disso,	 vale	 ressaltar	 que,	 apesar	 de	 estarem
relacionados	 com	 a	 concessão	 comum	na	 tradição	 administrativa	 brasileira,	 os
bens	 reversíveis	 existem	 em	 todo	 e	 qualquer	 tipo	 de	 delegação	 de	 serviços	 e
infraestruturas	 públicas	 a	 particulares,	 desde	 parcerias	 público-privadas,	 até
relações	contratuais	de	fomento	e	parcerias	sociais.
5.4									Perdimento	de	bens
Diferentemente	 do	 que	 ocorre	 nas	 situações	 de	 transferência	 ou
reversão,	 o	 perdimento	pressupõe	o	 cometimento	de	um	 ilícito	 pelo	particular,
daí	sua	natureza	sancionatória	e,	por	conseguinte,	a	 imprescindibilidade	de	sua
previsão	legal.	Como	se	trata	de	medida	punitiva	por	meio	de	constrangimento
patrimonial,	 aplica-se	 a	 reserva	 legal	 constitucional.	 Exatamente	 por	 isso,	 a
Constituição	 da	República	 dispõe	 que	 o	 perdimento	 de	 bens,	 como	medida	 de
natureza	repressiva,	esteja	previsto	em	lei	e,	de	modo	excepcional,	permite	que
se	o	execute	inclusive	contra	os	sucessores	do	condenado	até	o	limite	dos	valores
patrimoniais	 que	 lhes	 tenha	 sido	 transferido	 (art.	 5º,	 XLVI).	 Menciona	 ainda
alguns	casos	em	que	o	perdimento	se	impõe,	i.e.,	mostra-se	obrigatório.	Isso	se
verifica	 no	 art.	 243,	 parágrafo	 único,	 com	 redação	 dada	 pela	 Emenda
Constitucional	n.	81/2014.	Prescreve	o	dispositivo	que	“todo	e	qualquer	bem	de
valor	econômico	apreendido	em	decorrência	do	tráfico	ilícito	de	entorpecentes	e
drogas	 afins	 e	da	 exploração	de	 trabalho	 escravo	 será	 confiscado	e	 reverterá	 a
fundo	 especial	 com	 destinação	 específica,	 na	 forma	 da	 lei”.	 Na	 legislação
infraconstitucional	 identificam-se	 modalidades	 adicionais	 de	 perdimento	 de
bens,	valendo	mencionar	três	delas.	A	primeira	se	encontra	no	campo	tributário
(Lei	n.	10.833/2003,	art.	75);	a	segunda,	na	Lei	de	Improbidade	Administrativa
(Lei	 n.	 8.429/1992)	 e	 a	 terceira,	 como	 medida	 sancionatória	 civil	 da	 Lei
Anticorrupção	 (Lei	 n.12.846/2012,	 art.	 19,	 inciso	 I).	 De	 todas	 as	 hipóteses
mencionadas,	o	perdimento	previsto	 em	 razão	de	condenação	por	 improbidade
administrativa	 e	 por	 ato	 de	 corrupção	 despontam	 como	meios	 de	 aquisição	 de
bens	municipais.
5.5									Consórcio	imobiliário
Criado	 pelo	 Estatuto	 da	 Cidade,	 tem-se	 na	 figura	 em	 tela	 um
mecanismo	de	urbanização	negociada	e	contratual,
[9]
	pela	qual	o	Município	se
dispõe	a	colaborar	com	o	particular	que	foi	obrigado	a	edificar	ou	a	parcelar	seu
imóvel	 por	 reconhecimento	 objetivo	 do	 descumprimento	 da	 função	 social
urbana.	O	dever	de	edificar	ou	parcelar	no	caso	concreto	surge	após	notificação
feita	 pelas	 autoridades	 urbanísticas	 locais.	 Seu	 descumprimento	 resulta	 na
possibilidade	 de	 imposição	 de	 IPTU	 progressivo	 e,	 após	 cinco	 anos,	 na
autorização	para	se	decretar	a	desapropriação	sancionatória	urbana.	Sucede	que
o	Município,	 em	vez	de	percorrer	 caminho	 tão	 longo,	 recebeu	permissão	 legal
para	optar	pelo	consórcio	 imobiliário.	Nos	 termos	do	art.	46,	§	1º	do	Estatuto,
trata-se	 de	 “forma	de	 viabilização	 de	 planos	 de	 urbanização	 ou	 edificação	 por
meio	da	qual	o	proprietário	transfere	ao	Poder	Público	municipal	seu	imóvel	e,
após	 a	 realização	 das	 obras,	 recebe,	 como	 pagamento,	 unidades	 imobiliárias
devidamente	urbanizadas	ou	edificadas”.	Daí	se	extrai	que	o	consórcio	depende
de	 previsão	 em	 legislação	 local,	 manifestação	 formal	 de	 interesse	 pelo
proprietário	privado,	condições	financeiras	do	Município	para	assumir	a	obra	e
sua	 manifestação	 formal	 de	 interesse	 pelo	 negócio	 de	 acordo	 com	 um	 juízo
administrativo	 de	 conveniência	 e	 oportunidade.
[10]
Cumpridos	 todos	 esses
requisitos,	 o	Município	 absorverá	 a	 propriedade	 privada	 em	 seu	 patrimônio	 e
assumirá	 a	 tarefa	 de	 adaptá-la	 às	 diretrizes	 de	 política	 urbana.	 Nesse	 cenário,
duas	 serão	 suas	 obrigações:	 1)	 harmonizar	 o	 imóvel	 à	 função	 social	 urbanaestabelecida	 no	 plano	 diretor	 e	 em	 legislação	 dele	 decorrente	 e	 2)	 repassar	 ao
proprietário	originário	parte	do	 imóvel	 após	 a	 sua	 adaptação	como	maneira	de
lhe	ressarcir	pelo	valor	originário	do	bem	antes	da	realização	das	obras.	Diante
de	sua	eventual	incapacidade	financeira	ou	por	juízo	de	conveniência,	a	doutrina
especializada,	incluindo	as	vozes	de	Daniela	Libório	Di	Sarno	e	Guilherme	Dias
Reisdorfer,	 ainda	 reconhece	 a	 possibilidade	 de	 o	 Município	 repassar	 a	 outro
particular	a	operacionalização	das	funções	urbanísticas.
[11]
5.6									Compra	ordinária
O	 exame	 da	 legislação	 administrativa	mostra	 que	 a	 desapropriação	 e
outros	 institutos	 baseados	 no	 poder	 de	 autoridade	 não	 esgotam	 as	 ferramentas
aquisitivas	 de	 que	 dispõe	 o	 Estado.	 O	 uso	 de	 mecanismos	 típicos	 do	 direito
privado	 é	 frequente	 no	 direito	 administrativo,	 embora	 sigam	 algumas	 normas
especiais	de	caráter	publicístico.	Nesse	sentido,	a	compra
[12]
	de	bens	móveis	e
imóveis	 desponta	 como	 um	 dos	 principais	 mecanismos	 de	 aquisição	 de
propriedade,	 inclusive	 de	 imóveis.	 Quando	 envolve	 móveis,	 geralmente	 o
contrato	 de	 fornecimento	 de	 bens	 é	 precedido	 de	 licitação.	 No	 tocante	 aos
imóveis,	as	 regras	são	mais	complicadas.	A	Lei	de	Licitações	(Lei	8.666/1993,
art.	4,	X)	prevê	a	possibilidade	de	dispensa	de	licitação	para	“compra	ou	locação
de	imóvel	destinado	ao	atendimento	das	finalidades	precípuas	da	administração,
cujas	necessidades	de	instalação	e	localização	condicionem	a	sua	escolha,	desde
que	o	preço	seja	compatível	com	o	valor	de	mercado,	segundo	avaliação	prévia”
(g.n.).	 Na	 prática,	 ainda	 que	 a	 legislação	 tenha	 incluído	 tal	 hipótese	 como
dispensa,	 ela	 se	 aproxima	 muito	 mais	 da	 figura	 da	 inexigibilidade,	 pois	 se	 o
imóvel	 detiver	 características	 especiais,	 então	 se	 supõe	 que	 não	 haverá
concorrentes	 para	 viabilizar	 uma	 competição.	 Também	 existe	 dispensa	 para
compra	e	venda	de	imóveis	entre	entes	públicos	de	qualquer	esfera	da	federação.
Por	 conseguinte,	o	Município	poderá	obter	 imóvel	do	Estado	ou	da	União	por
meio	da	celebração	direta	do	contrato	(art.	17,	I	e	da	Lei	de	Licitações).
5.7									Compra	por	preempção
Ao	 se	 caminhar	 para	 o	 direito	 municipal	 e	 urbanístico,	 encontra-se
outro	instituto	ligado	à	compra	e	venda	de	bens	imóveis.	Trata-se	do	direito	de
preempção	 previsto	 no	Estatuto	 da	Cidade	 (art.	 25),	 ou	 seja,	 de	 um	direito	 de
preferência	na	aquisição	de	 imóveis	 localizados	em	certas	áreas	marcadas	pelo
Plano	 Diretor	 municipal.	 Como	 o	 instrumento	 se	 associa	 à	 política	 de
desenvolvimento	urbano,	para	que	 sua	 instituição	 seja	válida,	 é	preciso	que	os
imóveis	 atingidos	 pela	 preferência	 se	 mostrem	 relevantes	 para	 regularização
fundiária,	execução	de	programa	habitacional	de	interesse	social,	constituição	de
reserva	 fundiária,	 ordenamento	 da	 expansão	 urbana,	 implantação	 de
equipamentos	 urbanos	 e	 comunitários,	 criação	 de	 espaços	 públicos	 de	 lazer	 e
áreas	verdes,	 criação	de	unidades	de	conservação,	bem	como	para	proteção	de
áreas	 de	 interesse	 ambiental,	 histórico,	 cultural	 ou	 paisagístico.	 Imposta	 a
preempção,	“o	proprietário	que	alienar	seu	imóvel	sem	oferecê-lo	à	compra	pelo
Município	 estará	 sujeito	 a	 uma	 série	 de	 implicações,	 quais	 sejam:	 (1)	 a
declaração	de	nulidade	do	contrato	celebrado	com	o	adquirente	particular,	o	que
naturalmente	 dependerá	 de	 sentença	 judicial;	 (2)	 a	 execução	 forçada	 da
preferência	de	compra	pelo	ente	local	e	(3)	a	imposição	de	pagamento	do	imóvel
a	 partir	 do	 valor	 da	 base	 de	 cálculo	 do	 IPTU	 ou	 pelo	 valor	 da	 proposta	 do
contrato	privado,	 se	este	 for	 inferior	ao	primeiro.	Nesse	cenário,	o	Estado	será
privilegiado	com	um	poder	de	compra	exequível	facultativamente	e	com	o	poder
de	impor	um	preço	com	evidente	natureza	sancionatória.	Reitere-se,	porém,	que
todas	as	consequências	previstas	em	lei	somente	serão	aceitáveis	e	válidas	caso	o
Estado	 deseje,	 de	 fato,	 realizar	 a	 aquisição	 do	 bem	 para	 executar	 sua	 política
urbanística”.
[13]
5.8									Permuta
A	 troca	de	bens	ou	permuta	 configura	modalidade	de	 constituição	de
bens	municipais	bastante	 comum.	Pela	Lei	de	Licitações	 (art.	 17,	 I,	 c),	não	há
ressalva	 em	 relação	 ao	 contratante,	 de	 modo	 que	 se	 faculta	 à	 Administração
celebrar	 esse	 tipo	 de	 contrato	 com	 ente	 público	 ou	 privado.	 No	 entanto,	 a
permuta	de	bem	 imóveis	 somente	poderá	 ser	 realizada	 sem	 licitação	quando	o
imóvel	 recebido	pelo	Município	 for	 “destinado	 ao	 atendimento	das	 finalidades
precípuas	 da	 administração,	 cujas	 necessidades	 de	 instalação	 e	 localização
condicionem	a	sua	escolha...”	(art.	24,	X).	Já	no	caso	dos	móveis,	a	permuta	será
igualmente	 possível	 sem	 licitação,	 mas	 apenas	 entre	 órgãos	 ou	 entidades	 da
Administração	Pública	(art.	17,	II,	b).	Registre-se,	por	oportuno,	que	há	dúvidas
sobre	a	constitucionalidade	de	algumas	das	 restrições	 legais	mencionadas,	pois
elas	 exorbitariam	 o	 campo	 das	 normas	 gerais	 de	 licitações	 e	 invadiriam	 a
autonomia	 estadual	 e	 municipal.
[14]
	 A	 despeito	 dessa	 discussão,	 envolva	 a
permuta	 móvel	 ou	 imóvel	 e	 seja	 ela	 precedida	 ou	 não	 de	 licitação,	 será
imprescindível	 que	 os	 bens	 permutados	 demonstrem	 valor	 semelhante.	 Isso
decorre	 expressamente	 da	 Lei	 n.8.429/1992,	 cujo	 art.	 10	 considera	 ato	 de
improbidade	 por	 lesão	 ao	 patrimônio	 público	 “IV	 –	 permitir	 ou	 facilitar	 a
alienação,	permuta	ou	locação	de	bem	integrante	do	patrimônio	de	qualquer	das
entidades	 (...)	por	preço	 inferior	 ao	de	mercado”	e	“V	–	permitir	ou	 facilitar	 a
aquisição,	 permuta	 ou	 locação	 de	 bem	 ou	 serviço	 por	 preço	 superior	 ao	 de
mercado”	 (g.n.).	 Em	 adição,	 é	 preciso	 verificar	 se	 o	 bem	 a	 ser	 recebido	 pelo
Município	 na	 permuta	 se	 mostrará	 útil	 para	 fins	 públicos,	 afigurando-se
incabível	o	uso	do	instituto	para	obtenção	de	bem	sem	destinação	previsível	ou
com	o	intuito	de	enriquecer	indevidamente	a	outra	parte	contratante.
5.9									Dação	em	pagamento	e	adjudicação
Além	da	permuta,	a	dação	em	pagamento	serve	para	que	o	Município
receba	 bens	 em	 troca	 do	 pagamento	 de	 dívidas	 não	 saldadas	 em	 dinheiro,
inclusive	bens	por	meio	de	adjudicação	judicial.	Na	Lei	de	Licitações,	permite-
se	 ao	 ente	 público	 a	 alienação	 posterior	 desses	 bens	 desde	 que	 realizada
avaliação	 prévia,	 demonstrada	 a	 vantagem	 ou	 necessidade	 da	 alienação	 e
realizada	licitação	na	modalidade	de	concorrência	ou	leilão	(art.	19).	Conquanto
a	lei	mencione	de	modo	expresso	apenas	os	imóveis,	não	parece	haver	prejuízo
de	extensão	da	regra	a	móveis.	
5.10					Doações	puras	ou	condicionadas
Os	 Municípios,	 além	 de	 se	 beneficiarem	 de	 mecanismos	 de
transferência	 compulsória	 da	 propriedade,	 estão	 autorizados	 a	 receber	 bens,
públicos	 ou	 particulares,	 por	 doação.	 É	 imperioso	 que	 o	 ente	 local	 avalie	 os
impactos	 da	 doação,	 sobretudo	 em	 termos	 de	 custos	 de	 manutenção	 e
conservação	do	bem.	Na	doação	realizada	por	ente	público	a	favor	do	Município,
dispensa-se	a	licitação	pelo	doador,	seja	para	bens	imóveis	ou	móveis.	No	caso
dos	móveis,	a	Lei	de	Licitação	exige	que	o	bem	doado	seja	utilizado	para	 fins
sociais	 (art.	 17,	 II,	 a).	 Em	 relação	 aos	 imóveis,	 dispõe	 a	 lei	 que,	 “cessadas	 as
razões	que	justificaram	a	sua	doação,	reverterão	ao	patrimônio	da	pessoa	jurídica
doadora,	vedada	a	sua	alienação	pelo	beneficiário”	(art.	17,	§	1º).	Desde	que	se
considerem	 constitucionais	 essas	 restrições	 legais,
[15]
	 o	 Município	 que	 se
beneficiar	de	doação	de	imóvel	federal	ou	estadual	terá	que	devolver	o	bem	caso
desapareçam	 os	 motivos	 públicos	 que	 ensejaram	 a	 doação.	 No	 tocante	 às
doações	condicionais	feitas	porparticulares,	a	aprovação	do	encargo	que	recairá
sobre	 o	 ente	 local	 deverá	 ser	 avaliada	 e	 aprovada	 de	 modo	 expresso.	 Nessas
situações,	 sem	 prejuízo	 de	 iniciativa	 própria	 do	 doador,	 é	 possível	 que	 o
Município	induza	doações,	por	exemplo,	mediante	abertura	de	procedimento	de
seleção	 específico	 no	 qual	 ou	 o	Município	 fixe	 o	 encargo	 e	 escolha	 o	 doador
com	base	em	um	critério	relativo	à	maior	vantagem	gerada	pelo	bem	doado.	De
maneira	alternativa,	o	Município	poderá	simplesmente	selecionar	os	doadores	de
acordo	 com	 uma	 avaliação	 conjunta	 da	 vantajosidade	 do	 bem	 e	 do	 encargo
livremente	fixado	pelo	particular.	
5.11					Sucessão	testamentária
Além	de	receber	os	bens	da	herança	vacante	por	determinação	explícita
do	Código	Civil,	é	possível	que	particulares	deixem	voluntariamente	parte	de	sua
herança	para	o	Estado,	incluindo	os	Municípios.	Não	há	óbice	a	tanto,	na	medida
em	que	o	art.	1.799	do	Código	permite	que	pessoas	jurídicas	sejam	chamadas	à
sucessão.	 Observe-se,	 porém,	 que	 o	 ente	 local	 pode	 aceitar	 ou	 renunciar	 a
herança,	 opção	 que	 depende	 de	 juízo	 prévio	 acerca	 da	 conveniência	 e
oportunidade	do	 recebimento	dos	bens	 e	de	 suas	 consequências	patrimoniais	 e
orçamentárias,	sobretudo	quando	eles	vierem	acompanhados	de	algum	encargo.
Uma	 vez	 feita,	 a	 renúncia	 da	 herança	 atingirá	 os	 bens	 por	 completo,	 não
podendo	 ser	 parcial	 ou	 feita	 sob	 condição	 ou	 termo.	 Além	 disso,	 o	 ato	 será
irrevogável	(art.	1.808	e	1.812).
5.12					Usucapião
Não	é	 raro	que	os	Municípios	adquiram	bens	por	meio	da	usucapião,
modalidade	 de	 prescrição	 aquisitiva	 do	 direito	 de	 propriedade.	Nos	 termos	 do
art.	1.238	do	Código	Civil,	“aquele	que,	por	quinze	anos,	sem	interrupção,	nem
oposição,	 possuir	 como	 seu	 um	 imóvel,	 adquire-lhe	 a	 propriedade,
independentemente	 de	 título	 e	 boa-fé;	 podendo	 requerer	 ao	 juiz	 que	 assim	 o
declare	 por	 sentença,	 a	 qual	 servirá	 de	 título	 para	 o	 registro	 no	 Cartório	 de
Registro	 de	 Imóveis”.	 Diante	 de	 justo	 título	 e	 boa-fé	 ou	 em	 razão	 de	 obras	 e
serviços	produtivos	realizados	no	imóvel,	o	prazo	diminuirá	para	10	anos.	Para
os	móveis,	os	prazos	são	de	três	anos,	na	existência	de	justo	título	e	boa-fé,	e	de
cinco	anos	para	demais	situações.	A	usucapião	como	mecanismo	de	aquisição	da
propriedade	 se	 restringe	 a	 bens	 particulares,	 na	 medida	 em	 que	 os	 estatais
públicos,	 inclusive	 os	 dominicais,	 caracterizam-se	 pela	 imprescritibilidade
ancorada	em	normas	constitucionais	(art.	183,	§	3º	e	191,	parágrafo	único	da	CF)
e	 no	 Código	 Civil	 (art.	 102).	 Na	 realidade,	 o	 instituto	 em	 comento	 se	 revela
bastante	 útil	 em	 hipóteses	 de	 desapropriação	 indireta	 na	 qual	 o	 proprietário
originário	não	reclama	o	objeto	ocupado	e,	por	decurso	de	prazo,	perde	o	direito
de	 fazê-lo,	 restando	 ao	Município,	 caso	 seja	 o	 ocupante,	 solicitar	 a	 declaração
judicial	do	direito	de	propriedade.
6	 	 	 	 	 	 	 	 	Escala	 de	 regimes	 jurídicos,	 bens	 públicos	 de
direito	e	de	fato
A	 primeira	 cautela	 necessária	 ao	 se	 cotejaremos	 bens	 no	 direito
administrativo	consiste	em	não	se	confundir	a	categoria	maior	dos	bens	estatais
com	a	 subcategoria	 dos	bens	públicos,	 a	 qual	 ainda	 se	 subdivide	 por	 força	 do
direito	 positivo	 em	 três	 espécies	 de	 bens	 (de	 uso	 comum	 do	 povo,	 de	 uso
especial	 e	 dominicais).	 A	 segunda	 cautela	 imprescindível	 exige	 diferenciar	 a
natureza	jurídica	do	regime	jurídico	de	um	bem.	Natureza	indica	um	rótulo	que
denota	a	essência	jurídica	de	um	objeto	(ou	seja,	de	bem,	pessoa	ou	atividade).
Regime	consiste	no	conjunto	de	normas	jurídicas	que	paira	sobre	o	objeto	(bem,
pessoa	ou	atividade)	e	que	varia	em	 razão	da	natureza	e	de	 sua	 função,	daí	 se
afirmar	que	sobre	um	mesmo	objeto	é	possível	que	incidam	incontáveis	regimes
funcionais.
No	direito	 administrativo,	 convencionou-se	 fixar	os	 regimes	 jurídicos
por	 paralelismo	 à	 natureza	 jurídica	 do	 bem.	 De	 acordo	 com	 essa	 linha	 de
raciocínio,	 prega-se	 com	 frequência	 que	 o	 bem	 público	 entra	 em	 regime
administrativo,	enquanto	o	bem	particular,	em	regime	de	direito	privado.	A	falha
do	raciocínio	resulta	da	confusão	entre	natureza	e	regime	e	da	suposição	de	que
o	 regime	 siga	necessariamente	 a	natureza	 e	 somente	 ela.	No	entanto,	 a	 função
jurídica	 do	 objeto,	 dentro	 de	 um	 determinado	 contexto,	 exerce	 um	 relevante
papel	na	modulação	do	regime	jurídico.	É	exatamente	isso	que	permite	negar	a
homogeneidade	 interna	 do	 regime	 dos	 bens	 públicos	 e	 do	 regime	 dos	 bens
particulares.
Para	 se	 aproximar	 a	 análise	 doutrinária	 dos	 bens	 à	 realidade
patrimonial	 do	 Estado,	 a	 teoria	 contemporânea	 tem	 preferido	 sustentar	 a
existência	 de	 uma	 escala	 de	 regimes	 jurídicos,	 segundo	 a	 qual	 os	 bens	 se
distribuem	de	acordo	com	sua	titularidade,	natureza	e	função.	Em	um	panorama
teórico	básico,	do	cruzamento	dos	fatores	mencionados	se	chega	a,	pelo	menos,
cinco	 regimes	 no	 direito	 brasileiro,	 os	 quais	 se	 escalonam	 a	 partir	 da	 maior
incidência	de	direito	público	em	direção	à	maior	submissão	ao	direito	privado.	É
o	que	mostra	a	tabela	seguinte:
	
Escala	de	regimes	jurídicos	dos	bens
Titularidade Função Normas Rótulo	do
regime
Pessoa	jurídica
de	direito
público	(bem
estatal
público)
Uso	comum	do
povo	ou	uso
especial
Altíssima
incidência	de
direito	público
Domínio
público	estatal
Pessoa	jurídica
de	direito
privado	ou
pessoa	física
(bem	privado)
Uso	em	atividade
pública
Regime	híbrido	de
direito	público	e
privado.
Predominância	da
lógica	publicística.
Domínio
público
impróprio
Pessoa	jurídica
de	direito
público	(bem
estatal
público)
Uso	público
flexível	(bens
dominicais	ou
“bens	coringas”)
Regime	híbrido	(ou
público	flexível)
Domínio
público	não
afetado
Pessoa	jurídica
de	direito
privado	do
Estado
(domínio
estatal
privado)
Uso	semelhante
ao	dos
particulares
Regime	mais
privatístico,
derrogado	por
algumas	normas
públicas
Domínio
privado	estatal
Bem	não
estatal	privado
(pessoa	física
ou	jurídica	de
direito
privado)
Uso	particular Regime	privatístico
mitigado	apenas
por	restrições
estatais	à
propriedade	(poder
de	polícia)
Domínio
privado	não
estatal
Fonte:	elaboração	própria
	
Diante	do	escalonamento	normativo,	observa-se	que	o	regime	dos	bens
públicos	 propriamente	 ditos	 se	 afasta	 da	 homogeneidade.	 Os	 bens	 públicos
afetados	 (de	 uso	 comum	 do	 povo	 e	 de	 uso	 especial)	 ingressam	 em	 regime
altamente	 publicístico,	 enquanto	 os	 dominicais	 inserem-se	 em	 um	 regime
marcado	pelo	direito	público,	mas	com	algumas	relativizações	e	flexibilizações
de	direito	privado.
De	outra	parte,	ainda	se	nota	que	os	bens	particulares	se	distribuem	por
três	 degraus	 da	 escala.	 Em	 primeiro	 lugar,	 vislumbram-se	 os	 particulares
tradicionais,	 aqueles	 não	 pertencentes	 a	 entes	 estatais	 e	 que	 estão	 em	 função
privada,	 ou	 seja,	 são	 geridos	 em	 favor	 de	 seu	 proprietário	 com	 limitações
mínimas	 decorrentes	 da	 função	 social	 da	 propriedade	 e	 de	 outros	 interesses
públicos	gerais	(via	limitações	administrativas).	Em	segundo	lugar,	aparecem	os
bens	particulares	em	função	privada,	mas	estatais.	Aqui,	a	natureza	jurídica	não
varia,	mas	a	titularidade	muda,	já	que	o	bem	se	envolve	no	patrimônio	de	uma
pessoa	jurídica	de	direito	privado	do	Estado,	o	que	atrai	normas	administrativas
em	medida	 superior	 àquela	 que	 atinge	 os	 bens	 particulares	 do	primeiro	 grupo.
Em	 terceiro	 lugar,	 posicionam-se	 os	 bens	 particulares,	 estatais	 ou	 não,
vinculados	 ao	 cumprimento	 de	 funções	 administrativas	 ou	 à	 geração	 de
utilidades	 públicas	 específicas.	 Pela	 sua	 funcionalidade,	 esse	 conjunto	 de	 bens
ingressa	 em	 um	 regime	 significativamentepublicístico,	 aqui	 chamado	 de
domínio	público	impróprio	pelo	fato	de	se	aproximarem	do	regime	do	domínio
público	estatal	(ou	seja,	dos	bens	públicos	afetados).
Os	bens	particulares	que	compõem	o	domínio	público	impróprio,	pelo
seu	regime	publicístico	acentuado,	podem	ser	igualmente	denominados	de	“bens
públicos	de	fato”.	Eles	não	são	bens	públicos	jurídicos,	pois	não	participam	do
patrimônio	de	uma	entidade	estatal	com	personalidade	jurídica	de	direito	público
(como	 uma	 autarquia	 ou	 uma	 prefeitura),	 mas	 são	 públicos	 na	 função	 que
exercem,	ou	seja,	por	força	da	situação	fática	em	que	estão	inseridos.	Exemplo
disso	são	os	bens	reversíveis	de	concessionárias	de	serviços	públicos,	certos	bens
adquiridos	 com	 fomento	 estatal,	 além	 de	 alguns	 edifícios	 privados	 de	 uso
coletivo	e	de	utilidade	pública	à	população.
O	 reconhecimento	 teórico	 dessa	 nova	 categoria	 de	 bens,	 não	 tratada
pelo	 Código	 Civil,	 serve	 para	 se	 compreender	 uma	 nova	 classe	 de	 elementos
privados	 essenciais	 para	 o	 funcionamento	 das	 cidades	 e,	 por	 conseguinte,	 dos
próprios	Municípios.	Afinal,	no	ambiente	urbano,	esses	“bens	públicos	de	fato”
muitas	 vezes	 desempenharão	 o	 papel	 dos	 bens	 públicos	municipais	 afetados	 a
funções	 estratégicas,	 como	 transporte,	 lazer,	 saneamento	 e	 outros	 serviços
públicos	 sociais	 ou	 econômicos.	 Por	 conseguinte,	 ainda	 que	 sejam	 bens
particulares	 por	 força	 do	 critério	 subjetivo	 do	 Código	 Civil	 (baseado	 na
titularidade),	seu	tratamento	jurídico	deve	se	avizinhar	ao	dos	bens	públicos	de
direito,	 disso	 derivando	 uma	 série	 de	 restrições	 no	 tocante	 a	 seu	 uso,	 sua
alienabilidade	e	sua	penhorabilidade.
7									Regimes	jurídicos	dos	bens	municipais
Com	suporte	na	escala	de	dominialidade,	torna-se	possível	trabalhar	os
diferentes	 regimes	 jurídicos	 dos	 bens	 municipais.	 Por	 simetria	 ao	 que	 se
sustentou	 para	 a	 teoria	 geral	 dos	 bens,	 o	 regime	 dos	 objetos	 patrimoniais	 do
Município	 variará	 basicamente	 de	 acordo	 com	 sua	 natureza	 (vinculada	 à
titularidade)	 e	 função,	 daí	 ser	 possível	 dividi-los	 em	 quatro	 categoriais	 gerais,
quais	 sejam:	 a)	 bens	municipais	 públicos	 afetados	 (uso	 comum	do	povo	 e	 uso
especial);	 b)	 bens	 municipais	 públicos	 não	 afetados	 (dominicais);	 c)	 bens
municipais	 privados	 em	 função	 pública	 (domínio	 público	 impróprio);	 d)	 bens
municipais	privados	sem	função	pública	(domínio	estatal	privado).
Para	 cada	 uma	 das	 quatro	 categorias	 de	 bens	 municipais,	 a
diferenciação	 dos	 regimes	 jurídicos	 implicará	 variações	 normativas	 que	 se
referem,	ao	menos,	a	seis	quesitos	fundamentais.	O	primeiro	diz	respeito	ao	grau
de	 alienabilidade,	 ou	 seja,	 à	medida	 do	 direito	 de	 disposição	 que	 o	Município
exerce	 sobre	 o	 bem.	 Quanto	 mais	 público,	 mais	 se	 limitará	 a	 alienação.	 O
segundo	quesito	se	relaciona	com	as	normas	de	gestão	de	uso,	pois,	conforme	o
enquadramento	 do	 bem,	 os	 instrumentos	 de	 outorga	 de	 uso	 e	 o	 conteúdo	 da
função	 social	 diferirão.	 O	 terceiro	 se	 refere	 à	 prescritibilidade,	 isto	 é,	 à
possibilidade	de	o	bem	ser	ou	não	adquirido	por	usucapião	decorrente	da	posse
de	pessoas	físicas	ou	jurídicas.	O	quarto	trata	da	penhorabilidade,	da	viabilidade
de	 se	 penhorar	 judicialmente	 o	 bem	 para	 executar	 dívidas	 contra	 o	 Estado.	O
quinto,	 de	 maneira	 semelhante,	 aponta	 a	 compatibilidade	 do	 bem	 com	 a
instituição	de	garantias	reais	e	o	sexto,	dos	mecanismos	de	controle	patrimonial,
já	 que	 algumas	 formas	 de	 controle	 se	 aplicam	 a	 bens	 públicos,	 sobretudo
afetados	 e	vinculados	 a	 funções	 essenciais	para	 a	 coletividade,	mas	não	valem
para	 bens	 públicos	 dominicais	 ou	 bens	 estatais	 privados.	 Evidencia-se	 isso
quando	 se	 examinam	 os	meios	 de	 controle	 social	 e	 de	 controle	 por	 órgãos	 de
defesa	de	interesses	coletivos	e	difusos.
[16]
Não	 seria	 possível	 examinar	 à	 exaustão	 cada	 um	 dos	 seis	 quesitos
apontados	em	relação	às	quatro	categorias	de	bens	municipais.
[17]
	Desta	 feita,
oferecer-se-á	 um	breve	 panorama	 do	 regime	 jurídico	 com	base	 em	 alguns	 dos
elementos	citados.	Vejamos.
7.1									Bens	municipais	públicos	afetados	(uso	comum	do	povo	e	uso	especial):
Por	conta	de	sua	elevada	vinculação	a	finalidades	públicas	e	interesses
da	coletividade,	o	regime	jurídico	aplicável	se	torna	altamente	publicístico	e,	por
conseguinte,	 caracteriza-se	 por	 muitas	 restrições	 e	 alguns	 poderes.	 A
alienabilidade	 desses	 bens	 é	 bastante	 limitada,	 mas	 não	 completamente
impossível.	 Isso	 porque,	 entre	 entes	 públicos,	 não	 se	 deve	 considerar	 o	 bem
afetado	inalienável.	Nesse	contexto,	subsiste	o	comércio	público,	daí	ser	possível
a	certo	Estado	da	federação	 transferir	um	bem	afetado	seu	a	algum	Município.
Não	 se	vislumbra	nisso	qualquer	violação	da	 regra	geral	 do	Código	Civil	 (art.
100),	 pela	 qual	 os	 bens	 afetados	 são	 inalienáveis,	 já	 que	 o	mandamento	 legal
atinge	 somente	 o	 comércio	 privado.	 Entretanto,	 a	 alienabilidade	 se	 mostrará
absoluta,	 caso	 o	 bem	 público	 seja	 monopolizado	 em	 favor	 de	 algum	 nível
federativo,	como	os	potenciais	hidráulicos	e	os	recursos	minerais	da	União.	No
mais,	 aplicam-se	 aos	 bens	 públicos	 afetados	 a	 imprescritibilidade	 (art.	 102	 do
Código	Civil);	 a	 impossibilidade	 de	 oneração	 por	 garantias	 reais,	 já	 que	 estão
afetados	 a	 um	 fim	 público,	 além	 da	 impenhorabilidade	 judicial,	 pois	 seus
titulares,	 necessariamente	 pessoas	 jurídicas	 de	 direito	 público	 interno,
beneficiam-se	do	 regime	de	pagamento	de	dívidas	por	precatórios	 (art.	 100	da
CF).	 Apesar	 disso,	 sobre	 tais	 bens	 permite-se	 outorga	 de	 uso	 a	 terceiros,
inclusive	para	fins	privativos	e	mediante	remuneração,	mas	desde	que	se	respeite
a	afetação	ao	uso	primário.
7.2									Bens	municipais	públicos	não	afetados	(dominicais)
Nesta	 categoria,	 a	 existência	 de	 um	 titular	 com	 natureza	 de	 pessoa
jurídica	de	direito	público	atrai	regras	limitativas	à	gestão	do	bem,	embora	não
haja	afetação	a	um	fim	público.	Por	conseguinte,	o	regime	desses	bens	se	marca
por	 maior	 flexibilidade,	 embora	 ainda	 seja	 permeável	 a	 forte	 incidência	 do
direito	 administrativo.	 A	 alienabilidade	 existe	 tanto	 para	 o	 comércio	 público,
quanto	para	o	privado.	Porém,	a	Lei	de	Licitações	estabelece	o	cumprimento	de
uma	 série	 de	 requisitos	 prévios	 à	 alienação	 e	 cria	 hipóteses	 específicas	 de
dispensa	(art.	17	a	19).	A	imprescritibilidade	aquisitiva	também	se	aplica	a	esse
grupo	 patrimonial.	 Ainda	 que	 as	 normas	 constitucionais	 não	 mencionem	 a
restrição	 a	 favor	 de	 imóveis	 (art.	 183,	 §	 3º	 e	 191,	 parágrafo	 único	 da	 CF),	 o
Código	Civil	a	estende	aos	dominicais	móveis	(art.	102).	Por	força	do	regime	de
precatórios,	 a	 impenhorabilidade	 judicial	 igualmente	 existe,	 mas	 não	 há,	 em
regra,	vedação	para	se	gravá-los	com	garantias	reais.
7.3	 	 	 	 	 	 	 	 	 Bens	 municipais	 privados	 em	 função	 pública	 (domínio	 público
impróprio)
O	regime	desses	bens	é	o	mais	obscuro	de	todas	as	quatro	categorias.
Isso	se	explica	pela	ampla	lacuna	do	direito	positivo,	que	não	consagra	de	modo
explícito	o	conceito	de	domínio	público	impróprio	ou	de	bens	públicos	de	fato.
Dentro	 desse	 conjunto,	 encontram-se	 os	 bens	 particulares,	 contidos	 no
patrimônio	de	entes	estatais,	mas	com	personalidade	jurídica	de	direito	privado.
Como	 se	 sabe,	 alguns	 desses	 bens	 estatais	 particulares	 associam-se	 a	 funções
públicas,	 como	 ocorre	 muitas	 vezes	 com	 os	 bens	 de	 empresas	 municipais
executoras	de	atividades	de	polícia	de	trânsito	ou	de	serviços	públicos	locais.	Por
consequência,	o	bem	é	particular,	mas	seu	regime	recebe	limitações	em	virtude
de	 sua	 função	 e	 relevância	 pública.	 A	 alienabilidade,	 a	 prescritibilidade,	 a
penhorabilidadee	a	sujeição	a	garantias	reais	existem	a	princípio,	mas	devem	ser
afastadas	 quando	 puderem	 comprometer	 interesses	 públicos	 primários.	 Os
mecanismos	 de	 proteção	 ora	 decorrerão	 de	 lei	 específica,	 ora	 de	 disposições
administrativas	ou	até	mesmo	contratuais.
7.4									Bens	municipais	privados	sem	função	pública	(domínio	estatal	privado)
Os	bens	estatais	privados,	mesmo	não	vinculados	a	 funções	públicas,
sofrem	 a	 incidência	 qualificada	 das	 normas	 de	 direito	 administrativo.	Eles	 são
alienáveis	tanto	no	campo	do	comércio	privado,	quanto	no	público.	No	entanto,
nas	relações	patrimoniais	com	os	particulares,	impõe-se	o	respeito	aos	princípios
da	impessoalidade	e	da	moralidade,	do	que	decorre	a	necessidade	de	a	alienação
ser	 em	 regra	 precedida	 da	 avaliação	 do	 bem,	 da	 motivação	 quanto	 à
conveniência	 da	 alienação	 e	 da	 condução	 de	 uma	 licitação.	 Por	 conta	 de	 sua
proximidade	 ao	 direito	 privado,	 não	 se	 vislumbra	 fundamento	 para	 aplicar	 a
regra	 da	 imprescritibilidade	 a	 tais	 bens.	Ao	 vedar	 a	 usucapião,	 a	 Constituição
Federal	 e	 o	 Código	 Civil	 referem-se	 exclusivamente	 a	 bens	 públicos,	 não	 a
qualquer	tipo	de	bem	estatal.	Por	conseguinte,	excluem-se	da	regra	protetiva	os
bens	 estatais	 privados.	 Todos	 eles	 se	 sujeitam	 plenamente	 à	 aquisição	 por
usucapião.	Ademais,	sobre	eles	pode	recair	penhora	judicial,	pois	seus	titulares
são	pessoas	 jurídicas	estatais,	mas	de	direito	privado.	Enfim,	nada	 impede	que
sejam	objeto	de	garantia	real.
8									Domínio	urbano	ou	bens	com	função	urbanística
A	 delimitação	 dos	 bens	 municipais	 se	 pauta	 em	 um	 critério	 de
titularidade	 pelo	 qual	 se	 separa	 o	 patrimônio	 dos	 entes	 políticos	 locais	 do
patrimônio	 de	 outras	 pessoas,	 físicas	 ou	 jurídicas,	 particulares	 ou	 estatais.	 A
dominialidade	 municipal	 deriva	 em	 primeiro	 lugar	 de	 um	 critério	 subjetivo,
enquanto	 suas	 subdivisões	 categoriais	 resultam	 de	 um	 critério	 funcional	 pelo
qual	 cada	 bem	 se	 distribui	 nos	 vários	 degraus	 da	 escala	 de	 regimes	 do	 direito
brasileiro.
A	 expressão	 “domínio	 público	 urbano”	 se	 entrecruza	 de	 certo	 modo
com	 o	 chamado	 “domínio	 municipal”,	 mas	 seus	 critérios	 fundadores	 são
completamente	distintos.	Como	já	se	observou	de	modo	detalhado	em	tese	sobre
o	tema,	o	domínio	urbano	engloba	“o	conjunto	de	bens	públicos,	de	uso	comum
e	 de	 uso	 especial,	 de	 propriedade	 tanto	municipal	 quanto	 estadual	 ou	 federal,
assim	 como	 os	 bens	 particulares	 que	 se	 encontram	 em	 regime	 jurídico
derrogatório	do	direito	privado	pelo	fato	de	se	vincularem	à	realização	da	função
social	da	cidade”.
[18]
Ao	se	fragmentar	esse	conjunto	de	bens	por	um	critério	de	titularidade
encontram-se	três	blocos	patrimoniais,	a	saber:	1)	o	domínio	urbano	municipal,
como	 bloco	 de	 bens	 de	 uso	 comum	 e	 de	 uso	 especial,	 de	 propriedade	 dos
Municípios,	 e	 essencialmente	 relacionados	 à	 concretização	 das	 funções	 sociais
urbanas;	2)	o	domínio	urbano	supramunicipal,	que	abrange	bens	públicos	de	uso
comum	 e	 de	 uso	 especial,	 mas	 de	 propriedade	 dos	 Estados	 e	 da	 União,	 bem
como	 de	 outras	 pessoas	 jurídicas	 de	 direito	 público	 federais	 ou	 estaduais	 que
desempenhem	 funções	 socioeconômicas	 de	 relevo	 urbanístico;	 e	 3)	 o	domínio
urbano	 impróprio,	 que	 abarca	 os	 bens	 de	 pessoas	 físicas	 e	 jurídicas	 de	 direito
privado,	 estatais	 ou	 não,	 e	 que	 suportam	 a	 prestação	 de	 serviços	 ou	 funções
urbanas	 essenciais,	 por	 conta	 das	 quais	 se	 estendem	a	 eles	 algumas	 limitações
típicas	de	bens	do	domínio	público	estatal.
O	 recorte	 dos	 elementos	 do	domínio	 urbano	por	 força	 de	 um	critério
pessoal	 serve	 para	 comprovar	 a	 sua	 peculiaridade	 em	 relação	 ao	 domínio
municipal.	 Os	 bens	municipais	 constituem	 parte	 essencial	 do	 conceito,	 mas	 o
patrimônio	 federal,	estadual	e	particular	 também	constrói	a	base	 infraestrutural
da	 cidade.	 Portanto,	 bem	municipal	 é	 conceito	 que	 jamais	 poderá	 ser	 tomado
como	 sinônimo	 de	 domínio	 urbano.	 Alguns	 bens	 municipais	 participam	 do
domínio	urbano,	mas	outros	desempenham	finalidade	específica,	não	ligados	ao
funcionamento	da	 cidade	 como	um	espaço	público,	 razão	pela	qual	 devem	 ser
integrados	 no	 conceito	 tradicional	 de	 “propriedade	 urbana”.	 Na	 estruturação
física	 da	 cidade,	 todos	 os	 bens	 componentes	 do	 conceito	 maior	 de	 “domínio
público	 urbano”	 colocam-se	 ao	 lado	 da	 “propriedade	 urbana”,	 aqui	 entendida
como	 conjunto	 de	 áreas,	 habitações	 ou	 edifícios	 nos	 quais	 se	 desenvolvem
atividades	 domésticas	 ou	 produtivas,	 industriais	 ou	 comerciais	 em	 função
privatística.
[19]
Na	 prática,	 entretanto,	 são	 os	 bens	 do	 domínio	 público	 urbano	 que
exercem	 com	 predominância	 a	 tarefa	 de	 promover	 as	 funções	 essenciais	 da
cidade,	quais	sejam:	1)	a	função	provedora,	ou	seja,	de	oferta	de	acesso	a	bens	e
serviços	urbanos	essenciais	 (e.g.	 transporte,	 saúde,	 educação	 etc.);	 2)	 a	 função
integradora,	de	facilitação	do	exercício	de	direitos	fundamentais	civis,	políticos
e	culturais	dos	cidadãos	no	 tecido	urbano	como	espaço	de	 socialização;	e	3)	a
função	de	trânsito	ou	circulação,	imprescindível	à	proteção	da	cidade	como	um
espaço	natural	de	fluxos	e	trocas.
A	relação	do	domínio	urbano	com	as	três	funções	essenciais	da	cidade
torna-se	 mais	 evidente	 ao	 se	 detalharem	 os	 componentes	 do	 conceito	 aqui
tratado,	quais	sejam:	1)	os	logradouros	públicos	e	2)	o	mobiliário	urbano.
Os	logradouros	abarcam	os	bens	do	domínio	viário	e	as	áreas	públicas
da	 cidade.	 O	 domínio	 viário	 representa	 o	 conjunto	 de	 vias	 que	 estabelece	 as
interligações	 entre	 os	 fragmentos	 do	 tecido	 urbano,	 incluindo	 as	 obras
acessórias,	 como	 pontes,	 viadutos,	 passarelas	 etc.	 Já	 as	 áreas	 públicas
desempenham	 uma	 função	 integradora	 sob	 o	 ponto	 de	 via	 social	 e	 abrangem
praças,	parques	e	outras	áreas	públicas	de	uso	comum	da	população	para	fins	de
lazer,	cultura,	reunião	e	manifestação.
A	seu	turno,	o	mobiliário	urbano	engloba	sobretudo	os	bens	públicos	de
uso	 especial	 e	 bens	 particulares	 empregados	 como	 suporte	 à	 prestação	 de
serviços	 públicos	 essenciais	 ao	 funcionamento	 da	 cidade,	 como	 transporte,
segurança	pública,	iluminação	pública	e	saneamento	básico.	Dentro	do	conceito
de	 mobiliário,	 há	 dois	 blocos	 de	 bens.	 O	 primeiro	 abrange	 equipamentos
públicos,	coisas	singulares	e	tangíveis	destinadas	à	prestação	de	serviços,	como
cabines	 telefônicas,	 totens	 de	 medição	 de	 temperatura,	 relógios	 públicos,
barreiras,	 gradis,	 cones	 etc.	 Esses	 elementos	 diferem	 das	 chamadas	 redes	 de
infraestrutura,	que	representam	uma	coletividade	jurídica.	Melhor	dizendo:	cada
rede	 configura	 um	 conjunto	 de	 bens,	 tangíveis	 ou	 intangíveis,	 idênticos	 ou
diferenciados,	 interligados	 artificialmente	 pelo	 ser	 humano	 e	 destinados	 ao
cumprimento	de	uma	função	urbanística	ou	de	um	serviço	público.
9									Uso	de	bens	municipais:	sistematização	teórica
A	disciplina	jurídica	dos	bens	municipais	não	escapa	à	teoria	geral	do
direito	administrativo	dos	bens.	A	sistematização	doutrinária	dos	tipos	de	uso	e
de	 suas	 características	 centrais,	 além	 das	 considerações	 teóricas	 sobre	 os
mecanismos	de	outorga,	serve	a	princípio	para	a	gestão	dos	bens	dos	Municípios.
Mas	 há	 que	 se	 fazer	 uma	 advertência	 relevante.	Não	 se	 deve	 confundir	 teoria
administrativa	 com	direito	 positivo.	Diz-se	 isso,	 porque	 a	 extensão	da	 teoria	 a
todos	 os	 entes	 políticos	 não	 significa	 que	 as	 normas	 legais	 expedidas	 pelo
Congresso	Nacional	 se	 apliquem	automaticamente	a	Estados	e	Municípios.	Na
verdade,	muitas	delas	tratam	exclusivamente	da	gestão	de	bens	federais,	restando
aos	 entes	 subnacionais	 editar	 suas	 próprias	 normas.	Em	outrassituações,	mais
específicas,	 o	Congresso	 está	 autorizado	 a	 editar	 normas	 gerais	 nessa	matéria,
hipótese	em	que	caberá	aos	Estados	e	Municípios	respeitá-las	e	detalhá-las.
Uma	 situação	 a	 ilustrar	 a	 competência	 do	 Congresso	 Nacional	 para
expedir	 normas	 gerais	 se	 vislumbra	 no	 tocante	 aos	 instrumentos	 de	 direito
urbanístico.	Como	 já	demonstrado,	boa	parte	dos	bens	municipais	 se	 insere	no
conceito	de	domínio	urbano,	haja	vista	sua	essencialidade	para	o	desempenho	de
funções	 essenciais	 das	 cidades.	 Por	 isso,	 nessas	 situações,	 cabe	 ao	Município,
em	 sua	 gestão	 patrimonial,	 observar	 as	 regras	 nacionais	 referentes	 aos
instrumentos	de	política	urbana.
Além	da	importante	diferenciação	entre	teoria	e	direito	positivo	e	entre
normas	federais	e	normas	nacionais,	para	se	compreender	a	 realidade	dos	bens
municipais	 é	 igualmente	 fundamental	 que	 se	 parta	 de	 uma	 análise	 da	 teoria
administrativa	dos	usos,	lastreada	na	realidade	normativa	federal	e	que,	portanto,
pode	 ou	 não	 ser	 absorvida	 pelos	 Municípios	 conforme	 decisão	 discricionária
baseada	em	sua	autonomia	político-administrativa.
A	 teoria	da	classificação	dos	usos	de	bens	hoje	consagrada	no	direito
administrativo	brasileiro	se	enraíza	na	tese	de	doutorado	de	Maria	Sylvia	Zanella
Di	Pietro.
[20]
Em	linha	com	sua	corrente	teórica,	os	usos	de	bens	estatais	podem
ser	 comuns,	 abertos	 a	 todos	 de	 modo	 impessoal,	 e	 em	 regra	 sem	 prazo	 de
duração,	ou	privativos,	para	 finalidades	específicas	e	geralmente	 restritas	a	um
período	temporal	determinado.	Exemplo	da	modalidade	comum	se	vislumbra	no
uso	de	ruas	por	veículos	ou	de	praças	por	transeuntes.	O	uso	privativo	encontra
exemplos	 na	 instalação	 de	 barracas	 de	 feira	 ou	 de	 bancas	 de	 jornal	 em
logradouros	públicos	ou	na	 instalação	de	 restaurante	particular	 em	um	campus
de	uma	universidade	pública.
O	uso	comum	se	qualifica	como	ordinário	na	hipótese	de	ocorrer	sem
restrições,	 condicionamentos	 ou	 cobranças.	 Em	 contraste,	 o	 uso	 comum
extraordinário	se	caracteriza	por	cobranças	ou	algum	tipo	de	limitação	quanto	ao
modo	 ou	 quanto	 ao	 acesso	 (por	 exemplo,	 mediante	 exigência	 de	 autorização
estatal	 prévia).	 Assim,	 a	 cobrança	 de	 preço	 para	 uso	 da	 rodovia	 ou	 o
estabelecimento	de	idade	mínima	para	o	uso	de	uma	biblioteca	municipal	aberta
ao	público	geram	um	uso	comum	extraordinário.
No	plano	teórico,	ainda	se	diferenciam	os	usos	normais	dos	anormais.
No	primeiro	caso,	o	uso	se	dá	em	conformidade	com	a	afetação	do	bem,	isto	é,
em	harmonia	com	sua	vinculação,	por	lei	ou	por	ato	da	Administração,	a	um	ou
mais	usos	primários.	É	o	caso	de	uso	da	biblioteca	municipal	para	leitura	ou	do
domínio	 viário	 para	 o	 trânsito	 de	 pessoas	 e	 veículos.	 Todavia,	 a	 afetação	 não
exclui	 a	 possibilidade	 de	 usos	 secundários	 dos	 bens	 públicos.	 Muito	 pelo
contrário.	A	função	social	dos	bens	públicos	exige	que	eles	gerem	o	máximo	de
utilidades	 sociais,	 coletivas	 ou	 privadas,	 sempre	 se	 respeitando	 sua
sustentabilidade.
[21]
Por	 conta	 disso,	 é	 até	 sugerível	 que	 os	 usos	 secundários	 sejam
promovidos.	E	sempre	que	houver	uso	secundário,	não	previsto	na	afetação,	fala-
se	 de	 uso	 anormal.	 A	 anormalidade	 não	 indica	 a	 princípio	 qualquer	 ilicitude.
Desde	que	não	prejudique	o	uso	primário	(normal),	o	uso	secundário	(anormal)
será	lícito.	A	partir	do	momento	em	que	comprometa	a	função	primária	do	bem
público	afetado,	o	uso	anormal	se	tornará	inaceitável	e	ilegal.
[22]
A	organização
de	 festa	 junina	ou	de	uma	 reunião	de	bairro	em	uma	escola	pública	municipal
configura,	pois,	uso	anormal,	 lícito	na	medida	em	que	a	afetação	primária	(uso
do	bem	para	atividades	de	ensino)	não	seja	prejudicada	de	modo	irrazoável.
10	 	 	 	Outorga	de	uso	de	bens	municipais:	mecanismos
administrativos
Mecanismos	de	outorga	consistem	em	 instrumentos	 jurídicos,	 atos	ou
contratos,	que	viabilizam	o	uso	de	um	bem	estatal	por	terceiros,	pessoas	físicas
ou	jurídicas,	públicas	ou	privadas,	mediante	remuneração	ou	gratuitamente,	por
prazo	determinado	ou	não,	com	ou	sem	precariedade.
Embora	a	definição	do	conceito	seja	relativamente	simples,	no	direito
positivo	brasileiro,	a	teorização	a	respeito	dos	mecanismos	de	outorga	encontra
pelo	 caminho	 grandes	 barreiras.	 Em	 primeiro	 lugar,	 prescinde	 a	 legislação	 de
uma	classificação	evidente.	Os	mecanismos	de	outorga	espalham-se	pelas	mais
diversas	 leis	 que	 tratam	 do	 riquíssimo	 e	 altamente	 variado	 patrimônio	 estatal.
Em	segundo	lugar,	nas	várias	leis	que	os	mencionam	e	abordam,	prescinde-se	de
uma	 padronização	 conceitual	 e	 terminológica,	 de	 modo	 que	 institutos
significativamente	 distintos	 recebem,	 por	 vezes,	 nomenclatura	 idêntica,	 o	 que
gera	extremas	dificuldades	para	o	intérprete.
Em	virtude	desses	e	de	outros	fatores,	a	doutrina	brasileira	assumiu	um
papel	 de	 extremo	 relevo.	 Coube	 a	 ela	 buscar	 os	 elementos	 comuns	 dos	 mais
diversos	 institutos	 de	 outorga,	 traçar	 alguns	 conceitos	 e	 sugerir	 classificações
que	 facilitassem	 a	 tarefa	 dos	 operadores	 do	 direito	 e,	 ao	 mesmo	 tempo,
orientasse	 o	 legislador	 na	 construção	 de	 novas	 normas	 sobre	 o	 tema.	 Não	 é
possível	sustentar,	porém,	que	a	legislação	brasileira	atual	se	harmonize	com	os
posicionamentos	 doutrinários	 e	 suas	 sistematizações.	 Pelo	 contrário.	 Basta
cotejar	 o	 direito	 positivo	 dos	 mais	 diversos	 entes	 políticos	 da	 federação	 para
perceber	a	ausência	de	padronização	 terminológica	e	de	precisão	conceitual	no
tratamento	da	matéria.
Não	 obstante,	 o	 papel	 da	 doutrina	 nesse	 campo	 permanece
relevantíssimo.	Daí	 porque	 se	mostra	 imprescindível	 examinar	 ao	menos	 duas
propostas	 teóricas	de	classificação	de	 instrumentos	administrativos:	a	de	Maria
Sylvia	Zanella	Di	Pietro	e	a	de	Diogo	de	Figueiredo	Moreira	Neto.	
De	 acordo	 com	Maria	 Sylvia	 Zanella	Di	 Pietro,	 há	 três	 instrumentos
principais	a	merecer	estudo:	as	concessões,	as	permissões	e	as	autorizações	de
uso	de	bem.
[23]
	O	critério	de	distinção	que	justifica	a	tripartição	adotada	resulta
do	conteúdo	de	cada	mecanismo	de	outorga.	À	luz	desse	critério,	a	autorização
constitui	ato	jurídico	unilateral,	precário	e	discricionário	e	destinado	a	viabilizar
tanto	o	uso	comum	extraordinário	(mediante	cumprimento	de	alguns	requisitos),
quanto	 o	 uso	 privativo	 de	 bem	 estatais	 públicos.	 A	 permissão	 segue
características	similares.	No	entanto,	em	comparação	com	ela,	Di	Pietro	sustenta
que	a	autorização	apresenta	maior	grau	de	precariedade,	além	de	se	caracterizar
pela	 transitoriedade,	 por	 menores	 poderes	 de	 uso,	 pela	 inexigibilidade	 de
licitação	e	de	autorização	legislativa,	assim	como	pela	ausência	de	um	dever	de
utilização	 pelo	 particular	 que	 dela	 se	 beneficia	 e	 pelo	 seu	 frequente	 emprego
para	 usos	 de	 interesse	 privatístico	 e	 não	 de	 interesse	 coletivo.	 Por	 sua	 vez,	 a
concessão	 de	 uso	 configura	 outorga	 de	 uso	 privativo	 a	 particular,	 de	 caráter
contratual,	 onerosa	 ou	 gratuita,	 com	 prazo	 determinado,	 marcada	 pela
pessoalidade	e	dependente	em	geral	de	licitação.	
A	 segunda	 proposta	 teórica	 que	 merece	 destaque	 surge	 na	 obra	 de
Diogo	de	Figueiredo	Moreira	Neto.	Nela	se	separam	os	mecanismos	de	outorga
conforme	o	 tipo	 de	 uso	 que	 abrangem,	 pela	 sua	 natureza	 de	 ato	 ou	 contrato	 e
pelo	caráter	vinculado	ou	discricionário.	Nessa	linha,	para	os	usos	privativos	de
bens	públicos,	 separam-se	os	mecanismos	 legais	 (em	que	a	própria	 lei	opera	a
outorga	de	uso),	os	mecanismos	unilaterais	(permissão	de	uso	e	cessão	de	uso),
os	mecanismos	contratuais	(incluindo	a	concessão	de	uso,	a	concessão	de	direito
real	de	uso	e	o	aforamento	público),	e	as	modalidades	complexas	de	outorga	(por
meio	 de	 consórcios,	 convênios,	 acordos	 de	 programa,	 contratos	 de	 gestão,termos	de	parceria	e	outros	instrumentos	congêneres).
[24]
A	 sistematização	 pautada	 na	 natureza	 vinculada	 ou	 discricionária,
unilateral	 ou	bilateral,	 legal	 ou	 administrativa	dos	meios	de	outorga	 afigura-se
mais	 flexível	 e	 adequada	 para	 explicar	 toda	 a	 riqueza	 de	 experiências	 que	 se
vislumbra	 na	 gestão	 de	 uso	 de	 bens	 estatais	 no	Brasil.	 Já	 a	 proposta	 tripartite
antes	 examinada,	 paralela	 aos	mecanismos	 de	 outorga	 de	 serviços	 públicos,	 e
baseada	 na	 sistematização	 teórica	 da	 concessão,	 permissão	 e	 autorização,	 nem
sempre	 atinge	 o	 mesmo	 grau	 de	 sucesso.	 Isso	 se	 deve	 a	 pelo	 menos	 quatro
fatores.
A	 uma,	 a	 legislação	 e	 o	 próprio	 Executivo	 confundem	 os	 tipos	 ao
criarem	o	direito	administrativo	positivo	e,	frequentemente,	ignoram	a	tripartição
teórica.	 A	 duas,	 nem	 sempre	 os	 nomes	 jurídicos	 encontrados	 na	 legislação
correspondem	 à	 essência	 teórica	 criada	 pela	 doutrina	 para	 a	 concessão,	 a
permissão	e	a	autorização	–	caso	esse	que	se	vislumbra,	inclusive,	na	concessão
de	imóveis	públicos	para	fins	de	moradia	que,	pela	legislação,	seria	ato	jurídico	e
não	 instrumento	 contratual.	 A	 três,	 a	 tripartição	 dos	 mecanismos	 de	 outorga
parece	 insuficiente	 para	 abarcar	 a	 variabilidade	 dos	mecanismos	 existentes	 no
ordenamento	 e,	 enfim,	 no	 contexto	 federativo	 brasileiro,	 em	 que	 os	 entes	 se
caracterizam	pela	autonomia	administrativa	ampla,	mostra-se	difícil	 sustentar	a
validade	 de	 uma	 padronização	 teórica	 dos	 mecanismos	 de	 outorga	 que	 seja
aplicável	à	União,	aos	Estados	e	aos	Municípios.
Por	 tudo	 isso,	 mais	 importante	 que	 o	 nome	 jurídico	 do	 instituto	 de
outorga	de	uso	é	a	verificação	de	sua	natureza	discricionária	ou	vinculada,	de	seu
poder	de	criar	direito	subjetivo	de	uso,	de	sua	precariedade	e	de	sua	dependência
de	vínculo	contratual	ou	de	mero	ato	jurídico.
Na	atividade	de	gestão	dos	bens	municipais,	os	entes	locais	não	estão
presos	aos	rótulos	teóricos,	já	que	eles	não	detêm	base	normativa	nacional,	salvo
em	 certas	 áreas	 específicas,	 como	 a	 de	 recursos	 hídricos,	 recursos	 florestais,
direito	urbanístico	etc.	Fora	das	áreas	em	que	o	Congresso	detém	competência
para	 edição	de	 normas	nacionais,	 ao	 editarem	 sua	 legislação,	mais	 que	 atentar
aos	nomes,	os	Municípios	devem	buscar	estruturar	seus	instrumentos	de	outorga
de	 modo	 a	 respeitar:	 1)	 a	 segurança	 jurídica	 por	 parte	 dos	 utentes,	 inclusive
mediante	 a	 explícita	 definição	 do	 regime	 jurídico	 no	 intuito	 de	 se	 conferir
previsibilidade	 aos	 cidadãos;	 e	 2)	 a	 defesa	 dos	 interesses	 públicos	 primários,
sobretudo	pelo	respeito	à	afetação	do	bem	e	ao	uso	múltiplo	sustentável.
11	 	 	 	Outorga	de	uso	de	bens	municipais:	mecanismos
urbanísticos
Enquanto	grande	parte	dos	assuntos	de	direito	administrativo	recai	no
âmbito	 de	 competência	 dos	 entes	 políticos	 autônomos	 por	 conta	 da	 estrutura
federativa	brasileira,	gerando	dificuldades	na	sistematização	dos	mecanismos	de
outorga,	 no	 direito	 urbanístico,	 a	 situação	 é	 diversa	 e,	 felizmente,	muito	mais
previsível.	 Isso	decorre	de	um	 fator	 simples:	 a	 competência	para	 expedição	de
normas	gerais	nessa	matéria	se	reserva	ao	Congresso	Nacional	(art.	24,	I	da	CF),
cabendo	 aos	 Estados	 suplementá-las.	 Já	 aos	 Municípios,	 confere-se	 a
competência	 secundária	 de	 suplementação,	 impondo-se	 que	 respeitem	 tanto	 as
normas	gerais	do	Congresso,	quanto	as	normas	do	Estado	da	federação	em	cujo
território	se	inserem	(art.	30,	II).
É	 nesse	 contexto	 que	 o	 Estatuto	 da	 Cidade	 (Lei	 n.	 10.257/2001)
desponta	 como	 um	 importante	 conjunto	 normativo	 de	 sistematização	 de
mecanismos	 de	 outorga	 de	 bens	 estatais	 para	 finalidades	 urbanísticas.	 Os
instrumentos	 nele	 previstos	 são	 de	 aplicabilidade	 nacional.	 Ainda	 que	 os
Municípios	 possam	 optar	 pelos	 mecanismos	 que	 desejem	 empregar	 em	 seu
território	 (com	 parcial	 ressalva	 quanto	 ao	 Plano	 Diretor,	 dada	 sua
obrigatoriedade	em	certas	hipóteses),	sempre	que	um	instrumento	do	Estatuto	for
inserido	 no	 ordenamento	 local,	 as	 bases	 normativas	 dadas	 pelo	 Congresso
valerão	 de	 forma	 automática,	 evitando-se	 a	 fragmentação	 terminológica	 e	 a
imprecisão	conceitual.		
No	 campo	 urbanístico,	 dos	 inúmeros	 instrumentos	 previstos	 e
detalhados	 em	 normas	 nacionais,	 alguns	 merecem	 especial	 consideração	 pelo
fato	 de	 consistirem	 ou	 abrangerem	 outorgas	 de	 usos	 de	 bens	 municipais.	 São
eles:	 o	 direito	 de	 superfície;	 a	 concessão	 de	 uso	 para	 fins	 de	 moradia	 e	 a
permissão	de	uso	para	fins	comerciais.
11.1					O	direito	de	superfície
A	 teoria	 da	 acessão,	 pela	 qual	 o	 acessório	 segue	 o	 destino	 do	 bem
principal,	impõe	que	construções	ou	plantações	sobre	um	imóvel	passem	a	fazer
parte	do	mesmo.	O	imóvel	atrai	acessórios	em	benefício	de	seu	proprietário.	No
Código	Civil,	referida	consequência	se	enraíza	em	três	dispositivos	principais.	O
art.	 92,	 ao	 tratar	 dos	 bens	 reciprocamente	 considerados,	 dispõe:	 “principal	 é	 o
bem	 que	 existe	 sobre	 si,	 abstrata	 ou	 concretamente;	 acessório	 aquele	 cuja
existência	 supõe	 a	 do	 principal”.	 Já	 o	 art.	 1.248	 enumera	 os	 instrumentos	 que
expressam	 a	 acessão,	 incluindo	 a	 formação	 de	 ilhas,	 a	 aluvião,	 a	 avulsão,	 o
abandono	de	álveo,	bem	como	as	plantações	e	as	 construções.	O	 art.	 1.253,	 a
seu	turno,	dispõe	que	“toda	construção	ou	plantação	existente	em	um	terreno	se
presume	feita	pelo	proprietário	e	à	sua	custa,	até	que	se	prove	o	contrário”.
Ao	direito	municipal	e	urbanístico,	 interessa	sobretudo	a	atividade	de
construção.	A	previsão	do	direito	de	superfície	tanto	no	Código	Civil,	quanto	no
Estatuto	 da	 Cidade,	 gera	 uma	 exceção	 à	 vinculação	 de	 bens	 por	 acessão,
incluindo	os	casos	de	construção.	Na	prática,	os	regimes	jurídicos	da	superfície
civilística	e	da	urbanística	diferem	levemente.	Para	dar	um	exemplo,	a	do	direito
civil	não	abrange	subsolo,	mas	abarca	a	propriedade	urbana	e	rural	e	serve	para
fins	de	construção	e	plantação.
[25]
Diante	da	existência	de	dois	regimes	para	um	mesmo	instituto,	caso	o
Município	utilize	a	superfície,	deverá	esclarecer	a	modalidade	pela	qual	opta	e	as
normas	 aplicáveis.	 Supõe-se,	 porém,	 que	 a	 versão	 mais	 relevante	 em	 matéria
municipal	 venha	 a	 ser	 a	 regida	 pelo	 Estatuto	 da	 Cidade,	 já	 que	 ela	 configura
instrumento	 de	 política	 de	 desenvolvimento	 urbano,	 política	 essa	 que	 fica
principalmente	a	cargo	dos	entes	políticos	locais.
De	 acordo	 com	 o	 Estatuto	 da	 Cidade,	 permite-se	 que	 o	 proprietário
urbano	 conceda	 a	 outrem	 o	 direito	 de	 superfície	 do	 seu	 terreno,	 por	 tempo
determinado	 ou	 indeterminado,	 mediante	 escritura	 registrada	 no	 cartório	 de
registro	de	imóveis	(art.	21,	caput).	O	“proprietário”	a	que	o	dispositivo	se	refere
abrange	tanto	o	particular,	quanto	o	próprio	Estado	em	relação	a	bens	públicos
dominicais	 (não	 afetados)	 ou	 a	 bens	 estatais	 privados.	 Por	 conseguinte,	 é
possível	 incluir	 a	 superfície	 inicialmente	 como	 uma	 forma	 de	 outorga	 de	 uso
privativo	de	terceiros	sobre	bens	municipais.
[26]
A	 mesma	 conclusão	 vale	 em	 relação	 à	 figura	 do	 superficiário.	 Ele
poderá	ser	um	particular,	pessoa	física	ou	jurídica,	ou	até	mesmo	um	ente	estatal
que,	 no	 território	 da	 cidade,	 venha	 a	 colaborar	 com	 a	 execução	 da	 política
urbanística.	 Nessa	 linha	 de	 raciocínio,	 não	 há	 dúvidas	 de	 que	 o	 próprio
Município	 poderá	 obter	 o	 direito	 de	 superfície	 sobre	 um	 imóvel	 privado	 ou
estatal	 alheio,	 federal	 ou	 estadual,	 para	 nele	 edificar	 bens	 úteis	 ao
desenvolvimento	 da	 cidade,	 como	 infraestruturas	 de	 serviços	 urbanos	 ou
edifícios	residenciais	de	interesse	social	–	sempre	observada	a	finalidade	prevista
no	ajuste.
A	despeito

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