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As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais São Paulo 2011 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais Martiane Jaques La-Flor Copyright © 2011 by Editora Baraúna SE Ltda Capa Aline Benitez Projeto Gráfico Tatyana Araujo Revisão Pedro Chimachi CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ ________________________________________________________________ L165i La-Flor, Martiane Jaques As implicações da união estável no registro de imóveis à luz dos princípios registrais / Martiane Jaques La-Flor. - São Paulo : Baraúna, 2011. Inclui bibliografia ISBN 978-85-7923-334-0 1. União Estável. 2. Concubinato. 3. Companheiros (Direito de família). 4. Registro de Imóveis. 5. Direito Notarial e Registral. I. Título. 11-4107. CDU: 347.62 05.07.11 11.07.11 027807 ________________________________________________________________ Impresso no Brasil Printed in Brazil DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA www.EditoraBarauna.com.br Rua Januário Miraglia, 88 CEP 04547-020 Vila Nova Conceição São Paulo SP Tel.: 11 3167.4261 www.editorabarauna.com.br www.livrariabarauna.com.br Aos meus pais, materializações de Deus na Terra. 6 Martiane Jaques La-Flor 7 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais Apresentação Fui distinguido pela autora para apresentação deste tra- balho, que trata justamente de um assunto que tem sido uma tônica na atividade notarial e registral e é de extremo interesse para a sociedade e especialmente para comunidade jurídica. O tema relacionado à união estável tem sido deba- tido desde o advento da Constituição Federal de 1988, quando tivemos o reconhecimento da união estável entre homem e mulher como entidade familiar, constante do § 3º do art. 226. E, recentemente, com a decisão do Su- premo Tribunal Federal estendendo os efeitos da união estável às uniões homoafetivas, ampliou-se a discussão. A autora foca seu trabalho nas implicações que o re- conhecimento da união estável tem no registro imobiliário. A referida disposição fez com que surgisse a legislação infra- constitucional, tratando especificamente do tema e desaguou finalmente no Código Civil de 2002, que conceituou a união estável, distinguindo do instituto do casamento e regulamen- tando os efeitos do reconhecimento desta entidade familiar. O Código Civil ao definir os requisitos para que se caracterize a união estável, estabeleceu determinados crité- 8 Martiane Jaques La-Flor rios para o reconhecimento desta entidade familiar e que uma vez constituída resulta em direitos e obrigações. De- corre deste fato, a necessidade do direito enfrentar, tam- bém, a questão relacionada à dissolução desta convivência. Deve-se então analisar os efeitos da constituição da união estável e da sua dissolução, qualquer que seja o motivo. Como o Código Civil reconhece os efeitos da união estável, mas de forma distinta do casamento, surge o dilema quanto às exigências ou não de formalidades, uma vez que a união estável é fato, portanto, não decorre de formalidades. Sendo assim, em especial no que se refere à questão patrimo- nial, o problema é de como adaptar estes efeitos ao registro imobiliário, que é essencialmente formal. Por isso, esta obra vem em boa hora, pois trata jus- tamente da adaptação da informalidade que caracteriza a união estável ao formalismo característico da aquisição ou da transmissão de direitos reais. Assim, a questão crucial é fazer com que este fato tenha acesso ao registro imobiliário, para que este possa espelhar uma realidade existente e cum- pra a sua função de dar publicidade e segurança jurídica. Este livro contribui para isso, demonstrando a forma de se atingir o objetivo principal, adaptado aos princípios registrais, através de uma linguagem acessível, tornando a leitura agradável, oportunizando aos operadores do direi- to, uma fonte de informações. As famílias atuais têm ca- ráter mais afetivo e normalmente são livres de convenções e moralidades e o direito deve adaptar esta realidade fática aos preceitos legais e é o que esta obra busca demonstrar. Luiz Carlos Weizenmann – Tabelião. 9 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais Sumário Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 1. União Estável Reconhecida como Entidade Familiar .13 1.1 Contexto Histórico de Família . . . . . . . . . . . . . 13 1.2 A Família no Direito Brasileiro . . . . . . . . . . . . 16 1.2.1 Considerações Iniciais . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 1.2.2 Tipos Familiais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 1.3 União Estável e Registros Públicos . . . . . . . . . . 33 1.3.1 Aplicabilidade da Lei 11.441/2007 à União Estável . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 1.3.2 Possibilidade de um Pacto Patrimonial . . . . 43 1.3.3 Regime de Bens . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 1.3.4 Ausência de Ato Formal versus Aquisição de Direitos Reais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .50 1.3.4.1 Necessidade de Outorga do Companheiro . . 51 1.3.4.2 Responsabilidade Patrimonial do Companheiro na União Estável . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 10 Martiane Jaques La-Flor 2. Princípios Registrais e a União Estável . . . . . . . . . 61 2.1 Princípios como Base do Sistema . . . . . . . . . . 62 2.2 Princípios Registrais que Repercutem na União Estável . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65 2.2.1 Princípio da Continuidade ou do Trato Sucessivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .66 2.2.2 Princípio da Especialidade . . . . . . . . . . . . . 69 2.2.3 Princípio da Fé-Pública . . . . . . . . . . . . . . . . 70 2.2.4 Princípio da Publicidade . . . . . . . . . . . . . . . 73 2.2.5 Princípio da Segurança Jurídica . . . . . . . . . 77 2.2.6 Princípio da Concentração . . . . . . . . . . . . . 79 2.3 Solução encontrada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83 Considerações Finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89 Modelos dos Atos a Serem Praticados . . . . . . . . . . . . 91 Ato a ser praticado no Tabelionato de Notas . . . . . 91 Atos a serem praticados no Registro de Imóveis . . . 93 Ato de Registro no Livro 3 – Registro Auxiliar . . . . 93 Ato de Averbação no Livro 2 – Registro Geral . . . . 94 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95 11 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais Introdução A Constituição de 1988 representou um marco ao Direito de Família, já que inovou ao reconhecer como entidade familiar instituições não emolduradas no perfil tradicional de família concebido com o casamento. Essa mudança paradigmática, voltada para a adoção de um conceito fundado nos laços afetivos para a deter- minação do conceito de família, trouxe no reconheci- mento da união estável, o que trouxe impactos também nas relações patrimoniais dos indivíduos. Desde a edição da Lei nº 9.278, de 10 de maio de 1996, em seus artigos 3º e 4º, já se tentava formalizar a união estável. Tais artigos foram vetados pelo então Presidente da Repúbli- ca, Fernando Henrique Cardoso, com insigne e correta sus- tentação de que a união estável é fato e como tal não necessi- taria de um ato formal para reconhecimento de sua existência. No entanto, não encontramos vedação para tal re- gulamentação, caso os conviventes assim desejem; pelo contrário, na leitura doartigo 1.725 do Código Civil se extrai a possibilidade de formalização do instituto, po- dendo, igualmente, estipularem quanto aos bens. 12 Martiane Jaques La-Flor Tal proposição de um pacto patrimonial, em ana- logia ao que ocorre com o casamento e, tomando como fundamentos os princípios notariais e registrais, sob a égide dos princípios da publicidade e da concentração, nos força a reconhecer no artigo 167 da Lei 6.015/73, hipóteses não taxativas de registros e averbações. Assim, buscaremos, primeiramente, analisar os pontos referenciais atinentes à concepção de família, começando pela abordagem deste instituto nos tempos remotos fazendo sua contextualização histórica e a pro- blematização deste conceito, culminando nas inovações trazidas pela Constituição de 1988. Após, será abordada a questão dos princípios regis- trais que se relacionam ao instituto da união estável, sua importância e aplicação. Por fim, colocar-se-ão em diá- logo as relações existentes entre os princípios norteadores do sistema registral brasileiro, configurando-os como ga- rantias devidas a todos os cidadãos, demonstrando a ca- rência de segurança jurídica quando da não observância do princípio da concentração e da publicidade registrais no Registro de Imóveis. 13 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais 1. União Estável Reconhecida como Entidade Familiar Neste capítulo, será abordado o tema da concepção de família, culminando no reconhecimento da união es- tável como entidade familiar, tendo como referência a Carta Magna em seu art. 226. 1.1 Contexto Histórico de Família A busca de um conceito que contemple a com- plexidade das relações entre os indivíduos remonta aos primórdios da civilização e sempre esteve relacionada ao conhecimento teórico e empírico de cada sociedade ao longo dos tempos. Na Antiguidade, o surgimento da noção de família proveio da família consanguínea, através da união entre irmãos carnais e colaterais dentro de um grupo. Na Ba- bilônia, a família fundava-se no casamento monogâmico, que era obtido com o contrato privado do Código de 14 Martiane Jaques La-Flor Hamurabi, indiferente à coabitação e à relação sexual.1 Na Grécia Antiga o concubinato era normal e acolhido. Já no Direito Romano, a base da família natural era o casamento, que era formado por um conjunto de pes- soas e coisas que estavam submetidos a um chefe, o pater familias. As mulheres ao contrair casamento subordina- vam-se à autoridade do marido ou do pater familias do marido. Não existiam formalidades, o requisito era de liame psicológico, calcado na affectio maritalis; o consen- timento manifestável pela intenção era suficiente à cria- ção dos laços conjugais. Nenhuma solenidade era exigida e “a união dos sexos não precisava ser consumada para que o casamento tivesse existência legal”;2 o que perfazia o casamento não era a coabitação, mas o consentimento3. O concubinato era aceitável, sendo uma união de fato duradoura considerada forma inferior ao casamento, tanto que os filhos oriundos desse relacionamento eram considerados ilegítimos (spurri). 1 Como descreve o art. 128 do mesmo: “se um homem tomou sua esposa e não redigiu seu contrato, essa mulher não é sua esposa”. FINET, 1983 apud AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da Família de Fato. São Paulo: Atlas, 2002. p. 30. 2 NAMUR, 1888, apud LEITE, Eduardo de Oliveira. Tratado de Direito de Família. v.1. Curitiba: Juruá,1991. p. 144. 3 O parentesco romano baseava-se em duas maneiras: no poder (potestas) onde o pater familias juntamente com o conjunto de pessoas e coisas sobre as quais ele exercia poder compunham a família proprio iuri; já a família communi iure tinha o poder exercido por um pater familias já falecido. O parentesco agnatício é o proveniente do poder familiar exercido pelo pa- ter familias; era de cunho jurídico e se transmitia em linha direta através da linha paterna, visto que somente o varão poderia ser pater familias. O outro, tendo por conta os laços sanguíneos maternais para a formação da parentalidade, era denominado cognatio, e nestes, obviamente, excluíam-se os vínculos. (MARKY, Thomas. Curso Elementar de Direito Romano. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 154.) 15 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais No Direito Canônico, o matrimônio era para a Igreja Católica um instituto de direito divino natural, isto é, era a união íntima entre o homem e a mulher para integrá-los física e espiritualmente na geração da prole e na ajuda mútua. Desta forma, o concubinato foi combatido e desincentivado. O § 1º do cânone 1.081 afirmava que o casamento era um contrato e, como tal imprescindível a vontade das partes ao consentir, porém uma vez consentido permane- cerá por toda a vida. Conforme Vilhaça4: Com o advento do Cristianismo, o concubinato foi considerado imoral, tendo o imperador Constantino aplicado, contra ele, sanções, procurando estimular os concubinos a contraírem matrimônio. Por sua vez, o im- perador Justiniano, procurando limitar o número dessas uniões concubinárias, proibiu que um homem tivesse mais do que uma concubina e nenhuma se fosse casado. Durante a Idade Média a Igreja assumiu forte po- der de decisão dentro do Direito de Família; o casa- mento passou a ser considerado como uma concessão de Deus aos fracos e a moral sexual matrimonial tratava as uniões como pecaminosas. Nessa época não ocorreram grandes transformações no âmbito do Direito de Família, já que se mantiveram nos códigos as normas pré-estabelecidas pelo Direito Canôni- co. Como salienta Fachin, “a disciplina jurídica da família passa, como incólume, da Idade Média e se projeta para as primeiras codificações do início do século XVIII, nomea- 4 AZEVEDO, Álvaro Vilhaça de apud MARQUES, Batista. A União Es- tável e a Família. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/web/cegraf/ ril/Pdf/pdf_145/r145-18.pdf>. Acesso em: 14 jan. 2010. 16 Martiane Jaques La-Flor damente o Código Civil Francês5, que é, a seu tempo, o estatuto máximo da família, do Estado e da propriedade.”6 E foi a Corte de Paris, em julgado de 1872, que acolheu o critério da sociedade de fato a uma relação concubinária. Passaremos a analisar, agora, como ocorreu a evolu- ção da família, no direito pátrio. 1.2 A Família no Direito Brasileiro O Direito é um fenômeno social e, portanto de cará- ter instável e perecível7, só podendo ser encarado dentro dessa dinâmica, em perpétuo movimento, acompanhan- do as relações humanas; modificando-se e adaptando-se às exigências e necessidades da vida. Como poderemos observar, dessa forma se deu a evolução do Direito de Família em nosso país, refletindo na legislação e jurispru- dências atuais a repersonalização das relações e assim a abertura do conceito de entidades familiais. 5 Os tribunais franceses foram chamados a examinar pretensões fundadas em relações concubinárias. O Tribunal de Rennes, em 1883, assegurou a retribuição por serviços prestados por uma concubina. (VIANA, Marco Au- rélio apud SILVA, Maria Rosinete dos Reis. A união estável e sua evolução. Disponível em: <http://www.iuspedia.com>. Acesso em: 14 jan. 2010.) 6 FACHIN, Luis Edson. Elementos Críticos do Direito de Família: Curso de Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 29. 7 “É o conjunto de regras obrigatórias, determinando as relações sociais im- postas a todo o momento pelo grupo ao qual pertence.” (LÉVY-BRUHL apud LEITE, op. cit., p. 12.) 17 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais 1.2.1 Considerações Iniciais Primitivamente foram as ordenações Filipinas que adentraram o ordenamento jurídico brasileiro de Direito de Família e, em 1916 o CódigoCivil. Código este que refletia a sociedade eminentemente rural e patriarcal da época. O Estado assumia a regulamentação da família e do casamento sob forte pressão contrária da Igreja. Devido à moral e à grande influência oriunda da Igreja, o Direito brasileiro não se afastou dos cânones, absorvendo-os nas legislações em nascimento. Esta influ- ência era de tal amonte que a Constituição Imperial de 25 de março de 1824 promulgou em seu art.5º: “a reli- gião católica apostólica romana continuará ser a religião do Império. Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico ou particular, em casas destina- das, sem forma alguma exterior de templo.”8 A Constituição de 1891, amparada pelo Decreto nº. 181, de janeiro de 1890, regularizou e tornou obrigatório o casamento civil no Brasil, e conforme o § 4º de seu art.72 afirmava: “A República só reconhece o casamen- to civil, cuja celebração será gratuita”.9 Em 1934, com o advento da Constituição, se reconheceu o casamento reli- gioso com efeitos civis (art. 146). Com o implemento da Constituição de 1946 o posterior registro público desta celebração religiosa foi obrigado para fins civis.10 A Constituição de 16 de julho de 1934 em seu art. 146 8 AZEVEDO, op. cit., p. 123. 9 Ibid, p. 126. Neste sentido é o artigo 226, § 1° da atual Constituição Federal, seguindo-se do artigo 1.512, CC. 10 Neste sentido, na legislação atual, os artigos 226,§ 2°, CF e 1.516, CC. 18 Martiane Jaques La-Flor abriu as portas ao Direito de Família, inserindo o casamento em ordem constitucional e assegurando sua indissolubili- dade. As demais constituições subsequentes (1937; 1946; 1967; 1969) seguiram a mesma orientação da de 1934.11 A Constituição de 1988 representou um marco ao Direito de Família, já que inovou ao reconhecer como família instituições não emolduradas no perfil tradicio- nal: patriarcal, hierarquizada e heterossexual12 adentran- do no ramo do sentimento, tendo este como a pedra de toque para o reconhecimento do instituto de família, e não mais o matrimônio como prelecionava o Código Ci- vil de 1916. Inovou, também, ao reconhecer a igualdade conjugal referenciada no seu artigo 226, §5º13 revogando o retrógrado artigo 233 do Código Civil de 1916,14 que reconhecia o marido como chefe da sociedade conjugal. 11 Somente em 1962, com o advento da Lei nº. 4.121, de 27 de agosto (Esta- tuto da Mulher Casada) atribuiu-se a igualdade entre os cônjuges, retirando a incapacidade relativa da mulher casada. O divórcio foi chancelado após profundas lutas sociais, religiosas e políticas que eclodiram na época, fatores que favoreceram a não reestruturação e compilação do projeto de novo Có- digo Civil de 1975, que somente veio a vigorar em 2003. 12 FERNANDES, Jacinta Gomes. União Homoafetiva como Entidade Fami- liar: Reconhecimento no Ordenamento Jurídico Brasileiro. In: COUTO, Sérgio; MADALENO, Rolf; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro. Di- reito de Família e Sucessões. Sapucaia do Sul: Notadez, 2007. p. 183. 13 Artigo 226, § 5º, da CF/88: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercido igualmente pelo homem e pela mulher.” 14 Artigo 233, caput, do CCB de 1916: “O marido é o chefe da sociedade conjugal, função que exerce com a colaboração da mulher, no interesse comum do casal e dos filhos”. 19 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais 1.2.2 Tipos Familiais A atual concepção de família é plural, democrática e flexível. Não comporta mais em seu âmago aquela estru- tura patriarcal, patrimonialista e rígida de outrora. Hoje são os laços de afeto que unem as pessoas na constituição de uma vida em comum. Adiante se esboça aspectos de cada entidade familiar abarcada pelo Direito brasileiro, do casamento à união estável. O Decreto n° 181, de 24 de janeiro de 1890, se- cularizou o casamento, tornando-o formal, o que veio refletir na legislação civil. O Código Civil de 2002, já incorporando a Constituição Federal de 1988, traz a re- gulação do casamento nos arts. 1.511 e segs., traçando a igualdade entre os cônjuges. A sacralização do casamento fez parecer ser esta a úni- ca forma de constituir família, porém é a família a base da sociedade, conforme o art. 226 da Constituição Federal de 1988, e não aquele. Portanto, nesta acepção, além do casa- mento civil, novos tipos de famílias adentraram no cenário cotidiano forçando assim, sua regulamentação e resguardo. A família monoparental, surgiu pela ampliação propor- cionada pelo art. 226, §4°15, da Constituição Federal de 1988, onde se pressupõe a ausência de convivência biparental, ou seja, a formação de uma nova família, pelo casamento ou não, de um homem e uma mulher com os descendentes de cada um, havendo ou não prole comum, será caracterizada como uma nova entidade familiar, distinta da monoparental” 16 15 Art. 216, § 4º CF/88: Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. 16 FERNANDES, op.cit., p. 187. 20 Martiane Jaques La-Flor A família anaparental, expressão cunhada por Sérgio Resende de Barros17, dá nome à família formada entre parentes com ausência dos pais e em identificação de pro- pósito. São exemplos as famílias constituídas por irmãos que convivem juntos, avós e netos, tios e sobrinhos. Não reconhecida legalmente no nosso ordenamento jurídico, sendo amparada pela doutrina e jurisprudências pátrias. A família decorrente da convivência entre pessoas por laços afetivos e solidariedade mútua que busca a feli- cidade individual vivendo um processo de emancipação de seus membros é chamada eudemonista.18 É o caso dos jovens que saem da casa paterna em busca de realização pessoal tornando-se socialmente úteis. Tal como no caso da família anaparental, seu reconhecimento vem por meio da Justiça em prestigiosas e salvaguardas decisões. Já a família unipessoal, conforme a jurisprudência pátria19 é aquela formada por uma só pessoa (solteira, separada, divorciada ou viúva), que mantém um lar só seu, por imposição ou opção. Família homoafetiva,20 caracteriza-se pela relação afe- 17 Explica o autor sobre a expressão: bastante apropriada, pois “ana” é prefixo de origem grega indicativo de “falta”, “privação”, como em “anarquia”, termo que significa falta de governo. (BARROS, Sérgio Resende. Direitos Humanos e Direito de Família. In: Sérgio Resende de Barros. Disponível em: <http://www. srbarros.com.br/artigos.php?TextID=85>. Acesso em: 16 abr. 2009.) 18 WELTER apud DIAS, op.cit., p. 48. 19 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp n° 218.377/ES. 4ª Turma. Ministro Relator: Barros Monteiro. Data julgamento: 11/09/2000; STJ. AI 240.297/SP. 3ª Turma. Ministro Relator: Nancy Andrighi. Data de Julgamento: 24/10/2000. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/>. Aces- so em: 16 maio. 2009. 20 Neologismo cunhado por Dias na primeira edição da obra. (DIAS, Maria Berenice. União Homossexual: o Preconceito e a Justiça. 3ª ed. Porto Ale- gre: Livraria do Advogado, 2006. p. 34.) 21 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais tiva entre pessoas do mesmo sexo, com características de uma união estável, entendimento esse há muito defendido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul21. Muito embora persistia, na maioria das decisões do país, o enten- dimento de que a união homoafetiva era simples socieda- de de fato, aplicando-se a ela, dessa forma, a súmula 380 do Supremo Tribunal Federal: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adqui- rido pelo esforço comum.” Esse reconhecimento servia tão só para divisão do patrimônio amealhado pelo esforço comum. Ademais, era esse o entendimentodo Superior Tribunal de Justiça, porém reconhecendo em tal instituto direitos símiles à união estável,22 conforme se deduz do se- guinte voto do Ministro Humberto de Barros23: O relacionamento regular homoafetivo, embora não configurando união estável, é análogo a esse instituto. Com efeito: duas pessoas com relacionamento estável, 21 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. AI 599075496. 8ª C.Civil. Ministro Relator: Breno Moreira Mussi. Data de julgamento: 17/06/1997; TJRS. AC 598362655. 8ª C.Civil. Ministro Relator: José Ataídes Siqueira Trindade. Data de julgamento: 11/03/2009; TJRS. AI 70008631954. 8ª C.Civil. Ministro Relator: José Ataídes Siqueira Trindade. Data de julgamento: 24/06/2004. Disponível em: <http://tj.rs.gov.br/>. Acesso em: 14 jan. 2010. 22 PLANO DE SAÚDE. COMPANHEIRO. “A relação homoafetiva gera direitos e, analogicamente à união estável, permite a inclusão do compa- nheiro dependente em plano de assistência médica” (REsp nº 238.715, RS, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ 02.10.06). Agravo regimental não provido. (STJ. AgRg no Ag 971466 / SP. 3ª Turma. Minis- tro Relator: Ari Pargendler. Data de Julgamento: 02/09/2008. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/>. Acesso em: 14 jan. 2010.) 23 STJ. REsp 238715/RS. 3ª Turma. Ministro Relator: Humberto Gomes de Barros. Data de Julgamento: 07/03/2006. Disponível em: <http://www. stj.gov.br/>. Acesso em: 14 jan. 2010. 22 Martiane Jaques La-Flor duradouro e afetivo, sendo homem e mulher formam união estável reconhecida pelo Direito. Entre pessoas do mesmo sexo, a relação homoafetiva é extremamente se- melhante à união estável. Foi seguindo essa exegese que ocorreu o seguinte julgamento, incluído no Informativo de Jurisprudência nº. 472, do Superior Tribunal de Justiça: A Seção, ao prosseguir o julgamento, por maioria, enten- deu ser possível aplicar a analogia para reconhecer a parce- ria homoafetiva como uma das modalidades de entidade familiar. Para tanto, consignou ser necessário demonstrar a presença dos elementos essenciais à caracterização da união estável – entidade que serve de parâmetro diante da lacuna legislativa –, exceto o da diversidade de sexos, quais sejam: convivência pública, contínua e duradoura estabelecida com o objetivo de constituir família e sem os impedimen- tos do art. 1.521 do CC/2002 (salvo o do inciso VI em relação à pessoa casada separada de fato ou judicialmente). Frisou-se, ademais, que, uma vez comprovada essa união, devem ser atribuídos os efeitos jurídicos dela advindos. Reconheceu-se, portanto, o direito à meação dos bens ad- quiridos a título oneroso na constância do relacionamento, ainda que eles tenham sido registrados em nome de ape- nas um dos parceiros, não se exigindo a prova do esforço comum, que, no caso, é presumido. REsp 1.085.646-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 11/5/2011.24 No mesmo sentido entendeu o TSE, decidindo que o relacionamento homossexual estável gera a inelegibilidade prevista no art. 14, § 7º, da CF, pois, à semelhança do 24 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Informativos de Jurisprudência. Informativo nº. 0472 . Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/ infojur/toc.jsp>. Acesso em: 26 maio 2011. 23 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais casamento, da união estável e do concubinato presume-se na relação homoafetiva o forte laço afetivo, que influencia os rumos eleitorais e políticos. Por isso, o TSE atestou a existência de uma “união estável homossexual”.25 Recentemente, pacificou-se a controvérsia, quando os Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ao jul- garem, em 05/05/2011, a Ação Direta de Inconstitucio- nalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceram a união estável para casais do mesmo sexo. O relator das ações, Ministro Ayres Britto, votou no sentido de dar interpretação conforme a Constituição Federal para excluir qualquer significado do artigo 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união entre pes- soas do mesmo sexo como entidade familiar. Ele argu- mentou que o artigo 3º, inciso IV, da CF veda qualquer discriminação em virtude de sexo, raça, cor e que, nesse sentido, ninguém pode ser diminuído ou discriminado em função de sua preferência sexual. “O sexo das pessoas, salvo disposição contrária, não se presta para desiguala- ção jurídica”,26 observou o Ministro, para concluir que qualquer depreciação da união estável homoafetiva coli- de, portanto, com o inciso IV do artigo 3º da CF. O Superior Tribunal de Justiça já havia se pronun- ciado a respeito do tema, afirmando que as leis infra- 25 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. REsp Eleitoral nº 24.564. Ministro Relator: Gilmar Ferreira Mendes. Data de julgamento: 02/10/2004. Dis- ponível em: <http://www.tse.jus.br/internet/jurisprudencia/index.htm>. Acesso em: 14 jan. 2010. 26 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Notícias STF. Supremo reconhece união homoafetiva. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/cms/verNo- ticiaDetalhe.asp?idConteudo=178931>. Acesso em: 9 maio 2011. 24 Martiane Jaques La-Flor constitucionais garantiam status de união estável para relações homoafetivas. Segundo a Ministra Nancy An- drighi, “a negação aos casais homossexuais dos efeitos inerentes ao reconhecimento da união estável impossi- bilita a realização de dois dos objetivos fundamentais de nossa ordem jurídica, que é a erradicação da margina- lização e a promoção do bem de todos, sem preconcei- tos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”27 O reconhecimento de família sobre outras formas que não a provinda do casamento foi gradual. Foi a jurisprudên- cia que levou a Constituição a albergar as uniões extramatri- moniais sob o nome de união estável. A constitucionalização do conceito de entidade familiar sem estar condicionado à tríade: casamento, sexo e reprodução28 tem mérito da Justiça face ao legislador conservar-se inerte, como Maria Berenice Dias relatou: “o legislador sempre chega depois. Além de ter um viés conservador, ele teme defender causas das minorias, para não desagradar o eleitorado. Esse medo, o Judiciário não tem, porque é independente.” 29 O concubinato, primeiramente, para a sua configura- ção exigia a comprovação de vida more uxório, porém, de- pois de muitos julgados neste sentido, foi editada a súmula 27 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Sala de Notícias: Decisão. STJ afir- ma que leis já garantem status de união estável para relações homoafeti- vas . Disponível em: <http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine. wsp?tmp.area=398&tmp.texto=101785>. Acesso em: 13 maio 2011. 28 DIAS, Maria Berenice. Álbum de Família. In: Jornal Estado de Direito. Porto Alegre, Ano II, n. 13. fev/mar 2008. p. 13-14. 29 OLIVETO, Paloma. Justiça sai na Frente. In: Correio Brasiliense. Dispo- nível em: <http://www.direitos.org.br/index.php?option=com_content& task=view&id=2630&Itemid=2>. Acesso em: 5 abr. 2009. 25 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais 382 do Supremo Tribunal de Justiça, que dispensou tal re- quisito: “A vida em comum sob o mesmo teto, ‘more uxo- rio’, não é indispensável à caracterização do concubinato.” Para se evitar injustiças através de enriquecimen- tos injustificados, o STF editou outra súmula, a de número 380, já referida, a qual previu diante da exis- tência de uma sociedade de fato entre os concubinos, a partilha do patrimônio adquirido em conjunto es- forço. Não entendia o instituto da união estável como entidade familiar, sendo julgada a existência das socie- dades de fato nas varas cíveis da época. Este foi o passo da jurisprudência, deslocando os ca- sos de concubinatosao Direito Obrigacional contornan- do assim as vedações legais existentes. A referida súmula ainda tem aplicação nos casos de concubinatos impuros,30 evitando-se, assim, o locupleta- mento indevido. O concubinato puro foi legislado consti- tucionalmente e teve sua nomenclatura alterada para união estável, nos termos do art.1.723 do Código Civil de 2002.31 Somente em 1977 foi chancelado o divórcio (Lei 30 Ocorreu uma distinção entre os tipos de concubinatos. A importân- cia desta distinção está em manter a coerência em nosso ordenamento jurídico com o princípio da monogamia. Temos dois tipos de concu- binatos; o puro ou denominado união estável que é a união duradou- ra entre homem e mulher desimpedidos e o concubinato impuro ou adulterino onde um ou ambos os concubinos é/são comprometido(s) ou sofre(m) algum impedimento para o casamento. O concubinato impuro pode ser: adulterino no caso, por exemplo, de um homem casado manter relação concubinária ao lado/concomitantemente com a manutenção de uma família legítima; ou incestuoso, quando há pa- rentesco próximo entre os entre os concubinos. 31 Ao incorporar elementos da Lei nº 8.971/94 que estabelece o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão e da Lei nº 9.278/96 que regulou o § 3º do art. 226 da CF/88. 26 Martiane Jaques La-Flor 6.515/77), razão pela qual, segundo Sílvio Rodrigues,32 se jus- tificou, na época, a grande difusão do concubinato no Brasil. Já a Constituição Federal de 1988 surgiu como mar- co inovador reconhecendo expressamente a união estável como entidade familiar33 no §3º do artigo 226: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união es- tável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.” Desta forma tal instituto deixou de ser tratado como mera sociedade de fato, regulada pelo Direito das Obrigações, transformando-se em um instituto de Direito de Família.34 A família instituída pela união estável é a decorrente da convivência pública, contínua e duradoura entre um homem e uma mulher, formada com o objetivo de cons- tituição de família. A primeira lei a regulamentar este instituto jurí- dico foi a Lei n°. 8.971/94 que, dentre seus requisitos, exigia o elemento objetivo temporal de 5 (cinco) anos 32 RODRIGUES, Silvio apud Maria Rosinete dos Reis. A união estável e sua evolução. Disponível em: <http://www.iuspedia.com>. Acesso em: 14 jan. 2010. 33 Muitos autores, porém entendem que tal reconhecimento da união es- tável não a equipararia ao casamento, são eles: Arnaldo Wald, Benedito Silvério e Euclides de Oliveira. Posição esta não adotada pela maioria da doutrina, que embasada nos princípios fundamentais da igualdade e dig- nidade reconhecem a pluralidade de formas de constituição de família. 34 Em 1991, para dirimir as controvérsias existentes em relação à compe- tência para o julgamento dos litígios acerca da matéria, e em sintonia com o artigo 9º da Lei 9.278/96, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul editou a súmula 14 decretando: “ É da Vara de Família, onde houver, a competência para as ações oriundas de união estável” (RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Súmulas do Rio Grande Do Sul. Disponível em <http://www.tjrs.jus.br/jurispru/sumulas- tj.php>. Acesso em: 11 jan. 2010.) 27 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais de convívio ou a existência de prole para o seu reconhe- cimento. A citada lei tinha por fim regular a sucessão e os alimentos na união estável, silenciando sobre a regu- lação patrimonial entre os conviventes. Criticada severamente, foi complementada pela en- tão lei (Lei n° 9.278/96), que ensejou o artigo referente à união estável na Constituição, afastando assim, a exigên- cia de tempo mínimo, como condition sine qua non para sua tipificação e exigindo apenas o elemento subjetivo do animus de constituir família. Nesse ínterim, todavia, muita coisa foi tratada juris- prudencialmente e mesmo, legislativamente35, podemos citar a Lei 8.560/92 que dispõe acerca da investigação de paternidade, regulou quanto à união estável a ques- tão dos filhos havidos fora do casamento formal vedan- do qualquer tipo de referência no registro de nascimento acerca do estado civil dos genitores, da natureza da filia- ção, ordem em relação a irmãos do mesmo prenome, em prol da dignidade do reconhecido. Também, no campo da previdência social, o Plano de Benefícios da Previdên- cia Social (Lei 8.213, de 24.07. 1991) em seu artigo 16, 35 Antes mesmo já havia algumas regulações quanto à união estável como cita Marques: “o Decreto-Lei 7.036/44, que estabeleceu a igualdade de direitos entre a concubina e a esposa quando se tratasse de acidente no trabalho, o que veio a se consolidar com a Lei 6.367/76 (Seguros de Acidentes de Tra- balho). Com referência à possibilidade do reconhecimento de filhos havidos fora do matrimônio, tem-se o Decreto-Lei nº 4.737/42 e a Lei nº 883/49. Com relação à situação de contribuinte, acerca do tema, tem-se a Lei nº 4.242/63, a Lei nº 4.862/65 e o Decreto nº 85.450/80, que possibilita colocar-se como dependente do Imposto de Renda a concubina que esteja nessa condição por mais de cinco anos. (MARQUES, Batista. A União Está- vel e a Família. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/web/cegraf/ril/ Pdf/pdf_145/r145-18.pdf>. Acesso em: 14 jan. 2010.) 28 Martiane Jaques La-Flor I, com redação dada pela Lei 9.032, de 28.04.1995)36, assim como o Regulamento (Dec. 2.172, de 05.03.1997 artigo 13, I) permitiram a inclusão da companheira ou companheiro na categoria de beneficiários do Regime Geral da Previdência Social, recebendo, assim, tratamen- to semelhante ao dispensado aos legalmente casados, des- de que a união estável fosse devidamente comprovada. O Código Civil de 1916 não se preocupou com a família ilegítima, preocupava-se sim, em proteger a fa- mília real, ora proibindo doações à concubina, ora não reconhecendo os filhos ilegítimos (artigos 248 e 358 da Lei nº 3.071, de 1º de Janeiro de 1916). O Código Civil de 2002 tratou expressamente do assunto da união estável a partir do seu artigo 1.723, não trazendo grandes inovações, apenas acompanhando o que já havia sido legislado anteriormente. Acrescentou, entretanto, a inviabilidade da constituição da união es- tável quando presentes os impedimentos matrimoniais do artigo 1.521, CC, excetuando apenas a hipótese de pessoas casadas poderem se relacionar estavelmente, não o fazendo quanto às causas suspensivas do artigo 1.523. Adverte-se que os direitos e deveres advindos da união estável são os mesmos provenientes do casamento, excepcionando-se o da coabitação, que de per si não pro- va a existência da vida em comum: Sociedade de fato (inexistência). Concubinato. Patrimô- nio (partilha). A vida more uxorio de per si não basta 36 Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido. 29 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais à prova da sociedade. Exato, pois, ao se afirmar que “a simples existência do concubinato, que o próprio em- bargado reconhece, é prova insuficiente para caracterizar a existência da sociedade de fato”. 2. Sem dúvida que se admite, para o reconhecimento da sociedade, a contri- buição indireta da ex-companheira. Precedentes do STJ. Entretanto, se não se prova a contribuição, é inadmissí- vel, conforme bem se disse na origem, “acolher a sua pre- tensão de ver reconhecida a sociedade mantida ao longo de 4 (quatro) anos com o seu concubino”. 3. À míngua de ofensa a texto de lei federale de dissídio, a 3ª Turma do STJ não conheceu do recurso especial.37 O Código Civil ainda regulou expressamente o con- cubinato, em seu artigo 1.727. Questão a ser sublinhada neste ponto é que, como já referido, embora a lei fale em “impedidos de casar” admite-se ao separado judicialmente constituir união estável, não configurando concubinato. A lei civilista não regulou expressamente, porém, o direito real de habitação ao companheiro sobrevivente, decorren- do daí entendimentos, como o de Sebastião Amorim, de sua inexistência frente à ampliação dos direitos do convi- vente sobrevivente na sucessão hereditária, já que o Códi- go Civil de 2002 não o taxou como herdeiro necessário, como se fez com o cônjuge (art. 1.845, CC). Entendimen- to que não é seguido pela Corte Superior, como vemos: USUFRUTO. Companheira. Meação. Habitação. – O companheiro que tem filhos não pode instituir em favor da companheira usufruto sobre a totalidade do seu patrimô- nio, mas apenas sobre a parte disponível. Art. 1576 do CC. 37 STJ. REsp 125815/RJ. 3ª turma. Ministro Relator: Nilson Naves.. Data de julgamento: 08/08/2000. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 14 jan. 2010. 30 Martiane Jaques La-Flor – A companheira tem, por direito próprio e não decor- rente do testamento, o direito de habitação sobre o imó- vel destinado à moradia da família, nos termos do art. 7º da Lei 9278/96.38 Como vimos a união estável constitui uma espécie do gênero família, uma família que existe originariamen- te na prática, para depois buscar a proteção jurídica; dife- rentemente da já abordada família derivada do casamen- to, que primeiramente encontra amparo legal (com o ato formal do casamento civil), para depois existir. Em relação ao aspecto patrimonial da união estável, foi este tratado na Lei 9.278/96, que em seu artigo 5° prevê: Art. 5° Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a am- bos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito. Seguido do Código Civil que em seu artigo 1.725 fala em regime parcial de bens, mostra-se evidente pela leitura do artigo acima transcrito ou mesmo pela exegese do artigo 1.660, CC que os bens adquiridos na constân- cia do relacionamento a título oneroso são considerados frutos de uma colaboração mútua, pertencendo a ambos os conviventes em condomínio. Nota-se que esta “cola- boração” não precisa ser de ordem econômica: 38 STJ. REsp 175862/ES. 4ª turma. Ministro Relator: Ruy Rosado de Aguiar. Data de julgamento: 16/08/2001. Disponível em: <http://www. stj.jus.br>. Acesso em: 11 set. 2009. 31 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais União estável. Dissolução. Partilha do patrimônio. Regi- me da separação obrigatória. Súmula nº 377 do Supre- mo Tribunal Federal. Precedentes da Corte. 1. Não há violação do art. 535 do Código de Processo Civil quando o Tribunal local, expressamente, em duas oportunidades, no acórdão da apelação e no dos declara- tórios, afirma que o autor não comprovou a existência de bens da mulher a partilhar. 2. As Turmas que compõem a Seção de Direito Privado desta Corte assentaram que para os efeitos da Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal não se exige a prova do esforço comum para partilhar o patrimônio adquirido na cons- tância da união. Na verdade, para a evolução jurisprudencial e legal, já agora com o art. 1.725 do Código Civil de 2002, o que vale é a vida em comum, não sendo significativo ava- liar a contribuição financeira, mas, sim, a participação direta e indireta representada pela solidariedade que deve unir o casal, medida pela comunhão da vida, na presença em todos os momentos da convivência, base da família, fonte do êxito pessoal e profissional de seus membros. 3. Não sendo comprovada a existência de bens em nome da mulher, examinada no acórdão, não há como deferir a par- tilha, coberta a matéria da prova pela Súmula nº 7 da Corte. 4. Recurso especial não conhecido.(grifos nossos)39 DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. REGIME DE BENS. IMÓVEL ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DO RELACIONAMENTO. ES- FORÇO COMUM QUE SE PRESUME. – Não há ofensa ao Art. 535 do CPC se, embora rejeita- dos os embargos de declaração, o acórdão recorrido exa- minou, motivadamente, todas as questões pertinentes. – É inviável, em sede de recurso especial, o reexame de matéria fática. Incidência da Súmula 7, STJ. 39 STJ. REsp 736627/PR. 3ª turma. Ministro Relator: Carlos Alberto Me- nezes Direito. Data de julgamento: 11/04/2006. Disponível em: <http:// www.stj.jus.br>. Acesso em: 14 jan. 2010. 32 Martiane Jaques La-Flor – O regime patrimonial da união estável implica em se reco- nhecer condomínio com relação aos bens adquiridos por um ou por ambos os companheiros a título oneroso durante o re- lacionamento, conforme dispõe o art. 5º da Lei n.º 9.278/96. – A comunicabilidade de bens adquiridos na constância da união estável é regra e, como tal, deve prevalecer sobre as exceções, que merecem interpretação restritiva. – Deve-se reconhecer a contribuição indireta do compa- nheiro, que consiste no apoio, conforto moral e solida- riedade para a formação de uma família. Se a participa- ção de um dos companheiros se resume a isto, ao auxílio imaterial, tal fato não pode ser ignorado pelo direito. Recurso parcialmente provido.40 Portanto, como afirma Felipe Lerrer,41 a sociedade brasileira vive um novo panorama da união estável onde direitos são assegurados, mas deveres, que geram efeitos na esfera patrimonial dos conviventes, são impostos. Nesse desiderato, evidentes serão os reflexos patrimo- niais advindos dessa declaração, já que a união estável, como já referido, gera um condomínio dos bens adquiridos na constância do relacionamento, e o STF hodiernamente es- tendeu essa característica também às relações homoafetivas. Considerado o reflexo patrimonial uma consequên- cia da constituição da união estável, surge o impasse de como isto se refletirá nas aquisições de bens imóveis feitas pelos conviventes. Para tanto, iremos analisar, de início, este instituto em diálogo com os Registros Públicos. 40 STJ. REsp 915297/MG. 3ª Turma. Ministro Relator: Nancy Andrighi. Dara de julgamento: 13/11/2008. Disponível em: <http://www.stj.jus. br>. Acesso em: 14 jan. 2010. 41 LERRER, Felipe Jakobson. Execução contra o companheiro na união estável. In: MADALENO, Rolf (Org.). Ações de Direito de Família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 227. 33 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais 1.3 União Estável e Registros Públicos Lembramos que o casamento é negócio jurídico e a união estável é fato jurídico e, sendo fato, prescindiria de qualquer ato formal para o seu reconhecimento. No entan- to, é admitida a sua deliberada formalização, por meio dos Registros Públicos quando da sua inserção nos Registros de Títulos e Documentos, tendo em vista que a estes compete o registro de quaisquer documentos para fins de publici- dade e conservação, forte no art. 127 da Lei 6.015/73 que afirma: “No Registro de Títulos e Documentos será feita a transcrição: VII – facultativo, de quaisquer documentos, para sua conservação.” A Consolidação Normativa do Rio Grande do Sul vai ainda mais longe e aceita o registro de escrituras declaratórias de uniões homoafetivas, desta for- ma redigida em função do Provimento nº. 06/04-CGJ: Artigo 245, Parágrafo único. As pessoas plenamente ca- pazes, independente da identidade ou oposição de sexo, que vivam uma relação de fato duradoura, em comunhão afetiva, com ou sem compromisso patrimonial, poderão registrar documentosque digam respeito a tal relação. As pessoas que pretendam constituir uma união afetiva na forma anteriormente referida também poderão registrar os documentos que a isso digam respeito.42 Em convergência com o que dispõe a própria lei re- gistral, a qual atribui caráter residual ao Registro de Tí- 42 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Consolidação Normativa Notarial e Registral do Rio Grande Do Sul. Dispo- nível em: <https://www3.tj.rs.gov.br/legisla/CNNR_CGJ_junho_2009_ Prov_28.pdf?PHPSESSID=273bdada2470d5192c9979ac7db0dbfc>. Acesso em: 30 jun. 2009. 34 Martiane Jaques La-Flor tulos e Documentos, decidiu o Des. Salles na 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo, no processo de n° Processo nº: 000.02.156268-7: Ante o exposto, acolho o entendimento da maioria dos Oficiais das Serventias de Registro de Títulos e Docu- mentos, para reconhecer a registrabilidade das Declara- ções de União Estável quando um dos conviventes for casado, ou das Declarações de Sociedade de Fato, entre pessoas do mesmo sexo.43 Pela leitura do artigo acima transposto, que fala em “registrar documentos”, poderíamos dizer que o contrato de convivência poderá ser feito na forma pública por meio de escritura pública lavrada em Tabelionato de Notas, ca- bendo neste caso ao tabelião averiguar sobre a capacidade das partes; ou por contrato particular com as firmas reco- nhecidas por Tabelião, caso em que a análise da capaci- dade caberá ao registrador, seguida em ambos os casos de posterior registro no Registro de Títulos e Documentos, como ora ventilado. Adiante discorreremos pormenor- mente sobre a forma que deve se dar tal contrato. Cabe ressaltar, no entanto, que anteriormente havia o entendimento que a escritura pública declaratória de união estável não provava a união em si, mas servia para embasar futura decisão judicial, neste sentido, verifica- mos o excerto abaixo: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM MEDIDA CAUTELAR COM O OBJETIVO DE DES- 43 IRTDPJ-SP. 1ª Vara de Registros Públicos Decide Sobre o Registro de União Estável. Disponível em: <http://www.irtdpjsaopaulo.com.br/1Vara.Unia- oEstavel.htm>. Acesso em: 15 jan. 2010. 35 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais TRANCAR RECURSO ESPECIAL E CONFERIR-LHE EFEITO ATIVO. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. ANÁLISE DE SEUS PRESSUPOSTOS. REEXAME DE PROVAS. SÚ- MULA 7-STJ. APARÊNCIA DO BOM DIREITO. INEXISTÊNCIA. PROVAS DA EXISTÊNCIA DE UNIÃO ESTÁVEL. DECISÃO JUDICIAL E CERTIDÕES DELA DE- CORRENTES. CAUTELAR EXTINTA. – O entendimento do STJ é no sentido de que aferir se estão presentes ou não os requisitos da prova inequí- voca e da verossimilhança da alegação, exigidos pelo art. 273 do CPC, esbarra no óbice da Súmula 7/STJ, eis que tais pressupostos estão essencialmente ligados ao conjunto fático-probatório. Além disso, na espécie, o acórdão recorrido fez, explicitamente, análise das provas apresentadas. – A aparente inviabilidade do recurso especial, por óbice da Súmula 7/STJ, inviabiliza a demonstração do pressu- posto do fumus boni iuris do seu processo acessório. – As únicas provas da existência de união estável são: (i) a sentença judicial que reconhece a união estável, seja ela proferida em ação declaratória (cfr. art. 4.°, I, do CPC) ou em processo de justificação (cfr. arts. 861 a 866, do CPC); e (ii) as certidões decorrentes dessa sentença. Ou- tros documentos (tais como escrituras) e depoimento de testemunhas podem até servir de meios de prova da con- vivência duradoura, pública e contínua de um homem e uma mulher, a qual alude o art. 1.° da Lei n.º 9.278/96, mas não da existência da própria união estável, que depen- de de declaração judicial. Agravo regimental improvido.44 44 STJ. AgRg na MC 12068/RJ. 3ª C.Civil. Ministro Relator: Nancy Andri- ghi. Data de julgamento: 07/05/2007. Disponível em: <http://www.stj. gov.br/>. Acesso em: 15 jan. 2010. 36 Martiane Jaques La-Flor Com a admissão da aplicação da Lei 11.441/07 e da Resolução 35 do CNJ, no intuito de buscar a prevenção de litígios e a tempestividade dos atos, referido entendi- mento foi alterado, como adiante verificaremos. Abordaremos agora alguns pontos sobre a união es- tável numa visão notarial e registral. 1.3.1 Aplicabilidade da Lei 11.441/2007 à União Estável Inicialmente pairou dúvida se as questões pertinen- tes à união estável, seu reconhecimento, conversão em casamento, dissolução, entre outros assuntos, poderiam ou não ser regradas pela Lei 11.441/2007. Diante dis- so, analisando o instituto de uma forma sistêmica com todo o ordenamento jurídico, surgiu a Resolução nº. 35- CNJ de 24 de abril de 2007 que tratou de normatizar a aplicação da Lei 11.441/07, fazendo referência expressa à possibilidade de reconhecimento da união estável nas escrituras de inventário e partilha, não o fazendo em rela- ção às separações e divórcios. A outra conclusão não se poderia chegar senão pela possibilidade de realizar a dissolução da união estável de forma consensual por escritura pública. Aplicam-se aqui as mesmas exigências45 para viabilidade da separação e di- 45 Primeiramente deve haver consenso entre as partes e as mesmas devem ser capazes, não possuir filhos menores ou incapazes, estarem assistidas por advogado e no caso de inventário, não pode haver testamento. (CNJ. Re- solução 35 de 24 de Abril de 2007. Disponível em: <http://www.cnj.jus. br/index.php?option=com_content&view=article&catid=57:resolucoes&i d=2927:resolu-no-35-de-24-de-abril-de-2007->. Acesso em: 15 jan. 2010.) 37 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais vórcio consensuais extrajudiciais. Nesse sentido Júlio Ce- sar Medeiros e Maria de Guadalupe Medeiros ensinam: A solução para a omissão da lei é o emprego da analogia, de forma a aplicar o art. 1.124 – A também aos casos de dissolução da união estável. Ademais, se o próprio vínculo matrimonial pode ser dissolvido por meio de escritura pública, por que não admitir que seja a união estável, nas mesmas condições46. Corroborando este pensamento foi editado pela Corregedoria Geral de Justiça do Rio Grande do Sul o ofício circular nº. 309/2009, que trouxe em seu bojo: Senhor tabelião/registrador:considerando os termos da lei nº 11.441/07 e a ausência de previsão legal específica para a escrituração de dissolução de união estável com partilha; ressalvando, ademais, a oportunidade de sus- citação de dúvida nos casos concretos que resultem em averbação e/ou registro nos ofícios registrais, esclareço a vossa senhoria que inexiste óbice à realização de escri- tura pública de dissolução de união estável com parti- lha de bens, observados os requisitos previstos na lei nº 11.441/07, no que couber. Percebemos, então, ser somente necessária a inter- venção judicial nos casos de dissenso, filhos incapazes ou existência de testamento, conforme ratifica os artigos da sobredita Resolução: Art. 18 O(A) companheiro(a) que tenha direito à suces- 46 MEDEIROS, Julio César; MEDEIROS, Maria Guadalupe. A aplicabi- lidade da Lei 11.441/2007: inventário, partilha, separação e divórcio ex- trajudiciais. Revista Direito e Liberdade / Escola da Magistratura do Rio Grande do Norte, v.4, n.8, pt.2, p. 401-427, jan. 2008, p. 423. 38 Martiane Jaques La-Flor são é parte, observada a necessidade de ação judicial se o autor da herança não deixar outro sucessor ou não hou- ver consenso de todos os herdeiros, inclusive quanto ao reconhecimento da união estável. Art. 19 A meação de companheiro(a) pode ser reconhecida na escritura pública, desde que todos os herdeiros e interes- sados na herança, absolutamente capazes, estejam de acordo. Art. 3º As escrituras públicas de inventárioe partilha, separação e divórcio consensuais não dependem de ho- mologação judicial e são títulos hábeis para o registro ci- vil e o registro imobiliário, para a transferência de bens e direitos, bem como para promoção de todos os atos necessários à materialização das transferências de bens e levantamento de valores (DETRAN, Junta Comercial, Registro Civil de Pessoas Jurídicas, instituições financei- ras, companhias telefônicas, etc.) Seguido do provimento nº. 12/09-CGJ que alterou os artigos da Consolidação Normativa Notarial e Regis- tral do Rio Grande do Sul, regulamentando a conversão da união estável em casamento, recomendada pela Cons- tituição Federal em seu art. 226, §3º: Art. 148 – A transformação da união estável em casa- mento será procedida mediante pedido ao Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais, o qual fará exame preliminar da documentação, atentando em especial para as exigências do art. 1.525 e incisos, do CCB. Uma vez autuada e estando em ordem a documenta- ção, o Oficial remeterá ao Juiz competente, que desig- nará audiência para ouvir os requerentes e duas teste- munhas – não impedidas ou suspeitas. 39 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais Como percebemos, a conversão da união estável em casamento deve ser requerida junto ao Registro Civil das Pessoas Naturais, ficando dispensados os proclamas47 48, mas será homologado pelo juiz competente, ouvido o membro do Ministério Público.49 Somente após a homologação o juiz ordenará o re- gistro do casamento, que se realizará no Livro B auxiliar da serventia,50 no mesmo livro que recebe os casamentos religiosos com efeitos civis. Deve-se atentar ao fato, por fim, que só poderá haver dissolução de uma união estável que já tenha sido reconhe- cida pelos conviventes judicial ou extrajudicialmente, em caso contrário, a mesma escritura pública que põe termo a união estável, terá que primeiro reconhecê-la. Desta for- ma, utilizando-se do artigo 53 da Resolução em comento, havendo escritura pública declaratória de união estável ou de convivência ou de pacto patrimonial realizada ante- riormente ou mesmo sentença judicial de união estável, o Tabelião deve certificar na escritura de dissolução esta si- tuação que comprova a existência da união estável, dispen- 47 Em conformidade com o artigo 1.726, CC: “Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.” 48 De forma divergente é a norma do Estado de São Paulo, onde se requer habilitação e o posterior registro se dará no Livro B, conforme artigos 87.1 e 87.6 do Provimento 58/89 da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo. Disponível em: <http://www.tjsp.jus.br/Download/Corregedoria/Norma- sExtrajudiciais/NSCGJTomoII.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2010. Juntamente as normas do Estado do Paraná, ver item 15.7.3 CN/CGJ/PR. 49 Inteligência dos artigos 153 e 155 da Consolidação Normativa Notarial e Registral do RS. 50 Conforme artigos 53, “c” e 156 da CNNR/RS e artigo 33, III da Lei 6.015/73. 40 Martiane Jaques La-Flor sando neste caso as testemunhas de conhecimento. Caso contrário a declaração dos companheiros não bastará para a comprovação da existência da união estável, sendo in- dispensável a declaração de duas testemunhas de conheci- mento, que intervierem na escritura pública de dissolução, declarando a existência de dita união estável. Ocorre na prática que poucos recorrem à conversão da união estável em casamento, por ser um procedimento mais moroso e oneroso. A maioria opta por casar sim- plesmente, habilitando-se administrativamente junto ao Registro Civil, contra o que se insurge o Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos: “Descumpre aí o legislador, flagrantemente, o comando constitucional (artigo 226, p. 3°, CF) no sentido de que deva ser facilitada a conver- são da união estável em casamento.”51 O Deputado Ricardo Fiuzza propôs um projeto de lei (PL 6960/2002) que visava tornar tal procedimento mais ágil, conforme segue: O requerimento dos companheiros deve ser realizado ao Oficial do Registro Civil de seu domicílio e, após o de- vido processo de habilitação com manifestação favorável do Ministério Público, será lavrado o assento do casa- mento, prescindindo o ato da respectiva celebração.52 O projeto não vingou, fazendo com que os Tribu- nais criassem suas próprias normas. O Estado de São 51 SANTOS, Luiz Felipe Brasil. A União Estável no Novo Código Civil. Disponível em: <http://www.blindagemfiscal.com.br/familia/uniao_esta- vel01.htm>. Acesso em: 15 jan. 2010. 52 CAMARA. Consulta de tramitações. Disponível em: <http://www.camara. gov.br/Sileg/Prop_Detalhe.asp?id=56549>. Acesso em: 15 jan. 2010. 41 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais Paulo, perfilhando o entendimento da Constituição, emitiu parecer de n° 202/2006-E, admitindo a interven- ção judicial somente nos casos excepcionais: REGISTRO CIVIL – Procedimento de Conversão da União Estável em Casamento – Tramitação perante o Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais – Dispensa do pronunciamento judicial, salvo em casos excepcionais – Admissibilidade, desde que editada portaria neste sen- tido pelo Juízo Corregedor Permanente – Procedimento similar ao da Habilitação para o Casamento, onde já se encontra prevista a desobrigação de manifestação do juízo em determinadas situações (item 66 do Capítulo XVII das Normas de Serviço) – Hipóteses semelhantes que ensejam tratamento uniforme – Facilitação determinada pelo arti- go 226, § 3°, da CF – Edição de Provimento para que se dê nova redação aos itens 87.2 e 87.3 do Capítulo XVII das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.53 O único senão é que na conversão poderá o juiz, a pedido dos requerentes instituir o prazo inicial em que se deu a união estável, tendo o casamento assim, efeitos retroativos.54 55 Esta possibilidade de se auferir efeitos retroativos à conversão da união estável em casa- mento surge por um processo mental lógico dedutivo, pois o que adiantaria existir a norma regulamentando tal conversão se não preservasse a data em que a mes- 53 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Portal do Extrajudicial. Parecer 202/2006-E. Disponível em: <https://www.extraju- dicial.tj.sp.gov.br/pexPtl/visualizarDetalhesPublicacao.do?cdTipopublica cao=5&nuSeqpublicacao=284.>. Acesso em: 11 set. 2009. 54 Conforme previsão do artigo 152, CNNR/RS. 55 Diferentemente é a norma do Estado de São Paulo: “87.6. Não constará do assento de casamento convertido a partir da união estável, em nenhu- ma hipótese, a data do início, período ou duração desta.” 42 Martiane Jaques La-Flor ma se iniciou, pois do contrário bastaria o casamento e não haveria razão de existência na lei sobre a conver- são. Poderemos, igualmente, lançar mão de comparação com o registro de casamento religioso com efeitos civis, onde conforme o artigo 75 da Lei 6.015/73 os efeitos jurídicos do registro começa a viger da celebração do casamento religioso e não da data do registro do mesmo no Registro Civil competente.56 Em conformidade com o exposto, inclusive, o enun- ciado n. 261 do Conselho da Justiça Federal: “261 – art. 1.641: a obrigatoriedade do regime da separação de bens não se aplica a pessoa maior de sessenta anos, quando o casamento for precedido de união estável iniciada antes dessa idade.”57 Da mesma forma o julgado: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DO REGIME DE SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS PARA COMUNHÃO UNIVERSAL. INC. II DO ART. 1.641 DO CC/02. PEDIDO JURIDICA- MENTE POSSÍVEL. JULGAMENTO PELO TRI- BUNAL, NOS MOLDES DO PARÁGRAFO 3º DO ART. 515 DO CPC. MODIFICAÇÃO DO REGIME DE BENS DO CASAMENTO. POSSIBILIDADEE CONVENIÊNCIA. A alteração do regime de bens é possível juridicamente, consoante estabelece o § 2º do art. 1.639 do CCB e as razões postas pelas partes evi- denciam a conveniência para eles, constituindo o pedido motivado de que trata a lei. Assim, não é juridicamente impossível o pedido dos apelantes – conforme enten- 56 Art. 75 da Lei 6.015/73. O registro produzirá efeitos jurídicos a contar da celebração do casamento. 57 CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL. Enunciados aprovados – III jornada de direito civil: Disponível em: <http://daleth.cjf.jus.br/revista/ enunciados/IIIJornada.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2010. 43 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais dimento exposto na sentença – tendo eles o direito de postularem em juízo a troca do regime da separação obri- gatória de bens para os que possuem mais de 60 anos no momento do casamento, ainda que um deles conte com mais de sessenta anos, em face do caráter genérico da norma (inc. II do art. 1641 do CC), que merece ser rele- vada, no caso, diante da manifestação positiva das partes interessadas e atento ao princípio da isonomia. (SEGRE- DO DE JUSTIÇA) RECURSO PROVIDO.58 Ultrapassado este ponto, passamos a enfrentar a ideia de um pacto entre os conviventes, similarmente ao pacto antenupcial dos nubentes. 1.3.2 Possibilidade de um Pacto Patrimonial Como é cediço, para constituição do vínculo ma- trimonial pelo casamento (tanto o civil como o religioso com efeitos civis) deve-se inicialmente, caso escolhido regime diferente do estabelecido legalmente,59 qual seja, o da comunhão parcial de bens, lavrar, em Tabelionato de Notas, por meio de escritura pública, pacto ante- nupcial, seguindo o seu posterior registro no Livro 3 do 58 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. AC 70019358050. 7ª C.Civil. Ministro Relator: Ricardo Raupp Ruschel. Data de julgamento: 15/08/2007. Disponível em: <http://www.tjrs.jus. br>. Acesso em: 15 jan. 2010. 59 Art. 1.640, CC. Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão par- cial. Parágrafo único. Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este código regula. Quanto à forma, reduzir-se-á a termo a opção pela comunhão parcial, fazendo-se o pacto antenupcial por escritura pública, nas demais escolhas. 44 Martiane Jaques La-Flor Registro de Imóveis (Registro Auxiliar)60 do primeiro domicílio dos nubentes para que se obtenha publicida- de. Também averbar-se-á61 tal pacto, em todas as matrí- culas dos imóveis dos nubentes, conforme determina a Lei de Registros Públicos (Lei 6.01573). Cabe ressaltar que o Tabelião a ser escolhido para a lavratura do pacto antenupcial não se circunscreve ao li- mite territorial do domicílio dos nubentes, pois tais pro- fissionais só não poderão praticar atos de seu ofício fora do Município para o qual receberam delegação, confor- me rezam os artigos 8º e 9º da Lei dos Notários e Regis- tradores (Lei 8.935/94)62. Indagação surge, então, da possibilidade, à similitu- de do que ocorre com o casamento, da elaboração, pelos companheiros de um contrato de convivência que regu- lasse questões patrimoniais entre eles. Tal indagação é dirimida pela simples leitura do artigo 1.725, CC, que determina o seguinte: “Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às re- lações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.” (grifos nossos), desponta daí um novo questionamento quanto à forma a ser dada a este contrato. 60 Art. 178 da Lei 6.015/73– Registrar-se-ão no Livro nº 3 – Registro Au- xiliar: V – as convenções antenupciais; 61 Art. 167 da Lei 6.015/73– No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos. II – a averbação: 1) das convenções antenupciais e do regime de bens diversos do legal, nos registros referentes a imóveis ou a direitos reais pertencentes a qualquer dos cônjuges, inclusive os adquiridos poste- riormente ao casamento. 62 Art. 8º É livre a escolha do tabelião de notas, qualquer que seja o domi- cílio das partes ou o lugar de situação dos bens objeto do ato ou negócio; Art. 9º O tabelião de notas não poderá praticar atos de seu ofício fora do Município para o qual recebeu delegação. 45 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais Embora a lei não faça referência à forma que de- verá ser feito o referido contrato, intitulado de “pacto patrimonial” pelo Registrador Mario Mezzari, afirma ele que deverá ser feito por escritura pública, forte no artigo 1.653, CC, a exemplo do que ocorre no casamento. Po- sição que encontra discordância na doutrina, citamos o eminente doutrinador Sílvio de Salvo Venosa que afirma a não obrigatoriedade da escritura pública, já que a lei apenas fala em “contrato escrito.”63 Com a devida vênia, nos filiamos à linha de enten- dimento difundida por Mezzari, não só pelo caráter do pacto patrimonial em si, que regula matéria de ordem relevante (Direito de Família) o que requereria maior diligência que é conseguida quando lavrado por pro- fissional que traz segurança jurídica (Notário ou Tabe- lião); como também alicerçados analogicamente nos ar- tigos 1.640, parágrafo único, combinado com o 1.653, ambos do Código Civil. Pacificada a possibilidade de um pacto patrimo- nial, levanta-se ainda outra pergunta, seria possível o seu posterior registro no Livro 3 do Registro de Imóveis e sua averbação nas matrículas dos imóveis dos convi- ventes tal como o pacto patrimonial? Esta é a indagação cerne deste trabalho, o qual entendendo pela sua admis- sibilidade irá solvê-la ulteriormente. Falamos aqui em possibilidade de estipulação contra- tual, não sendo ato obrigatório entre as partes, poderá ter o seu momento de celebração estabelecido pelas partes, 63 VENOSA, Sílvio da Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 6ªed. São Paulo: Atlas. 2006. p. 451. 46 Martiane Jaques La-Flor quer antes quer no decorrer da relação afetiva.64 É ques- tão discutível, como nos aponta Weizenmann,65 já que se a união é fato e configurada pela convivência pública, contínua e duradoura, só se configuraria com a efetiva convivência, mas parte da doutrina dando uma exegese mais aberta ao artigo 1.725, CC, admite a realização pré- via de uma escritura pública declaratória que terá efeito suspensivo, ou seja, só terá eficácia se realmente se der a união pública, contínua e duradoura. Eventual alteração posterior do contrato de união estável no ensinamento de Gozzo,66 não admite restrições podendo ser modificado a qualquer tempo apenas com a anuência de ambos conviventes. Postura a qual não com- pactuamos, já que o artigo 1.639, § 2° do Código Civil somente admite a alteração do regime de bens mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, ressalvados os direitos de terceiros.67 68 64 Anotamos posições contrárias: Grieco B. Pessoa e Francisco Cahali en- tendem que deve ser na constância da relação e Guilherme Calmon e Al- buquerque Pizzolante em momento anterior. (WOHNRATH, Vinícius Parolin. Parâmetros e delimitações do contrato de convivência nas relações de união estável. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2038, 29 jan. 2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12266>. Acesso em: 18 jan. 2010.) 65 Luiz Carlos Weizenmann, Presidente do Colégio Notarial do Brasil Sec- ção do Rio Grande do Sul, em entrevista cedida por e-mail em data de 18/01/2010. 66 GOZZO, Débora apud WOHNRATH, op. cit. 67 Mesma posição adotada por Salaverry, que ainda cita outra cláusula in- disponível por vontade das partes: a de reconhecimento de filho. (SALA- VERRY, op. cit.). 68 Ainda o grande mestre da áreanotarial, Luiz Carlos Weizenmann, sobre o assunto: “Entendo que, por analogia, a alteração só poderia ser feita com intervenção judicial. No casamento o juiz é quem julga se os motivos para alteração são razoáveis (art. 1639, §2º.-CC) Por isso, não faço escrituras 47 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais Noutro curso, poderão os conviventes de comum acor- do extinguirem o contrato através de realização de escritura pública de dissolução de união estável com partilha de bens, fulcro no art. 1.124-A, CPC, de acordo com ofício circular nº. 309/2009 CGJ/RS; extinguindo-o também com a mor- te de uma das partes ou o fim da situação fática existente. A diferença fundamental entre o pacto antenupcial e o contrato de convivência reside em relação aos efeitos surtidos,69 enquanto o pacto antenupcial só gerará efei- tos se os nubentes casarem, o contrato surte os efeitos desde já, da sua lavratura independente de seu registro. Friza-se, o contrato de convivência não cria a união es- tável (está é fato), mas ajuda a estabelecer regras, que para Cahali,70 podem ser as mais diversas ao arbítrio dos conviventes, porém suas cláusulas71 não poderão ser vetadas pelos dispositivos legais, nem eivadas de vícios e ilicitudes e terão efeitos obrigatórios somente entre os contratantes, não se pode obrigar que outrem reconhe- declaratórias de alteração de regime de bens na união estável. Não estou dizendo com isso que eles estariam ‘proibidos’ de fazer, afinal tudo é ‘fato’, e, por se tratar de fato, nada impede que eles façam uma declaratória no meu Tabelionato hoje e daqui a seis meses façam nova declaração em ou- tro Tabelionato declarando a união estável com outro regime, sem referir a existência do anterior, pois não existe registro cativo para isso.” 69 SALAVERRY, Ursula Ernlund. Aspectos Patrimoniais no Ato da Conversão da União Estável em Casamento. Disponível em: <www.cesumar.br/pesquisa/perio- dicos/index.php/revjuridica/article/.../461>. Acesso em: 15 jan. 2010. 70 CAHALI apud SALAVERRY, Ursula Ernlund. Aspectos Patrimoniais no Ato da Conversão da União Estável em Casamento. Disponível em: <www. cesumar.br/pesquisa/periodicos/index.php/revjuridica/article/.../461>. Acesso em: 15 jan. 2010. 71 Quanto às cláusulas poderão estipular interesses futuros ou situações pre- téritas, ao exemplo de definir propriedade de imóvel adquirido anterior- mente pelo casal. (VENOSA, op. cit. pp. 43-44.) 48 Martiane Jaques La-Flor ça o contrato firmado entre os conviventes. Podem ser cláusulas de estipulação diferenciada do patrimônio, di- reito real de habitação, formal de partilha caso haja dis- solução da união, pagamento de indenização por quem der causa a dissolução, escolha de arbitragem para reso- lução de conflitos, proposições sobre a administração dos bens, pensão alimentícia72 e previdenciária, reco- nhecimento de filhos, dentre outros, o próprio regime de bens que os regulará, conforme explanação abaixo. 1.3.3 Regime de Bens A doutrina diverge, bem assim, quanto ao regime que se aplicaria às uniões estáveis quando inexistente o pacto patrimonial; para Gama o regime legal que regeria as uniões estáveis não seriam os relacionados com o casa- mento, mas aplicar-se-ia o art. 1.660, inciso I do Código Civil73, pois que há presunção de comunhão das aquisi- ções feitas durante o convívio dos companheiros, confi- gurando o regime de participação final nos aquestos, uma 72 Que não terá força de título executivo: “Habeas corpus. Título executivo extrajudicial. Escritura pública. Alimentos. Art. 733 do Código de Processo Civil. Prisão civil.1. O des- cumprimento de escritura pública celebrada entre os interessados, sem a intervenção do Poder Judiciário, fixando alimentos, não pode ensejar a prisão civil do devedor com base no art. 733 do Código de Processo Civil, restrito à “execução de sentença ou de decisão, que fixa os alimentos pro- visionais”.2. Habeas corpus concedido.” (STJ. HC 22401/SP. 3ª T. Mi- nistro Relator: Carlos Alberto Menezes Direito. Disponível em: <http:// www.stj.jus.br>. Acesso em: 14 jan.2010.) 73 Art. 1.660. Entram na comunhão: I – os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; 49 As Implicações da União Estável no Registro de Imóveis à Luz dos Princípios Registrais vez que os bens elencados no art. 1.659, CC74 e os incisos II, IV e V do art. 1.660, CC também não se comunica- riam ao regime legal de bens do companheirismo.75 Em posição divergente e majoritária, Sílvio Rodri- gues76 e Marilene Guimarães sustentam que passam a par- tilhar todo o patrimônio adquirido na constância da união, como se casados fossem77. Para Pizzolante78 não se fala em sede de união estável em comunicabilidade ou incomuni- cabilidade de aquestos, como se discute no casamento. A união estável reger-se-á pelas normas pertinentes 74 Art. 1.659. Excluem-se da comunhão: I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; II – os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares; III – as obrigações anteriores ao casamento; IV – as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal; V – os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; VI – os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; VII – as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes. (Ibidem.) 75 NOGUEIRA DA GAMA, Guilherme Calmon. Regime legal de bens no companheirismo: o paradigma do regime da comunhão parcial de bens. apud LERRER, Felipe Jakobson. Execução contra o companheiro na união estável. In: MADALENO, Rolf (Org.). Ações de Direito de Família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 232. 76 RODRIGUES, Sílvio apud LERRER, Felipe Jakobson. Execução contra o companheiro na união estável. In: MADALENO, Rolf (Org.). Ações de Direito de Família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 232. 77 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp 915297 / MG. 3ªturma. Ministra Relatora: Nancy Andrighi. Data julgamento: 13/11/2008; STJ. REsp 251057/SP. 4ª turma. Ministro Relator: Aldir Passarinho Junior. Data de julgamento: 22/04/2003. Disponível em: <http://www.stj.jus. br>. Acesso em: 12 set. 2009. 78 PIZZOLANTE, Albuquerque de; PIRES, Francisco E.O. União Estável no Sistema Jurídico Brasileiro. São Paulo: Atlas, 1999. p.114. 50 Martiane Jaques La-Flor ao regime da comunhão parcial de bens o que nos reme- te, necessariamente, aos artigos 1.659 e 1.660 do Código Civil, admitindo assim, a divisão de bens adquiridos por fato eventual e os frutos dos bens comuns pendentes. Portanto, se o bem adquirido, embora após a cons- tância da união estável, for fruto de patrimônio particular de um dos conviventes não se cogita falar em aquisição em condomínio ou patrimônio comum. Assunto intrigante circunda a escolha do regime de bens quando feita em momento oportuno. Explico: se os conviventes há anos convivem estavelmente sem qualquer contrato escrito que os regule, vindo posteriormente firmar pacto estabelecendo o regime de separação absoluta entre eles, teremos que dar efeito ex nunc a este ato, devendo os bens adquiridos anteriormente ser partilhados em partes iguais entre os parceiros, já que há época da aquisição deste imperava o regime de comunhão parcial de bens. 1.3.4 Ausência de Ato Formal versus Aquisição de Direitos Reais Como mencionado, sendo a união estável um fato social, independe de qualquer rigor formal para sua caracterização,79 opostamente do que se dá com o ca- 79 Euclides de Oliveira explica: ‘não há formalidade prévia nem qualquer ato solene que
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