Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
ANÁLISE DA MARCHA DE PACIENTE HEMIPARÉTICO DECORRENTE DE ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO – ESTUDO DE CASO Cerisley Regina Martins1, Rina Márcia Magnani2. 1Graduação em Fisioterapia, Pontifícia Universidade Católica – PUC, Poços de Caldas/MG. 2Universidade Estadual Paulista – Unesp, Marília/SP. Resumo: O objetivo deste estudo foi caracterizar a marcha hemiparética conseqüente de AVE, em um estudo de caso descritivo de um paciente portador de hemiparesia à esquerda conseqüente de AVE isquêmico do sexo masculino, 40 anos, estatura de 1,68 m e massa corporal de 80 kg. Na avaliação física observou-se redução da força muscular, ADM, déficit de equilíbrio em pé e presença de hipertonia no membro inferior hemiplégico, fatores que afetam diretamente a marcha do paciente. Os parâmetros temporais da marcha desse paciente apresentaram os seguintes valores: velocidade média da marcha de 1,35 (±1,29) metros/segundo e cadência de 1,62 (±0,032) passos/segundo, já os espaciais foram passo direito 25,9 (±1,14) cm, esquerdo (hemiparético) 19,4 (±4,03) cm e passada 45,3 (±3,89)cm. Observamos a necessidade de um tratamento focalizado na marcha, equilíbrio e alongamento para a prevenção de futuras limitações de movimento, que interferem na habilidade funcional da marcha em pacientes hemiplégicos. Palavras-chaves: acidente vascular cerebral; hemiplegia; análise da marcha. Abstract: The objective of this study was to characterizes the hemiparetic gait in consequence of an AVE, in a descriptive case study of a patient with left hemiparesia consequent of ischemic AVE of the masculine sex, 40 years, stature of 1, 68 meters and corporal mass of 80 kg. The physical evaluation were observed reduction of the muscular force, ADM, balance deficit and presence of hypertonic in the lower limb hemiplegics, these factors affect directly the patient’s gait. The temporal parameters of this patient gait presented the following values: average speed of the 1,35 (±1,29) meters/second and cadence of 1,62 (±0,032) steps/second, while the spatial parameters was right left 25,9 (±1,14) cm, left (hemiparetic) 19,4 (±4,03) cm and stread 45,3 (±3,89)cm. We observed the necessity of a treatment focused in the march, balance and strength for the prevention of future movement limitations, which affects the functional ability of the hemiplegics patient’s gait. Keywords: stroke, hemiplegic, gait analysis. INTRODUÇÃO O Acidente Vascular Encefálico (AVE) é a patologia neurológica mais comum, resulta de uma restrição da irrigação sanguínea ao cérebro, causando lesões celulares e danos nas funções cerebrais de suposta origem vascular e com mais de 24 horas de duração, devido a uma isquemia ou hemorragia. A gravidade da lesão esta relacionada com a extensão e a área cerebral atingida [1,2]. O AVE merece grande atenção dos profissionais da saúde por ser um problema de saúde publica não só no Brasil, mas também no mundo. Afirmam que ainda trata-se da terceira maior causa de morte, superada apenas pelas doenças cardíacas e o câncer [3]. A incidência da doença aumenta rapidamente com o avançar da idade. O AVE é responsável por cerca de 25% dos óbitos nos paises desenvolvidos e por boa parte da incapacidade que atinge os mais idosos [4]. Vários déficits neurológicos estão presentes após AVE como: alterações do tônus, distúrbios da linguagem, da fala, compreensão, sensibilidade, memória, esquema corporal, amplitude de movimento, força muscular, sendo a hemiplegia um sinal clássico desta patologia. A hemiplegia se caracteriza por perda dos movimentos voluntários em um hemicorpo com alterações musculares, no lado oposto do corpo ao da lesão no hemisfério cerebral [5,6]. Indivíduos que sofrem hemiparesia são acometidos por uma restrição de suas habilidades físicas como controle voluntário do membro, propriocepção adequada, equilíbrio do corpo e tônus postural e de movimento intactos e automaticamente lançam mão de compensações para as ações e posturas que devem desempenhar na realização de sua marcha [7,8]. A dificuldade em suportar o peso corporal em pé, sobre o membro afetado, somente se torna possível com ajuda da espasticidade extensora. O padrão de andar desenvolve-se semelhante ao padrão de se movimentar no chão na posição sentada, arrastando o lado afetado atrás de si [9]. Eles acabam transferindo o peso para o membro não plégico, resultando em significativa assimetria. A fase de apoio no membro plégico é curta e abrupta e o corpo não esta preparado para uma progressão anterior. Os déficits resultantes da marcha não são apenas devido à fraqueza muscular, mas também às anormalidades complexas no controle motor [1]. Durante a marcha, o paciente hemiplégico freqüentemente exibe um controle em massa do membro. Devido o padrão sinérgico de massa, quando ele estende o joelho, estende também o quadril e o tornozelo. Similarmente, a flexão do quadril é acompanhada pela flexão do tornozelo. A dependência por completa destes padrões motores primitivos para a atividade do membro hemiplégico resulta num passo de aproximadamente metade do seu comprimento normal. A sinergia de flexão faz o paciente avançar arrastando o membro, mas logo que o joelho é estendido, a extensão associada do quadril retrai a perna para a linha do corpo. A inclinação anterior e a rotação do tronco levam a um deslocamento do centro de gravidade, que associado à retração dos adutores, impulsionam o pé hemiplégico à frente do outro membro [10]. Os pacientes exibem uma redução na velocidade da marcha e no tamanho do passo, bem como na diminuição do equilíbrio e inabilidade para transferir o peso no membro inferior afetado [3]. Esses pacientes apresentam dificuldade em modificar a velocidade, a direção, a duração e a intensidade da atividade muscular, resultando em um movimento mal coordenado do membro afetado [11]. Os valores médios de indivíduos com parâmetros normais de marcha de velocidade é 1,25 m/seg e cadência de 110 passos/min. O comprimento do passo e passada é de 0,8 m e 1,47 m. [12]. Em indivíduos hemiparéticos a média dos parâmetros cinemáticos da marcha representa velocidade de 0,54 m/seg, cadência de 66 passos/min e comprimento de passo hemiparético correspondente a 0,37 m e da passada, 0,93 m. [10]. O objetivo deste estudo foi avaliar os parâmetros cinemáticos da marcha hemiparética de um indivíduo que sofreu AVE e a condição musculoesquelética dos membros inferiores. METODOLOGIA Este é um estudo de caso descritivo constituído de uma avaliação da marcha de um paciente portador de hemiparesia à esquerda conseqüente de AVE isquêmico do sexo masculino, 40 anos, estatura de 1,68 m e massa corporal de 80 kg e que aceitou participar do estudo por meio do termo de consentimento livre e esclarecido. O procedimento foi dividido em duas fases, na primeira foi realizada uma avaliação física de padrão patológico, força muscular, amplitude de movimento (ADM) e espasticidade do paciente e na segunda constou da análise da marcha. O padrão postural patológico instalado foi analisado por inspeção durante a avaliação em frente ao simetrógrafo e equilíbrio analisado através de transferências e atividades cotidianas da Escala de Equilíbrio de Berg. A força muscular dos grupos musculares de todas as articulações foi testada em ambos os membros inferiores por meio do teste de Kendall com graduação de força de 0 a 5. A ADM dos mesmos grupos musculares foi mensurada através da goniometria com goniômetro. A espasticidade foiavaliada através da escala de Ashworth. Foi analisada a marcha sem auxílio e independente do paciente num percurso de 10 metros sem obstáculos. A cronometragem da velocidade e cadência foi quantificada em cinco voltas no percurso, e mensuração do comprimento dos passos direito e esquerdo e da passada através da caminhada sobre papel carbonado ao longo do percurso. A análise dos dados de média e desvio padrão dos parâmetros foi realizada com o software New Instat 2.0. RESULTADOS O comprometimento motor do paciente estudado é caracterizado por adução de ombro, flexão de cotovelo, punho e dedos do membro superior esquerdo. Já o membro inferior esquerdo apresentava padrão em rotação interna da articulação do quadril, hiperextensão de joelho, flexão plantar e inversão do pé, em posição ortostática. A avaliação da espasticidade dos membros inferiores demonstrou hipertonia acentuada em dorsiflexores e plantiflexores do tornozelo, flexão de joelho, flexão e extensão de quadril. O equilíbrio estático demonstrou maior déficit nas posições em pé e sentado. Enquanto que para equilíbrio dinâmico o paciente alcançou as passagens das posturas (de pé para sentado; sentado para decúbito dorsal; rolamentos para o lado acometido e não acometido, decúbito ventral para gato e gato para sentado sobre calcanhares) sem auxílio e sem dissociação de cinturas e não foi capaz de realizar as transferências de ajoelhado para semi-ajoelhado e semi-ajoelhado para de pé. Pudemos observar maior fraqueza muscular instalada no membro inferior esquerdo ou hemiparético, especialmente no pé. A ADM das articulações dos membros inferiores foi menor no membro inferior esquerdo, sendo as mais importantes nos movimentos do tornozelo e quadril. O paciente apresentou marcha ceifante, com uso de musculatura quadrado lombar, pé eqüino e em inversão, embora seja independente e sem auxílio. Os parâmetros temporais da marcha desse paciente apresentaram os seguintes valores: velocidade média da marcha de 1,35 (±1,29) metros por segundo e cadência de 1,62 (±0,032) passos por segundo ou 97 passos por minuto. Já os parâmetros espaciais apresentaram os valores 25,9 (±1,14) para comprimento do passo direito, e 19,4 (±4,03) para o passo esquerdo e passada 45,3 (±3,9), sendo este o membro acometido. DISCUSSÃO A marcha hemiplégica é caracterizada como uma marcha lenta, abrupta e laboriosa, ocasionada pelos vários déficits na percepção- cognição, força muscular, tônus, controle motor, equilíbrio e mobilidade articular e que mencionou que o potencial da marcha na hemiplegia de cada paciente, depende do controle motor seletivo residual, da espasticidade e do padrão da resposta muscular [13]. Como evidenciado em nosso estudo, a redução da força muscular, ADM, déficit de equilíbrio na postura em pé e presença de hipertonia no membro inferior hemiplégico também foram fatores que afetaram diretamente a marcha do paciente, principalmente no passo hemiparético. Dos padrões básicos da postura e da marcha hemiplégica, a alteração mais freqüente ocorre em nível da articulação do tornozelo, onde 70% dos indivíduos hemiplégicos apresentam uma flexão dorsal do pé insuficiente durante a fase de balanço, ocasionando o arrasto do pé; 65% dos indivíduos hemiplégicos podem apresentar uma flexão dorsal insuficiente também na fase de apoio impedindo o posicionamento adequado do pé. Além da postura em eqüino do pé (em plantiflexão), ocorre também uma limitada extensão do quadril e a queda da pelve do lado contralateral na fase de balanço podendo-se observar uma elevação excessiva do joelho para liberar a passagem do pé e a ausência de rotação anterior da pelve para o avanço do membro inferior [13]. Seguindo os achados clínicos do nosso estudo, onde observamos uma redução significativa das ADM’s das articulações do tornozelo e extensão do quadril o que segue os achados de vários estudos que demonstraram o fenômeno que o movimento articular humano na ausência de respostas proprioceptivas, pode exibir um comportamento estável de equilíbrio e que a função viscoelástica do sistema musculoesquelético proporciona um controlador do sistema [14]. Em indivíduos normais, a velocidade natural da marcha, varia de 1,15m a 1.75 metros/segundo, com média de 1,36 metros/segundo e a cadência apresentou valores, em velocidade natural de marcha, variando de 96 a 142 passos/minuto com média de 114,5 passos/minuto [10, 12, 15]. Já em estudos realizados com indivíduos hemiparéticos os parâmetros relacionados ao tempo-distância apresentam os seguintes valores médios, velocidade entre 0,23 e 0,73 metros/segundo com média de 0,53 metros/segundo e cadencia de 66 passos/minuto [4, 10, 12]. Sendo que em nosso estudo de caso encontramos 1,35 metros/segundo de velocidade da marcha, valor bem próximo da média encontrada para indivíduos normais e cadência de 97 passos/minuto, sendo 84% do valor médio atribuído aos sujeitos normais e acima da média de indivíduos hemiparéticos. A velocidade de caminhada está relacionada com o estágio de recuperação ou melhora do desempenho sensório-motor dos pacientes hemiparéticos [4]. E também a velocidade da marcha tem valor prognóstico para indicar o grau de independência a ser alcançado pelo paciente, além de servir como parâmetro comparativo mensurável durante o programa de reabilitação [13]. Com relação aos parâmetros espaciais os indivíduos normais apresentam comprimento do passo variando de 80 a 120 cm, com passada de aproximadamente 150 cm [10, 12]. Enquanto que sujeitos hemiparéticos apresentam valores bem reduzidos, com passo hemiparético de 37 cm e passada 93 cm [10]. No nosso estudo foram encontrados os valores de 25,9 cm para o passo direito, 19,4 cm para o esquerdo (uma redução de 25%, comparado ao lado direito) e 45,3 cm para a passada esquerda, de acordo com as citações acima mencionadas demonstrando valores espaciais menores (53% do passo e 49%da passada) para pacientes com marcha hemiplégica decorrente de AVE. Indivíduos hemiparéticos apresentam passos mais curtos, maior duração da fase de apoio e menor duração da fase de oscilação no lado afetado em relação ao sadio, com acentuada flexão de quadril do lado afetado durante o ponto médio da fase de apoio, a qual, por colocar o centro da massa bastante à frente do joelho, pode explicar o aumento do momento de extensão do joelho devido aos componentes verticais de força. A transferência lateral do lado afetado encontra-se diminuída assim como a flexão do joelho e a dorsiflexão do tornozelo estão prejudicadas [13]. Conclui-se que através da avaliação fisioterapêutica e das variáveis identificadas neste trabalho, observa-se a necessidade de um tratamento focalizado na marcha, no equilíbrio e no alongamento para a prevenção de futuras limitações de movimento, já que estes fatores interferem diretamente na habilidade funcional da marcha em pacientes hemiplégicos. REFERÊNCIAS [1] Guedes PV, Mota EPO. Protocolo de avaliação de marcha para pacientes hemiplégicos pós- acidente vascular cerebral. Reabilitar, 2000; 8(16): 16- 19. [2] Castro RB, Vianna LM. Mecanismos que explicam o efeito da efetividade física na prevenção de acidente vascular encefálico. Fisioterapia Brasil 2004; 5(3): 221-223. [3] Soares AV. A combinação da facilitação neuromuscular proprioceptiva com o biofeedback eletromiográficona recuperação do pé caído e na marcha de paciente com acidente vascular cerebral. Fisioterapia em Movimento 2003; 16(2): 61-72. [4] Veronezi AMG, et al. Avaliação da performance da marcha de pacientes hemiplégicos do projeto hemiplegia. Fisioterapia em Movimento. 2004; 17(1): 31-38. [5] Magri M, Silva NS, Nielsen MBP. Influência da inervação recíproca na recuperação da função motora de paciente hemiplégico por acidente vascular cerebral. Fisioterapia Brasil. 2003:4(3): 223-226. [6] UMPHRED 2004 [7] Baron CE et al. Avaliação da efetividade da palmilha FES na marcha de pacientes hemiplégicos. Fisioterapia Brasil. 2003; 4(4): 243- 246. [8] Oliveira SCF, Meira JR, Lucema NM. Fisioterapia em grupo utilizando técnicas de relaxamento: influência no grau de independência funcional de pacientes com seqüelas de acidente vascular cerebral. Fisioterapia Brasil. 2001; 2(4): 247-252. [9] Rabacher M et al. Análise fisioterapêutica da marcha de pacientes hemiplégicos espásticos utilizando a equoterapia. Reabilitar. 2004; 6(22): 65-69. [10] Alencar JF et al. Análise cinemática da marcha em pacientes hemiparéticos tratados nos serviços de fisioterapia da UFPB. Anais do VII Congresso Brasileiro de Biomecânica; 2000. p.197-202. [11] Coelho JL, Abrahão F, Mattioli R. Aumento do torque muscular após tratamento em esteira com suporte parcial de peso em pacientes com hemiparesia crônica. Revista Brasileira de Fisioterapia. 2004; 8(2): 137-143. [12] Abreu F, et al. Analise quantitativa da marcha no idoso institucionalizado. Fisioterapia Brasil. 2003; 4(2): 92-94. [13] Saad M. Análise da Marcha: Manual do CAMO-SBMFR (Comitê de Análise de Movimento da Sociedade Brasileira de Medicina Física e Reabilitação). São Paulo, 1997 Email: rinamagnani@gmail.com [14] Duan XH, Allen RH, Sun JQ. A stiffness varying model of human gait. Med. Eng. Phys. 1997; 19(6):518-524. [15] Malisz T, Santos G, Ávila AO. Análise do comportamento cinemático da marcha de um paciente portador de diplegia espástica submetido a tratamento fisioterápico. Anais do VII Congresso Brasileira de Biomecânica; 2000.p.203-208.
Compartilhar