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AUTOMAÇÃO E TRABALHO HUMANO

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AUTOMAÇÃO E TRABALHO HUMANO: CONSIDERAÇÕES GERAIS A
PARTIR DA INDÚSTRIA METALÚRGICA
Geraldo Augusto Pinto1
Introdução
Apresentar-se o avanço da automação nos locais de trabalho como destinada a um
aproveitamento qualitativamente superior da força de trabalho, seja no sentido de
libertá-la de tarefas arriscadas, seja no de deslocar os (as) trabalhadores (as) por elas
responsáveis a atividades consideradas mais qualificadas, não é algo raro na história,
principalmente em se tratando dos discursos dos proprietários dos meios de produção.
Todavia, estudos empreendidos numa perspectiva histórica e crítica acerca dos modos
de produção e das formas de apropriação privada do trabalho humano permitem
questionar tais discursos, indagando-se, por exemplo, acerca do conteúdo das novas
qualificações exigidas aos (às) trabalhadores (as) nestas mudanças, as sutilezas nas
formas de controle social surgidas e, mesmo de uma perspectiva mais ampla, os custos e
benefícios sociais advindos desses processos de “objetivação” do trabalho humano em
máquinas, considerando-se a totalidade dos esforços investidos pela sociedade na
formação educacional e profissional da sua força de trabalho, em face de fenômenos
como o desemprego estrutural, a rotatividade ou mesmo o absenteísmo.
Dentro dessa temática, pretende-se no presente texto abordar as relações entre a
automação e o trabalho humano no contexto histórico do capitalismo contemporâneo,
amparando-se em experiências como as desenvolvidas por setores avançados da
indústria metalúrgica, como a cadeia automotiva, e os sistemas de organização do
trabalho que, daí surgidos, tornaram-se os mais influentes, desde o início do século XX
até os dias atuais, quais sejam: o sistema taylorista/fordista e o sistema toyotista.
Objetivos
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Analisar alguns dos principais precedentes e efeitos da automação do trabalho humano
no século XX, a qual ocorreu, ora sob a metodologia de organização taylorista/fordista,
ora sob a metodologia toyotista. Entre as diferenças, nesses casos, encontra-se o uso de
um mesmo conceito, o de flexibilidade, como meta a ser alcançada pelos proprietários
dos meios de produção, ou pelas gerências assalariadas das empresas.
Mostrar-se-á, então, como o conceito de flexibilidade adquire significados distintos em
cada situação, embora o pressuposto básico de sua aplicação no modo de produção
capitalista seja o mesmo: sustentar a propriedade privada dos meios de produção e a
divisão social e técnica do trabalho, combater as lutas sociais dos que vivem da venda
da própria força de trabalho, multiplicar as formas de assalariamento e proletarização,
tudo em prol de manter-se o circuito global de acumulação de capital.
Nessa perspectiva de análise, questiona-se neste texto a hipótese de uma “qualificação”
inerente ao trabalho denominado “polivalente” pelo sistema toyotista, ao supor que tal
polivalência resgata a compreensão global dos (as) trabalhadores (as) acerca dos limites
e alcances das suas funções no conjunto geral da divisão social e técnica do trabalho em
que se inserem nas organizações contemporâneas.
Metodologia
Este texto procede de uma revisão da literatura sobre o assunto, em especial pesquisas
publicadas em livros, em artigos de periódicos científicos, em dissertações de mestrado
e teses de doutorado.
Quanto à orientação teórico-metodológica seguida, perfaz-se o movimento dialético do
materialismo histórico, pelo qual todo fenômeno social, sensório ou ideológico, tem sua
origem, fundamento e explicação na realidade concreta das relações sociais
estabelecidas entre os seres humanos e o meio ambiente, ao longo da história. Parte-se
aqui, ademais, do pressuposto crítico da economia política marxista de que o fim último
da produção capitalista é a acumulação de capital, sendo que tal fim é mantido através
da concorrência, entre os empresários capitalistas (detentores dos meios de produção e
compradores de força de trabalho), sobre as possibilidades de ampliação dos lucros: (1)
seja pelo rebaixamento dos salários ou extensão das jornadas de trabalho – através da
 
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 Docente do Centro de Educação e Letras da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus de Foz
3
mais-valia absoluta; (2) seja por métodos que elevem a produtividade pela redução
crescente do tempo de trabalho necessário à produção de mercadorias – através da mais-
valia relativa; (3) seja pelo aumento do giro de capital através da taxa decrescente do
valor de uso das mercadorias produzidas.
Segundo o Dicionário crítico sobre trabalho e tecnologia:
O termo automação [...] diz respeito a todo instrumento ou
objeto que funcione sem a intervenção humana, podendo ser
aplicado a qualquer tipo de máquina ou artefato que opere desse
modo. [...] Atualmente, com a mudança em curso da automação
de base eletromecânica para a de base eletroeletrônica, passa a
ser utilizado o termo automatização, que ‘... implica técnicas
diversas de coleta, armazenamento, processamento e
transmissão de informações’ [...], materializadas em diferentes
tipos de equipamentos utilizados na produção de bens e
serviços. Apesar dessas diferenciações, é comum, na literatura
sobre o tema, a utilização do termo automação em referência,
também, às tecnologias de base microeletrônica (CATTANI,
1999, p. 25, 26).
Considera-se aqui, portanto, que a automação situa-se dentro das estratégias inerentes à
segunda alternativa acima, ou seja, através de métodos que elevem a produtividade pela
redução crescente do tempo de trabalho necessário à produção de mercadorias. Esta
alternativa implica, por sua vez, considerarem-se as inovações ocorridas nos métodos de
organização do trabalho, pois, historicamente, se a elevação da produtividade foi
acompanhada por uma crescente automação, este último fenômeno é muito mais o
resultado de sucessivas mudanças no conteúdo das funções e das tarefas desempenhadas
pelos trabalhadores, do que o contrário.
Assim, na análise aqui apresentada, o elemento “maquinaria” é compreendido como
parte das diversas configurações da divisão social e técnica do trabalho humano e, nesse
sentido, toma-se por base três sistemas que constituíram os pilares da organização
técnica capitalista do trabalho no século XX: o taylorismo, o fordismo e o toyotismo.
Resultados
 
do Iguaçu. Endereço para contato: CEL/Unioeste. E-mail: geraldoaugusto@hotmail.com
4
A automação de qualquer processo de trabalho, no sentido da absorção pelas máquinas
de tarefas realizadas por seres humanos, relaciona-se estreitamente com a forma pela
qual o trabalho humano se constitui, como atividade individual e social, num dado
momento histórico, ou seja: implica considerarem-se, de um lado, os componentes
cognitivos e corpóreos do trabalho individual e, de outro, a distribuição desigual de tais
componentes entre indivíduos pertencentes a grupos distintos na sociedade, mediante o
estabelecimento de uma divisão social do trabalho. Ora, junto desta última, encontra-se
também uma determinada divisão técnica do trabalho, na medida em que se atribuem
aos (às) trabalhadores (as), individualmente, prescrições sobre o desempenho de suas
atividades, variantes conforme o contexto histórico-cultural em que são realizadas.
Percebe-se, assim, que essa divisão técnica, fundamento de toda automação, não apenas
se alicerça como também reproduz, numa relação dialética, todo o edifício de uma
divisão social desigual, não apenas das atividades, mas dos produtos do trabalho entre
os seres humanos. É a essa divisão técnica a que se refere no presente texto a expressão
“organização do trabalho” (PINTO,2007a).
Uma vez que “a história de toda sociedade até hoje é a história de lutas de classes”
(MARX, 1988, p. 66), em cada momento histórico, o conhecimento empírico e teórico
acumulado acerca das diversas formas de organização do trabalho foi objeto de disputa
entre os grupos sociais. Nesse sentido, todo argumento a favor da conservação de uma
determinada divisão técnica do trabalho expressa o interesse de uma classe dominante
em manter, num dado contexto histórico, a sua supremacia material e ideológica, por
meio de uma específica divisão social do trabalho e de uma correlata apropriação
privada dos seus resultados produtivos (PINTO, 2007a).
Analisando por esse prisma as sociedades contemporâneas, é possível supor que o
conhecimento acerca da organização do trabalho nunca tenha explicitado tanto a sua
importância política quanto após a emergência do modo de produção capitalista.
Instaurou-se, desde então, uma disputa aberta entre o empresariado capitalista (classe
proprietária dos meios de produção e compradora de força de trabalho) e os
trabalhadores (classe expropriada nesse processo e cuja subsistência exige a venda da
sua capacidade de trabalho em troca de salários): enquanto aos últimos tal conhecimento
passou a ser o principal meio de assegurar a sua vida, aos primeiros é imprescindível
5
enquanto um meio de controle social, econômico e político da classe trabalhadora, no
objetivo de manter o sistema de acumulação de capital (PINTO, 2003).2
Com as descobertas científicas sendo aplicadas aos processos produtivos, em especial
após o século XIX, configura-se uma situação cada vez mais tensa: ao passo que certas
atividades arriscadas (como o carregamento excessivo de pesos ou a manipulação direta
de produtos tóxicos) foram sendo assumidas por máquinas, paralelamente o controle
dos trabalhadores pelos empregadores foi sendo ampliado, pois a automação, além de
incorporar nas máquinas a experiência profissional ou o conhecimento tácito destes,
interveio, não obstante, também no ritmo das suas tarefas, aumentando, mesmo junto da
redução das jornadas, a intensidade do trabalho e provocando, com isso, uma constante
diversidade de lesões e de acidentes (PINTO, 2003, 2007b).
A explicação desse aparente paradoxo é complexa, pois exigiria aqui uma extensa
digressão sobre os fundamentos da teoria do valor em Marx, ou, pelo menos, sobre as
relações entre a propriedade privada, a divisão do trabalho, o processo de alienação, as
trocas e a estratificação social no modo de produção capitalista. De qualquer forma,
pode-se apontar aqui alguns elementos que, de um modo mais imediato, estão presentes
nesta relação contraditória entre a automação e o trabalho humano no modo de
produção capitalista.
Preliminarmente, a transferência de atividades do trabalho humano assalariado às
máquinas somente é considerada economicamente viável, do ponto de vista do
empregador capitalista, quando estas mesmas atividades, ao longo de sucessivas
reformulações, atingem uma simplicidade que as torna passíveis de serem assimiladas
por uma maquinaria tão barata quanto os custos de reprodução social dos trabalhadores.
Isso em parte explica o aparente paradoxo do combate a certas causas de acidentes
enquanto se geram outras, pois, quando introduzida no espaço de trabalho, qualquer
máquina não somente substitui o trabalho humano, como põe em marcha uma
 
2
 Essa luta atravessou fases. Enquanto os primeiros empresários capitalistas eram apenas fornecedores de
matérias-primas e coletores do resultado da transformação destas pelos artífices (entregando-as como
produtos acabados aos consumidores ou comerciantes), a complexa trama da divisão técnica do trabalho
não lhes interessava. Aos trabalhadores cabia desenvolver um conjunto de habilidades e competências a
serem empreendidas na transformação dos materiais brutos e, por isso, desde então eram responsáveis
pela organização dos processos de trabalho realizados individualmente ou em equipe. Mais adiante,
entretanto, a ampliação do comércio e da competição por novos mercados, se alastrando para além das
necessidades locais, elevaram as exigências nos prazos e na qualidade dos produtos, tendo então o
conhecimento acerca da organização do trabalho alçado a posição de prioridade estratégica pelos
empresários capitalistas (PINTO, 2003).
6
capacidade de trabalho sobre-humana, a qual exige dos trabalhadores remanescentes
uma adequação individual e grupal, cognitiva e corpórea, a um “ritmo máximo” (pois
sempre potencialmente maior que o limite humano) de extração de excedentes de
trabalho nas jornadas3.
Há, no entanto, uma questão ainda mais importante: se toda automação, para se tornar
viável, é precedida por mudanças na organização do trabalho, as alterações aí propostas
não podem prescindir do conhecimento e da habilidade historicamente acumulados
pelos (as) trabalhadores (as). Precedendo toda automação, houve, assim, uma intensa
acumulação, sistematização, experimentação, compêndio e elaboração, nos escritórios
dos empregadores capitalistas e dos seus gestores assalariados, das mais variadas
formas, tradicionalmente operárias, de organização e execução do trabalho humano.
Não foi outro o papel de Taylor, considerado o criador da chamada Administração
“Científica”, na virada do século XIX para o XX. E, por isso, talvez ninguém melhor do
que ele para deixar tão claro a impossível neutralidade axiológica da Ciência: ora, ao
elaborar seus estudos, Taylor não somente partiu do conhecimento e das habilidades
tradicionais, acumuladas historicamente pelos próprios trabalhadores, como, por meio
de pesquisas feitas em condições claramente artificiais, buscou depreciá-los e entregar,
de forma parcial, tais conhecimentos às gerências das empresas, com a ilusão de que
estas pudessem desenvolver aspectos potencialidades puramente “técnicas” do trabalho
(PINTO, 2007a).
Mesmo que isso não viesse a ocorrer como esperava Taylor, haja vista as reações da
classe trabalhadora e as constantes crises no processo global de acumulação de capital, o
taylorismo, por onde se espalhou, padronizou formas complexas do trabalho humano
em atividades uniformes e, com isso, possibilitou a distribuição dos trabalhadores e suas
ferramentas ao longo de uma trajetória fixa. Constituiu, assim, uma base sobre a qual se
fundou o sistema fordista, no qual máquinas automáticas passaram a se encarregar,
quando não do próprio trabalho, ao menos do deslocamento dos materiais aos operários,
fixando-os em postos alimentados numa cadência raramente decrescente e impondo-
 
3
 Um caso exemplar no Brasil é a planta da GM na cidade de Gravataí, RS: o automóvel Celta, ali
fabricado, possui metade das peças de um veículo similar tradicional, podendo ser montado com cores e
opcionais diretamente escolhidos pelo comprador através da Internet; internamente, a planta possui 113
robôs, colocados principalmente nas atividades de montagem e pintura, e estão aí empregados apenas
1.500 trabalhadores da GM, contra 8.000 de sua planta em São Caetano do Sul, no ABC paulista, a
montarem um carro em cerca de 13 horas, contra a média atual da indústria de 22 horas (e eram 48 horas
há uma década) (CONCEIÇÃO, 2001).
7
lhes movimentos repetitivos (BRAVERMAN, 1987; FLEURY; VARGAS, 1983;
PINTO, 2007a)4.
A idéia fundamental no sistema taylorista/fordista (como nos referiremos a ele daqui em
diante), foi, portanto, desagregar e, por isso mesmo, especializar o conhecimento e a
habilidade dos trabalhadores a um nível tão extremo que, a partir de certo momento,
estes tornaram-se meros “apêndices das máquinas”, tal como antecipara Marx ainda em
meados do século XIX, ao analisar o avanço da automação na indústria de sua época5.
Por reduzir formas complexas do trabalho humano a movimentos repetitivos e passíveis
de serem executados semtreinamentos longos ou experiência prévia, a intervenção
criativa dos (as) trabalhadores (as) foi praticamente anulada no taylorismo/fordismo,
bem como a sua possibilidade de conceber a cadeia de processos de trabalho onde estão
inseridos, pois cada qual é fixado num mesmo posto durante toda a jornada (PINTO,
2007a).
Não surpreende, assim, o fato de acompanharem o taylorismo/fordismo as altas taxas de
absenteísmo e de rotatividade nas empresas, além dos baixos níveis de qualificação
educacional e profissional dos (as) trabalhadores (as), o que certamente se deve ao
desinteresse, não só das empresas, mas deles (as) mesmos (as) com o aprendizado posto
por uma forma de trabalho estranhada que, nestas condições, se torna a própria negação
de um processo de aprendizado. Configurava-se, assim, um uso extensivo e rotativo da
força de trabalho e, por conseguinte, uma “flexibilidade externa” na contratação dos
contingentes de trabalhadores pelas empresas, contratações que variavam conforme as
demandas do mercado.
Em fins do século XX, os postos fixos, as funções repetitivas e a cadência seriada e
eletromecanicamente automatizada do sistema taylorista/fordista encontraram o seu
primeiro aperfeiçoamento técnico na emergência de sistemas de organização do trabalho
que, buscando expandir as taxas de produtividade e reduzir custos com maquinário,
apostaram na agregação de múltiplas tarefas em poucos postos móveis e numa cadência
 
4
 Há obras escritas de Taylor e Ford, entre as quais indicamos, para uma leitura preliminar: Taylor (1970)
e Ford (1995).
5
 De resto, toda a separação do espaço fabril em departamentos ou setores específicos, desde a
administração até a produção direta, foi mantida muito próxima aos moldes tayloristas – exceto o
surgimento de um departamento especificamente voltado aos atualmente denominados “recursos
humanos”, o qual era incumbido de manter a ordem “dentro e fora” da empresa, isto é: de restabelecer
psicológica e fisicamente os trabalhadores cansados da rotina estafante no ambiente de trabalho e,
8
de trabalho controlada por equipes de trabalhadores (as) polivalentes, cujas atividades
foram paulatinamente combinadas ao uso de uma automação de base microeletrônica6.
A nova metodologia de organização do trabalho, em especial no mais difundido
internacionalmente desses sistemas, o toyotista, ao se sustentar no uso intensivo e
menos rotativo da força de trabalho, necessitou e com isso exigiu novos perfis de
qualificação aos (às) trabalhadores (as), como experiência prévia, habilidades múltiplas,
conhecimentos gerais e, inclusive, o comprometimento e o desempenho individual no
trabalho7. Desde então, as empresas passaram a buscar o que se pode designar como
uma “flexibilidade interna” na alocação de um número mínimo de trabalhadores (as),
pois, pari passu à relativa diminuição da rotatividade, reduziram-se, cronicamente, os
seus quadros, cada vez mais mobilizados como uma massa plástica nas mais diferentes
funções e ao longo de jornadas também variáveis.
Tal como nos primeiros passos de Taylor, o criador do sistema toyotista de organização,
Taichii Ohno, não se fundamentou num desenvolvimento puro e simples da maquinaria,
mas na reorganização espacial destes processos e na reformulação dos direitos, deveres
e métodos de trabalho inerentes a cada trabalhador (a) neles envolvidos, no tocante à
posição que ocupam na teia de relações que vai dos níveis operacionais até os gerencias
(OHNO, 1997)8. Isso não significa, entretanto, que a “flexibilidade interna” do sistema
toyotista prescinde da automação, como se pode constatar por uma de suas técnicas
principais, a chamada “autonomação” (CORIAT, 1994): dispositivos de controle nas
máquinas que lhes permitam operar sem a intervenção humana direta, produzindo
quantidades exatas e parando automaticamente no caso de defeitos, a fim de se evitar
desperdícios de matérias-primas, ferramentas, tempo e força de trabalho.
Portanto, seja no sistema taylorista/fordista, seja no sistema toyotista de organização do
trabalho, temos, em ambos os casos, a transferência de atividades do trabalho humano
para máquinas. Mas, enquanto sobre a especialização de postos sugerida por Taylor,
 
especialmente, de organizar a sua vida pessoal (familiar, social, individual, etc.), para que não se
tornassem improdutivos em suas funções diárias (GRAMSCI, 1990).
6
 Sobre o contexto social, econômico e político global em que desenrolaram tais experiências em torno da
organização do trabalho, ver os estudos de Harvey (1992), Garrahan e Stewart (1994), Castro (1995),
Antunes (1995, 1999), Amin e Malmberg (1996), Alves (2000), entre tantos outros estudos.
7
 Sobre as características da divisão técnica do trabalho do sistema toyotista e sua metodologia de
organização, bem como casos de sua implementação em empresas ocidentais, ver os estudos de Monden
(1984), Hiraoka (1989), Silva (1991), Womack, Jones e Roos (1992), Posthuma (1994), Ohno (1997),
Gounet (1999), Lima (2004), Marcelino (2004), Pinto (2006), entre outras pesquisas.
9
desenvolveu-se, com Ford e a eletromecânica, uma automação altamente dedicada e
estrutural no deslocar dos objetos aos trabalhadores fixos, sobre ambas estas formas
Ohno buscou desenvolver uma automação menos dedicada, mais pontual e voltada à
multifuncionalidade, objetivos para os quais contou com a aplicação da microeletrônica
e da informática após os anos 80.
Conclusões
A transferência, ao longo da história, das ferramentas das mãos dos (as) trabalhadores
(as) para as máquinas, perfez uma “objetivação”, nestas máquinas-ferramenta, de
parcela do conhecimento por eles (as) acumulado, acerca da realização dos vários tipos
de atividades de trabalho. Ademais, a trajetória da automação, ao caminhar não somente
para a absorção de operações humanas simples, mas para uma auto-regulação potencial
da própria maquinaria, permitindo-a operar sendo apenas programada e supervisionada
por um grupo seleto de trabalhadores, tem ampliado a disparidade na repartição entre os
conhecimentos concentrados nas máquinas e nos homens e o seu papel na divisão do
trabalho social.
No modo de produção capitalista, no qual a venda da força de trabalho é condição de
subsistência da maioria da população, sendo negociada como uma mercadoria especial,
de cujo usufruto, nas jornadas reguladas tão simplesmente pelo tempo, os empregadores
capitalistas buscam extrair um máximo de excedentes de valores de uso, o avanço deste
processo de automação tem levado à desvalorização de uma gama de saberes, tornando-
os obsoletos e, por conseguinte, desnecessários os seus possuidores, sem contar a
possibilidade da dispensa dos encargos sociais e da previsibilidade de custos, quando
substituídos os (as) trabalhadores (as) por máquinas.
Ainda assim, se a classe trabalhadora não pode ser absolutamente excluída do sistema
de produção de mercadorias, pois a acumulação de capital depende da sua posição
contraditória enquanto produtora e consumidora alienada dos meios e do resultado do
seu próprio trabalho, o aumento da maquinaria em relação ao volume de trabalho
humano – mesmo que este seja considerado “qualificado” por operá-la – representa uma
força global na redução do tempo de trabalho socialmente necessário à produção das
 
8
 Para um estudo sociológico da ruptura ou continuidade, no sistema toyotista, de elementos do sistema
10
mercadorias. Como os salários (mas jamais os lucros) historicamente são cotados pelas
condições mínimas de alimentação, moradia, saúde e educação necessáriasà reprodução
da força de trabalho, o poder de barganha que os (as) trabalhadores (as) detêm, mesmo
quando empregados (as), nos contratos da venda de sua força de trabalho, tende a cair.
Os resultados desse processo, no entanto, são globais e atingem toda a sociedade. A
formação educacional e profissional dos trabalhadores consiste numa parcela de todo o
trabalho social que é “reinvestida” na própria reprodução da força de trabalho, pois são
necessários cursos, treinamentos, equipamentos e o emprego de outros trabalhadores. À
medida que atributos da força de trabalho são sujeitos à compra e venda no capitalismo,
um trabalhador desempregado não realiza o valor de sua qualificação, o que significa
um desperdício de uma porção de trabalho social investido na formação de capacidades
particulares de trabalho. Num cômputo geral, o desemprego acaba, portanto, elevando
significativamente os custos de formação de cada trabalhador ocupado (CASTILLO,
1996).
Como vimos no tópico anterior, se no modo de produção capitalista há um processo de
obsolescência das qualificações acumuladas pela classe trabalhadora, no estágio atual, a
superação das metodologias tayloristas/fordistas de organização por princípios como os
do toyotismo, pressupõe uma superação também das bases da automação, ou seja, da
eletromecânica para a microeletrônica, o que deixa claro não somente a intensidade
como a maior complexidade e custos desse processo. Do ponto de vista dos
empregadores capitalistas, a automação atual requer, portanto, para o seu pleno
desempenho, um conjunto de novos conhecimentos e técnicas dos (as) trabalhadores,
(as) a fim de que se amortizem imensas quantias de capital investidas em máquinas,
antes que as mesmas também se tornem obsoletas.
Isso não quer dizer, todavia, que a classe trabalhadora vem assumindo, neste processo,
um papel estratégico, enquanto assegura o funcionamento desses equipamentos e,
mediante tarefas preventivas, diagnosticam e reparam falhas. Estudos como Castillo
(1996) e Riquelme (1994), por exemplo, observam que, à medida que computadores
programados passam a monitorar, checar e mesmo a reprogramar, em caso de erro, as
próprias máquinas-ferramenta, responsáveis pelos processos produtivos, a distribuição
de conhecimentos entre as forças produtivas humanas e materiais tem sido radicalmente
 
taylorista/fordista, ver Coriat (1993) e Pinto (2007c).
11
alterada, culminando em uma rápida incorporação, pelas máquinas, de funções até então
exclusivamente humanas, como atividades cerebrais reflexivas, armazenamento de
informações, cálculos, desenhos, raciocínio e até mesmo certas tomadas de decisões.
Ao interpor um novo conjunto de informações entre os (as) trabalhadores (as) e seus
processos de trabalho, as máquinas modificam o ambiente e as relações entre eles (as),
gerando, entre outras conseqüências, o fato de que agora, em grande parte das atividades
automatizadas, quase não se “executam” operações manuais, mas se “interpretam”
informações geradas pelas máquinas, ou se “vigia” o funcionamento integral do sistema
e seu estado.
Partindo de constatações similares, Freyssenet (1993) já apontava, nesse sentido, que a
preocupação de empresas francesas, ao investirem em automatização, era planejar tanto
quanto possível a restrição do campo de intervenção dos (as) trabalhadores (as) na
condução geral dos processos, ou seja, uma organização que restringe a compreensão
dos (as) trabalhadores (as) ao que os projetistas das instalações automatizadas
consideram como necessário e suficiente. Ademais, diz o mesmo estudo, mesmo o
controle supervisório dos processos, com a introdução de alarmes e de paradas
automáticas na ocorrência de defeitos, como no toyotismo, pode ser usado para confiar
aos (às) trabalhadores (as) tarefas simplórias e mais sujeitas às baixas remunerações.
Há ainda outras constatações, em estudos como Castillo (2000, p. 119), no qual se
apresentam informações de pesquisas empíricas realizadas em empresas nas quais “[...]
fortes investimentos em novas tecnologias [...] não foram acompanhados por mudanças
no layout [na disposição do espaço de trabalho], permanecendo a tradicional
organização por setores [típica do taylorismo/fordismo]”. A autora cita uma pesquisa,
por exemplo, realizada numa empresa de autopeças de grande porte (localizada no
interior do Estado de São Paulo), onde a organização do trabalho em equipes
multifuncionais não logrou romper com a lógica taylorista/fordista, uma vez que o
conteúdo das atividades permaneceu limitado. Nas suas palavras:
[...] o grau de enriquecimento do trabalho vai depender não
apenas da forma organizacional, mas também da complexidade
das tarefas envolvidas e dos graus de autonomia concedidos aos
trabalhadores (Ibid., p. 134, 135).
12
Ao que apontam as entrevistas de um estudo de caso em profundidade por nós realizado
em meados de 2000, em uma empresa transnacional do setor de autopeças, situada no
interior do Estado de São Paulo, a automação, a polivalência e a organização em células
(outro elemento do sistema toyotista) não têm configurado mais que uma simples
“aglutinação” de tarefas “rotinizadas” aos (às) trabalhadores (as), os (as) quais, ao
realizarem-nas dentro da mesma jornada, intensificam os seus próprios ritmos de
trabalho. Um operário, por exemplo, nos enfatizou que um torneiro, em outros tempos,
de posse de uma peça bruta, “[...] tinha que trabalhar ela, lapidar até chegar numa
ferramenta”, sendo que, “hoje, as máquinas, os tornos, são todos automáticos, então
você aprende com mais facilidade, você opera apertando botão”9.
Frente às constatações empíricas daquele estudo e a falas como a deste operário, acima
descrita, concluímos que a organização toyotista do trabalho, ao lado da automação de
base microeletrônica, pode levar gradativamente à perda, pelos (as) trabalhadores (as),
de especialidades que até então garantiam aos mais experientes posições relativamente
estáveis nas empresas, e mesmo uma identidade no conjunto do trabalho social do qual
participam (PINTO, 2007b).
De todo modo, três teses estão claras nesses casos e esperamos, ao concluir a presente
explanação, tê-las demonstrado suficientemente. Em primeiro lugar, o fato de que os
processos de automação sempre são precedidos de mudanças nos sistemas de
organização do trabalho humano, de modo que efeitos, como o desemprego estrutural
no modo de produção capitalista, não devem ser atribuídos simplesmente à maquinaria,
mas, sobretudo, à obsolescência que as empresas impõem ao conhecimento tácito
acumulado pela classe trabalhadora, através das reformulações dos processos de
trabalho.
Em segundo lugar, embora a literatura em geral aponte o conceito de “flexibilidade” na
organização do trabalho como originariamente toyotista, é preciso esclarecer que, neste
caso, trata-se de uma mobilidade interna no uso da força de trabalho pelas empresas, ao
contrário do que gera o taylorismo/fordismo, ou seja, uma mobilidade externa, por meio
de alta rotatividade e absenteísmo.
 
9
 AUGUSTO, Marcos. Depoimento [entrevista realizada com trabalhador da esfera da Produção da
American Company do Brasil em 2006]. Entrevistador: Geraldo Augusto Pinto. Campinas, SP: [s. n.],
2006. 2 cassetes sonoros (120 min.) [Arquivo pessoal do pesquisador]. Cf. Pinto (2007b, p. 174, grifo
nosso).
13
Há que se considerar, no entanto, e este é a terceira e última tese, que, mesmo nos
sistemas de organização do trabalho mais atuais, como o próprio sistema da Toyota,
nem sempre se verifica uma real qualificação das atividades de trabalho nos postos
polivalentes, o que nos sugere, junto das formas precárias de uso do trabalho que
surgiram em meio à expansão deste sistemano Ocidente (como as terceirizações, as
jornadas flexíveis, os contratos temporários ou por tempo determinado etc.), que a
flexibilização “externa” ainda permanece, tendo se tornado, junto do desemprego
estrutural, mais um obstáculo na vida dos trabalhadores assalariados.
Referências
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