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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE DEPARTAMENTO DE LETRAS CLÁSSICAS E VERNÁCULAS LÍNGUA PORTUGUESA O MODO NOS VERBOS Modo é como se chamam as diferentes formas que toma o verbo para indicar a atitude de certeza, de dúvida, de suposição, de mando etc. da pessoa que fala em relação ao fato que enuncia. Assim, quem diz 1) João está aqui. 2) João estava aqui. 3) João estará aqui. Em qualquer caso, está se referindo a situações que retrata como reais. Sua relação com o que enuncia é, nesses casos, de certeza. Contudo, se diz 4) É possível que João esteja aqui. 5) Acreditávamos que João estivesse aqui. 6) Conte histórias se João estiver aqui. A ‘presença de João’ não é mais uma informação concebida como um dado no mundo, mas a representação da possibilidade desse dado. Agora, sua relação com o que enuncia é de dúvida ou suposição. Esta segunda atitude vem expressa duplamente em cada frase: de um lado, por meio dos termos É possível que, Acreditávamos e se; e, de outro, por meio das formas verbais esteja, estivesse e estiver, variações do verbo estar. Em cada série, expressa-se, portanto, uma diferente atitude do falante em relação ao conteúdo proposicional do enunciado: certeza em (1), (2) e (3); e suposição em (4), (5) e (6). Dessa forma, a variação da forma do verbo (está/esteja, estava/ estivesse, estará/estiver) para a expressão da atitude do enunciador constitui a categoria gramatical que denominamos modo. Há três modos em português: o indicativo, o subjuntivo e o imperativo. Com o modo indicativo, exprime-se, em geral, uma ação ou um estado considerados na sua realidade ou na sua certeza, quer em referência ao presente, quer ao passado ou ao futuro. Esse modo é próprio dos enunciados declarativos simples, em que ocorre apenas um verbo ou uma locução verbal. Ao empregarmos o modo subjuntivo, é completamente diversa a nossa atitude. Encaramos a existência ou não existência do fato como uma coisa incerta, duvidosa, eventual, ou, mesmo, irreal. Esse modo, que serve para representar fatos como dependentes do ponto de vista pessoal do enunciador, é o usual nas formas verbais de dois grupos principais: as estruturas dependentes de alguma expressão que exige o subjuntivo, como o É possível que e o se dos exemplos (4) e (6), e as construções que expressam hipóteses, como a do exemplo (5). Além dos modos indicativo e subjuntivo, há um terceiro, o modo imperativo. Este é usado em frases em que o enunciador expressa uma ordem, uma exortação, um conselho, uma advertência, um pedido: 7) Saia. (ordem) 8) Não reaja a assaltos. (exortação) 9) Venha à festa. Será bem-vinda. (convite) 10) Valha-me Nossa Senhora! (súplica) Por fim, cabe ainda mencionar duas importantes diferenças entre o modo imperativo e os modos indicativo e subjuntivo. A) As formas verbais dos modos indicativo e subjuntivo variam para situar os fatos em diferentes intervalos de tempo (amo/presente; amei, amava, amara/ passado; amarei, amaria/futuro; ame/presente; amasse/passado; amar/ futuro), ao passo que as formas do imperativo são invariáveis quanto ao tempo (ama, ame, amemos, amai, amem/imperativo afirmativo; não ames, ame, amemos, ameis, amem/imperativo negativo). B) A segunda diferença diz respeito às funções da linguagem. As formas do indicativo e do subjuntivo se empregam em todas as funções da linguagem, já as do modo imperativo são exclusivas dos usos da língua em que o enunciador se dirige explicitamente ao seu coenunciador e frequentemente o nomeia pelo emprego de um vocativo, o que limita a ocorrência do imperativo à função conativa da linguagem em que O destinatário é o elemento básico e Orienta-se para o receptor. Ex.: Fale, amor, que eu a ajudarei. Categorias, flexões e usos do verbo: o Modo nos verbos, os Tempos nos verbos, os Verbos Pronominais, a Voz verbal, o Aspecto verbal Português IV Profª: Ana Cláudia Machado Pasta na Xerox do Bloco B: 169 __ O TEMPO NOS VERBOS USOS De acordo com Cunha e Cintra (2014), tempo é a variação que indica o momento em que se dá a ação verbal, tomando- se como referência o momento da comunicação. O que está situado antes chama-se passado, e o depois, futuro. O presente, então, é tudo o que não está situado nesses dois tempos. O presente é indivisível. No entanto, o pretérito e o futuro subdividem-se, conforme podemos perceber na tabela a seguir: Tabela 1: Tempos verbais Indicativo Presente canto Pretérito Imperfeito cantava Perfeito Simples: cantei Composto: tenho cantado Mais que perfeito Simples: cantara Composto: tinha ou havia cantado Futuro Do Presente Simples: cantarei Composto: terei ou haverei cantado Do Pretérito Simples: cantaria Composto: teria ou haveria cantado Subjuntivo Presente cante Pretérito Imperfeito cantasse Perfeito Tenha ou haja cantado Mais que perfeito Tivesse ou houvesse cantado Futuro Simples: cantar Composto: tiver ou houver cantado Imperativo Presente Afirmativo canta, cante... Negativo não cantes, não cante... O presente do indicativo emprega-se para enunciar um fato atual, fato que ocorre no momento em que se fala: 11) Está tarde. Também se emprega o presente para indicar ações e estados permanentes ou assim considerados: 12) A Terra é redonda. Além disso, o presente é empregado para expressar uma ação habitual ou uma faculdade do sujeito: 13) Como muito! No mais, emprega-se o presente para dar vivacidade a fatos ocorridos no passado ou para marcar um fato futuro, mas próximo: 14) O homem sequestra, tortura, mata, esquarteja e joga os restos mortais de uma mulher aos cães, e recebe pena de 22 anos? 15) Janto contigo em outra ocasião. O pretérito do indicativo apresenta-se de três formas: imperfeito, perfeito e mais-que-perfeito. Quanto ao pretérito imperfeito do indicativo, a própria denominação deste tempo nos ensina o seu valor fundamental: designa um fato passado, mas não concluído, inacabado. Esse tempo compreende uma noção de continuidade, de duração do processo verbal mais acentuada do que os outros tempos pretéritos. Emprega-se esse tempo quando nos transportamos a uma época passada e descrevemos o que então era presente: 16) Quando criança, eu pegava goiaba escondido na casa do vizinho. O pretérito imperfeito também é empregado para indicar uma ação passada habitual ou repetida e para indicar fatos passados concebidos como contínuos ou permanentes: 17) Íamos para Friburgo em todas as férias de janeiro. 18) Ele sempre cantava na missa. Além disso, emprega-se o pretérito imperfeito para situar, vagamente, contos, lendas, fábulas etc. no tempo: 19) Era uma vez uma princesa... O pretérito perfeito do indicativo, por sua vez, apresenta-se de duas formas: a simples e a composta. Quando simples, ele indica uma ação que se produziu em certo momento do passado, ação essa completamente concluída. É empregado para descrever o passado tal como aparece a um observador situado no presente e que o considera do presente: 20) Assisti a um belíssimo filme ontem. Quando composto, o pretérito perfeito do indicativo exprime a repetição de um ato ou a sua continuidade até o presente em que falamos. Ele aproxima-se, pois, do presente: 21) Tenho lido muitos livros bons. 22) Perguntei-lhe se ele tinha feito todos os exercícios. Conforme Cunha e Cintra (2007, p. 456), convém ter presentes as seguintes distinções de emprego do pretérito imperfeito e do pretérito perfeito simplesdo indicativo: a) o pretérito imperfeito exprime o fato passado habitual; o pretérito perfeito, o não habitual: Quando o via, cumprimentava-o. Quando o vi, cumprimentei-o. b) o pretérito imperfeito exprime a ação durativa, e não a limita no tempo; o pretérito perfeito, ao contrário, indica a ação momentânea, definida no tempo. Comparem-se estes dois exemplos: # O mancebo desprezava o perigo e pago até da morte pelos sorrisos, que seus olhos furtavam de longe, levava o arrojo a arrepiar a testa do touro com a ponta da lança. # O mancebo desprezou o perigo e pago até da morte pelos sorrisos, que seus olhos furtaram de longe, levou o arrojo a arrepiar a testa do touro com a ponta da lança. Finalmente, o pretérito mais-que-perfeito indica uma ação que ocorreu antes de outra ação passada: 23) Perguntei- lhe se ele fizera todos os exercícios. 24) Perguntei-lhe se ele tinha feito todos os exercícios. Note que, apesar de o pretérito mais-que-perfeito simples ter o mesmo conteúdo da forma composta, ambos têm uma aplicabilidade distinta: enquanto a forma simples é restrita aos usos formais da língua escrita, a forma composta é uma alternativa à forma simples na escrita, mas a única empregada na fala corrente. O futuro do indicativo é o tempo verbal que situa a ação ou o estado num momento posterior ao momento em que se fala, o futuro apresenta-se de duas formas: o futuro do presente e o futuro do pretérito. O futuro do presente pode ser simples ou composto. Quando simples, é empregado para indicar fatos certos ou prováveis e incertos: 25) Viajarei para o Paraná amanhã. 26) Será que chove hoje? O futuro do presente composto é empregado para indicar que uma ação futura está consumada antes de outra: 27) Amanhã terei acabado este trabalho. Também é empregado para exprimir a certeza de uma ação futura: 28) Caso eu não volte em cinco minutos, terei sido atendido. Além disso, o futuro do presente composto também é aplicado para significar a incerteza sobre fatos passados: 29) Ao chegar a casa, me perguntei: terá passado aqui um furacão?! Assim como o futuro do presente, o futuro do pretérito pode ser simples ou composto. Quando simples, designa ações posteriores à época de que se fala: 30) O Papa comunicou que renunciaria ao papado. Também designa incerteza sobre fatos passados: 31) Quem seria aquele homem? Ademais, o futuro do pretérito é empregado nas afirmações condicionadas, quando se referem a fatos que não se realizaram e que, provavelmente, não se realizarão: 32) Se seus credores lhe pagassem o que lhe devem, ele ficaria rico. Quando composto, o futuro do pretérito indica que um fato teria acontecido no passado, mediante certa condição: 33) Se eu tivesse chegado mais cedo, nada disso teria acontecido. No mais, o futuro do pretérito composto exprime a possibilidade de um fato passado e a incerteza sobre fatos passados, em certas frases interrogativas que dispensam a resposta do interlocutor: 34) Você teria sido um excelente linguista. 35) O que teria acontecido para justificar tamanho atraso? O presente do subjuntivo situa um fato num intervalo de tempo simultâneo ou posterior ao presente, o presente do subjuntivo representa-o como não concluído: 36) Acredito que eles conheçam este filme. 37) Espero que eles venham. O pretérito do subjuntivo pode ser imperfeito, perfeito ou mais-que-perfeito. O imperfeito do subjuntivo pode ter o valor de passado, de futuro e de presente: 38) Chovesse ou fizesse sol, Dona Lúcia ia à missa. 39) Todas as quartas, George presenteava com uma canção o primeiro que chegasse. 40) Se tivesse paciência, teria conseguido mais. O perfeito do subjuntivo pode exprimir um fato passado (supostamente concluído) e um fato futuro (terminado em relação a outro fato futuro): 41) Espero que você tenha encontrado a sua mãe. 42) Espero que você tenha terminado a lição quando eu voltar. Finalmente, o pretérito mais-que-perfeito pode indicar uma ação anterior a outra ação e uma ação irreal no passado: 43) Todos os alunos que tivessem terminado a prova sairiam mais cedo. 44) Se tivessem ganhado o campeonato carioca, não lhes faltaria o reconhecimento merecido. O futuro do subjuntivo apresenta-se de duas formas: a simples e a composta. Quando simples, marca a eventualidade no futuro e é empregado em orações subordinadas: a) adverbiais (condicionais, conformativas e temporais), cuja oração principal vem enunciada no futuro ou no presente: 45) Se estudar, passará num concurso. 46) Faça conforme souber. 47) Quando puder, venha falar comigo. b) adjetivas cuja principal venha enunciada no futuro ou no presente: 48) Serei grato aos que me ajudarem. O futuro do subjuntivo composto, por sua vez, indica um fato futuro como terminado em relação a outro fato futuro: 49) Quando tiver terminado a leitura, poderá sair. Há, em português, duas formas de imperativos: a afirmativa e a negativa. O imperativo afirmativo é um tempo misto; para a sua formação concorrem o presente do indicativo e o presente do subjuntivo. Por outro lado, no imperativo negativo, basta antepor a partícula “não” às formas do presente do subjuntivo, excluída a primeira pessoa do singular (eu). Isso se dá tanto para esta forma, imperativo negativo, quanto para a forma afirmativa. CONJUGAÇÃO VERBAL NO IMPERATIVO Presente do indicativo Presente do subjuntivo Imperativo afirmativo (eu) louvo louve — (tu) louvas louves louva (tu) (ele, ela...) louva louve louve (você) (nós) louvamos louvemos louvemos (nós) (vós) louvais louveis louvai (vós) (eles, elas...) louvam louvem louvem (vocês) Imperativo negativo — não louves (tu) não louve (você) não louvemos (nós) não louveis (vós) não louvem (vocês) Observe que as duas formas da segunda pessoa do discurso (tu, vós) do imperativo afirmativo são tiradas às formas correspondentes no presente do indicativo, sem o -s final. As demais formas são retiradas do presente do subjuntivo. CONSTITUIÇÃO DA FORMA DOS TEMPOS VERBAIS COMPOSTOS 1) NA VOZ ATIVA MODO INDICATIVO Pretérito perfeito composto Formado pelo presente do indicativo do verbo ter ou haver com o particípio do verbo principal: tenho/hei cantado tens/hás cantado tem/há cantado temos/havemos cantado tendes/haveis cantado têm/hão cantado Pretérito mais-que-perfeito composto Formado pelo imperfeito do indicativo do verbo ter (ou haver) com o particípio do verbo principal: tinha/havia cantado tinhas/havias cantado tinha/havia cantado tínhamos/havíamos cantado tínheis/havíeis cantado tinham/haviam cantado Futuro do presente composto Formado pelo futuro do presente simples do verbo ter (ou haver) com o particípio do verbo principal. terei/haverei cantado terás/haverás cantado terá/haverá cantado teremos/haveremos cantado tereis/havereis cantado terão/haverão cantado Futuro do pretérito composto Formado pelo futuro do pretérito simples do verbo ter (ou haver) com o particípio do verbo principal. teria/haveria cantado terias/haverias cantado teria/haveria cantado teríamos/haveríamos cantado teríeis/haveríeis cantado teriam/haveriam cantado MODO SUBJUNTIVO Pretérito perfeito composto Formado pelo presente do subjuntivo do verbo ter (ou haver) com o particípio do verbo principal. tenha/haja cantado tenhas/hajas cantado tenha/haja cantado tenhamos/hajamos cantado tenhais/hajais cantado tenham/hajam cantado Pretérito mais-que-perfeito composto Formado pelo imperfeito do subjuntivo do verbo ter (ou haver) com o particípio do verboprincipal. tivesse/houvesse cantado tivesses/houvesses cantado tivesse/houvesse cantado tivéssemos/houvéssemos cantado tivésseis/houvesses cantado tivessem/houvessem cantado Futuro composto Formado pelo futuro simples do subjuntivo do verbo ter (ou haver) com o particípio do verbo principal. tiver/houver cantado tiveres/houveres cantado tiver/houver cantado tivermos/houvermos cantado tiverdes/houverdes cantado tiverem/houverem cantado 2) NA VOZ PASSIVA Na voz passiva, as locuções ou perífrases são constituídas pela cooperação dos verbos ter ou haver e ser com o particípio do verbo principal. MODO INDICATIVO Pretérito perfeito composto Formado pelo presente do indicativo do verbo ter (ou haver) com os particípios do verbo ser e do verbo que se quer conjugar. tenho/hei sido amado (-a) tens/hás sido amado (-a) tem/há sido amado (-a) temos/havemos sido amados (-as) tendes/haveis sido amados (-as) têm/hão sido amados (-as) Pretérito mais-que-perfeito composto Formado pelo pretérito imperfeito do indicativo do verbo ter (ou haver) com os particípios do verbo ser e do verbo que se quer conjugar. tinha/havia sido amado (-a) tinhas/havias sido amado (-a) tinha/havia sido amado (-a) tínhamos/havíamos sido amados (-as) tínheis/havíeis sido amados (-as) tinham/haviam sido amados (-as) Futuro do presente composto Formado pelo futuro do presente do indicativo do verbo ter (ou haver) com os particípios do verbo ser e do verbo que se quer conjugar. terei/haverei sido amado (-a) terás/haverás sido amado (-a) terá/haverá sido amado (-a) teremos/haveremos sido amados (-as) tereis/havereis sido amados (-as) terão/haverão sido amados (-as) 10 Futuro do pretérito composto Formado pelo futuro do pretérito do indicativo do verbo ter (ou haver) com os particípios do verbo ser e do verbo que se quer conjugar. teria/haveria sido amado (-a) terias/haverias sido amado (-a) teria/haveria sido amado (-a) teríamos/haveríamos sido amados (-as) teríeis/haveríeis sido amados (-as) teriam/haveriam sido amados (-as) MODO SUBJUNTIVO O modo subjuntivo apresenta apenas o futuro composto. É formado pelo futuro do subjuntivo do verbo ter (ou haver) com os particípios do verbo ser e do verbo que se quer conjugar. tiver/houver sido amado (-a) tiveres/houveres sido amado (-a) tiver/houver sido amado (-a) tivermos/houvermos sido amados (-as) tiverdes/houverdes sido amados (-as) tiverem/houverem sido amados (-as) OS VERBOS PRONOMINAIS Existem alguns verbos que são sempre conjugados com pronomes átonos. Nesse caso, tais pronomes fazem parte da constituição do verbo e não apresentam seu sentido próprio (ex.: queixar-se, apiedar-se, condoer-se, arrepender-se, alegrar-se, zangar-se, indignar-se etc.). Tais verbos são conjugados na voz ativa, associando-se a eles os pronomes me, te, se, nos, vos, se. Veja: a) Ele se queixou da falta de salário. b) Maria se arrependeu de sua atitude. c) Ele sempre se indigna com as posturas do filho mais novo. Vale ressaltar que as formas da 1ª pessoa do plural perdem o -s final antes de receber o pronome enclítico, isto é, o pronome que se posiciona após o verbo, separando-se deste por hífen. Veja: Arrependemo-nos de nossa má atitude. Não devemos confundir verbo pronominal com voz reflexiva (também conhecida como voz Média ou Medial) do verbo. Nos casos de verbo pronominal, tem-se o pronome como constituinte do próprio verbo, conforme explicação prévia. Nos casos em que há voz reflexiva (média) do verbo, a presença do pronome oblíquo (nesse caso, pronome reflexivo) não é obrigatória. Na verdade, seu uso evidencia que o sujeito gramatical é ao mesmo tempo agente e paciente, isto é, ele faz uma ação cujos efeitos ele mesmo sofre ou recebe. Veja: a) Você se prejudicará se não fizer a prova (você prejudicará a você mesmo). b) Intoxiquei-me com o camarão (intoxiquei a mim mesmo). VOZES VERBAIS As vozes verbais indicam a relação entre sujeito e a ação expressa pelo verbo expressa na enunciação, ou seja, não é propriamente um assunto relativo à morfologia verbal e sim à conjugação dos níveis pragmático, semântico, sintático a partir da enunciação. Em português, o verbo se distribui em três vozes: - Voz ativa: quando o sujeito pratica a ação, é um sujeito agente. Ex.: A criatura desprezível alimentou o animal. Sujeito verbo ativo objeto No exemplo dado, a criatura (sujeito) pratica a ação. - Voz passiva: quando o sujeito sofre a ação verbal, é um sujeito paciente. Ex.: O animal foi alimentado pela criatura desprezível. sujeito verbo passivo agente No exemplo dado, o animal (sujeito) recebe a ação. Há dois tipos de voz passiva: a) Voz passiva sintética: formada por verbo transitivo na terceira pessoa mais o pronome apassivador se. Ex.: Vende -se computador. verbo na pronome sujeito terceira pessoa apassivador b) Voz passiva analítica: formada pelo verbo auxiliar (ser ou estar) mais o particípio de um verbo transitivo. Ex.: A criança foi penteado pelo pai. sujeito locução ou perífrase verbal agente VERBO SER + PARTICÍPIO DO VERBO PRINCIPAL - Voz reflexiva (Média ou Medial): quando o sujeito pratica e ao mesmo tempo recebe a ação. A voz reflexiva apresenta a seguinte estrutura: verbo na voz ativa + pronome oblíquo exercendo a função de objeto. Ex.: A menina penteou -se (a si mesma). sujeito verbo pronome oblíquo obj. direto Obs.: não confundir o emprego reflexivo do verbo com a noção de reciprocidade. Por exemplo: Os lutadores feriram-se. (um ao outro) Segundo estudo feito por Duarte (s/d), a categoria de voz, na gramática tradicional, é mal descrita. Por isto, divergem os critérios, às vezes num mesmo autor, e consequentemente altera-se a tipologia. O critério mais destacado tanto na definição de voz como na caracterização dos seus tipos é o semântico. Este critério aparece isolado, conjugado à forma ou disfarçado de critério sintático, neste caso, havendo referência à relação sujeito/predicado. Outras vezes, os autores empregam um critério no conceito e outro na tipologia diatética. Cunha & Cintra (1985), por exemplo, apresentam voz como uma variação verbal, o que seria o mesmo que afirmar ser ela uma “forma verbal”. Em seguida, asseveram que “o fato expresso pelo verbo pode ser representado de três formas: como praticado pelo sujeito, como sofrido pelo sujeito, como praticado e sofrido pelo sujeito” (1985:372). Esta caracterização é nitidamente semântica. Luft (1974) é outro que define voz como “forma que toma o verbo para exprimir as relações de atividade e passividade entre sujeito e verbo” (1974:132), usando, então, um critério morfossemântico, que se revela apenas semântico na tipologia das vozes. Bechara (s/d) não define a categoria de voz, mas a expressão comum a todos os conceitos que dá de cada tipo é “forma verbal”, o que indicia o emprego do critério mórfico, mas o todo de cada definição conduz também a um critério semântico. Já Lima (1992) define a voz como “acidente que expressa a relação entre o processo verbal e o comportamento do sujeito.” (1992:123). Usa o critério semântico disfarçado de sintático. Todavia, quando a coloca como um dos acidentesdo verbo, assume claramente que é uma categoria formal e semântica. A confusão não é apenas conceitual, mas também tipológica. Há autores que reconhecem dois tipos de voz, como Melo (1978), a ativa e a passiva, e Lima (1992) que identifica a ativa e a medial. Outros há que distinguem três, a exemplo de Cunha & Cintra (1985), a ativa, a passiva e a reflexiva. Almeida (1980), por seu turno, reconhece quatro: ativa, passiva, reflexiva e neutra. Ainda segundo Duarte (s/d), Camara Jr. (1977a: s.v.) define a voz medial como aquela em que à forma ativa adjunge- se um pronome adverbal átono referente à pessoa do sujeito, indicando integração do sujeito na ação que dele parte. O autor subdivide a medial em reflexiva, dinâmica e expletiva. Na medial-reflexiva, a pessoa do sujeito, sob o aspecto do pronome adverbal átono, incorporado no verbo, reaparece no predicado como objeto de uma ação verbal transitiva que parte dele, como se vê em (a). (a) eu me feri = eu o feri. Na medial-dinâmica, o sujeito reaparece no predicado como centro de uma ação transitiva que parte dele, mas não sai do seu âmbito, eliminando assim o objeto sobre que ela recairia, como em (b). (b) eu me levantei _ eu o levantei. Na medial-expletiva, o sujeito reaparece como centro de uma ação verbal intransitiva que fica mais intensamente relacionado ao sujeito de que parte, como em (c). (c) eu me ri = eu ri. Camara Jr. (1977a) procura distinguir o que é linguístico do extralinguístico, diferenciando, assim, atividade de voz ativa e passividade e voz passiva. Outro ponto a destacar é que o autor considera tipos heterogêneos de voz média. Em suma, segundo Duarte, não há voz média em português, considerando os parâmetros estruturais em que se baseia para configurar uma categoria linguística. Rigorosamente falando, do ponto de vista estrutural, só há voz ativa, sendo a chamada passiva um tipo de frase nominal (cf. Llhorach, 1980:170, Camara Jr., 1979:165). O ASPECTO VERBAL Como nas vozes verbais, o aspecto verbal não é uma categoria gramatical do verbo estudada na morfologia, uma vez que não trata especificamente da estrutura interna do verbo. No caso do aspecto, estuda-se o verbo em relação aos níveis pragmático e semântico vinculados à enunciação. Mattoso Câmara Jr. (1970), Câmara Jr. (1974A, p.84-6) e Câmara Jr. (1974b, p.140-8)apud TRAVAGLIA (1985) Câmara Jr. define o aspecto como “a propriedade que tem uma forma verbal de designar a duração do processo (momentâneo ou durativo) ou o aspecto propriamente dito sob que ele é considerado pelo falante (Exemplo: em seu começo - incoativo)”. Diz ainda que o aspecto é a maneira de ser da ação e que apresenta o processo verbal do ponto de vista da sua duração.Reunindo o que ele diz em diferentes passagens podemos dizer que ele apresenta o seguinte quadro aspectual: a.aspecto inceptivo ou incoativo: indica a ação que principia, a ação em seu começo, marca o princípio de um processo; b.aspecto inconcluso ou imperfeito: apresenta a ação que se desdobra sem alusão ao início ou ao fim, a ação em seu curso e ainda inconclusa; c.aspecto concluso ou cessativo ou perfeito: apresenta a ação terminada, acabada, em seu fim e já conclusa, marca o fim de um processo; d.aspecto permansivo: apresenta o processo como concluso, mas permanente, persistente em seus efeitos, à maneira de uma coisa adquirida; e.aspecto resultativo: registra os resultados de um processo realizado; f. aspecto pontual ou momentâneo: assinala um processo realizado de maneira súbita e instantânea; g.aspecto durativo: frisa a duração do processo. Subdivide-se em: g.1 – progressivo: é o durativo em que o processo se intensifica cada vez mais; g.2 – cursivo: é o durativo em que o processo se desenrola simplesmente; g. 3 - frequentativo ou iterativo: é o durativo em que o processo se repete por uma série de processos pontuais. Segundo Câmara Jr. o aspecto pode ser expresso: 1.pelo semantema do verbo. Exs.: partir (inceptivo ou incoativo), chegar (concluso ou cessativo), cair (pontual), andar (durativo), andar, viajar (inconcluso); 2.por sufixos. Exs.: -ITAR, -EJAR (frequentativo); -ECER(incoativo); 3.pela conjugação verbal: A - tempos verbais: presente do indicativo (iterativo); pretérito imperfeito do indicativo (inconcluso ou imperfeito); pretérito perfeito (concluso ou perfeito), embora Câmara Jr. (1970, p.90) afirme que o pretérito perfeito é indiferente à assinalização de aspecto concluso ou inconcluso. B - perífrases: a.Cursivo (no presente, passado e futuro) e durativo (em qualquer tempo): “estar + gerúndio ou a + infinitivo”, “ir + gerúndio (durativo progressivo); b.Cessativo (concluso, realização perfeita): • TER ou HAVER + PARTICÍPIO: Essa perífrase expressa o cessativo em todos os tempos exceto no presente do indicativo onde assinala um fato constante (contínuo ou repetido) até o momento presente ou esporadicamente um aspecto permansivo (Exemplo: “A areia tem corrido e o livro de minha infanda história está completo”- Varela, Obras, II, 38). Pode-se afirmar que o uso permansivo desta perífrase inexiste hoje, pelo menos no Português do Brasil. • SER + PARTICÍPIO (de verbo intransitivo). Exs.: 2.“Já cinco sóis eram passados” (Lusíadas, V-37) 3.“Meu Deus, meu Deus, pois a isto somos chegados!” (Cf. Boléo, 1936)11c) Inceptivo: “ir + infinitivo”. 11 Exs. apud. Câmara Jr. (1974a, p.86). O próprio Câmara Jr. diz que com esta perífrase o processo se apresenta como prestes a começar, portanto não pode ser, como se verá, marcadora de aspecto inceptivo. C - formas nominais: o gerúndio indica o aspecto inconcluso ou imperfeito e o particípio o aspecto concluso ou perfeito. 4.pela repetição do verbo. Exemplo: “cai,cai, balão, na rua do Sabão...” (aspecto durativo). Referências bibliográficas: ALMEIDA, Napoleão Mendes de Gramática Metódica da Língua Portuguesa, São Paulo, Saraiva, 1980.. AZEREDO, José Carlos de. Fundamentos de gramática do português. Rio de Janeiro:Jorge Zahar Editor, 2010. BECHARA, Evanildo, Moderna Gramática Portuguesa, São Paulo, Nacional, 2008. CÂMARA JR., Joaquim Mattoso. Estrutura da língua portuguesa. 21. ed. Petrópolis: Vozes, 1970. CUNHA, Celso & CINTRA, Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 6ª, (1985) 2014. DUARTE, Paulo Mosânio Teixeira. A voz média em português: seu estatuto. Disponível em: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/4606.pdf, acessado em: 01 abr. 2016 LIMA, Amorim R. (et al.) Português IV. V.1. Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2014 LLHORACH, Emilio Alarcos Estudios de Gramática Funcional del Español, Madrid, Gredos, 1980. LUFT, Celso Pedro Moderna Gramática Brasileira, Rio de Janeiro, Globo, 1974. ROCHA LIMA, Carlos Henrique da. Gramática Normativa da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: José Olympio, (1992) 2012 TRAVAGLIA, Luiz Carlos. O aspecto verbal no Português: a categoria e sua expressão. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 1985. CAMARA JR., Joaquim Mattoso, Dicionário de Linguística e Gramática: Referente à Língua Portuguesa, Petrópolis, Vozes, 1977 (a) CAMARA JR., Joaquim Mattoso Princípios de Linguística Geral, Rio de Janeiro, Padrão. 1977b, CAMARA JR., Joaquim Mattoso História e Estrutura da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro, Padrão, 1979. MELO, Gladstone Chaves de, Gramática Fundamental da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro, Ao Livro Técnico, 1978.
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