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2ª Edição – Revisada Florianópolis, 2011 Álgebra I Oscar Ricardo Janesch Inder Jeet Taneja Governo Federal Presidente da República: Dilma Rousseff Ministro de Educação: Fernando Haddad Coordenador Nacional da Universidade Aberta do Brasil: Celso Costa Universidade Federal de Santa Catarina Reitor: Alvaro Toubes Prata Vice-Reitor: Carlos Alberto Justo da Silva Secretário de Educação a Distância: Cícero Barbosa Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Yara Maria Rauh Müller Pró-Reitora de Pesquisa e Extensão: Débora Peres Menezes Pró-Reitor de Pós-Graduação: Maria Lúcia de Barros Camargo Pró-Reitor de Desenvolvimento Humano e Social: Luiz Henrique Vieira Silva Pró-Reitor de Infra-Estrutura: João Batista Furtuoso Pró-Reitor de Assuntos Estudantis: Cláudio José Amante Centro de Ciências da Educação: Wilson Schmidt Centro de Ciências Físicas e Matemáticas: Tarciso Antônio Grandi Centro de Filosofia e Ciências Humanas: Roselane Neckel Curso de Licenciatura em Matemática na Modalidade à Distância Coordenação de Curso: Neri Terezinha Both Carvalho Coordenação de Tutoria: Jane Crippa Coordenação Pedagógica/CED: Roseli Zen Cerny Coordenação de Ambientes Virtuais/CFM: Nereu Estanislau Burin Comissão Editorial Antônio Carlos Gardel Leitão Albertina Zatelli Elisa Zunko Toma Igor Mozolevski Luiz Augusto Saeger Roberto Corrêa da Silva Ruy Coimbra Charão Laboratório de Novas Tecnologias - LANTEC/CED Coordenação Pedagógica Coordenação Geral: Andrea Lapa, Roseli Zen Cerny Núcleo de Formação: Nilza Godoy Gomes Núcleo de Pesquisa e Avaliação: Claudia Regina Flores Núcleo de Criação e Desenvolvimento de Materiais Design Gráfico Coordenação: Laura Martins Rodrigues, Thiago Rocha Oliveira Projeto Gráfico Original: Diogo Henrique Ropelato, Marta Cristina Goulart Braga, Natal Anacleto Chicca Junior Redesenho do Projeto Gráfico: Laura Martins Rodrigues, Thiago Rocha Oliveira Diagramação: Laura Martins Rodrigues Ilustrações: Kallani Bonelli Capa: Rafael Naravan Kienen Design Instrucional Coordenação: Elizandro Maurício Brick Design Instrucional: Maria Carolina Machado Magnus Revisão Gramatical: Daniela Piantola, Evillyn Kjellin, Hellen Melo Pereira Copyright © 2011, Universidade Federal de Santa Catarina/CFM/CED/UFSC Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Coordenação Acadêmica do Curso de Licenciatura em Matemática na Modalidade à Distância. Ficha Catalográfica J35a Janesch, Oscar Ricardo Álgebra I / Oscar Ricardo Janesch , Inder Jeet Taneja. – 2. ed. rev. – Florianópolis : UFSC/EAD/CED/CFM, 2011. 215 p. : il. ; grafs. , tabs. Inclui bibliografia UFSC. Licenciatura em Matemática na Modalidade a Distância ISBN xxx 1. Álgebra. I. Taneja, Inder Jeet. II. Título. CDU 519.6 Elaborada pela Bibliotecária Eleonora M. F. Vieira – CRB – 14/786 Sumário Apresentação ............................................................................. 7 Introdução .................................................................................. 9 1. Anéis, Domínios e Corpos ................................................ 13 1.1 Introdução ................................................................................... 15 1.2 Anel, domínio e corpo ............................................................... 18 1.3 Propriedades dos anéis .............................................................. 25 Resumo .............................................................................................. 32 2. Alguns Anéis Especiais .................................................... 33 2.1 Anéis de funções ........................................................................ 35 2.2 Anéis de matrizes ...................................................................... 38 2.3 Anéis n ....................................................................................... 43 2.4 Anel produto direto ................................................................... 55 Resumo .............................................................................................. 60 3. Subanéis, Elementos Notáveis e Divisibilidade ........... 61 3.1 Subanéis, subdomínios e subcorpos ........................................ 63 3.2 Elementos notáveis de um anel ................................................ 73 3.3 Divisibilidade, elementos primos e elementos irredutíveis ............................................................ 82 Resumo .............................................................................................. 94 4. Ideais e Anéis Quociente .................................................. 95 4.1 Ideais ............................................................................................ 97 4.2 Aritmética de ideais ..................................................................107 4.3 Ideais primos e ideais maximais .............................................113 4.4 Anel quociente .......................................................................... 120 Resumo ............................................................................................ 134 5. Homomorfismos e Isomorfismos ................................... 135 5.1 Homomorfismo de anéis ..........................................................137 5.2 Propriedades dos homomorfismos .........................................145 5.3 Isomorfismos de anéis ............................................................. 153 Resumo .............................................................................................168 6. O Corpo dos Números Complexos ................................ 169 6.1 O corpo .................................................................................. 171 6.2 Conjugado e norma .................................................................. 180 6.3 Forma trigonométrica e potências ......................................... 188 6.4 Raiz n-ésima complexa ............................................................ 195 6.5 Alguns subdomínios de ...................................................... 208 Resumo .............................................................................................214 Apresentação Este material foi elaborado para o curso de ensino à distância de Álgebra I. Os objetivos principais desta disciplina são o estudo de estruturas algébricas e das propriedades dos elementos de cada estrutura algébrica. O conteúdo está dividido em seis capítulos. Cada capítulo está dividido em seções, de acordo com os assuntos abordados, e ter- mina com um resumo. Os capítulos 1, 2 e 3 são menos extensos, e os exercícios referentes a cada um destes capítulos aparecem no final do respectivo capí- tulo. Os capítulo 4, 5 e 6 têm mais conteúdo e por isso os exercí- cios destes capítulos são colocados no final de cada seção. Os exercícios integram ao texto. É indispensável resolvê-los. As dúvidas que surgirem podem ser sanadas com os colegas de cur- so, com os tutores ou com o professor da disciplina. O programa da disciplina foi desenvolvido de forma que inicias- se com os conceitos básicos e exigisse o mínimo de pré-requisitos. Todas as seções, com exceção da primeira, utilizam conceitos e re- sultados das seções anteriores. Desta forma, nenhuma parte deste material pode ser deixada de lado sem a possibilidade de prejuízo de aprendizado. Todo o material deste livro é de responsabilidade do Professor Oscar Ricardo Janesch. Oscar Ricardo Janesch 9 Introdução Atualmente, quando estudamos conjuntos numéricos, temos in- teresse em conhecer propriedades das operações e relações nestes conjuntos. Esta maneirade tratar com conjuntos numéricos teve início com os trabalhos de Pitágoras de Samos, que viveu no sé- culo VI a.C.. Pitágoras tinha conhecimento que os egípcios e babilônios faziam cálculos usando regras que eram passadas de geração a geração. Analisando tais regras, ele passou a considerar os números como elementos abstratos (que não eram necessariamente associados a problemas práticos que envolvessem medidas ou quantidades), e deduziu propriedades das operações entre estes elementos. Para ter certeza dos resultados obtidos, Pitágoras aperfeiçoou a prova científica ou prova matemática, que também chamamos simplesmente de demonstração. A demonstração matemática ini- cia com uma “verdade aceita” e através de argumentação lógica chega a uma conclusão inegável. Esta é a ferramenta fundamental para o estudo da matemática. Os conhecimentos sobre várias áreas da matemática são forma- lizados através do método axiomático, que consiste de conceitos primitivos e axiomas. Os conceitos primitivos são termos aceitos sem explicação formal, e os axiomas são proposições, envolvendo os conceitos primitivos, tomadas como verdadeiras por estarem baseadas na intuição elementar. A partir dos axiomas provam- se novas proposições, e a partir dos axiomas e das novas propo- sições provam-se outras proposições, e assim sucessivamente se constrói a teoria sobre determinado assunto. A geometria foi o primeiro ramo da matemática que teve sua teo- ria construída de forma axiomática. Isto se deve aos trabalhos de Euclides (século III a.C.) publicados na obra Elementos. A axiomatização da álgebra ocorreu bem mais tarde. A primeira tentativa foi feita pelo inglês Benjamin Peacok (1791-1858) em 1830, mas não se mostrou consistente. Nesta época poucos matemáticos 10 se dedicavam à tentativa de axiomatizar operações em conjuntos de forma geral, pois o objetivo principal era obter a axiomatização dos conjuntos numéricos , , , e . O conjunto dos números complexos foi o primeiro a ter sua cons- trução descrita pelo método axiomático. Isso ocorreu em 1833, com trabalhos de Willian R. Hamilton (1805-1865). O último foi o conjun- to dos números naturais em 1899, graças aos estudos de Giuseppe Peano. Conjuntos com operações que satisfazem axiomas determinados previamente são chamados de estruturas algébricas. O conceito da estrutura algébrica chamada anel, fundamental para a axiomatiza- ção da álgebra, surgiu como conseqüência da sistematização dos conjuntos numéricos. A definição formal de anel foi elaborada em 1914 pelo alemão A. Fraenkel (1891-1965). A estrutura algébrica chamada anel é o assunto do curso de Álgebra I. Veremos que um anel é um conjunto não vazio onde estão de- finidas operações que satisfazem propriedades bem determinadas. Por exemplo, o conjunto dos números inteiros , com as operações usuais de adição e multiplicação, é um anel. A definição de anel surge da necessidade de saber em quais conjun- tos temos boas propriedades aritméticas que permitem fazer contas. De outra forma, o conceito de anel está relacionado com as seguintes perguntas: Qual o conjunto mínimo de propriedades da adição e da multiplicação em , a partir do qual é possível demonstrar as de- mais propriedades de ? Quais propriedades as operações de um conjunto A devem satisfazer para que possamos fazer contas em A de forma semelhante a que fazemos em ? As respostas para as perguntas acima levaram aos seis axiomas de anel. Isto é, um conjunto mínimo de propriedades que as operações de adição e de multiplicação em (e de qualquer outro conjunto com duas operações) devem satisfazer para que possamos deduzir outras propriedades. Seja A um conjunto onde estão definidas duas operações que satisfa- zem os seis axiomas de anel. Chamaremos A de anel. Suponha que 11 a partir dos seis axiomas de anel consigamos provar outras quinze propriedades operacionais. Como usamos apenas os seis axiomas de anel para deduzir estas quinze novas propriedades, elas valem não apenas para A , mas para todo conjunto com duas operações que satisfaçam os seis axiomas de anel. Note que isso leva a uma mudança de enfoque. Deixamos de estu- dar um conjunto baseados na natureza de seus elementos, e pas- samos a estudá-lo com base nas propriedades de suas operações. Veremos que este procedimento é útil para obter informações sobre vários conjuntos. Existem várias outras estruturas algébricas, mas neste curso trata- remos apenas com estruturas algébricas que são anéis, ou que são anéis e satisfazem novos axiomas. Especificamente estudaremos as estruturas algébricas chamadas anéis comutativos, anéis com uni- dade, anéis comutativos com unidade, domínios e corpos. No Capítulo I definiremos formalmente as estruturas algébricas ci- tadas acima, veremos alguns exemplos e provaremos propriedades aritméticas comuns aos anéis. O Capítulo seguinte trata de anéis específicos. A saber, os anéis de funções, os anéis de matrizes, os anéis n e os anéis produto direto. No Capítulo III estudaremos subanéis como uma ferramenta para produzir novos anéis, e tra- taremos de elementos especiais em anéis. O Capítulo IV aborda os ideais como a família de subanéis para a qual é possível construir um anel quociente. As funções que relacionam anéis, chamadas de homomorfismos de anéis, serão tratadas no Capítulo V. O último Capítulo traz um estudo do corpo dos números complexos, e de alguns subanéis de . Capítulo 1 Anéis, Domínios e Corpos Capítulo 1 Anéis, Domínios e Corpos Neste capítulo definiremos formalmente as estruturas algébricas chamadas anel, anel comutativo, anel com unidade, anel comutativo com unidade, domínio e cor- po. Apresentaremos alguns exemplos e provaremos pro- priedades aritméticas dos anéis. 1.1 Introdução Iniciaremos com conceitos e resultados conhecidos sobre o con- junto dos números inteiros . O objetivo é apresentar como um exemplo que motive a definição formal de anel. As operações usuais de adição e multiplicação de números in- teiros são indicadas respectivamente por :+ × → e :⋅ × → ( , )a b a b+ ( , )a b a b⋅ . Essa notação é usada para deixar claro que a adição e a multi- plicação são funções de × em . Assim, a operação de adi- ção associa a cada par ( , )a b ∈ × um único elemento a b+ ∈ . Analogamente, a operação de multiplicação associa a cada par ( , )a b ∈ × um único elemento a b⋅ ∈ . É claro que existem outras operações em . Vejamos dois exemplos: :− × → • ( , )a b a b− . :∗ × → • ( , ) 2 5a b a b a b∗ = + . 16 Para indicar que consideramos no conjunto as operações usuais de adição ( )+ e multiplicação ( )⋅ , escrevemos ( , , )+ ⋅ . Nosso interesse é por propriedades das operações de ( , , )+ ⋅ . Existem muitas, mas vamos destacar seis delas, que chamaremos de axiomas de anel: (i) Comutatividade da adição: , ,a b b a a b+ = + ∀ ∈ . (ii) Associatividade da adição: ( ) ( ), , ,a b c a b c a b c+ + = + + ∀ ∈ . (iii) Existência de elemento neutro para a adição: 0 0 ,a a a a+ = + = ∀ ∈ . (iv) Existência de elemento simétrico em relação à adição: Dado a∈ , existe ( )a− ∈ tal que ( ) ( ) 0a a a a+ − = − + = . (v) Associatividade da multiplicação: ( ) ( ), , ,a b c a b c a b c⋅ ⋅ = ⋅ ⋅ ∀ ∈ . (vi) Distributividade da multiplicação em relação à adição: ( ) , , ,a b c a b a c a b c⋅ + = ⋅ + ⋅ ∀ ∈• ; ( ) , , ,a b c a c b c a b c+ ⋅ = ⋅ + ⋅ ∀ ∈• . Pelo fato de ( , , )+ ⋅ satisfazer os axiomas acima, dizemos que ( , , )+ ⋅ é um anel. É evidente que existem outros conjuntos munidos de duas ope- rações que satisfazem os axiomas de anel. Por exemplo, ( , , )+ ⋅ , ( , , )+ ⋅ e ( , , )+ ⋅ com operações usuais. Veremos neste capítu- lo que existem muitosoutros. Na verdade existem infinitos con- juntos munidos de duas operações que satisfazem os axiomas de anel. Em analogia ao que fizemos com ( , , )+ ⋅ , cada um desses conjuntos com suas operações será chamado de anel. É claro que ( , , )+ ⋅ também satisfaz outros axiomas, mas no momento estamos interessados apenas nos axiomas (i)-(vi) citados acima. A importância desses seis axiomas está no fato de forma- rem o menor conjunto de axiomas, a partir dos quais é possível provar as propriedades operacionais básicas de ( , , )+ ⋅ . 17 Para ilustrar de que maneira os axiomas de anel podem ser usados para provar propriedades operacionais de ( , , )+ ⋅ , va- mos provar um fato bem conhecido: 0 0,a a⋅ = ∀ ∈ . Pelo axioma (iii): 0 0 0= + . Multiplicando por a: 0 (0 0)a a⋅ = ⋅ + . Pelo axioma (vi): 0 0 0a a a⋅ = ⋅ + ⋅ . Pelo axioma (iv), existe um simétrico ( .0)x a= − para 0a ⋅ . Somando x em ambos os lados da igualdade acima: 0 ( 0 0)a x a a x⋅ + = ⋅ + ⋅ + . Pelo axioma (ii): 0 0 ( 0 )a x a a x⋅ + = ⋅ + ⋅ + . Como x é simétrico de 0a ⋅ : 0 0 0a= ⋅ + . Pelo axioma (iii): 0 0a= ⋅ . Note que na demonstração acima não foi relevante o fato de trabalharmos com números inteiros, mas sim o fato de valerem os axiomas de anel. Isso leva à conclusão seguinte: Qualquer conjunto não vazio A, com duas operações que satisfazem os axiomas de anel, tem a propriedade a · 0 = 0, para todo a ∈ A. De forma mais geral: Toda propriedade provada a partir dos axiomas de anel vale para qualquer conjunto que satisfaz os axiomas de anel. Isso leva a uma mudança de enfoque. A saber, estudar um con- junto não pela natureza de seus elementos, mas sim pelas pro- priedades de suas operações. Esse novo enfoque começou a ser 18 usado na primeira metade do século passado, e alguns autores o chamam de “Álgebra Moderna”. Neste contexto a ênfase está na estrutura algébrica do conjunto, isto é, nos axiomas satisfeitos pelas operações do conjunto. A vantagem da abordagem acima está no fato de obtermos pro- priedade para muitos conjuntos de uma só vez. Claro que estes conjuntos devem ter operações que satisfaçam axiomas previa- mente estabelecidos. Em nosso caso, queremos conhecer proprie- dades obtidas através dos axiomas de anel e conhecer conjuntos que satisfaçam estes axiomas. Iniciaremos este trabalho na próxi- ma seção. 1.2 Anel, domínio e corpo Definição 1.2.1. Um anel é um conjunto A ≠ φ no qual estão definidas duas operações, + e ⋅ , satisfazendo os seguintes axiomas: (i) , ,a b b a a b A+ = + ∀ ∈ . (ii) ( ) ( ), , ,a b c a b c a b c A+ + = + + ∀ ∈ . (iii) Existe 0A A∈ tal que 0 0 ,A Aa a a a A+ = = + ∀ ∈ . (iv) Dado a A∈ , existe ( )a A− ∈ tal que ( ) ( ) 0Aa a a a+ − = − + = . (v) ( ) ( ) , , ,a b c a b c a b c A⋅ ⋅ = ⋅ ⋅ ∀ ∈ (vi) ( )a b c a b a c⋅ + = ⋅ + ⋅ , ,a b c A∀ ∈ . ( ) , , ,a b c a c b c a b c A+ ⋅ = ⋅ + ⋅ ∀ ∈ . Observação 1.2.1. Os símbolos + e · indicam operações em A, isto é, : A A A+ × → e : A A A⋅ × → ( , )a b a b+ ( , )a b a b⋅ , são funções de A A× em A . Observação 1.2.2. A escolha dos símbolos + e ⋅ para indicar as operações do anel A é apenas uma notação. Poderíamos, por exemplo, representar as operações do anel A por ∗ e ∆ . 19 Observação 1.2.3. Por indicar que o conjunto A é anel, em relação às operações ∗ e ∆ , escrevemos ( , , )A ∗ ∆ . A primeira operação ∗ , na notação ( , , )A ∗ ∆ , é chamada de adição. A segunda operação ∆ é chamada de multiplicação. Quando não houver possibilida- de de confusão sobre as operações consideradas, podemos nos referir simplesmente ao anel A , sem mencionar as operações. Observação 1.2.4. O elemento 0A do axioma (iii) é chamado de elemento neutro ou zero da adição do anel A . Quando apenas o anel A for considerado denota-se 0A simplesmente por 0 . Observação 1.2.5. O elemento a A− ∈ , visto no axioma (iv), é chamado de simétrico de a . Note que o axioma (iv) garante que todo elemento de A tem simétrico em A . Assim, se ,a b A∈ en- tão ,a b A− ∈ e podemos efetuar a operação ( )a b+ − . Para facili- tar a escrita, usamos a notação a b− para indicar ( )a b+ − , isto é, ( )a b a b+ − = − . Chamamos de operação subtração em A a opera- ção que a cada ( , )a b A A∈ × associa o elemento a b A− ∈ . Observação 1.2.6. Ao efetuarmos a multiplicação dos elementos a e b do anel ( , , )A + ⋅ , é comum omitir o símbolo ⋅ que indica a operação. Isto é, a b ab⋅ = . Observação 1.2.7. Os axiomas (i)-(vi) são chamados de axiomas de anel. Antes de apresentar exemplos de anel, veremos que anéis cujas operações satisfazem novos axiomas têm denominação especial. Lembre que quando dizemos que A é um anel, fica subentendida a existência de duas operações que satisfazem os axiomas de anel. Definição 1.2.2. O anel A é comutativo quando: (vii) , ,ab ba a b A= ∀ ∈ . Definição 1.2.3. O anel A é unitário ou com unidade quando: (viii) Existe 1A A∈ tal que 1 1 ,A Aa a a a A⋅ = ⋅ = ∀ ∈ . Observação 1.2.8. O elemento 1A da definição acima é chamado de unidade do anel A . Quando não houver possibilidade de con- 20 fusão sobre o anel considerado, escrevemos apenas 1 para indicar a unidade do anel A . Observação 1.2.9. Um elemento a do anel A é chamado divi- sor de zero quando 0a ≠ e existe b A∈ , 0b ≠ , tal que 0ab = ou 0b a = . Definição 1.2.4. Dizemos que o anel A é um anel sem divisores de zero quando: (ix) ,a b A∈ e 0 0 ou 0ab a b= ⇒ = = . Definição 1.2.5. Um domínio de integridade é um anel unitário, comutativo e sem divisores de zero. Observação 1.2.10. Um domínio de integridade também é cha- mado de anel de integridade ou simplesmente domínio. Definição 1.2.6. Um corpo é um anel unitário e comutativo K que satisfaz: (x) a K∈ e 0 ; 1a x K a x≠ ⇒ ∃ ∈ = . Observação 1.2.11. O elemento x da definição acima é chamado de inverso do elemento a K∈ , e denotado por 1a− . Assim, um corpo é um anel unitário e comutativo no qual todo elemento diferente de zero tem inverso. Observação 1.2.12. A estrutura algébrica de um conjunto com operações é a denominação dada ao conjunto em função dos axio- mas satisfeitos pelas operações. Nosso interesse é pelas estruturas algébricas de anel (anel comutativo e anel com unidade), domínio e corpo. Segue das definições acima que: Todo domínio é anel;• Todo corpo é um anel.• Veremos agora que todo corpo é um domínio. Por isso, usa- remos o lema abaixo, cuja demonstração é cópia do que fizemos para verificar que 0 0,a a⋅ = ∀ ∈ . 21 Lema 1.2.1. Se A é um anel, então 0 0 0a a⋅ = ⋅ = , para todo a A∈ . Demonstração. Seja a A∈ . Verificaremos que 0 0a ⋅ = . A igual- dade 0 0a⋅ = se prova de forma análoga. Pelo axioma (iii) temos: 0 0 0= + (Multiplique por a à esquerda) (Use o axioma (vi)) (Some o simétrico x de .0a , que .0 .0 .0a a a= + existe pelo axioma (iv)) .0 ( .0 .0)a x a a x+ = + + (Use o axioma (ii)) ( .0 0a x+ = ) 0 .0 0a= + ( .0 0 .0a a+ = ) 0 0a= ⋅ . Proposição 1.2.1. Se K é corpo, então K é domínio. Demonstração. Como K é corpo, temos que K é anel unitário e comutativo que satisfaz o axioma (x). Assim, para provar que K é domínio só faltar verificar que K não tem divisores de zero, isto é, verificar o axioma (ix). Sejam ,a b K∈ tais que 0ab = . Se 0a = a demonstração acabou. Se 0a ≠ , usamos o axioma (x), pois K é corpo, para obter 1a K− ∈ tal que 1 1a a− ⋅ = . Agora, 0ab = (multiplique por 1a− à esquerda) 1 1( ) 0a ab a− −= ⋅ (use o Lema 1.2.1) 1( ) 0a ab− = (use o axioma (v)) 1( ) 0a a b− = 1 0b⋅ = 0b = . 22 Portanto, quando 0ab = devemos ter 0a = ou 0b = . Isso asse- gura que K é um domínio. Passemos aos exemplos de anéis. Note que oExemplo 1.2.1 abaixo mostra que não vale a recíproca da Proposição 1.2.1, isto é, existe domínio que não é corpo. Exemplo 1.2.1. Com as operações usuais, ( , , )+ ⋅ é domínio que não é corpo. É claro que ( , , )+ ⋅ é domínio cujo elemento neutro é o número 0 , o simétrico de a∈ é a− ∈ , e a unidade é o número 1. No entanto ( , , )+ ⋅ não é corpo, pois 2∈ e não existe x∈ tal que 2 1x⋅ = . Exemplo 1.2.2. No conjunto defina as operações: a b a b∗ = +• 0a b =• . Como a operação ∗ é a adição usual, os axiomas (i), (ii), (iii) e (iv) são verificados. Vejamos que valem os axiomas (v) e (vi). Tome , ,a b c∈ . ( ) 0 ( )a b c a b c= = , ( ) 0 0 0 ( ) ( ) ( ) ( )a b c a b a c a b a c∗ = = + = + = ∗ , ( ) 0 0 0 ( ) ( ) ( ) ( )a b c a c b c a c b c∗ = = + = + = ∗ . Segue que ( , , )∗ é anel. Obviamente é comutativo, pois 0 , ,a b b a a b= = ∀ ∈ . No entanto, ( , , )∗ não tem unidade. De fato, suponha que x∈ é unidade, então, teremos 2 2 0x= = , que é uma contradição. Concluímos que, ( , , )∗ é anel comuta- tivo sem unidade, e portanto não é domínio. Observe ainda que ( , , )∗ é anel com divisores de zero, pois 2 0≠ , 3 0≠ e 2 3 0= . Os exemplos acima mostram que a estrutura algébrica de um conjunto depende das operações consideradas. Vimos que com as operações usuais é um domínio, mas não é domínio com as operações a b a b∗ = + e 0a b = . O próximo exemplo mostra que pode sequer ser anel, dependendo da escolha das operações. 23 Exemplo 1.2.3. No conjunto defina as operações: a b a b∗ = −• a b ab=• . Afirmamos que ( , , )∗ não é anel. Basta observar que não vale o axioma (i), pois 1 0 1 0 1∗ = − = e 0 1 0 1 1∗ = − = − . Exemplo 1.2.4. Com as operações usuais ( , , )+ ⋅ é um corpo. Não há dificuldade para verificar que ( , , )+ ⋅ é anel comutativo e com unidade 1 . Além disso, dado pa q = ∈ , ,p q∈ , 0a ≠ , vem que 0p ≠ e q p ∈ . Então 1 qa p − = ∈ , pois 1p q q p ⋅ = . Exemplo 1.2.5. No conjunto defina as operações: a b a b∗ = +• 0a b =• . De forma análoga ao Exemplo 1.2.2 vemos que ( , , )∗ é anel comutativo sem unidade e com divisores de zero. Logo, ( , , )∗ não é corpo e nem domínio. Exemplo 1.2.6. Com as operações usuais ( , , )+ ⋅ é um corpo. É claro que ( , , )+ ⋅ é anel comutativo com unidade 1. Também sabemos que se x∈ , 0x ≠ , então 1 x ∈ e 1 1x x ⋅ = . Isso garante que ( , , )+ ⋅ é corpo, pois todo elemento não nulo tem inverso. No próximo exemplo apresentamos operações em um conjun- to finito A através de tabelas. Para isso escrevemos os elementos do conjunto A em uma coluna (vertical) e também em uma linha (horizontal) separados por traços, como no exemplo abaixo. A ta- bela é preenchida operando, em ordem, o elemento da coluna por cada elemento da linha. Portanto, dada uma tabela deste tipo, sa- bemos como operar quaisquer dois elementos do conjunto. 24 Exemplo 1.2.7. Seja { },A e a= um conjunto com 2 elementos. Defi- na as operações + e ⋅ em A , pelas tabelas abaixo: + e a · e a e e a e e e a a e a e a Afirmamos que ( , , )A + ⋅ é corpo onde 0A e= e 1A a= . Analisan- do a tabela da operação +, vemos que esta operação é comutativa e associativa, isto é, satisfaz os axiomas (i) e (ii). Além disso 0A e= , pois e e e+ = e e a a+ = . O simétrico de e é e e o simétrico de a é a . Até agora vimos que ( , , )A + ⋅ satisfaz os axiomas (i), (ii), (iii) e (iv). Olhando para a tabela da operação ⋅ , vemos que vale (v). Para verificar o axioma (vi) precisamos fazer algumas contas: ( )e e e ee e e e ee ee+ = = = + = + ( )e e a ea e e e ee ea+ = = = + = + ( )a e e ae e e e ae ae+ = = = + = + ( )a a e aa a a e aa ae+ = = = + = + ( )a a a ae e a a aa aa+ = = = + = + . Isso prova a distributividade à esquerda. De forma análoga veri- fica-se a distributividade à direita. Portanto, ( , , )A + ⋅ é anel. A co- mutatividade da multiplicação é óbvia. Desde que ae e= e aa a= temos que 1A a= . Para provar que ( , , )A + ⋅ é corpo, só falta mos- trar que todo elemento diferente de 0A e= tem inverso. Mas o único elemento diferente de 0A e= é a , que tem inverso a . Con- cluímos que ( , , )A + ⋅ é corpo. Vimos acima que para apresentar um exemplo de anel finito com 2 elementos, dá algum trabalho. Veremos no decorre des- te curso, que para cada número natural n , é possível construir um anel com n elementos. Claro que iremos desenvolver técnicas 25 mais refinadas do que simplesmente fazer contas como no Exem- plo 1.2.7. Imagine quantas combinações deveríamos trabalhar para verificar a propriedade distributiva em um conjunto com 50 elementos. No próximo capítulo estudaremos famílias especiais de anéis, inclusive uma família de anéis finitos. Antes, vamos terminar este capítulo provando várias propriedades comuns aos anéis. 1.3 Propriedades dos anéis Proposição 1.3.1. Sejam ( , , )A + ⋅ um anel e , ,a b c A∈ . (1) O zero é único. (2) O simétrico é único. (3) 0 0 0a a⋅ = ⋅ = . (4) a b a c b c+ = + ⇔ = . (5) b c ab ac= ⇒ = e ba ca= . (6) ( )a a− − = . (7) ( ) ( ) ( )ab a b a b− = − = − . (8) ( )a b c ab ac− = − . (9) ( )a b c ac bc− = − . (10) ( )a b a b− + = − − . (11) ( )( )a b ab− − = . Demonstração. (1) Sabemos que o anel A tem um zero que denotamos por 0A . Suponha que exista outro zero em A , que indicaremos por x . Como 0A é elemento neutro da adição, vale 0A x x+ = . Como x é elemento neutro da adição, vale 0 0A Ax+ = . Das igualdades acima concluímos que 0Ax = , e portanto 0A é o único elemento neutro do anel A . 26 (2) Seja a A∈ . Sabemos que a tem um simétrico a A− ∈ . Supo- nha que x A∈ também é simétrico de a . 0x x= + ( 0 é elemento neutro para A ) ( ( ))x a a= + + − ( a− é simétrico de a ) ( ) ( )x a a= + + − (axioma (ii)) 0 ( )a= + − (pois x é simétrico de a ) a= − . ( 0 é elemento neutro de a ) Logo x a= − e então a− é o único simétrico de a . (3) Já foi provada no Lema 1.2.1. (4) ( )⇐ Desde que + é operação em A , ela associa a cada par de elementos de A um único elemento de A . Como b c= te- mos que os pares ( , )a b e ( , )a c são os mesmos em A A× . Assim a b a c+ = + . ( )⇒ Por hipótese a b a c+ = + . Então, usando a direção ( )⇐ , podemos somar a− em ambos os lados obtendo: ( ) ( ) ( ) ( ) 0 0 . − + + = − + + ⇒ − + + = − + + ⇒ + = + ⇒ = a a b a a c a a b a a c b c b c (5) É análoga a ( )⇐ da propriedade anterior, trocando + por ⋅ . De fato, como b c= os pares ( , )a b e ( , )a c coincidem em A A× , e a operação multiplicação associa a cada par de elementos de A um único elemento de A . Portanto, ab ac= . Da mesma maneira verifica-se que ca ba= . (6) Como a− é o simétrico de a valem as igualdades ( ) ( ) 0a a a a+ − = − + = . Isso mostra que a é o simétrico de a− . Desde que o símbolo − indica o simétrico temos ( )a a− − = . (7) ( ) ( )a b ab a a b− + = − + (axioma (vi)) 0 b= ⋅ 0= . (propriedade (3)) 27 Analogamente verifica-se que ( ) 0ab a b+ − = . Isso mostra que ( )a b− é simétrico de ab . Pela unidade do simétrico vista na pro- priedade (2) vem que ( ) ( )ab a b− = − . A igualdade ( ) ( )ab a b− = − pode ser verificada da mesma forma. (8) ( ) ( ( ))a b c a b c− = + − ( )ab a c= + − (axioma (vi)) ( )ab ac= + − (propriedade (7)) = ab ac− . (9) ( ) ( ( ))a b c a b c− = + − (axioma(vi)) ( )ac b c= + − (propriedade (7)) ac bc= − (10) ( ) ( ) ( ) ( )a b a b a a b b+ + − + − = + − + + − (axiomas (i) e (ii)) 0 0= + 0= . Analogamente, ( ) ( ) 0a b a b− + − + + = . Segue que o simétrico de a b+ é ( ) ( )a b a b− + − = − − . Portanto, ( )a b a b− += − − . (11) ( )( ) ( ( ))a b a b− − = − − (propriedade (7)) ( )ab= − − (propriedade (7)) ab= . (propriedade (6)) Proposição 1.3.2. Seja ( , , )A + ⋅ um anel com unidade. (1) A unidade é única. (2) Se , 0a A a∈ ≠ e a tem inverso em A , então o inverso de a é único. (3) Se 1 0= então {0}A = . 28 Demonstração. (1) É idêntica à que fizemos na Proposição 1.3.1(1) trocando 0A por 1 e trocando + por ⋅ . (2) Análoga à demonstração da Proposição 1.3.1(2), trocando a− por 1a− , trocando 0 por 1e trocando + por ⋅ . (3) Seja a A∈ . Como A tem unidade 1 temos 1a a= ⋅ . Por hipótese 1 0= , então usando a Proposição 1.3.1(3) vem que 1 0 0a a a= ⋅ = ⋅ = . Logo {0}A = . Observação 1.3.1. Em geral não temos interesse em estudar o anel { }0A = . Assim, quando trabalhamos com anel com unidade, fica subentendido que 1 0≠ . Pois, se 1 0= temos { }0A = , de acordo com a Proposição 1.3.2(3). Veremos agora que, em um anel, a inexistência de divisores de zero é equivalente às leis do cancelamento para a multiplicação. Assim, em um domínio sempre valem as leis do cancelamento. Proposição 1.3.3. Se ( , , )A + ⋅ é um anel, então são equivalentes: (a) A é anel sem divisores de zero; (b) ab ac b c ba ca b c = ⇒ = = ⇒ = , , , 0a b c A a∀ ∈ ≠ . Demonstração. (a) ⇒ (b). ab ac= 0ab ac⇒ − = ( ) 0ab a c⇒ + − = ( ) 0a b c⇒ − = . Como A não tem divisores de zero e 0a ≠ , vem que 0b c− = , e daí b c= . O outro item se verifica da mesma maneira. 29 (b) ⇒ (a). Sejam ,a b A∈ tais que 0ab = . Suponha que 0a ≠ . Aplicando a hipótese na igualdade 0 0ab a= = ⋅ , vem que 0b = . Portanto, 0a = ou 0b = , isto é, o anel A não tem divisores de zero. Definição 1.3.1. Seja ( , , )A + ⋅ um anel. Dado a A∈ e , 0n n∈ ≠ , definimos: 1a a= a n+1 = a n.a , n ≥ 1. Quando A tem unidade também definimos 0 1a = . Proposição 1.3.4. Sejam ( , , )A + ⋅ um anel, ,a b A∈ e , {0}m n∈ − . Então: (1) m n m na a a += ; (2) ( )m n mna a= ; (3) ( )n n nab a b= , quando ab ba= . Demonstração. Usaremos o Primeiro Princípio de Indução sobre n nas três provas. (1) Para 1n = temos 1 1m m ma a a a a += = , pela definição de potência. Suponha que vale para 1n r= ≥ , isto é, m r m ra a a += . Vejamos que vale para 1n r= + . 1 1 ( ) 1 ( 1)( ) ( )m r m r m r m r m r m ra a a a a a a a a a a a+ + + + + += = = = = . (2) Para 1n = temos 1 1( )m m ma a a ⋅= = . Suponha que vale para 1n r= ≥ , isto é, ( )m r mra a= . Então, 1 ( 1)( ) ( )m r m r m mr m mr m m ra a a a a a a+ + += = = = . Logo, vale para 1n r= + . Observe que usamos o item (1) na penúltima igualdade acima. (3) Para 1n = , temos 1 1 1( )ab ab a b= = . Suponha que vale para 1n r= ≥ , isto é, ( )r r rab a b= quando ab ba= . Então, 1 1 1( ) ( ) ( )r r r r r r r rab ab ab a b ab a ab b a b+ + += = = = . Logo, vale para 1n r= + . 30 Observação 1.3.3. Quando A é anel com unidade a Proposição 1.3.4 vale para quaisquer ,m n∈ . De fato, é fácil acrescentar o caso 0n = nas demonstrações acima: • 0 01 +⋅ = ⋅ = =m m m ma a a a a 0 0 0( ) 1 ⋅= = =m ma a a• 0 0 0( ) 1 1 1⋅ = = ⋅ = ⋅a b a b• . Observação 1.3.4. Se A é um anel com unidade, a A∈ e existe 1a A− ∈ , então definimos , u∈ . Nesse caso é possível verificar que m n m na a a += e , para quaisquer ,m n∈ . Além disso, se ,a b A∈ e ab ba= , então ( ) , n n nab a b n= ∀ ∈ . 31 Lista de exercícios Verifique se 1) (( ), ,A ∗ ∆) é anel quando: a) A = , a b a b∗ = e a b a b∆ = + . b) A ∗= , a b a b∗ = e a b a b∆ = + . c) A = , 1a b a b∗ = + − e a b a b a b∆ = + − . d) A = , 3a b a b∗ = + − e 3 a ba b a b∆ = + − . Para cada item do Exercício anterior em que 2) (( ), ,A ∗ ∆) é anel, determine sua melhor estrutura algébrica. Isto é, verifique se A é apenas anel, é anel comutativo, é anel com unidade, é anel comutativo com unidade, é domínio ou é corpo. Sejam 3) S um conjunto não vazio, (( ), ,A + ⋅) um anel e :f S A→ uma função bijetora. Para ,x y S∈ defina as operações: e . Verifique que (( ), ,S ∗ ∆) é um anel. Seja 4) A um anel que possui um elemento 0x ≠ tal que 2x x= e x não é divisor de zero em A . Verifique que A tem unida- de e 1A x= . Seja 5) A um anel tal que 2a a= , para todo a A∈ . Verifique que a a= − e que A é anel comutativo. Seja 6) { }, , ,A e a b c= um anel com unidade 1A a= e 0A e= . Sa- bendo que a a b b e+ = + = e b c e= , construa as tabelas das operações do anel A . 32 Resumo Neste capítulo você viu: As definições axiomáticas das estruturas algébricas chama-• das anel, anel comutativo, anel com unidade, anel comutati- vo com unidade, domínio e corpo. Que todo corpo é um domínio e que todo domínio é um • anel comutativo com unidade. Que um conjunto pode ser ou não um anel, dependendo das • operações definidas neste conjunto. Que operações diferentes podem definir estruturas algébri-• cas diferentes no mesmo conjunto. Que em um anel o elemento neutro é único, o simétrico de • cada elemento é único e valem outras nove propriedades aritméticas. Que, em um anel com unidade, a unidade é única. Se um • elemento possui inverso, então o inverso é único. Que as leis do cancelamento do produto valem em um anel • se, e somente se, este anel não tem divisores de zero. Propriedades de potências de elementos de um anel.• Capítulo 2 Alguns Anéis Especiais Capítulo 2 Alguns Anéis Especiais Neste capítulo veremos outros exemplos de anéis. Tra- taremos especificamente com anéis de funções, anéis de matrizes, anéis n e anéis produto cartesiano. 2.1 Anéis de funções Sejam X um conjunto não vazio e A um anel. Denote por XA o conjunto de todas as funções de X em A , isto é, { }: ; é funçãoXA f X A f= → . Lembre que duas funções são iguais quando têm mesmo do- mínio, mesmo contra-domínio e mesma imagem para todos os pontos do domínio. Assim, dados , Xf g A∈ temos: ( ) ( ),f g f x g x x X= ⇔ = ∀ ∈ . Vamos introduzir operações de adição e multiplicação em .XA Para , Xf g A∈ defina f g+ e f g⋅ por ( )( ) ( ) ( )f g x f x g x+ = + , ( )( ) ( ) ( )f g x f x g x⋅ = , x X∀ ∈ . Note que a operação + em f g+ é a que estamos definindo, e a operação + em ( ) ( )f x g x+ é a adição do anel A . O mesmo vale para a operação multiplicação. A cada par de funções , Xf g A∈ associamos únicas funções , Xf g f g A+ ⋅ ∈ . Dessa maneira + e ⋅ são operações em XA . Proposição 2.1.1. Com a notação acima temos: (1) ( , , )XA + ⋅ é anel. (2) Se ( , , )A + ⋅ é comutativo, então ( , , )XA + ⋅ é comutativo. 36 (3) Se ( , , )A + ⋅ tem unidade, então ( , , )XA + ⋅ tem unidade. Demonstração. (1) Devemos mostrar que ( , , )XA + ⋅ satisfaz os 6 axiomas de anel. Verificaremos alguns e os demais ficarão como exercício. Sejam , , Xf g h A∈ . Axioma (i): f g g f+ = + . Seja x X∈ . Como ( ), ( )f x g x A∈ e a adição é comutativa em A , temos: ( ) ( ) ( ) ( )f x g x g x f x+ = + . Então, ( )( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )( )f g x f x g x g x f x g f x+ = + = + = + . Portanto, f g g f+ = + . Axioma (iii): Elemento neutro. Tome Xl A∈ dada por ( ) 0l x = , .x X∀ ∈ Então para qualquer Xf A∈ temos: ( )( ) ( ) ( ) ( ) 0 ( )f l x f x l x f x f x+ = + = + = f l f⇒ + = . Pela comutatividade vista acima também vale l f f+ = . Logo, l é um elemento neutro de XA . Axioma (iv): Elemento simétrico. Dada Xf A∈ , defina a função ( ) :f X A− → por ( )( ) ( )f x f x− = − . Então temos: ( ( ))( ) ( ) ( )( ) ( ) ( ) 0f f x f x f x f x f x+ − = + − = − = ( )f f l⇒ + − = . Pela comutividade, ( )f f l− + = . Portanto, ( ) Xf A− ∈ é o simé- trico de Xf A∈ . (2) Sejam , Xf g A∈ . Como A é comutativo por hipótese e ( ), () ,f x g x A x X∈ ∀ ∈ , temos: ( ) ( ) ( ) ( )f x g x g x f x⋅ = ⋅ , x X∀ ∈ . Então, ( )( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )( )f g x f x g x g x f x g f x⋅ = ⋅ = ⋅ = ⋅ fg gf⇒ = . 37 (3) Por hipótese A tem unidade 1. Defina : X Aψ → por ( ) 1xψ = , x X∀ ∈ . Então, ψ xx A∈ e dados Xf A∈ e x X∈ temos: ( )( ) ( ) ( ) ( ) 1 ( )f x f x x f x f x⋅ψ = ⋅ψ = ⋅ = , e ( )( ) ( ) ( ) 1 ( ) ( )f x x f x f x f xψ ⋅ = ψ ⋅ = ⋅ = . Segue que f f f⋅ψ = = ψ ⋅ . Portanto, ψ é a unidade de XA . Na demonstração acima vimos que se A é anel então AX é anel e O elemento neutro de • XA é a função nula, : , ( ) 0.l X A l x→ = O simétrico de • Xf A∈ é a função ( ) :f X A− → , ( )( ) ( )f x f x− = − . Se • A tem unidade então a unidade de XA é a função constante 1, isto é, : X Aψ → , ( ) 1xψ = . Já sabemos que para qualquer conjunto não vazio X e qual- quer anel A o conjunto { }: ; é funçãoXA f X A f= → é um anel. Em particular tomando X A= vem que { }: ; é funçãoAA f A A f= → é anel. Em outras palavras, para cada anel A , o conjunto das fun- ções de A em A é um anel. Isso fornece um procedimento para obtermos novos anéis a partir de anéis conhecidos. Por exemplo, sabemos que ( , , )+ ⋅ é anel e então { }: ; é funçãof f= → é anel. Além disso, pela Proposição 2.1.1, é anel comutativo com unidade. Observação 2.1.1. Não é verdade, em geral, que anéis de funções XA sejam domínios, mesmo que A seja corpo. De fato, é corpo mas não é domínio, pois tomando : , ( )f f x x→ = 0, 0 : , ( ) 1, 0 se x g g x se x ≠→ = = . 38 Temos que , , 0, 0,f g f g∈ ≠ ≠ porém . 0f g = . De fato, . (0) (0). (0) 0.1 0,f g f g= = = e para 0x ≠ , . ( ) ( ). ( ) .0 0f g x f x g x x= = = . 2.2 Anéis de matrizes Sejam ( , , )A + ⋅ um anel e n∈ , 1n ≥ . Denote por ( )nM A o conjunto das matrizes quadradas de ordem n , com entradas em A , isto é, 11 12 1 21 22 2 1 2 ( ) ; n n n ij n n nn a a a a a a M A a A a a a = ∈ . Note que quando 1n = o conjunto ( )nM A pode ser identifica- do com A . Por isso nosso interesse é por 2n ≥ . Para simplificar a escrita é comum denotar a matriz 11 12 1 21 22 2 1 2 ( ) n n n n n nn x x x x x x X M A x x x = ∈ por ijX x = , onde fica subentendido que 1 ,i j n≤ ≤ . Lembre que duas matrizes são iguais quando têm entradas correspondentes iguais. Assim, para ijX x = , ( )ij nY y M A = ∈ (A) temos: ij ijX Y x y= ⇔ = , , {1,2,..., }i j n∀ ∈ . Em ( )nM A vamos definir a adição e a multiplicação de manei- ra usual. Dados ijX x = , ( )ij nY y M A = ∈ (A), escrevemos: ijX Y Z z + = = , onde ij ij ijz x y= + (isto é, [ ] [ ] [ ]ij ij ij i jx y x y+ = + ) e ijX Y Z z ⋅ = = , onde 1 n ij ik kj k z x y = = ∑ . 39 Proposição 2.2.1. Com as notações acima temos: (1) (( )( ), ,nM A + ⋅ ) é anel. (2) Se ( , , )A + ⋅ tem unidade, então (( )( ), ,nM A + ⋅) tem unidade. Demonstração. (1) Devemos verificar os 6 axiomas de anel. Para isso fixamos as notações ijX x = , ijY y = , ( )ij nZ z M A = ∈ . Axioma (i): X Y Y X+ = + . ij ij ij ijX Y x y x y + = + = + ij ij ij ijy x y x Y X = + = + = + . Na terceira igualdade acima usamos a comutatividade da adição do anel A . Axioma (ii): ( ) ( )X Y Z X Y Z+ + = + + . ij ij ijx y z = + + ij ij ijx y z = + + ( )X Y Z= + + . Na quarta igualdade acima usamos a associatividade da adição do anel A . Axioma (iii): Elemento neutro. Tome E = [0][ ] 0 0 0 ( ) 0 0 nE M A = = ∈ . É claro que para todo ( )nX M A∈ temos E X X E X+ = + = . 40 Axioma (iv): Elemento simétrico. Dada ( )ij nX x M A = ∈ temos que ijx A∈ . Como A é anel exis- te o simétrico ijx A− ∈ tal que ( )ij ijx x+ − ( ) 0ij ijx x= − + = . Tome ( )ij nX x M A − = − ∈ . Então ( ) [ ] [ ]ij ijX X x x+ − = + − [ ]ij ijx x= − [0] E= = . Pela comutatividade provada no axioma (i) também temos ( )X X E− + = . Portanto, [ ]ijX x− = − é o simétrico de [ ]ijX x= . Axioma (v): ( ) ( )X YZ XY Z= Escrevendo [ ] [ ] [ ]ij ij ijy z a⋅ ⋅ , com 1 n ij it tj t a y z = =∑ [ ] [ ] [ ]ij ij ijx a b⋅ = , com 1 n ij ik kj k b x a = =∑ [ ] [ ] [ ]ij ij ijx y c⋅ = , com 1 n ij ik kj k c x y = =∑ [ ] [ ] [ ]ij ij ijc z d⋅ = , com 1 n ij it tj t d c z = =∑ , devemos provar que ij ijb d= . 1 1 1 n n n ij ik kj ik kt tj k k t b x a x y z = = = = = ⋅∑ ∑ ∑ 1 1 ( ) n n ik kt tj k t x y z = = =∑ ∑ 1 1 ( ) n n ik kt tj k t x y z = = = ⋅∑ ∑ 1 1 ( ) n n ik kt tj t k x y z = = = ⋅∑ ∑ 1 n it tj t c y = =∑ ijd= . Axioma (vi): ( )X Y Z XY XZ+ = + e ( )X Y Z XZ YZ+ = + . Faremos apenas ( )X Y Z XY XZ+ = + . A outra é análoga. , onde 41 1 1 ( ) ( ) n n ij ik kj kj ik kj ik kj k k a x y z x y x z = = = + = +∑ ∑ 1 1 n n ik kj ik kj k k x y x z = = = +∑ ∑ . Por outro lado, [ ][ ] [ ][ ] [ ] [ ]ij ij ij ij ij ijXY XZ x y x z b c+ = + = + onde 1 n ij ik kj k b x y = =∑ e 1 n ij ik kj k c x z = =∑ Segue que ij ij ijb c a+ = e então [ ] [ ] [ ]ij ij ij ijXY XZ b c b c+ = + = + [ ] ( )ija X Y Z= = + . (2) Seja 1 a unidade de A . Tome 1 0 0 0 1 0 ( ) 0 0 1 nI M A = ∈ e note que [ ]ijI a= , onde 1iia = e 0ija = para i j≠ . Dado [ ] ( )ij nX x M A= ∈ temos: [ ][ ] [ ]ij ij ijX I x a b⋅ = = , onde 1 n ij ik kj k b x a = = ∑ . Como 0kja = para k j≠ e 1jja = , vem que 1 1 n ij ik kj ij jj ij ij k b x a x a x x = = = = ⋅ =∑ . Logo, [ ] [ ]ij ijb x= , isto é, X I X⋅ = . Analogamente prova-se que I X X⋅ = . Portanto, 1 0 0 0 1 0 0 0 1 I = é a unidade de ( )nM A . Observação 2.2.1. O anel ( )nM A não é comutativo em muitos ca- sos. Por exemplo, se 2n ≥ e A tem unidade, temos: 1 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 X = , 1 0 0 0 1 0 0 0 ( )0 0 0 0 0 0 0 0 nY M A = ∈ . 42 Mas 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 XY = e 1 1 0 0 1 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 YX = . Pela observação anterior, podemos concluir que: ( )nM • não é comutativo para 2n ≥ . ( )nM • não é comutativo para 2n ≥ . Observação 2.2.2. O anel ( )nM A tem divisores de zero para todo 2n ≥ . De fato, seja a A∈ , 0a ≠ . Então: 0 0 0 0 0 0 0 0 a X = , 0 0 0 0 0 0 ( ) 0 0 nY M A a = ∈ e , 0X Y ≠ . Porém 0 0 0 0 0 0 0 0 0 X Y ⋅ = . Pelo visto até aqui, podemos concluir que se 2n ≥ então ( )nM , ( )nM , ( )nM são anéis com unidade, não comutativos e com divisores de zero. Mais que isso, mesmo quando A é corpo, ( )nM A não é domínio para 2n ≥ . A construção de anéis de matrizes é importante pois, a partir de um anel fixado A , produzimos infinitos anéis. A saber, um novoanel ( )nM A para cada n∈ , 2n ≥ . Exemplo 2.2.1. Os anéis abaixo têm unidade, não são comutati- vos e têm divisores de zero. 2 2 2 3 3( ), ( ), ( ), ( ), ( )M M M M M e 3( ).M 43 2.3 Anéis n Vamos iniciar recordando a congruência em . Para cada n∈ , 2n ≥ , definimos em a relação (mod ) | ( )a b n n a b≡ ⇔ − . A expressão “ (mod )a b n≡ ” deve ser lida como: a é congruente a b módulo n . A congruência módulo n é uma relação de equivalência em , isto é, satisfaz as propriedades: reflexiva, simétrica e transitiva. Reflexiva: (mod )a a n≡ . Como | ( )n a a− temos que (mod )a a n≡ . Simétrica: (mod ) (mod )a b n b a n≡ ⇒ ≡ . (mod )a b n≡ | ( )n a b⇒ − | ( )n a b⇒ − − | ( )n b a⇒ − (mod )b a n⇒ ≡ . Transitiva: (mod )a b n≡ e (mod )b c n≡ (mod )a c n⇒ ≡ . (mod )a b n≡ e (mod )b c n≡ | ( )n a b⇒ − e | ( )n b c− nx a b⇒ = − e ny b c= − , para certos ,x y∈ ( )n x y a b b c a c⇒ + = − + − = − |n a c⇒ − (mod )a c n⇒ ≡ . Toda relação que satisfaz as propriedades reflexiva, simétrica e transitiva é chamada relação de equivalência. Portanto, a congruên- cia módulo n é uma relação de equivalência em . Em , com a relação de equivalência (mod )a b n≡ , chamamos de classe de equivalência de a o conjunto { }; (mod )a b b a n= ∈ ≡ . 44 Observe que: (mod )b a b a n∈ ⇔ ≡ | ( )n b a⇔ − ( )nx b a⇔ = − , para algum x∈ b a nx⇔ = + , x∈ . Portanto, { };a a nx x= + ∈ , isto é, a é o conjunto dos múltiplos de n somando com a . Por isso, é comum a notação: { };a a n a nx x= + = + ∈ . Por exemplo, para 2n = , { }0 0 2 2 ;k k= + = ∈ - conjunto dos números pares. { }1 1 2 2 1;k k= + = + ∈ - conjunto dos números ímpares. { }2 2 2 2 2; 0k k= + = + ∈ = { }3 3 2 2 3; 1k k= + = + ∈ = { }1 1 2 2 1; 1k k− = − + = − ∈ = { }2 2 2 2 2; 0k k− = − + = − ∈ = { }3 3 2 2 3; 1k k− = − + = − ∈ = Observe que só temos duas classes distintas, 0 e 1 . Além dis- so, todo elemento de está em exatamente uma dessas classes. Vejamos o que ocorre com 3n = . { }0 0 3 3 ;k k= + = ∈ { }1 1 3 3 1;k k= + = + ∈ { }2 2 3 3 2;k k= + = + ∈ { }3 3 3 3 ; 0k k= + = ∈ = { }4 4 3 3 4; 1k k= + = + ∈ = { }5 5 3 3 5; 2k k= + = + ∈ = { } { }1 1 3 3 1; 3 2; 2k k k k− = − + = − ∈ = + ∈ = 45 { } { }2 2 3 3 2; 3 1; 1k k k k− = − + = − ∈ = + ∈ = { } { }3 3 3 3 3; 3 ; 0k k k k− = − + = − ∈ = ∈ = Assim, temos três classes distintas, 0 , 1 e 2 e todo elemento de está em exatamente uma dessas classes. Os exemplos vistos são casos particulares do seguinte caso geral: A relação de congruência módulo n determina exatamente n classes de equivalência distintas. Para mostrar o resultado acima vamos usar um lema que faci- lita a verificação de igualdade de classes módulo n . Lema 2.3.1. Sejam ,a b∈ e n∈ , 2n ≥ . São equivalentes: (a) a b= . (b) (mod )a b n≡ . Demonstração. (a) ⇒ (b). Pela propriedade reflexiva, ( )moda a n≡ (mod n) e daí a a b∈ = . Segue que a b∈ , e pela definição de b temos (mod )a b n≡ . (b) ⇒ (a). Devemos provar a igualdade entre os conjuntos a e b . Vamos mostrar que a b⊆ . A outra inclusão é análoga. Seja x a∈ . Então ( )modx a n≡ (mod n). Por hipótese, (mod )a b n≡ . Pela propriedade transitiva, vem que (mod )x b n≡ e portanto x b∈ . Observação 2.3.1. Como caso particular do lema acima temos: | ( ) (mod )a b n a b a b n a b= ⇒ − ⇒ ≡ ⇒ = . Exemplo 2.3.1. De acordo com o Lema 2.3.1, temos: Para • 2n = , 0 2 4 ...= = = 1 3 5 ...= = = 46 Para • 7n = , ___ 0 7 14 ...= = = _ _ ___ 1 8 15 ...= = = _ _ ___ 2 9 16 ...= = = _ ___ ___ 3 10 17 ...= = = _ ___ ___ 4 11 18 ...= = = _ ___ ___ 5 12 19 ...= = = _ ___ ___ 6 13 20 ...= = = O conjunto de todas as classes de equivalência módulo n é denotado por n , isto é, { };n a a= ∈ . Na próxima proposição veremos que a relação de congruên- cia módulo n determina exatamente n classes de equivalência, e mais ainda, podemos escolher os representantes dessas classes como 0,1, , 1n − . Proposição 2.3.1. Para cada , 2n n∈ ≥ temos que { }0,1,..., 1n n= − é um conjunto com exatamente n elementos. Demonstração. Pela definição de n é claro que { }0,1,..., 1 nn − ⊆ . Vamos ver a inclusão contrária. Para isso, tome na ∈ . Como a∈ e n∈ , 2n ≥ , podemos dividir a por n obtendo quociente q∈ e resto r∈ . Assim, a nq r= + , 0 r n≤ < (mod )a r nq a r n− = ⇒ ≡ . Pelo Lema 2.3.1 vem que a r= . Mas como { }0,1,..., 1r n∈ − te- mos a r= { }0, 1,..., 1n∈ − . Para provar que n tem exatamente n elementos, devemos mostrar que os elementos de são distintos dois a dois. Suponha que isso não é verdade, isto é, su- ponha que existem { }, 0, 1,..., 1x y n∈ − com x y≠ e x y= . Sem perda de generalidade vamos assumir que x y< . Como x y= , o Lema 2.3.1 assegura que (mod )x y n≡ e daí | ( )n y x− . Mas 0 y x n< − < e | ( )n y x− é impossível. Portanto, nossa suposição 47 não pode ser feita e os elementos de são dois a dois distintos. Exemplo 2.3.2. . Como 0 2 4 ...= = = 1 3 5 ...= = = Também podemos escrever . Exemplo 2.3.3. , que também pode ser representado por , pois 7 0= , 15 1= , 16 2= , 10 3= , 25 4= , 5 5= e 13 6= . Chamamos a atenção para o fato de 20∈ ser diferente de 70∈ . De fato, 20∈ indica o conjunto dos múltiplos de 2, en- quanto 70∈ indica o conjunto dos múltiplos de 7. Em geral, a é distinto em cada n . Observação 2.3.2. Trabalhamos com n∈ , 2n ≥ , para definir os conjuntos {0,1,2,..., 1}n n= − . Os casos 0n = e 1n = são pouco usados. No entanto, trabalhando com congruência módulo 0n = e 1n = , podemos definir 0 e 1 e verificar que: 1 {0}=• , com 0 0 1= + ⋅ = . 0 {..., 2, 1,0,1, 2,...}= − −• , com 0 { }x x x= + = . Isto é, cada classe 0x∈ é o conjunto unitário { }x . Nosso objetivo é mostrar que n é um anel. Por isso precisa- mos definir operações de adição e multiplicação em n . Lembre que os elementos de n são classes de equivalência, isto é, são conjuntos que podem ser representados de mais de uma maneira. Por isso devemos tomar cuidado ao definir as ope- rações, de forma que o resultado não dependa da escolha dos re- presentantes. Sejam __ __ , na b∈ . Defina a adição e a multiplicação em n , res- pectivamente, por: 48 __ __ ______ a b a b+ = + __ __ _____ a b ab= . Assim, : n n n+ × → e : n n n⋅ × → __ __ ______ ( , )a b a b+ __ __ _____ ( , )a b ab . Vamos fazer um teste para verificar se há chance dessas opera- ções estarem bem definidas, ou seja, não dependerem da escolha dos representantes das classes. Em 7 temos as igualdades _ ___ 1 15= e _ ___ 3 10= . Queremos que __ __ ___ ___ 1 3 15 10+ = + e __ __ ___ ___ 1 3 15 10⋅ = ⋅ . Mas, __ __ __ 1 3 4+ = e ___ ___ ___ 15 10 25+ = . No entanto, 25 4 (mod 7)≡ e então, pelo Lema 2.3.1, temos __ ___ 4 25= . Segue que: __ __ ___ 1 3 4 25 15 10+ = = = + . Da mesma forma, __ __ __ 1 3 3⋅ = e ___ ___ _____ 15 10 150⋅ = . Como 150 3 (mod 7)≡ vem que _____ __ 150 3= , e portanto: __ __ ___ ___ 1 3 3 150 15 10⋅ = = = ⋅ . Note que a verificação acima informa apenas que há chances das operações estarem bem definidas. Para termos certeza dis- so, necessitamos de uma prova geral do seguinte resultado, para cada , 2n n∈ ≥ , , , , na b x y∈ , __ __ a b= e __ __ x y= __ __ __ __ a b x y⇒ + = + e __ __ __ __ a b x y= . Para fazermos essa prova usaremos um lema sobre proprieda- des aritméticas das congruências. Lema 2.3.2. Sejam , , ,a b x y∈ e , 2n n∈ ≥ . Então: (mod )a x n≡ e (mod )b y n≡ (mod )a b x y n⇒+ ≡ + e (mod )ab xy n≡ . Demonstração. Como (mod )a x n≡ então | ( )n a x− , isto é, existe u∈ tal que nu a x= − . Analogamente, (mod )b y n≡ assegura que existe v∈ tal que nv b y= − . Agora, 49 ( )n u v nu nv a x b y+ = + = − + − ( ) ( )a b x y= + − + | (( ) ( ))n a b x y⇒ + − + (mod )a b x y n⇒ + ≡ + ( ) ( ) ( )n ub vx nub nvx a x b b y x ab x y+ = + = − + − = − (mod )ab xy n⇒ ≡ Proposição 2.3.2. As operações de adição e multiplicação estão bem definidas em n , isto é, , , ,a b x y∈ , __ __ a x= e __ __ b y= __ __ __ __ a b x y⇒ + = + e __ __ __ __ a b x y= . Demonstração. Primeiro usamos o Lema 2.3.1. (mod )a x a x n= ⇒ ≡ (mod )b y b y n= ⇒ ≡ . Agora, usamos o Lema 2.3.2, (mod )a x n≡ e (mod )b y n≡ (mod )a b x y n⇒ + ≡ + e (mod )ab xy n≡ . Usando novamente o Lema 2.3.1, concluímos que a b x y+ = + e ab xy= . Assim, __ __ __ __ a b x y+ = + e __ __ __ __ a b x y= . Agora que conhecemos o conjunto n e temos operações bem definidas, vamos mostrar que n é um anel. Note que estamos produzindo uma infinidade de exemplos de anéis finitos. Proposição 2.3.3. ( , , )n + ⋅ é anel comutativo com unidade. Demonstração. Sejam , , na b c∈ . Axioma (i): __ __ __ __ a b b a+ = + . __ __ ______ ______ __ __ a b a b b a b a+ = + = + = + Na segunda igualdade acima usamos a b b a+ = + , e daí ______ ______ a b b a+ = + . 50 Axioma (ii): __ __ __ __ __ __ ( ) ( )a b c a b c+ + = + + . Axioma (iii): Elemento neutro. Dado __ na ∈ , temos que a∈ . Também sabemos que 0∈ e 0 0a a a+ = + = . Então __ ______ __ __ 0 0a a a= + = + e __ ______ __ __ 0 0a a a= + = + , isto é, __ 0 é o elemento neutro de n . Axioma (iv): Elemento simétrico. Dado __ na ∈ , temos que a∈ . Também a− ∈ e 0a a a a− = − + = . Então __ ___________ ______ __ 0 ( ) ( )a a a a= − + = − + e __ _______ __ ______ 0 ( )a a a a= − = + − , isto é, ______ ( )a− é o simétrico de __ a . Axioma (v): __ __ __ __ __ __ ( ) ( )a b c a b c= . __ __ __ __ ___ _______ _______ __ __ __ ( ) ( ) ( ) ( ) ( )a b c a bc a bc ab c a b c= = = = . Axioma (vi): ( )a b c ab ac+ = + e ( )a b c a c bc+ = + . ( ) ( ) ( )a b c a b c a b c ab ac ab ac ab ac+ = + = + = + = + = + ab ac+ . A outra igualdade é análoga. Axioma (vii): __ __ __ __ a b b a= . __ __ ___ ___ __ __ a b ab ba b a= = = . Axioma (viii): Unidade. Dado __ na ∈ , temos que a∈ . Como 1∈ e 1 1a a a⋅ = ⋅ = te- mos __ ____ __ __ 1 1a a a= ⋅ = ⋅ e __ ____ __ __ 1 1a a a= ⋅ = ⋅ . Portanto, __ 1 é a unidade de n . Para treinar operações em n , vamos elaborar a tabela das operações para 2,3,4 e 5n = . 51 Exemplo 2.3.4. __ __ 2 {0, 1}= . Como __ 0 é elemento neutro e __ 1 é a unidade, sabemos que __ __ __ 0 0 0+ = , __ __ __ 0 1 1+ = , __ __ __ 1 0 0⋅ = e __ __ __ 1 1 1⋅ = . Lembrando que n é comutativo podemos escrever + 0 1 ⋅ 0 1 0 0 1 0 0 1 1 1 0 1 Para completar, calculamos __ __ _____ __ __ 1 1 1 1 2 0+ = + = =• (pois 2 0 (mod 2)≡ ) __ __ __ 0 0 0⋅ =• + 0 1 ⋅ 0 1 0 0 1 0 0 0 1 1 0 1 0 1 Como curiosidade, denote __ 0 e= e __ 1 a= . Agora note que este exemplo coincide com o anel finito visto no Exemplo 1.2.7. Exemplo 2.3.5. __ __ __ 3 {0, 1, 2}= . Desde que __ 0 é elemento neutro e __ 1 é unidade, sabemos somar __ 0 a qualquer elemento e multiplicar __ 1 por qualquer elemento. Restam as seguintes contas: __ __ __ 1 1 2+ = __ __ __ __ 1 2 3 0+ = = __ __ __ __ 2 2 4 1+ = = __ __ __ __ 2 2 4 1⋅ = = Lembre que multiplicar o elemento neutro __ 0 , por outro elemen- to qualquer do anel, sempre resulta __ 0 (Proposição 1.3.1(3)). Isso completa as contas. 52 + 0 1 2 ⋅ 0 1 2 0 0 1 2 0 0 0 0 1 1 2 0 1 0 1 2 2 2 0 1 2 0 2 1 Exemplo 2.3.6. __ __ __ __ 4 {0, 1, 2, 3}= . Seguindo de forma análoga aos exemplos acima, temos: + 0 1 2 3 ⋅ 0 1 2 3 0 0 1 2 3 0 0 0 0 0 1 1 2 3 0 1 0 1 2 3 2 2 3 0 1 2 0 2 0 2 3 3 0 1 2 3 0 3 2 1 Exemplo 2.3.7. __ __ __ __ __ 5 {0, 1, 2, 3, 4}= . Seguindo de forma análoga aos exemplos acima, temos: + 0 1 2 3 4 ⋅ 0 1 2 3 4 0 0 1 2 3 4 0 0 0 0 0 0 1 1 2 3 4 0 1 0 1 2 3 4 2 2 3 4 0 1 2 0 2 4 1 3 3 3 4 0 1 2 3 0 3 1 4 2 4 4 0 1 2 3 4 0 4 3 2 1 Analisando as tabelas de multiplicação em 2 , 3 e 5 , vemos que esses anéis não têm divisores de zero, pois o produto de dois elementos só é __ 0 quando um deles for __ 0 . Como n é anel unitá- rio e comutativo, concluímos que 2 , 3 e 5 são domínios. 53 Olhando para a tabela de multiplicação em 4 , vemos que __ __ __ 2 2 0⋅ = e portanto 4 não é domínio. Isso fornece uma pista para saber quando n é domínio. Que propriedade os números 2, 3 e 5 têm em comum e que não é sa- tisfeita por 4? A primeira resposta que vem à cabeça é que 4 não é número primo e 2, 3 e 5 são números primos. De fato, n ser número primo é a condição necessária e suficiente para n ser domínio. Antes de provar esse resultado, observe que se n não é primo, então existem ,x y∈ tais que n xy= com 1 ,x y n< < , ou seja, n tem divisores próprios. Proposição 2.3.4. As condições abaixo são equivalentes: (a) n é domínio; (b) n é número primo; (c) n é corpo. Demonstração. (a) ⇒ (b) Seja x∈ um divisor de n . Devemos provar que 1x = ou x n= . Como x divide n , existe y∈ tal que n xy= . Desde que n é domínio, __ __ ______ __ __ __ __ __ __ 0 0 ou 0n x y x y x y= = ⋅ = ⋅ ⇒ = = . 1º Caso: __ __ 0x = __ __ 0 0 (mod ) |x x n n x= ⇒ ≡ ⇒ . Como |n x , |x n e ,x n∈ , temos x n= . 2º Caso: __ __ 0y = __ __ 0 0 (mod ) |y y n n y= ⇒ ≡ ⇒ nt y⇒ = , para algum t∈ . Substituindo o valor de y em n xy= vem que n xnt= . Como é domínio e 0n ≠ , cancelamos n obtendo 1xt = . Portanto, 1x = . (b) ⇒ (c) Já sabemos que n é anel unitário e comutativo. Para ver que é corpo devemos mostrar que todo elemento __ nx∈ , __ __ 0x ≠ , tem inverso em n . Desde que __ __ 0x ≠ podemos admitir 54 {1,2,..., 1}x n∈ − e como n é primo temos ( , ) 1mdc n x = . Pela Identidade de Bezout, existem ,r s∈ tais que 1nr xs+ = . To- mando classes módulo n vem que __ _________ ___ ___ __ __ __ __ 1 nr sx nr sx n r x s= + = + = + __ __ __ __ __ __ __ __ __ 0 0r x s x s x s= + = + = . Portanto, __ s é o inverso de __ x e n é corpo. (c) ⇒ (a) Já vimos na Proposição 1.2.1 que todo corpo é domínio. Observe que a proposição anterior assegura que, para os anéis n , ser corpo é o mesmo que ser domínio. Além disso, para cada número primo p obtemos um corpo finito p , com p elementos. Lembrando que o conjunto dos números primos é infinito, te- mos construída uma família infinita de corpos, a saber, p para cada número primo p . Combinando os anéis n com os anéis de matrizes podemos produzir outros exemplos de anel. De fato, para cada ,m n∈ , , 2m n ≥ , sabemos que ( )m nM é um anel, pois ( , , )n + ⋅ é anel. Mesmo que os elementos de ( )m nM não sejam números, eles sa- tisfazem propriedades aritméticas, como as descritas na Proposição 1.3.1. Portanto, é perfeitamente possível fazer contas em ( )m nM . Exemplo 2.3.8. 1 0 0 0 0 1 1 0 , , , , 0 0 1 1 0 1 0 1 0 1 1 0 1 1 0 1 , , , , 1 0 1 0 0 0 1 1 1 0 1 1 1 1 1 1 , , , 1 1 0 1 1 0 1 1 . 55 Sabemos que 2 2( )M é anel com elementos neutro __ __ __ __ 0 00 0 e unidade __ __ __ __ 1 0 0 1 . Como vimos nas Observações 2.2.1 e 2.2.2, 2 2( )M não é co- mutativo e tem divisores de zero. É fácil fazer contas em 2 2( )M , veja exemplo abaixo: __ __ __ __ __ __ __ __ __ __ __ __ 0 1 1 1 1 0 1 0 1 1 0 1 + = , e __ __ __ __ __ __ __ __ __ __ __ __ 0 1 1 1 1 1 1 0 1 1 1 1 = . Veremos agora um outro procedimento para obter anéis, a par- tir de anéis conhecidos. 2.4 Anel produto direto Sejam ( , , )A ∗ e ( , , )B ⊕ anéis quaisquer. Em A B× defina as operações de adição e multiplicação por ( , ) ( , ) ( , )a b c d a c b d+ = ∗ ⊕ e ( , ) ( , ) ( , )a b c d a c b d⋅ = . Note que a adição + é obtida fazendo a adição ∗ entre os ele- mentos de A que estão na primeira coordenada, e fazendo a adição ⊕ entre os elementos da segunda coordenada que pertencem a B . Observação similar vale para a multiplicação ⋅ definida em A B× . As operações acima são as mais simples que se pode definir em A B× , pois são obtidas operando as coordenadas respectivas. Proposição 2.4.1. Com a notação acima, ( , , )A B× + ⋅ é anel. 56 Demonstração. Verificaremos os axiomas (i), (iii), (iv) e (v). Deixamos os axiomas (ii) e (vi) como exercício. Sejam ( , ), ( , ), ( , )a b c d e f A B∈ × . Axioma (i): ( , ) ( , ) ( , ) ( , )a b c d c d a b+ = + . Basta usar a comutividade de ∗ em A e de ⊕ em B . ( , ) ( , ) ( , )a b c d a c b d+ = ∗ ⊕ ( , )c a d b= ∗ ⊕ ( , ) ( , )c d a b= + . Axioma (iii): Elemento neutro. Sejam 0A e 0B elementos neutros de A e B respectivamente. Então (0 ,0 )A B A B∈ × e ( , ) (0 ,0 ) ( 0 , 0 ) ( , )A B A Ba b a b a b+ = ∗ ⊕ = , (0 ,0 ) ( , ) (0 ,0 ) ( , )A B A Ba b a b a b+ = ∗ ⊕ = . Portanto, (0 ,0 )A B é o elemento neutro de A B× . Axioma (iv): Elemento simétrico. Dado ( , )a b A B∈ × , temos que a A∈ e b B∈ . Como A e B são anéis, existem a A− ∈ e b B− ∈ tais que ( ) ( ) 0Aa a a a∗ − = − ∗ = e ( ) ( ) 0Bb b b b⊕ − = − ⊕ = . Então ( , )a b A B− − ∈ × e ( , ) ( , ) ( ( ), ( )) (0 ,0 )A Ba b a b a a b b+ − − = ∗ − ⊕ − = , ( , ) ( , ) (( ) , ( ) ) (0 ,0 )A Ba b a b a a b b− − + = − ∗ − ⊕ = . Portanto, ( , )a b− − é o elemento simétrico de ( , )a b A B∈ × . Axioma (v): . Basta usar a associatividade de em A e de em B . 57 Definição 2.4.1. O anel A B× obtido na proposição acima é cha- mado de anel produto direto (ou produto cartesiano) dos anéis A e B . Exemplo 2.4.1. ( , , )× + ⋅ é anel com operações ( , ) ( , ) ( , )a b c d a c b d+ = + + ( , )( , ) ( , )a b c d ac bd= . Aqui as operações nas coordenadas são as operações de adição e multiplicação usuais. Exemplo 2.4.2. Sabemos que 3 e 2 ( )M são anéis. Então o anel produto direto é __ __ 11 12 3 2 3 21 22 ( ) , ; e ij x x M a a x x x × = ∈ ∈ . Note que 3 2 ( )M× não é anel comutativo, pois __ __ __1 1 1 0 2 0 2, 2, 1, 0 0 1 0 0 0 ⋅ = e __ __ __1 0 1 1 1 1 2, 2, 1, 1 0 0 0 1 1 ⋅ = . Exemplo 2.4.3. Apesar de 2 e 3 serem corpos, o anel produto direto , não é corpo. Na verdade sequer é domínio. De fato, e são elementos não nulos de 2 3× , porém . A próxima proposição mostra que o produto direto mantém a comutatividade e a existência de unidade dos anéis A e B . Proposição 2.4.2. Sejam ( , , )A ∗ e ( , , )B ⊕ anéis. (1) Se A e B têm unidade, então A B× tem unidade. (2) Se A e B são comutativos, então A B× é comutativo. 58 Demonstração. (1) Sejam 1A e 1B os unidades de A e B respectivamente. Então (1 ,1 )A B A B∈ × , e para todo ( , )a b A B∈ × temos: (1 ,1 ) ( , ) (1 ,1 ) ( , )A B A Ba b a b a b⋅ = = ( 1 , 1 ) ( , ) (1 ,1 )A B A Ba b a b= = ⋅ . Portanto, (1 ,1 )A B é a unidade de A B× . (2) Sejam ( , ), ( , )a b c d A B∈ × . Usando a comutatividade de em A e de em B temos ( , ) ( , ) ( , ) ( , ) ( , ) ( , )a b c d a c b d c a d b c d a b⋅ = = = ⋅ . Observação 2.4.1. Valem as recíprocas de (1) e (2) na proposição acima. No entanto, não nos preocupamos em demonstrar essas recíprocas, pois nosso interesse é conhecer a estrutura algébrica do anel A B× a partir das estruturas de A e B . Exemplo 2.4.4. O anel 4× é anel comutativo com unidade, pois e 4 o são. No próximo capítulo estudaremos novos anéis produzidos a partir de anéis conhecidos. Mais especialmente, trataremos com subconjuntos de um anel ( , ,.)A + que com as operações herdadas de A têm estrutura de anel. Os novos anéis assim obtidos são chamados de subanéis dos anéis iniciais. Veremos que esse pro- cedimento fornece anéis sem exigir muitas contas. 59 Lista de exercícios Verifique os axiomas de anel 1) (ii), (v) e (vi) para o anel ( , ,.)XA + , que foi deixado como exercício na demonstração da Proposição 2.2.1. Verifique os axiomas de anel 2) (ii) e (vi) para o anel ( , ,.)A B× + , que foi deixado como exercício na demonstração da Propo- sição 2.4.1. Construa as tabelas das operações do anel 3) n , para n = 6, 7 e 8. Calcule os elementos inversíveis dos anéis 4) 4 , 5 e 6 . Mostre que 5) nx∈ é inversível em n se, e somente se, ( , ) 1mdc x n = . Sejam 6) , , ,a b m n∈ , 1m ≥ e 2n ≥ . Mostre que: . Sejam 7) A = e ( )2 3B M= (( )2 3B M= ). Descreva um elemento genérico do anel x A B . Qual é o elemento neutro de A B× ? Calcule 3 elementos inversíveis em cada um dos anéis abaixo.8) a) b) c) d) e) Sabemos que 9) { }: ; é funçãof f= → e que é anel comutativo com unidade. Troque o produto de funções pela composição de funções e verifique que valem os axiomas de anel em , com exceção da distributivi- dade. Conclua que não é anel. Dica: Tome , e calcule e . 60 Resumo Neste capítulo vimos que: Com as operações usuais de soma e multiplicação de fun-• ções, o conjunto XA das funções do conjunto X no anel A , é um anel. Mais ainda, XA será comutativo quando A for comutativo, e XA terá unidade quando A tiver unidade. Em geral XA não é domínio, mesmo que A seja corpo. Com as operações usuais de soma e multiplicação de ma-• trizes, o conjunto ( )nM A das matrizes n n× com entradas no anel A , é um anel. Se A tem unidade então ( )nM A tem unidade. O anel ( )nM A , 2n ≥ , não é comutativo em geral, e possui divisores de zero. Mesmo que A seja corpo, a melhor estrutura algébrica de ( )nM A , 2n ≥ , é anel com unidade. As propriedades de congruência em • , estudadas na seção 2.3, levam à construção do anel n , que é comutativo e tem unidade. Provamos que n é corpo se, e somente se, n é número primo, e que isso é também equivalente a n ser domínio. A partir de anéis conhecidos • A e B , podemos construir o anel produto direto A B× . Quando A e B são comutativos então A B× é comutativo. Quando A e B têm unidade en- tão A B× tem unidade. Mesmo quando A e B são corpos o anel A B× não é domínio. Combinando os anéis de funções, os anéis de matrizes, os • anéis n e os anéis produto direto, podemos produzir vá- rias famílias infinitas de anéis. Capítulo 3 Subanéis, Elementos Notáveis e Divisibilidade Capítulo 3 Subanéis, Elementos Notáveis e Divisibilidade Este capítulo está dividido em três seções. Na primeira estudaremos subanéis com o objetivo de produzir no- vos exemplos de anéis. Na segunda seção destacaremos elementos especiais dentro de umanel. Na última seção trataremos da divisibilidade em anéis. Veremos que o quociente de uma divisão é único em domínios e desta- caremos os elementos primos e irredutíveis. 3.1 Subanéis, subdomínios e subcorpos Estudaremos agora como produzir novos anéis a partir de anéis conhecidos. Mais especificamente, trataremos de anéis contidos em anéis dados. Os novos anéis obtidos desta forma são chama- dos subanéis dos anéis iniciais. Veremos que esse procedimento leva a novos exemplos de anéis, sem exigir muitas contas. Definição 3.1.1. Seja ( , , )A + ⋅ um anel. Um subconjunto não vazio B A⊆ é subanel de A quando: (1) As operações de A são operações em B , isto é, ,a b B∈ a b B⇒ + ∈ e ab B∈ . (2) ( , , )B + ⋅ é anel. A condição (1) da definição acima expressa que a adição e a multiplicação do anel A são operações fechadas em B . Todo anel tem pelo menos dois subanéis, que são { }0 e A . Es- ses subanéis são chamados de subanéis triviais. Nosso interesse é utilizar subanéis para produzir novos exemplos de anéis. Por isso procuramos subanéis não triviais. 64 De acordo com a Definição 3.1.1, para verificar que B Aφ ≠ ⊆ é subanel de A , devemos mostrar que as operações de A são fecha- das em B e que valem os seis axiomas de anel em B . No entanto, alguns dos axiomas de anel são propriedades hereditárias, isto é, valem automaticamente em todo subconjunto. Por exemplo, a comutatividade da adição vale em A , portanto vale em todo subconjunto de A . De outra forma, , ,a b b a a b A+ = + ∀ ∈ , ,x y y x x y B A⇒ + = + ∀ ∈ ⊆ . Logo, a comutatividade da adição é hereditária. Abaixo descre- vemos os axiomas de anel que são hereditários. (i) comutatividade da adição; (ii) associatividade da adição; (v) associatividade da multiplicação; (vi) distributividade. O fato de alguns axiomas de anel serem hereditários reduz o trabalho de verificar se um subconjunto é subanel. A próxima proposição reduz ainda mais este serviço. Note que no enunciado abaixo, b− é o simétrico de b em A . Proposição 3.1.1. Sejam ( , , )A + ⋅ um anel e B Aφ ≠ ⊆ . São equiva- lentes: (a) B é subanel de A ; (b) , ea b B a b B ab B∈ ⇒ − ∈ ∈ . Demonstração. (a) ⇒ (b). Como B é subanel, então B é anel. Assim dados ,a b B∈ temos , ,a b b B− ∈ , daí a b B− ∈ e ab B∈ . (b) ⇒ (a). Já temos por hipótese que a multiplicação é fechada em B . Além disso, os axiomas de anel (i), (ii), (v) e (vi) são heredi- tários. Resta provar que a adição é fechada em B e que valem os axiomas de anel (iii) e (iv). 65 Axioma (iii): Elemento neutro. Desde que B ≠ φ , podemos tomar a B∈ . Então, por hipótese, 0A a a B= − ∈ . Como 0A é elemento neutro para adição em A , também será em B . Logo, B tem elemento neutro para adição e 0 0B A= . Axioma (iv): Elemento simétrico. Seja b B∈ . Pelo que fizemos acima, temos ,0Ab B∈ . Daí, aplican- do a hipótese obtemos 0A b B− ∈ , isto é, b B− ∈ . Desde que b− é o simétrico de b em A , então b− é o simétrico de b em B . Adição Fechada em B : ,a b B a b B∈ ⇒ + ∈ . Sejam ,a b B∈ . Já sabemos que b B− ∈ . Então , ( )a b B− ∈ e por hipótese temos ( )a b B− − ∈ . Isso garante que a b B+ ∈ . Observação 3.1.1. Na demonstração acima vimos que se B é su- banel de A então 0 0B A= , e o simétrico de b B∈ é o mesmo em A e B . Por isso podemos denotar o elemento neutro de A e B pelo mesmo símbolo 0 , e o simétrico de b em A e B pelo mesmo símbolo b− . Exemplo 3.1.1. Com as operações usuais, ( , , )+ ⋅ é subanel de ( , , )+ ⋅ e ( , , )+ ⋅ é subanel de ( , , )+ ⋅ . Exemplo 3.1.2. O conjunto dos números ímpares { }2 1;B k k= + ∈ não é subanel de . Basta ver que 1, 3 B∈ porém 3 1 2 B− = ∉ . Exemplo 3.1.3. O conjunto dos números pares { }2 ;B k k= ∈ é subanel de . De fato, o produto é a diferença de números pares é sempre um número par. Exemplo 3.1.4. O conjunto é subanel de 4 . Basta observar que 40 0 2.0 2.2 0⋅ = = = ∈ 40 0 2.0 2.2 0⋅ = = = ∈40 0 2.0 2.2 0⋅ = = = ∈ e 0 0 0− = , 0 2 2− = , 2 0 2− = , 42 2 0− = ∈ 40 0 2.0 2.2 0⋅ = = = ∈40 0 2.0 2.2 0⋅ = = = ∈ . 66 Exemplo 3.1.5. O conjunto não é subanel de 4 , pois 3 3 1 B⋅ = ∉ . Exemplo 3.1.6. Para cada número primo positivo p , o conjunto é subanel de ( , , )+ ⋅ com as operações usuais. Para verificar isso, tomemos u a b p= + e v c d q= + em p . ( ) ( )a c b d p p = − + − ∈ , pois ,a c b d− − ∈ , e ( ) ( )ac pbd ad bc p p = + + + ∈ , pois O anel p é chamado de anel adjunção p . De maneira totalmente análoga ao exemplo anterior, podemos construir o anel adjunção p , , que é subanel de ( , , )+ ⋅ . Desde que o conjunto dos números primos positivos é infini- to, obtivemos duas famílias infinitas de anéis, a saber, p e p . Esses anéis serão bastante utilizados durante o curso. Exemplo 3.1.7. • é subanel de p . p • é subanel de p . p • é subanel de . Observação 3.1.2. Se p é número primo positivo, então p não é subanel de , pois p ⊄ . Para ver isso, note que 0 1p p p = + ⋅ ∈ . Agora vamos mostrar que p ∉ . Su- 67 ponha o contrário, isto é, suponha que p ∈ . Então podemos escrever ap b = com ,a b∈ e ( , ) 1mdc a b = . 2 2 2 2 a ap p pb a b b = ⇒ = ⇒ = 2| |p a p a⇒ ⇒ . Escreva pt a= , t ∈ , e substitua na igualdade 2 2pb a= ; 2 2 2 2 2 2 2 2| |pb a pb p t b pt p b p b= ⇒ = ⇒ = ⇒ ⇒ . Obtivemos assim que |p a e |p b . Isso contradiz a escolha de a e b com ( , ) 1mdc a b = . Portanto p ∉ . A proposição abaixo é útil para fazer contas nos anéis p e p . Proposição 3.1.2. Sejam a b p+ , c d p p + ∈ . Então a b p c d p a c+ = + ⇔ = e b d= . Demonstração. (⇒) Suponha que b d≠ . Então 0d b− ≠ . a b p c d p+ = + a cp b d −⇒ = ∈ − . Vimos na Observação anterior que p ∉ . Portanto não é ver- dade que b d≠ , isto é, devemos ter b d= . Assim a igualdade a b p c d p+ = + leva a a c= . (⇐) É óbvia. Observação 3.1.3. Segue da Proposição 3.1.2 que se a b p+ , c d p p + ∈ , então: a b p c d p a c+ = + ⇔ = e b d= . Seja B um subanel do anel A. É claro que se A é anel comutativo então B é anel comutativo, pois a comutatividade da multiplicação é uma propriedade hereditária. Outra propriedade que o subcon- junto B herda do anel A é a inexistência de divisores de zero. Com efeito, se B tivesse divisores de zero então A teria divisores de zero. Vamos deixar isso registrado na próxima proposição. 68 Proposição 3.1.3. Seja B um subanel do anel A . (1) Se A é comutativo então B é comutativo. (2) Se A é anel sem divisores de zero então B é anel sem divisores de zero. Demonstração. Imediata, pois essas propriedades são hereditárias. Exemplo 3.1.8. Com as operações usuais temos que: • é um subanel comutativo e sem divisores de zero do anel . • é subanel comutativo e sem divisores de zero do anel . • é subanel comutativo e sem divisores de zero do anel p . p • é subanel comutativo e sem divisores de zero do anel p . p • é subanel comutativo e sem divisores de zero do anel . Em cada item do exemplo acima temos um resultado a mais. A saber, o anel e o subanel têm a mesma unidade. Por isso, dize- mos que o subanel é subanel unitário do anel, de acordo com a definição abaixo. Definição 3.1.2. O subanel B é subanel unitário do anel com unida- de A quando B tem unidade e 1 1B A= . Vamos ver agora dois exemplos de subanéis que não são unitá- rios. O primeiro deles não é unitário porque não tem unidade, e o segundo não é unitário, pois tem unidade diferente da unidade do anel. Exemplo 3.1.9. Seja , 2n n∈ ≥ . O conjunto
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