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Tensas relações entre a defesa do Projeto ético-político e o assalariato

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Instituto de Ciências Sociais Aplicadas – ICSA 
Departamento de Ciências Sociais - DCSO 
Departamento de Serviço Social – DESSO 
Curso: Serviço Social 
Disciplina: Serviço Social na Contemporaneidade 
 
 Docente: Dr. Claudio Horst 
Discente: Izabela Fernandes Resende 
 
Atividade avaliativa II 
1) Ao considerar as tensas relações entre Projeto Ético Político Profissional e Estatuto 
Assalariado, Iamamoto (2011) contribui para uma leitura do trabalho profissional 
que não resulte “numa incriminação moral da categoria por não aderir ou não ser 
capaz de implementar o projeto idealizado” (IAMAMOTO, 2015, p. 431). Nesse 
sentido, a autora nos chama atenção em relação a análises que deslocam o projeto 
profissional das bases sociais de sua realização e que passam a tratá-lo apenas ao 
nível da intencionalidade das profissionais. A partir dos elementos apresentados pela 
autora elabore: 
a) uma reflexão sobre os fundamentos do trabalho profissional na 
contemporaneidade; 
 Dialogando com Iamamoto (2011), embora o Serviço Social tenha se confirmado 
como profissão desde a década de 1980, ele enfrenta desafios que se circunscrevem a partir 
da contradição que lhe está posta a partir do momento que ele se insere nas relações 
mercantis provenientes do modo de produção capitalista. Tal contradição está 
fundamentada na dubidade que condensa a prática profissional e a relação de venda de 
força de trabalho desse profissional, ou seja, entre o tipo de intervenção salvaguarda por 
prerrogativas subscritas em seu projeto Ético-Político e as condições de assalariato sob as 
quais esses profissionais estão condicionados. A problemática deste cenário, está na 
circunstância de relativa autonomia do exercício profissional. 
 Em outras palavras, embora a atuação profissional deva se esforçar no sentido de 
oferecer respostas às demandas apresentadas pelo usuário — fundamentadas em princípios 
éticos, políticos e sua realização deva seguir respaldo teórico-metodológico no sentido de 
alimentar uma leitura crítica da totalidade que considere a investigação da essência dos 
fenômenos para então propor uma intervenção de qualidade, que muitas vezes precisa 
superar os limites institucionais e da política constituintes do espaço socio ocupacional em 
que atua — sua atuação está contingenciada por fatores que lhe são externos — advindos 
do empregador e da sua condição de mercantilização da sua força de trabalho. A relativa 
 
 
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autonomia deste profissional é, portanto, contingenciada por fatores que lhes são exteriores 
e estão além do seu domínio. 
Aquela autonomia é condicionada pelas lutas hegemônicas presentes na 
sociedade que alargam ou retraem as bases sociais que sustentam a direção social 
projetada pelo assistente social ao seu exercício, permeada por interesses de 
classes e grupos sociais (...), conhecimentos e princípios éticos alimentam 
projeções profissionais historicamente determinadas, materializando a dimensão 
teleológica do trabalho do assistente social: a busca por parte da categoria, de 
imprimir nortes ao seu trabalho, afirmando-se como sujeito profissional. 
Por outro lado, o exercício da profissão realiza-se pela mediação do trabalho 
assalariado, que tem no Estado e nos organismos privados —, empresariais ou 
não —, os pilares de maior sustentação dos espaços sociocupacionais deste 
profissional, perfilando o seu mercado de trabalho componente essencial da 
profissionalização do Serviço Social. A mercantilização da força de trabalho do 
assistente social, pressuposto do estatuto assalariado, subordina esse trabalho de 
qualidade particular aos ditames do trabalho abstrato e o impregna dos dilemas 
da alienação, impondo condicionantes socialmente objetivos à autonomia do 
assistente social na condução do trabalho e integral á implementação do projeto 
profissional. (IAMAMOTO, 2011, Pp. 415-416) 
 Disto, a atuação profissional além de circunscrita nesse dilema, de defesa de um 
projeto profissional perante a condição de assalariamento, está imbricada no desafio de 
responder a três interesses principais: o do empregador, através cumprimento das 
requisições sinalizadas por este no âmbito dos limites institucionais de atuação; o dos 
usuários, cujas respostas devem ser materializadas na forma de respostas concretas às 
demandas que eles trazem quando buscam os serviços desse profissional; e a defesa e luta 
pela efetivação das determinações constituintes do seu projeto ético-político. 
Consequentemente, o profissional então, mesmo possuindo uma idealização de seu 
trabalho, está limitado, e o desafio é manter a sua capacidade crítica e reflexiva na sua 
atuação profissional e, para além, deve considerar também que o enfrentamento para 
mudança das condições limitantes deve ser feito de maneira coletiva e não singular, uma 
vez que tais condições não são da esfera individual e sim frutos de construções sociais, 
sendo então comuns a todos os profissionais por serem intrínsecas ao trabalho no modo de 
produção capitalista. 
 Uma das estratégias de enfrentamento dessa condição de contrariedade posta pela 
realidade de atuação dos assistentes sociais está na transcendência da capacidade desse 
profissional de identificar nas equipes multidisciplinares em que atua, outros profissionais 
— com projetos éticos e políticos que se assemelham com o do Serviço Social — que 
possam servir como base de apoio e fortalecimento da luta em defesa do respeito da 
autonomia dos profissionais. Ainda no que tange à autonomia profissional, o processo 
formativo do assistente social é um dos principais responsáveis pela clareza que ele terá no 
 
 
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seu exercício profissional no sentido de conhecer o lhe compete enquanto profissional, não 
assumindo competências de outrem. 
 De maneira paralela, segundo Iamamoto (2011), aqueles profissionais que não 
compreendem as considerações supracitadas a respeito da contradição entre a condição de 
assalariamento e defesa do projeto ético-político, são aqueles incapazes de identificar a 
centralidade da categoria trabalho dentro do modo de produção capitalista e que, 
consequentemente, também fundamenta a contradição posta na realidade desse 
profissional. Segue-se a essa incapacidade de interpretação da categoria trabalho a defesa 
da leitura de uma disparidade entre teoria e prática. 
 Do contexto acima discutido, Iamamoto (2011) ainda pontua que um dos desafios 
para a profissão é a superação de leituras unilaterais a respeito da profissão. Leituras tais 
que são questionáveis justamente por desconsiderarem a duplicidade da categoria trabalho 
no embate entre defesa de um projeto ético-político versus condição de assalariamento e 
que estão sob vieses fatalistas ou messiânicos. O viés fatalista, por exemplo, pressupõe 
uma interpretação baseada na crença de que o domínio capitalista é tal que o/a profissional 
não conseguirá propor intervenções que reafirmem a defesa do projeto ético-político, 
estando limitado e sem perspectivas de avanços. 
 O segundo desafio remete à necessidade de uma mudança na área das produções 
acadêmicas, que atualmente estão em sua maioria voltadas para uma análise qualitativa da 
profissão. Há uma necessidade latente de que as produções acadêmicas do Serviço Social 
abarquem o trabalho do Assistente Social em si e se voltem para o estudo de como o 
Assistente Social auxilia/participa da produção de valor conforme Iamamoto (2011), e que 
podem ser objetivadas, por exemplo, nas produções das Teses de Conclusão de Curso 
serem resultado de investigações e problematizações nascidas das reflexões dos campos de 
estágio. É importante também uma sistematização da prática na direção da produção de 
conhecimento,através da coleta de dados e elaboração de pareceres e laudos, por exemplo. 
Em outros termos, o exercício profissional tem sido abordado em sua dimensão 
de trabalho concreto: em seu valor de uso social, como uma atitude progmática e 
de realização que persegue finalidades e orienta-se por conhecimentos e 
princípios éticos, requisitando suportes materiais e conhecimentos para sua 
efetivação. (...) 
O que não dispõe da centralidade nessa mesma literatura é a identidade do 
trabalho do assistente social enquanto trabalho abstrato, com o trabalho social 
médio: como parte alíquota do trabalho total socialmente produzido. As 
implicações do trabalho do assistente social no circuito de valor —, da produção 
e distribuição do valor e da mais valia —, não são tratadas, como se a “forma 
valor fosse mero cerimonial” na sociedade do capital fetiche. Ainda que a citada 
produção reconheça o fato do assistente social ser um trabalhador assalariado —, 
 
 
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e, enquanto tal, vivendo uma situação comum a todos os demais assalariados — 
não erige essa característica como central. (grifos do autor, IAMAMOTO, 2011, 
p. 418) 
 A autora ainda sublinha que não existe um processo de trabalho do assistente social 
e sim a inserção deste profissional nos mais diversos campos de atuação, segue-se a 
reafirmação da importância de uma formação com viés de totalidade. Em virtude disto e 
fundamentando que fatidicamente temos no Estado o nosso principal empregador e este faz 
recortes — consubstanciado nas políticas públicas — para inserir esse profissional, reitera-
se a importância dessa formação com caráter de totalidade uma vez que, ao ser chamado 
para trabalhar na esfera pública, esse profissional atuará de maneira fragmentada e, caso 
não possua uma leitura crítica e de totalidade da realidade social, limitará a realização de 
sua ação na forma de uma prática focalizada e restrita aos limites da política em que foi 
chamado a atuar. 
 Outro fator importante, que diz respeito tanto ao processo de formação profissional 
quanto a atuação em campo, é o adoecimento psicológico que acomete parte dos 
assistentes sociais e se apresenta como resultado de um processo de auto culpabilização 
advindo de fatores como a ausência de clareza e criticidade sobre os limites de sua atuação 
profissional na instituição e na política em que atuam. 
 
b) uma reflexão sobre os desafios colocados para a atuação profissional – mediada 
pelo projeto ético político – no que tange à convocação desse profissional para atuar à 
em causas no âmbito jurídico através do chamado Depoimento sem dano. 
 Os fatores condicionantes à atuação profissional que se colocam nos mais diversos 
espaçõs ocupacionais que o Assistente Social é integrado, refletem diretamente sobre 
autonomia daquele profissional, relativizando-a, e colaboram nos desafios que compõem a 
vivência institucional destes no sentido da defesa e promoção de uma atuação profissional 
mediada pelo projeto ético-político. Como forma de divulgar informações e tecer 
recomendações aos profissionais da categoria mediante novas demandas específicas 
latentes nos espaços ocupacionais, o Conselho Federal de Serviço Social produz e divulga 
o CFESS Manifesta. 
 Baseando-se na especificidade do CFESS MANIFESTA divulgado em agosto de 
2017, este aparece como uma elucidação sobre particularidade posta a profissão no âmbito 
jurídico e que ilustra bem esses desafios propostos para à categoria nos espaços de 
 
 
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trabalho. O manifesto traz ponderações acerca do chamado “Depoimento sem Dano” que 
fora instituído pela Lei 13.431/2017 e implica diretamente na ação dos Assistentes Sociais 
do socio-jurídico à medida que reivindica que esses profissionais devam compor equipes 
que, baseadas em uma metodologia que propõe entre outras coisas, o chamado Depoimento 
sem Dano, são destinadas a acompanhar crianças e adolescentes que tenham vivenciado ou 
testemunhado situações de violência e que portanto tenham tido feridos seus direitos 
assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. 
 Conforme as colocações trazidas no documento, o CFESS buscou alianças com o 
Conselho Federal de Psicologia no sentido de construir um enfrentamento dessa iniciativa 
que é composta por outras questões além da metodologia que propõe o Depoimento sem 
Dano (DSD). Esse posicionamento da entidade federativa de representação da categoria é 
uma materialização do aspecto que Iamamoto (2011) traz sobre a importância da 
construção de alianças com outras categorias que comunguem de certos valores éticos no 
sentido de fortalecer a busca pela reafirmação e consolidação da defesa de princípios éticos 
e políticos que salvaguardam a atuação dos profissionais e revigoram sua autonomia, 
mesmo que esta relativa. 
 O CFESS se posicionou contrário à metodologia por compreender que 
ao priorizar a tramitação penal e responsabilização do suposto agressor, o campo 
de instituições do sociojurídico insere a criança e/ou adolescente em um contexto 
em que ela se torna, na maioria dos casos, o principal meio de prova. 
Considerando que parte significativa das situações judicializadas se refere a 
situações de violência doméstica, a criança e/ou adolescente se torna a pessoa 
responsável por acusar, em muitos casos, pessoas com quem mantinha vínculos 
afetivos ou de convivência. Embora os argumentos de defesa da metodologia 
creditem à criança o direito de se expressar, não há previsão de uma avaliação 
das condições que esta criança e/ou adolescente possui para ser ouvida no 
processo judicial criminal, ou sua vontade de participar de tal ato. O Conjunto 
CFESS-CRESS questionou ainda o papel a ser desempenhado pelos/as 
assistentes sociais nesta metodologia. Ao serem inseridos no contexto da 
audiência como “intérpretes” do juiz, não têm poder para limitar nem a natureza 
nem número de questionamentos que será responsável por transmitir à 
criança/adolescente. Além disso, não terá como realizar escolhas dos 
instrumentos, procedimentos, abordagens a serem realizados, de acordo com a 
compreensão da demanda apresentada, posto que a “inquirição” não se confunde 
com o estudo social. (CRESS, 2017) 
 Mesmo com a articulação e o enfrentamento propostos pelo CFESS no sentido de 
alteração dessa metodologia, prosseguiu-se sua defesa por outros setores judiciais e acabou 
aprovada, evidenciando a concordância da justiça com esse modelo de inquirição (CFESS, 
2017). O documento elaborado pelo CFESS ainda elucida que o repúdio à essa Lei se dá 
 
 
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no sentido de reafirmar o compromisso contrário ao DSD já proposto em documentos do 
conjunto CFESS/CRESS desde 2008. 
Uma das principais iniciativas decorrentes de tal posicionamento, a Resolução 
CFESS 554/2009 – que dispõe sobre o não reconhecimento da inquirição das 
vítimas crianças e adolescentes no processo judicial, sob a Metodologia do 
Depoimento Sem Dano (DSD), como sendo atribuição ou competência do 
assistente social – está suspensa desde 2014, por decisão judicial, apesar de todos 
os recursos interpostos pela assessoria jurídica do CFESS em sentido contrário. 
Este cenário desfavorável e a suspensão de nossa resolução sobre o tema, 
entretanto, não nos fizeram recuar de nossa posição contrária à participação de 
assistentes sociais nesta metodologia. Na nossa avaliação, a Lei 13.431/2017 não 
obriga a participação de assistentes sociais nas equipes responsáveis pela 
inquirição especial/DSD. (CRESS, 2017) 
A recusa do Assistente Social em participar do Depoimento sem Dano deve ter sua base de 
sustentação em sua autonomia profissional assegurada pelo seu Código de Ética 
Profissional. A partir de tal sustentação, a compreensão do papel deste profissional seencerra no fato de que sua atuação 
• (...) junto à criança ou adolescente se orienta pela lógica da proteção integral e 
se diferencia, portanto, daquela que orienta o Poder Judiciário, cujo objetivo é a 
busca da verdade material, coleta de provas de seu interesse e busca efetiva da 
punição do/a infrator/a. Esse trabalho inquisitório não nos cabe; 
• O reconhecimento das diferentes competências e autonomia profissional 
também estão previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), cujo 
ordenamento institui que: cabe ao Poder Judiciário manter quadro 
interdisciplinar destinado a colaborar com a Justiça da Infância e da Juventude, 
competindo-lhes fornecer subsídios por escrito, por meio de laudos ou 
verbalmente, na audiência, bem como desenvolver trabalhos de aconselhamento, 
orientação, vigilância, sendo sempre assegurada a livre manifestação do ponto de 
vista técnico. (CFESS, 2017) 
 A partir dos apontamentos vislumbrados nesse documento, o CFESS finaliza suas 
considerações inferindo a importância de se tecer enfrentamentos respaldados no projeto 
ético-político, canalizando a necessidade de um maior debate sobre a nova legislação e a 
metodologia proposta a partir dela bem como o uso do Estado Penal como ferramenta para 
lidar com as “múltiplas necessidades de crianças e adolescentes em situação de violência” 
(CFESS, 2017) ao invés de investir em políticas sociais que possam asseverar proteção às 
crianças e adolescentes em situação de direitos violados. 
 
2) Guerra (2018) e Iamamoto (2011) apresentam importantes reflexões sobre os 
fundamentos de uma formação profissional crítica. Orientadas pelos questionamentos 
de como formar profissionais que possuam coerência ético-política, consistência 
teórico-metodológica e competência técnico operativa ambas destacam os avanços, os 
limites e bem como os desafios. A partir dos elementos gerais apresentados elabore 
 
 
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uma reflexão sobre a formação profissional em Serviço Social na UFOP apontando 
suas potencialidades, limites e desafios. 
 Tomando por base os apontamentos propostos por Iamamoto (2011) e Guerra 
(2018) a respeito dos desafios, limites e capacidades do processo formativo em Serviço 
Social e fazendo uma leitura conjuntural a respeito desse processo na Universidade Federal 
de Ouro Preto, pretendo identificar e discutir de forma breve alguns fatores, que dentre 
tantos outros, obstruem a construção desse processo com um nível elevado de excelência e 
apontar formas de resistência e organização presentes no âmbito da formação em Serviço 
Social nesta intituição. Nesse contexto, é primordial a retomada de uma leitura política e 
econômica da realidade brasileira, permeada por ataques diretos sobre as mais diversas 
esferas da vida social. 
 Um governo que se alinha diretamente com as flexibilizações demandadas pelo 
capital no sentido de retomar suas taxas de lucro não consegue manter, e nem é de seu 
interesse essa sustentação, os investimentos numa educação pública superior. Mesmo 
restringindo a análise somente da área da educação, ainda assim há um emaranhado de 
problematizações que se interligam e que por vezes serão citados e, mesmo que aqui não 
sejam aprofundados, cabem atenção e análise em momento oportuno. Diante da realidade 
brasileira e do seu papel de dependência
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 do capital internacional, os esforços 
governamentais estão focalizados no sentido de manter a acumulação do capital e o status 
quo, e isso repercute e materializa na forma de ataques às áreas sociais onde está inclusa a 
educação superior. 
 No panorama de corte nos recursos destinados ao ensino superior
2
, os cursos que 
mais sofrem com essa retirada abrupta de investimentos são aqueles cujo retorno social não 
se remete diretamente à questão monetária ou cuja formação não é de mão de obra, de 
certa forma qualificada, mas ainda assim barata, para ser inserida no mercado. Isto pois, os 
cursos voltados para a inserção no ciclo produtivo do capital muitas vezes recebem 
investimentos também do setor privado. Além disso, tem-se também a questão de que os 
 
1 Categoria cunhada por Ruy Mauro Marini em sua obra “Dialética da Dependência”, em 1973. 
 
2 O portal on-line do jornal El País, noticiou em 06/05/2019, que os cortes promovidos pelo governo Bolsonaro representavam “os 
primeiros efeitos da asfixia financeira de Bolsonaro sobre as ciências do Brasil”. Já o portal on-line G1, em 15/05/2019 trouze alguns 
números importantes a respeito do corte/congelamento dos gastos do governo federal brasileiro com ensino superior e deixou pairar no 
ar o clima de incerteza a respeito do futuro. “No fim de abril, governo anunciou o congelamento de R$ 1,7 bi dos gastos das 
universidades, de um total de R$ 49,6 bi. Ministro disse que verba pode ser desbloqueada no 2º semestre se a arrecadação de impostos 
crescer”. 
 
 
 
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cursos das áreas de sociais e humanas geralmente estão alinhados com o debate crítico e 
acabam se tornando um incômodo para o governo que preza manter o status quo. 
 A proposta da educação superior segue prerrogativas internacionais
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 que pouco ou 
nada se preocupam com a qualidade do ensino. É tudo uma questão de quantidade. Desse 
movimento infere-se a leitura de uma formação profissional perpassada por entraves desde 
o seu início até o seu fim — se é que tem um fim — e que se rebate sobre a qualidade dos 
professores que estão sendo formados e logo ocuparam a docência nas universidades. No 
caso específico do ensino superior público, são condições desgastantes de trabalho, uma 
carga horária excessiva e cobranças sobre produção e tudo isso tem rebatimentos sobre a 
saúde do profissional e logicamente na forma como esse profissional vai lecionar em sala 
de aula. 
 Tendo apresentadas essas considerações iniciais, reitero que o meu esforço se dará 
no sentido de traçar uma panorama geral sobre como essa realidade de ataque à educação 
superior brasileira afeta o formação em Serviço Social na Universidade Federal de Ouro 
Preto. Esse panorama será elaborado a partir de alguns exemplos que pude acompanhar 
e/ou vivenciar ao longo desses mais de dois anos como aluna de graduação do curso de 
Serviço Social nesta instituição. 
 Até hoje, na caminhada no curso, me deparei com um corpo docente composto por 
pessoas de muita luta e compromisso classista, em defesa daqueles que produzem a riqueza 
material e quase não se apropriam dela. No entanto, apesar dos constantes tensionamentos 
engendrados pelo corpo profissional, não se deve perder de vista os limites colocados a ele, 
que materializam os apontamentos de Iamamoto (2011) sobre as dificuldades e os limites 
da atuação, mas sempre buscando defender a sua autonomia profissional. Limites esses 
que, condicionando a realidade de atuação dos professores, limitam consecutivamente a 
realidade do processo pedagógico e a forma como os alunos compreendem tal processo. 
 Os esforços sobre o sucateamento da educação muitas vezes tem conformidades 
claras e evidentes e noutras, requer uma certa criticidade e embasamento teórico-
metodológico para uma leitura concisa e na UFOP não é diferente. De forma evidente, 
temos a questão de professores que se afastam por motivos de saúde e que por vezes não 
são substituídos — percebo aqui o quão limitantes e burocráticos são os processos para 
contratação de professores temporários, embora a burocracia também seja uma certa 
 
3
 Para confirmar a existência da relação direta entre a educação brasileira e o Banco Mundial basta consultar “Banco Mundial analisa a 
evolução e os desafios da educação brasileira”, disponível noportal do Ministério da Educação. 
 
 
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garantia de acesso igualitário aos cargos públicos num esforço de evitar o nepotismo —, 
impactando a formação dos alunos que acabam ficando sem ter cumprida a carga horária 
mínima
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 dos cursos. 
 Outro exemplo da materialidade de desmonte de um processo de educação de 
qualidade reside na condição dos alunos que também são trabalhadores, uma constante que 
também se aplica aos cursos ofertados no Instituto de Ciências Sociais Aplicadas. Alunos 
nessa condição, por vezes, não tem tempo suficiente para se dedicar a leitura prévia dos 
textos e esse fator acaba prejudicando o andamento e a condução das aulas. Os professores 
acabam fazendo aulas expositivas com pouca participação dos alunos. Esse cenário impede 
também que a maioria dos alunos viva potencialmente tudo que o processo formativo 
oferece - Ensino, Pesquisa e Extensão. 
 Os professores precisam então traçar novas estratégias que visem possibilitar a 
construção do processo de aprendizagem/formação de acordo com essa realidade do corpo 
discente, na direção de reduzir, dentro das possibilidades, a defasagem ocasionada por tal 
situação. Ao meu ver, uma das ferramentas para contornar essa situação que tem sido 
positivamente é a leitura conjunta dos textos em sala, unida a comentários e exemplos. 
 Esse exemplo converge tanto com os apontamentos de Iamamoto (2011) sobre a 
importância da capacidade de leitura de totalidade que o profissional do Serviço Social 
deve ter, no sentido de compreender a essência dos fenômenos e traçar respostas que 
superem aquelas propostas pela política em si, quanto com os trazidos por Guerra (2018) a 
respeito do movimento de construção de mediações entre a produção de conhecimento 
crítico na academia e a efetivação das respostas alternativas elaboradas pelos profissionais 
sobre as atuais condições e relações de trabalho e requisições institucionais. 
 Um aspecto positivo da instituição em questão é que, mesmo em meio a tantos 
empecilhos e problemas das mais variadas ordens, os docentes estão em processo de 
formação continuada, o que possibilita conforme Guerra (2018), manterem uma 
proximidade/conhecimento sobre a existência de novas demandas postas na realidade 
concreta deste modo de produção. Essa continuidade na formação possibilita uma leitura 
crítica, análise e elaboração de respostas que contenham pressupostos defendidos pelo 
projeto Ético-Político da profissão, no sentido de enfrentamento das condições colocadas 
pela classe que governa. Essa realidade deve ser confrontada com outro apontamento 
 
4Não me reservarei aqui ao debate sobre a questão da carga horária como ferramenta de efetivação do processo pedagógico e nem 
discutirei sobre os limites deste último. 
 
 
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trazido por Guerra (2018), a respeito da necessidade de se reduzir o distanciamento entre 
as produções teóricas e a vivência profissional nos diversos espaços socio ocupacionais em 
que esse profissional se insere, para além da academia. 
 Diante dessa relação, ora de confronto ora de compatibilidade, entre a realidade do 
curso de Serviço Social da Universidade Federal de Ouro Preto e as ponderações propostas 
tanto por Iamamoto (2011) quanto por Guerra (2018) a respeito do processo de formação 
em Serviço Social, pode-se inferir também que a missão de defender os preceitos 
estabelecidos pelo projeto Ético-político e pelas Diretrizes Curriculares de 1996 
representam um desafio diário do corpo docente, principalmente no sentido de esclarecer e 
reafirmar o fato de que o Serviço Social só pode ser explicado a partir de uma leitura de 
totalidade e de uma imersão na essência que constitui as relações sociais, resultado da 
contradição entre capital e trabalho. 
 Dentro do modo de produção capitalista, retomando mais uma vez Iamamoto 
(2011) e Guerra (2018), mesmo com os limites da política de educação sendo postos, o 
enfrentamento está na capacidade que professores e alunos têm de se articular 
coletivamente para fazer enfrentamentos dentro e fora das instituições de ensino, 
construindo também propostos interventivas que favoreçam um processo formativo dotado 
de qualidade, que dará resultados positivos em todos os espaços socio ocupacionais que o 
profissional do Serviço Social ocupa. 
 No sentido de possibilidades de resistência e intervenção, um exemplo dentro da 
Universidade Federal de Ouro Preto é o “Mineração do OuTro: programa de cultura e 
crítica social”. De caráter extensionista e coordenado por dois professores efetivos do 
curso de Serviço Social, o programa é composto por três ações centrais: “Lavras de 
Versos”, “Cine Faísca” e “Curso de Extensão: Ontologia, estética, arte e sociedade’’. 
Através de um movimento de aproximação com a comunidade e um incentivo para que 
esta participe das ações promovidas pela academia, o programa e suas ações buscam 
proporcionar elementos para que a própria comunidade desenvolva uma leitura crítica da 
realidade marianense, brasileira e latino-americana. 
 Percebo nas ações extensionistas propostas pelo programa, uma forma de 
resistência contra o desmonte da educação e os ataque ao pensamento crítico e além, elas 
são a materialidade da proposição de Iamamoto (2011) a respeito da importância de uma 
atuação interventiva dos profissionais do Serviço Social, que precisam responder a 
demandas do empregador (no caso o Estado, poder federal), aos usuários (comunidade 
 
 
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acadêmica e sociedade) e ainda reafirmar o projeto ético-político da profissão. Disto, 
percebo que, apesar de todos os desafios e a contraditoriedade postas aos assistentes sociais 
que também são docentes e atuam no curso de Serviço Social da UFOP, eles têm 
conseguido articular ações de enfrentamento e dentro das possibilidades de atuação nesse 
espaço socio ocupacional, confirmando e defendendo através de suas ações os preceitos do 
projeto ético-político, utilizando também aspectos teórico-metodológico e técnico-
organizativos para reafirmar sua importância enquanto profissão, consolidar a resistência 
coletiva e buscar avanços. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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