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no Processo de Planejamento t7 v1 Vicente dei Rio 5$ Projeto cultural ~ BRAS51NTER 5.4.W INDÚSTRIA E COMERCIO índice Capftulo 1 - Os anos 60: contexto para mudanças disciplinares Capftulo 2 - Planejamento urbano x arquitetura: desenho urbano? Capftulo 3 - Por uma definição de desenho urbano Capftulo 4 - Processo de planejamento e desenho urbano Capftulo 5 - Uma proposta metodológica • Morfologia urbana • Análise visual • Percepção do meio ambiente • Comportamento ambiental Capftulo 6 - Implementando o desenho urbano Capftulo 7 - Agora, um caminho aberto 57 67 70 86 92 96 107 117 Anexo 1 - Urbanização, estruturação e crescimento de favela: Desenho urbano na favela da Maré, Rio de Janeiro 123 Anexo 2 - Desenho urbano e revitalização no bairro de Fells Point, Baltimore, EUA 145 Anexo 3 - Os projetos de estruturação urbana no processo de planejamento: experiências recentes no Rio de Janeiro 157 Bibliografia 171 Bibliografia comentada 183 Créditos das ilustrações 195 Capítulo 1 Os anos 60: contexto para mudanças disciplinares A década de 60 via surgir as primeiras críticas e protestos generalizados sobre a qualidade do ambiente urbano que vinha sendo produzido, tanto pelo poder público quanto pela iniciativa privada. Criticava-se tanto o impacto dos empreendi- mentos sobre o meio ambiente e a vida das comunidades, quanto a própria qualidade dos espaços urbanos e da arquite- tura. Essas críticas surgiram, principalmente, da população afetada, além de pesquisadores e acadêmicos de ponta e da imprensa em geral. Vamos destacar as cinco questões básicas na origem dos debates e que, no nosso entender, passariam a caracterizar a produção de conhecimento dos anos 60 e 70, como um repensar das formas de como o próprio desenvolvimento vinha ocorrendo até então, num primeiro momento, nos paí- ses do chamado Primeiro Mundo. Claro está que este "repen- sar humanístico" deu-se, podemos dizer, em paralelo e inde- pendente ao desenvolvimento normal de campos de conheci- mento ditos "científicos", como a própria informática. Isto levaria a novas ideologias, novas posturas e valores, fortale- cendo, inclusive, as Ciências Sociais com enfoques mais hu- manísticos, e outras disciplinas com enfoques mais "pé no chão", como a microeconomia e a educação básica. Até mes- mo novas disciplinas e campos de conhecimento viriam a ser abertos, facilitando o aparecimento de novas profissões. Foi a partir destas atitudes críticas, dos novos valores surgidos e da necessidade de novas categorias de análise e de novos instrumentos para o controle do desenvolvimento urbano, que o Desenho Urbano se consolidaria enquanto campo de conhecimento e, para muitos, profissão específica. A seguir, sem a pretensão de esgotar o assunto, destaca- remos os fatos e trabalhos mais significativos e influentes para a consolidação do Desenho Urbano e seu desenvol- vimento acadêmico nos diversos centros de pesquisa e cur- sos de pós-graduação. Organizamos esta discussão em torno das cinco questões básicas na origem dos debates sobre a qualidade do meio ambiente. Foi nos anos 60 que, pela primeira vez, intensas e violentas ondas de protesto enfrentavam as intervenções urbanísticas e os programas de renovação urbana das grandes cidades (fig. 1). Essas políticas públicas haviam sido iniciadas, ou tomado corpo, a partir da 1I Grande Guerra Mundial e visavam a reposição completa de grandes áreas do tecido urbano consolidado, principalmente aquelas dos antigos centros que, se não haviam sido bombardeados, eram considerados "dete- riorados" ou em decadência. Em muitos casos, aqueles de áreas grandemente afetadas pela guerra, como nas cidades de Coventry (Inglaterra). Rot- terdam (Holanda) e Berlin (Alemanha). para citar apenas os casos mais famosos, esta atitude se justificava face à escala da destruição. Os novos planos e projetos seriam sempre desenvolvidos segundo os novos paradigmas e preceitos dos Congressos de Arquitetura Moderna e da Carta de Atenas. É muito demonstrativa a observação do famoso urbanista britânico Sir Percy JOHNSON-MARSHALL, responsável por inúmeros esforços de reconstrução e um dos mais famosos urbanistas na Grã-Bretanha, quanto à área de entorno da histórica Catedral Saint Paul, em Londres. A área havia sofrido intenso bombardeio e, segundo o urbanista, " .. apesar da devastação, se mantiveram de pé um número suficiente de edificações como que para criar problemas na hora de reorga- nizar a estrutura urbana" (JOHNSON-MARSHALL 1986: 124) Para ele, talvez fosse melhor se as bombas tivessem conseguido acabar com tudo para possibilitar o livre exercício do urbanismo modernista (fig. 2). Nos países do Primeiro Mundo, principalmente nos EUA, este tipo de ideologia e de modo de atuação se aplicaria às políticas públicas para com as áreas centrais, tanto habita- cionais quanto comerciais, que se encontrassem em situação de esvaziamento populacional e econõmico. Esvaziamento este que, na maioria das vezes, não era causado pelas caracte- rísticas físico-ambientais das áreas mas, de um lado, pelas próprias políticas regionais vigentes e de outro, pelos novos modos de vida e paradigmas buscados pela classe média, insuflados pela sociedade de consumo. Seriam as novas con- dições "dignas" de moradia ofertadas pelo subúrbio, as cida- des-novas onde tudo era "corretamente planejado para nosso conforto", as migrações das grandes empresas para maior eficácia de sua atuação e de sua imagem, a nova forma de comprar dos" shopping-eenters", entre outros fatores (fig. 3). Como consequência, as áreas centrais se deterioraram física, econômica e socialmente; os grupos mais abastados se instalariam em suas novas casas de subúrbiO, o comércio e as atividades culturais perseguiram seu mercado, mudando para os subúrbios, os imóveis das áreas centrais passariam a apresentar alto índice de deterioro e abandono, os grupos menos favorecidos herdariam estas condições e os cortiços e guetos se formariam. Grandes intervenções do Poder Público, ou por ele apoiadas, buscariam adequar estas áreas centrais às novas funções pr conizadas pelos planos diretores e políticas de renovação, Figura 2 -As linhas modernistas de projeto modelo de renovação nos esforços do pós-guerra; centro multiuso Barbican, Londres, Chamberlain-Powell & Bon, 1954 Figura 3 - O shopping-center regional e novos padrões de ocupação nos subúrbios norte-americanos; incompatibilidade morfológica com o urbano tradicional em Stonestown, San Francisco de forma a viabilizar os mercados imobiliário e financeiro. Impunham-se CBDs ("Central Business Districts", distritos centrais de negócios). imponentes e grandiosos sistemas viários, espia nadas monumentais, grandes conjuntos habita- cionais em periferias mas com condições mais "dignas", shopping-centers etc. (figs. 4 e 5). As cidades eram então vistas como simples problemas de funcionamento, maximi- zação de investimentos e viabilização da reprodução e acumu- lação do capital. Importantes aspectos seriam ignorados nestes processos, tais como os valores da população e os intensos e lonÇ)os :.;1 Figura 4 - Conjuntos residenclals para programas de renovação' urbana e o paradigma corbusiano; Stuvvesant Town e Peter Cooper Village, Nova lorque, 1943 .:-:~.~ \,I'"..,~~ • 10 Figura 5 . Os projetos de renovação e suas vias expressas como barreiras e o abandono do potencial de lazer da margem do rio, hoje uma prioridade; Cincinati, EUA investimentos sociais e econômicos das comunidades e do indivíduo no seu ambiente habitacional. As características simplistas e, não raro, desumanas dos ambientes então gera- dos desconsideravam a complexidade da vida urbana, de patrimônio histórico, da integração e inter-relaçã<Jentre as funções e atividades humanas, a importância das redes so- ciais estabelecidas, dos valores afetivos e de tantos outros fatores vitais para o cidadão. Nos EUA. por exemplo, nos anos 50 aprovou-se legislação passando a permitir que os governos locais adquirissem com- pulsoriamente, ou por outros meios convincentes, os imóveis considerados em condições de abandono, revendendo-os no estado ou após reurbanizações e melhorias no entorno, a empreendedores que se dispusessem a construir algo de acordo com o que o Poder Público achasse "desejável" para a cidade. Seus objetivos sempre implicariam em prioridade para a dinamização da economia formal. o incremento dos impostos, e os lucros financeiros imediatistas Estas políticas seriam conhecidas como do "bulldozer" (trator) ou "urban removal" (remoção urbana). ou até "negro removal" (remo- ção de negros), por seu viés preconceituoso e elitista (CAS- TELLS 1971, GOODMAN 1971) Por todo mundo iriam implementar-se políticas e programas do tipo "arrasa quarteirão", inclusive no Brasil. O Rio foi palco de diversos deles, inaugurados por Pereira Passos na virada do século, para serem retomados depois, na época do milagre. Ainda hoje sentem-se os efeitos de intervenções modernistas traumatizantes, como as da esplanada de Santo Antônio (Av. Chile e adjacências). do Catumbi, do Estácio e da Cidade Nova, além das violentas remoções de favelas (figs. 6 e 7) Alguns destes casos estão bem cobertos por literatura existente no Brasil (PERLMAN 1976, VALLADARES 1978, SANtOS 1981). Hoje ainda ronda o fantasma desta ideologia, que se utiliza do discurso de ser o "remédio para as doenças patológicas dos centros decadentes", como no caso recente de São Paulo e o prefeito Jânio Quadros. Fazendo frente a esta situação e às violentas remoções de grupos de baixa-renda e minorias étnicas, surgiram ondas de protesto que, não raro, acabavam em "lutas urbanas" (riots) de violentas proporções e base racial. São conhecidos os casos das cidades americanas de Baltimore, Newark e Detroit, em meados dos anos 60 (GOODMAN 1971, scon 1971) Os estudos acadêmicos, a opinião pública, as campa- nhas da imprensa e o apoio dos próprios técnicos mais cons- cientes terminaram por obter apoio político suficiente para alterações nos programas de renovação irrestrita e nas inter- venções urbanísticas de cunho meramente funcionalista. Poderíamos, sem dúvida, destacar como pioneiro nesta cons- cientização o livro da jornalista americana Jane JACOBS (1961) em que critica profundamente as ideologias dos plane- jadores de então, seu distanciamento do mundo real e o produto de seus trabalhos. Ela destacava fatores e qualidades urbanas totalmente ignorados pelos planos modernos, como a variedade de funções e suas inter-relações, a importãncia de haver intensas atividades nos espaços públicos para maior segurança, e as limitações da ordem visual. Segundo ela, "a pseudociência do planejamento urbano e sua companhei- ra, a arte do city design, ainda não romperam o conforto superficial de desejos, superstições familiares, supersimplifi- cações e símbolos, e não iniciaram a aventura de provar o mundo real" (JACOBS 1961. 23). ) r~-·-j,·. A~ t?, Iç--'nnr-'\l,' './., ~ J~ ,.., ~.e_"_ \\ I I \\':~ r~ l!)~ :I :~:':~~~::. . - Figura 6 -Projeto de reurbanização da área resultante do desmonte do Morro de Santo Ant6nio, centro do Rio; Affonso E. Reidy, 1948 Também foram de grande importância os trabalhos gerados pelas Ciências Sociais, como os dos sociólogos Herbert GANS (1968) e Suzanne KELLER (1968), e da antropóloga Lisa PEATTIE (1972). O primeiro levantava a incompatibilidade entre os planos urbanísticos e os interesses das populações diretamente atingidas, enquanto as duas últimas desenvol- veram pesquisas comprovando a importância dos valores e das relações sociais para os bairros de baixa renda. No caso brasileiro foram fundamentais as pesquisas pioneiras de PERLMAN (1976), que estudou a inadequação das políticas de remoção de favelas no Rio, e de VAL.LADARES (1978), que demonstrou a falência dos programas de financiamento e dos conjuntos habitacionais, com a maioria dos mutuários repassando seu imóvel para outra família e retornando às favelas. Novas posturas profissionais também viriam a ser assumidas, gerando novas formas de atuação, como a do citado Robert GOODMAN e sua postura anárquica, e de Paul DAVIDOFF (1965). Este lançou o conceito de "advocacy planning" (plane- jamento advocatício ou advocacional) que se tornaria muito popular nos EUA, onde até hoje técnicos perfilam-se ao lado ou são contratados por comunidades atingidas por um projeto ou plano para que advoguem soluções alternativas. _. .~': Figura 7 -Ambiente gerado pela legislação urbanística na Esplanada (ex-morro) de Santo Ant6nio, Rio, inspirada no projeto de Reidy: monofuncionalidade, conflitos morfológicos e grandes dist/1ncias para o pedestre Na década de 60 o mundo despertou para a Questão do patrimônio histórico, para os valores tradicionais, a produção vernacular, as culturas alternativas e uma maior consciência dos excessos do consumismo. Talvez seja possível afirmar Que se tratou de um ressurgimento do Humanismo, tomando o termo em suas conotações mais amplas e positivas. Para as áreas da Arquitetura e do Urbanismo destacaríamos algu- mas vertentes de pensamento na produção de conhecimento e de influência no desenvolvimento destas disciplinas. Nesta Questão, foram muito influentes os trabalhos de Gor- don CULLEN (1961) e Ivor DE WOLFE (1963l. representativos do renascimento do interesse público e profissional pelo am- biente construido vernacular. O vernacular define-se como a linguagem, técnicas e valores transmitidos tradicionalmente na cultura de um determinado grupo social, sem sofrer maio- res influências externas. Os dois autores se inspiram nas pitorescas cidades antigas e nas belezas geradas pelo Urba- nismo "espontãneo" vernacular (fig. 8). Ainda nesta linha, mas tomando outra dimensão de análise, menos visual e mais "objetiva", encontram-se os trabalhos Que tratam da "morfologia urbana", Que estuda o tecido urbano e seus elementos formadores, através de sua evolução, transfor- mações, inter-relações e dos processos sociais Que os gera- ram. Estas teorias serão tratadas com maiores detalhes no capitulo sobre metodologias. Pelo lado norte-americano também pesQuisava-se e publica- va-se sobre o vernacular, a dimensão cultural e a antropo- lógica do ambiente construído. Obteve grande popularidade, em meados dos anos 60, a exposição (lIVro de mesmo nome) "Arquitetura Sem Arquitetos", com fotos de exemplos de todo o mundo, organizada por Bernard RUDOWSKY (1964) no Museu de Arte Moderna de Nova 10rQue (de 9/11/64 a 7/2165). Esta temática seria retomada em dois trabalhos fun- damentais do arquiteto e antropólogo Amos RAPOPORT (1967, 1969l. ao estudar as relações entre o ambiente cons- truído e a cultura, chamando a atenção para valores como a complexidade de significados, as mensagens visuais experi- mentadas pelo cidadão e a importãncia das ricas conotações dos elementos arQuitetônicos vernaculares e indígenas. Mais tarde, o mesmo pesquisador publicaria um dos trabalhos mais influentes e citados em Desenho Urbano, ainda sobre os aspectos humanos e antropológicos da forma urbana (RAPO- PORT 1977) (fig. 9). Figura 8 -San Gigminiano, a cidade das torres na Itália, retrata a redescoberta das qualidades e belezas da arquitetura vernacular e das cidades "não-planejadas" O interesse nas mensagens arQuitetônicas e suas diferentes leituras fomentou o desenvolvimento dos estudos de semio- logia, ou semiótica, aplicada à Arquitetura e ao Urbanismo. A semiologia estuda todos os fenômenos de comunicação como se fossem um sistema de símbolos, ou seja, uma linguagem.Um grande modismo do fim dos anos 60 e início dos 70, na Itália e França, revelou-se depois limitado enquanto maiores desenvolvimentos de sua praticidade. Quanto à sua aplicação em nossa área de estudos e suas obras mais impor- tantes, comentaremos durante nossa proposta de procedi- mentos metodológicos. Nesta dimensão analítica do simbólico, destacamos os con- trovertidos e influentes livros do arquiteto americano Robert VENTURI e colaboradores (1966, 1977). Eles lidam com os aspectos contraditórios e complexos das mensagens arQuite- tônicas, colocando em evidência seus significados mais popu- lares ditos "cafonas" ou "bregas", utilizando-se do termo contemporâneo Seus livros e seus projetos tornar-se-iam referências obrigatórias para a Arquitetura Pós-Moderna. Em um de seus escritos, por exemplo, em Que defende a validade de edificações como o estande em forma de "pato", VEN- TURI (1966: 166/167) diz Que "as Justaposiçôes de elementos de má-reputação, Que parecem caóticos, expressam um tipo intrigante de vitalidade e validez, alcançando também uma aproximação inesperada da unidade. ( ) ... no edifício ou na paisagem urbana validamente complexos, a visão não Quer Figura 9 -A "arquitetura sem arquitetos" e as possibilidades de soluções mais apropriadas e adaptação ao meio. Há centenas de anos, o melhor uso das possibilidades das formações vulcânicas na Capadocia, Turquia ser satisfeita rápida ou facilmente em sua busca pela unidade no conjunto" (fig. 10) Ainda segundo VENTU RI (1977). a arquitetura depende da experiência passada e da associação emotiva para a sua percepção e criação. I Todas estas discussões e pesquisas terminaram por influen- ciar decisivamente no desenvolvimento de nova corrente de pensamento arquitetõnico que veio a contrapor-se ao Movi- Figura 10 - O pato, estande de "fast food" referido por VENTURI como das principais manifestações da arquitetura simbólica, a que toma a forma do próprio símbolo; Long Island, Nova lorque mento Moderno. A arquitetura Pós-Moderna que, em seu estado mais válido e original, tenta uma recuperação e reinter- pretação de símbolos e linguagens tradicionais ou populares, ignorados pelo modernismo do International Style (fig. 10). Busca-se, para tanto, uma arquitetura mais rica em suas di- mensões simbólica e lúdica, como deixa claro o importante trabalho de Charles JENCKS, o responsável pela colocação feliz da expressão "Arquitetura Pós-Moderna" (JENCKS 1977) Isto é verdadeiro se analisarmos as obras pioneiras desta corrente, como as dos arquitetos americanos Charles MOORE, Robert VENTURI e Robert STERN, dentre outros. Um bom exemplo é a Piazza d'ltalia, projeto de Charles MOO- RE e associados, de 1977, uma praça símbolo para a comuni- dade italiana onde o arquiteto manipulou decorativamente diversos símbolos típicos daquela cultura, como uma fonte em forma de mapa da Itália ou colunas e capitéis de ordem romanas, só que em aço escovado, tudo com intenção ceno- gráfica e lúdico-irõnica (fig 11) Talvez pela característica con- sumista do Pós-Moderno, utilizando-se de símbolos arquite- tõnicos de fácil comunicação e apelo popular, foi justamente nos EUA onde mais prosperou. Também podemos identificar projetos urbanísticos Pós-Mo- dernos, tendo por base principal a Europa. Isto porque a a Figura 11 (a, b) - D Pós-moderno lúdico e cenográfico da Piazza d'ltalia, praça sfmbolo para a comunidade italiana de Nova Drleans; coordenação de Charles MDDRE, 1977. No medalhão, o rosto do arquiteto ·;;"1 ••• 1 nu Figura 12 - D Pós-moderno no neo-racionalismo de A Ido RDSSI e seu projeto para a sede do governo local de Trieste, Itália, 1974 corrente gerou fone contextualismo, por isto muitos os classi- ficam como "neo-racionalistas", e larga utilização de técnicas de análise de Morfologia Urbana, que serão comentadas no Capitulo 5. São exemplos os trabalhos dos irmãos Leo e Rob KRIER, de Aldo ROSSI e do escritório de James STIR- L1NGe Michael WILFORD (figs 12 e 13) o público em geral consumiu facilmente o Pós-Modernismo, talvez por seu fácil apelo a símbolos já aceitos pela classe média. Como no sucesso dos projetos do catalão Ricardo BOFI LL. No complexo habitacional Les Arcades du Lac, nos arredores de Paris, construido no fim dos anos 70, o arquiteto utilizou-se de uma linguagem arquitetônica e de organização espacial neo-clássica, embora os métodos construtivos te- nham sido de moderna pré-fabricação. A idéia foi muito bem aceita e o empreendimento é hoje um sucesso para os grupos de classe média ascendente (fig. 14). Mais tarde, BOFILL foi vencedor de concurso internacional para renovação da área conhecida por Quartier Les Halles, em Paris, e, desde ',,~(cr;) G'O"OU""'l'b'b'b •••••••••• .-: ooooooel.).ot' (Í)"O\~. OOQOOQOCílI1tQOOOOI»Gi OOOOOOO"G~Ot'OüI!'O OOOOOOOG~OI\) OrlJQQC-1 IÜOüQ0QQOOOOOOOO() 6@l".Wóe:s •• o OO()O(JOf}ClO~OOoe •• ()()t){)()O~OO OOGUOef# j t'j(\UU(}OOOO(,ilO."'~ •• l"lO(H)00CJOOOOGoe ee \ ('I()OOO(JOOc:>o~oooe •. 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Este sucesso também se refletiu junto ao público em geral. tanto em termos arquitetõnicos quanto urbanísticos, com a Bienal Mundial de Veneza (1980), a Bienal Internacional de Arquitetura (1980) e o Salão de Outuno (1981). ambos em Paris, que exaltaram o Pós-Moderno. popularizando-o ain- da mais, assim como um Urbanismo mais consciente do passado e do patrimõnio instalado. culminando os esforços iniciados nos meados dos anos 60. Por seu lado, a corrente Neo-Vernacular também se popula- rizou, pela mesma razão de fácil consumo de símbolos. só que estes apelando para o "rudimentar" ou o "rústico". Bom exemplo disto é Port Grimaud. proj to d François SPOERRY. um luxuoso complexo de re idências d veraneio na co ta da França mediterrãnea. construído em 1977. que explorou as imagens de vernacular franc's c mo produto "chiqu " de consumo (fig. 15). Um fenõm no de consumo sem Ihant ao que hoje observamos. por x mplo. no litor I Rio-Santos e em Búzios. cidade de praia no Estado do Rio. com uas "casas de pescadores". Em segundo lugar. apontamo a importância das pesquisas das transformações urbanas: o r0 ultados fí ico- spaciai de processos de apropriação pela população dos elementos urbanos e arquitetõnicos ao longo dos séculos. como os anfi- teatros romanos. Servindo como "estruturas-suporte" para as transformações. são elementos que acabaram transmu- tados em praças. residências etc .. perfeitamente incorpo- rados ao tecido urbano mas cuja lógica conformadora e estru- turas básicas ainda são distinguíveis (fig. 17) Uma grande alteração nas políticas urbanas e nas profissões ocorrida neste período foi relativa à ampliação da democracia A partir do crescente descontentamento dos habitantes sub- metidos a ambientes modernistas e dos movimentos de pro- testo e resistência aos programas de intervenção urbana, fato comentado anteriormente, as populações das grandes cidades dos países desenvolvidos foram conquistando impor- tantes reivindicações. Assim como nos EUA. as principais cidades européias seriam palco de movimentos sociaisseme- lhantes e suas administrações se veriam pressionadas a inse- rir maior participação comunitária em seus processos de pla- nejamento e, principalmente, nos programas habitacionais (fig. 18). na gestão urbana e na própria produção arquitetõnica, através da participação das comunidades e dos usuários dos projetos ! 'I .• Figura 14 - Conjunto residencial de média-renda Les Arcades du Lac; pós-moderno classicista de Ricardo BDFFIL em subúrbio de Paris; final dos anos 70. Sucesso nas classes burguesas com a linguagem simbólica associada ao clássico e seu rígido formalismo Ao mesmo tempo, verificava-se um forte questionamento da própria noção de progresso e de desenvolvimento. Sur- giam os grupos de defesa do meio ambiente, a ecologia se impunha como ciência necessária à própria sobrevivência da nossa espécie. levantava-se a questão de utilizar os recur- sos não-renovàveis, e a noção de produtividade econômica acabaria por ser contestada pela de produtividade social (SCHUMACHER 1973, BRASilEIRO 1981) Surgiram, nestn época, estudos e movimentos que advogavam a utilizaçã() de tecnologias mais apropriadas aos contextos da produção, tomados como partes de um todo profundamente inter-rela- cionado, e de processos alternativos que, em Arquitetur e em Desenho Urbano, maximizassem a utilização dos recul- sos disponíveis, da mão-de-obra, e a participação dos próprios ~'.~~"~:~ ~ . ,"No';'.;; "i"''/ ~ ',t ,to' '}, Figura 15 - Port Grimaud, costa francesa mediterr/Jnea, luxuoso empreendimento de veraneio projetado por François SPOERRY, 1977. Sucesso na reprodução de padrões vernaculares locais; os corretores desafiavam o comprador a tentar achar duas casas iguais! "'-:"4~ ,.-~""~ .'. • ,If,.'4: ."i/- , . . , ) .' .e:",'. ,. "",-t'~• ~ Í"--. _ i~ Figura 17 (a, b) - A contfnua apropriação de antigas estruturas pela população, como os anfiteatros romanos: em Florença ele foi absorvido pelo tecido e em Lucca sua arena conforma uma praça e sua estrutura incorporou-se às casas Figura 18 - As cidades tornadas palco de movimentos sociais por melhor qualidade ambienta! e as comunidades conquistando mais peso na "balança" polftica usuários no seu meio ambiente construído. Evidentemente, pela sua natural importância na reprodução da força de traba- lho, as alternativas habitacionais tomaram lugar primordial nestas preocupações (TURNER & FICHTER 1972, WARD C 1974, HARMS 1982) A sociedade, principalmente através da nova geração e seus movimentos estudantis, buscava novas ideologias alterna- tivas e forma comunitária de vida, como os movimentos "Flo- wer Power" e "Hippie", ou as comunidades "drop out", ao som do rock de protesto ou de baladas romântico-lisér- gicas. Bom exemplo desta nova maneira de pensar o desen- volvimento encontra-se no famoso livro de E. F. SCHUMA- CHER (1973), um "best-seller" até hoje, que se inspirou na obra de Gandhi para tratar de "economia como se fossem as pessoas o que importasse". Também foi sintomática a p netração do livro de Richard SENNET (1970), onde defende os "usos da desordem" e a necessidade de contexto urbano d ord nado e diversificado com in trumento de liberação p I lib rd d de ação para H m m. Nos p r d r I ncia dos siste- m s Ir dicion i ntaç O polítiCt, r Ila de susten- tação omunit ri p r S tivid d do Pod r Público e a provisão dos serviç urbanos (CA I LI 1 72, AUNDERS 1979). Era crescente o distanciam nt d p Iíti os das reais necessidades da população. Os gov rn viram-se, então, obrigados a lidar com a participação popul r nos processos de planejamento, mesmo porque se consci ntizaram que esta seria uma solução mais populista e econômica do que o enfrentamento direto. Evidentemente, esta participação vi- ria tomar várias formas, desde a co-optação até a utilização de mão-de-obra comunitária barata para as obras, não sendo "per se", garantia de influência nos processos de tomada de decisões (GOODEY 1980) (fig 19). •..··jr tf I CO~TROLE:. oos Jf'''~ CIPAPAOS 6 ~A \ - \"~~IIlI"1 l!WJiiI DElE~AÇAO DE . "l'lAU5 PODE'" I - - l !"-"II'""'I/7 DE. pODER. 50el EDADE i ' R~~1' I - "'1;l!11 ~~II'~• !IJ PACIFICA~à ~ ((5 . ;:: r '~~'jI ~CONSULTA LE"'ITIMAÇÃO ~ 7J11'''l ' E POPULISMO ~NFORMAÇÃO • . 3 .•••••. TERAPIA '2 " ..4~ MANIPULAÇÃO _ fWdil _i··· l1-C-'--::---= 1 HAO PiC,PAÇAO r1\;~-j' -.,., j~ FIgú7a 19 - Os nfveis da participação comunitária nos projetos e processos decisórios como degraus de uma escada, desde a manipulação dos participantes pelos técnicos (participação zero) até o controle decisório (participação máxima) Não se pode negar. entretanto. que a partir disto os processos de planejamento se tornariam um pouco mais transparentes para a população e mais permeáveis a suas reivindicações: mais em alguns países e cidades do que em outros. Os movimentos de bairro e de grupos de cidadãos com interes- ses especiais. como os grupos de defesa do meio ambiente. se institucionalizariam e passariam a ser consultados e a ter voz ativa na administração e no desenho das cidades. Na Grã-Bretanha. por exemplo. foi aprovada legislação. em 1965. que tornaria obrigatória a participação popular na elabo- ração de planos diretores locais. Nos EUA. em 1969. nova legislação federal instituiu a obrigatoriedade de relatórios de impacto ambiental e participação das comunidades onde se- riam aplicados os recursos federais. Logo. em 1974. também passaria a exigir-se a participação das comunidades de áreas atingidas por programas federais de urbanização para defini- ção de prioridades de investimentos (fig. 20). Estas novas instâncias políticas e movimentos sociais urba- nos levariam as Universidades e os técnicos a uma redefi- nição de seus papéis no processo de desenvolvimento urbano (SIMMIE 1974). As disciplinas sociais se veriam obrigadas a incorporar a dimensão participativa em seus programas. e a produzir novas metodologias. Surgiram novas atividades profissionais e até mesmo novos cursos superiores. como foi o caso dos cursos de graduação em Planejamento Comu- nitário ("community planning''), nos EUA. Inúmeros exemplos poderiam ser citados para ilustrar o cres- cimento da participação popular e sua incorporação à gestão das cidades nos países do Primeiro Mundo. As experiências proliferaram nos anos 70 e foram de enorme influência no desenvolvimento do Desenho Urbano. Em Nova lorque instituiu-se 59 Comissões Comunitárias de Planejamento para participar do processo decisório da gestão sobre alguns serviços urbanos. Em Baltimore. também nos EUA. implantou-se o planejamento comunitário distrital (com- munity district planning). um sistema de planejamento coinci- dente com os distritos políticos oficiais a nível local. Em Ams- terdam. na Holanda. o governo viu-se obrigado a ceder aos protestos. implantando um sistema de repasse de verbas a fim de que as comunidades contratassem seus próprios escritórios de projeto para elaboração de planos locais. pois verificou-se ser muito mais barato do que se o governo proce- desse à produção e aprovação do plano frente à participação dos moradores. Figura 20 - D desenho participativo através da televisão e de telefonemas dos espectadores; projeto de reurbanização em Dayton, Dhio, EUA, coordenado por Charles MDDRE em 1976. Hoje o baixo custo relativo da TVa cabo aumentou o potencial de uso deste veiculo para programas comunitários . Na Inglaterra. vale mencionar uma experiência participatlva no projeto e implantação de conjunto habitacional que obteria grande sucesso popular. Trata-se de Byker, na cidade de Newcastle. onde o arquiteto Ralph ERSKINE e sua equipe montaram um escritório de campo onde os nove mil mora- dores podiam participar da decisão de diversos elementos do projeto arquitetônico e urbanístico. num processoque demorou de 1969 até 1982. quando complementou-se a obra final (BERNFELD et ai. 1980. BUCHANAN 1981. TRANCIK 1986 (fig. 21) Por toda Europa e EUA repetiam-se os casos bem-sucedidos, evidenciando a importância da participaçâo direta. Revela- va-se, entretanto, a sua viabilidade relativa pois verificavam-se fortes determinantes na escala do projeto e no próprio con- texto sócio-eultural em que se trabalha. A participação legíti- ma revelava-se muito dependente da capacidade organiza- cional das próprias comunidades participantes do plano ou projeto, como demonstraram vários estudos. Foi também no fim dos anos 60 que teóricos e técnicos começaram a se concientizar da escala do problema habita- cional e a importância da autoconstrução, auto-ajuda e muti- rão no Terceiro Mundo (fig. 22). Importância esta que se refletia não apenas a níveis psicológico e cultural, e evidente maior satisfação dos usuários com o produto de projeto, mas também a nível econômico. Se, por um lado, o Estado veria possibilidades amplas de maximização de seus investimentos Figura 21 - Conjunto residencial de Byker, Newcastle, Inglaterra, 1969/1982, arquiteto Ralph ERSKINE. Participação dos futuros moradores em decisões relativas a suas unidades e ao conjunto Figura 22 -A intensidade do problema habitacional mostrou a importtJncia dos investimentos já feitos pelos moradores e de programas mais participatívos; favela de Jacarezinho, Rio, população oficial 31.405 moradores (1980) nos programas habitacionais de baixa-renda, por outro as famílias teriam a possibilidade de melhor investir conforme suas próprias capacidades de desembolso a longo prazo, ad- ministrando seus próprios gastos a partir da segurança gerada por um título de propriedade de um lote urbanizado ou casa- embrião (DEL RIO 1982, WARD 1982). Neste sentido, destacamos o trabalho de HABRAKEN (1962). que apresentava estudos para programas habitacionais com "estruturas-suporte", edificações com interiores e fachadas flexíveis à participação dos moradores, enquanto que alguns elementos seriam fixos, como os núcleos de cozinha e ba- nheiro e o sistema estrutural. Esta alternativa ao alojamento de massa, de concepção racionalizada, tem uma grande pene- tração acadêmica até hoje (fig. 23). . Por seu lado Charles ABRAMS (1964). que foi assessor do governo norte-americano em questões de habitação e urbani- zação para países em desenvolvimento, informava em seus relatórios, publicados em forma de livro posteriormente, da importãncia e viabilidade da autoconstrução, da capacidade de progresso sócio-econâmico da população, dos assenta- mentos ilegais, e das desvantagens de sua remoção indiscri- minada. Uma extensa experiência junto ao governo do Peru possibi- litou que William MANGIN e John TURNER compreendes- sem amplamente o problema da habitação de baixa-renda nos países do Terceiro Mundo e os levou a publicarem traba- lhos importantíssimos para o desenvolvimento da questão. Os trabalhos e a atuação dos profissionais, divulgando seus resultados, vieram a ser instrumentais para as alterações das políticas governamentais e das instituições internacionais de crédito, como o Banco Mundial, no estabelecimento de suas políticas e programas habitacionais (PAYNE 197-6, WARD 1982). Contestando alguns conceitos aceitos na época, MANGIN (1967) negava que as favelas eram caóticas e desorganizadas, marcadas por "patologias sociais", como o crime, e defendia que se constituíam, na verdade, em solução eficiente dos pobres e dos migrantes para o problema da falta de habitação. Junto com TURNER publicaria alguns artigos em revistas de penetração, sempre sobre suas experiências com as "bar- riadas" (assentamentos ilegais) de Lima, demonstrando as reais possibilidades da participação popular (MANGIN & TUR- NER 1968). Figura 23 - Estruturas-suporte; elementos prefixados e participação dos moradores: processos flexfveis às necessidades e com potencial para interessantes resultados plásticos. Esqueleto de prédio invadido no Rio Comprido, Rio de Janeiro Porém, foi TURNER o mais influente nesta questão, tanto por seus trabalhos publicados quanto por sua atuação acadê· mica e como ativo consultor internacional (TURNER & FICH- TER 1972, TURNER 1976, 1982). Ele defendia o potencial da autoconstrução e dos processos por mutirão se dirigidos e apoiados pelo Estado. A idéia básica seria a instituciona- lização de processos participativos em habitação, maior auto- nomia local e o Estado agindo como provedor de condições não-passíveis de serem conquistadas pelas comunidades. como programas de financiamento, transporte coletivo, assis- tência técnica, acesso à terra etc. (fig. 24) No Brasil destacou-se a atuação pioneira de grupo de arqui- tetos à frente da CODESCO (Companhia de Desenvolvimento de Comunidades). antigo órgão estadual criado em meados dos anos 60 e que, embora de curta existência, provou a víabilidade de trabalhos participativos de urbanização de fave- las. A literatura existente já se dedicou à experiência da favela de Brás de Pina: urbanização participativa de forma progres- siva por setores e com resultados físico-espaciais e sócio-eco- nômicos significativos. principalmente se analisados numa perspectiva histórica, embora sofrendo diversas limitações como a não-regularização da propriedade do solo (BLANK 1977 e 1979, SANTOS 1981) Algumas outras experiências recentes brasileiras demons- tram a viabilidade da participação comunitária na produção habitacional. a nível de projeto e de construção. como as de Vila Nova Cachoeirinha, em São Paulo. e Favela do Gato. em Niterói. O conjunto Vila Nova Cachoeirinha abrigou. em terreno originalmente ocupado por uma favela com 105 famí- lias, mais 333 novas famílias que. num processo de partici- pação e ajuda mútua. conseguiram implantar o conjunto em 15 meses, sob coordenação de equipe da prefeitura de São Paulo Apesar de diversos percalços, principalmente a nível institucional, a experiência foi bem-sucedida e encontra-se detalhada em REINACH (1985). Já no caso da Favela do Gato. originalmente um assentamento de pescadores às mar- "'-" 4. 'j "'~ li: ~ ~"Z""" ,:;, ••. I- :zot:,~C .( "'~~ ,,( ~ ..Ju,~"" ....... o. 1.U",)4 Z J'. t: /<:""<0 - '" " ~OVf-P.NO •e /•C.E.NTll-.~L "-~OVERNO e • /•LOCA\... '\. )t.TO~pP;iVADO e /r.. /'\OI1-.~])Ofl..E.~ • • "Figura 24 - Matriz baseada em TURNER para maior autonomia local sobre habitação e ambiente: como é e como deveria ser; o Estado como provedor e a população como decisora e realizadora gens da Baía de Guanabara, os moradores obtiveram asses- soria técnica de uma equipe do Departamento de Arquitetura da Universidade Federal Fluminense para lutar contra sua remoção. quando da construção de uma nova rodovia federal. Através de pressões junto ao DNER, CEHAB e BNH, conse- guiu-se a manutenção da comunidade e um projeto partici- pativo definiu a urbanização da favela e a construção de um novo conjunto, em área próxima. para as famílias removidas (CANEDO & BIENENSTEIN 1984). O trabalho dos pioneiros nos anos 60/70, corroborado por pesquisas em outras disciplinas, influenciou toda uma com- preensão mundial para a importância da participação dos mo- radores na produção de seu ambiente habitacional. Organis- mos como as Nações Unidas, principalmente após sua confe- rência internacional HABITAT de 1976, o Banco Mundial e, mais tarde. a partir do final dos anos 70 o próprio BNH. alteraram suas políticas e programas de forma a incluir o público-alvo através da autoconstrução dirigida. Elas acaba- riam incentivando algum tipo de participação dos grupos afe- tados em quase todos os programas para os quais ofereciam financiamento. Isto manifestava-se até nos programas cultu- rais e educativos. como as experiênciaspioneiras do Conse- lho da Europa dos anos 70 (GOODEY 1981). A institucionalização da autoconstrução e do mutirão tem sido bastante criticada; ela estaria legitimizando formas de espoliação das famílias de poucos recursos, através da sobre- exploração de sua mão-De-obra e seu tempo livre (WARD 1982. DEL RIO 1982). Sem dúvida, seria completamente equi- vocado advogar-se estas alternativas como os únicos progra- mas habitacionais a serem oferecidos à baixa-renda. Entre- tanto. eles se apresentam como das opções a serem oferta- das amplamente, e não se pode negar que vieram a contribuir com o despertar de uma nova atitude para projetos mais democráticos. ao menos no que diz respeito às opções do morador em sua capacidade de investimento e na flexibilidade do produto final para suas necessidades. Também foi nos anos 60 que apareceram as primeiras críticas ao que era preconizado pelo Movimento Moderno para a Arquitetura e o Urbanismo. Os moradores e os usuários dos ambientes e edificações modernas. projetados com as tão conhecidas premissas modernistas. manifestavam-se des- contentes, tanto em termos estéticos quanto de conforto ambienta!. ou mesmo quanto aos aspectos econômicos e funcionais. A crítica a este último aspecto era a própria ironia do destino. uma vez que era a funcionalidade um dos precei- tos do Modernismo. Quanto à Arquitetura, as críticas principais reportavam ao chamado International Style. um submovimento do Moder- nismo. e à própria postura ideológica e conceitual dos arquite- tos, cUIOSprotestos ignoravam as condições específicas do contexto onde se inseriam, fosse em termos físico-ambien- tais ou sócio-culturais. Esta corrente levaria às últimas conse- quências o conceito da "máquina de morar" de Le Corbusier e, com o aval do capital especulativo imobiliário, que via nela imensas economias. faria surgir a mesma tipologia seja em Nova lorque. Londres. Tóquio ou São Paulo. Suas fachadas em "curtain wall" (cortinas de vidro). seus pilotis. sua ocupa- ção em centro de terreno, suas grandes alturas, seu despoja- mento e formas simples, sua economia de acabamento, eram os valores universais teorizados e vendidos (fig. 25). A outra corrente popular dos modernistas promovia edificações muito mais personalistas. de dotes escultóricos e, muitas vezes, de inegável beleza pláslica. Entretanto. pecariam por excesso e cairiam nos mesmos equívocos decorrentes por incompatibi- lidade ao contexto. fraco desempenho climático e de conforto ambienta I, desrespeito às condições do terreno, linguagem em choque com culturas locais e pobre inserção ao seu entorno (fig 26). Isto tudo sem mencionar os graves problemas constru- tivos de detalhamento e funcionamento interno. sacrificados pela estética externa. Profissionais de renome e inegável importância incutiram nes- tes erros. nestas duas correntes arquitetônicas. influenciando várias geraçôes. Atualmente muitos ainda praticam a mesma Arquitetura. com os mesmos equívocos de antes. Trabalhos acadêmicos e da crítica especializada têm sido publicados sobre esta questão e nas palavras do crítico inglês, atual- mente diretor da escola de arquitetura de Columbia (EUA). Kennet FRAMPTON a Arquitetura teve, evidentemente, um certo papel no empobrecimento do Meio Ambiente. particularmente onde foi instrumental na racionalização das tlpologias e métodos construtivos, e onde tanto o material do acabamento quanto a forma da planta foram reduzidos a.o seu denominador co- mum mais básico, para tornar a produção m8ls barata e otimi- zarouso"(FRAMPTON 1981. 9) As críticas mais consistentes foram publicadas pela primeira vez a partir da segunda metade dos anos 60 e diversos auto- Figura 25 (a, b) - Dois paradigmas modernistas para o mundo: o modelo sobre pilotis de Le Corbusier para o Ministério da Educação, Rio, e a l/imina sobre embasamento do prédio da Seagram's de Mies Van der Rohe Figura 26 - O Memorial da América Latina, projeto de Oscar NIEMEYER, São Paulo, 1988. A linha modernista "escultórica" e sua fraca resposta às atividades humanas e às condições do sitio. Os espaços entre as edificações como "Espaços Negativos", as "Sobras" ... res e pesquisadores poderiam ser citados. Fundamental pe- netração teve a obra de Robert VENTU RI em que. num primei- ro livro. chamava atenção para a importãncia da contradição e da complexidade nas mensagens arquitetônicas e. no se- gundo. fazia elogios ao simbolismo arquitetônico de Las Ve- gas e à função de suas ricas mensagens (VENTURI. IZENOUR & SCOTT-BROWN 1977) Cabe lembrar. também, o livro intitulado "A Forma egue o Fiasco". parodiando a máxima modernista "a form egue a função". onde o autor expunha diversas experi ncias mal- sucedidas da Arquitetura e do Urbanismo Modernos (BLAKE 1974) (fig. 27). De importância semelhante foi o livro de Char- les JENCKS (1973), que analisava os movimentos modernos da Arquitetura. suas origens. influências e conflitos. Mais recentemente o jornalista autor do "best-seller" "A Fogueira das Vaidades" publicou um livro sobre as desventuras da arquitetura moderna que. com seu estilo cínico. cômico e altamente personalista. teve ampla penetração (WOLFE 1981). Sobre a reação dos operários à habitação projetada por Le Corbusier para Pessac. em 1925 (fig. 28), WOLFE comenta: Figura 27 - Pessoas idosas sofrendo os efeitos do vento acelerado através situação espacial gerada pela aplicação inconsequente dos paradigmas modernistas: prédios altos em lâmina e amplas plazas; Boston, EUA "Se os operários gostaram de sua habitação? Oh, eles recla- maram, o que era próprio de sua natureza neste momento histórico. Em Pessac as pobres criaturas estavam desespera- damente virando os frios cubos de Corbu de dentro para fora. tentando torná-Ias aconchegantes e coloridos. Mas isto era compreensível. Como o próprio Corbu disse, eles tinham de ser reeducados para entender a beleza da Cidade Radio- sa ... não havia porque consultá-Ias diretamente pois. como Gropius havia dito. eles eram intelectualmente subdesen- volvidos "(WOLFE 1981: 32) Estas obras críticas foram vitais para a formação teórica e ideológica que nutre quase todos os trabalhos de Desenho Urbano atual. Mas este criticismo teórico ou. algumas vezes empírico (NEWMAN 1972), viria a ser corroborado com meto- dologias mais científicas a partir do final dos anos 70 com o desenvolvimento de pesquisas de avaliação pós-ocupação. atualmente indispensáveis para grandes projetos, como vere- mos ao tratar de procedimentos metodológicos para o Dese- nho Urbano (RABINOWITZ 1979, DEL RIO 1989). Os conflitos verificáveis entre os usários e seus ambientes modernistas vão desde insatisfação com a rigidez de edifícios de "desenho total", onde o arquiteto controlava até os cinzeiros a serem utilizados, como no caso do edifício da CBS em Nova lorque, estudado por RAPOPORT (1967). até falhas técnicas e estru- turais. Em relação ao Urbanismo ditado pelo Movimento Moderno, algo similar aconteceu pois evidenciou-se a falácia de assu- mir-se um modelo de Homem universal e reduzir a vida urbana a quatro variáveis: habitar, trabalhar, circular e cultivar o corpo e espírito. Que os seres humanos não são máquinas de com- portamento amoldável e totalmente previsível foi compro- vado a duras penas pela população usuária dos ambiente" modernistas. Os urbanistas inspiravam-se em visões simplis- tas do urbano, colhendo seus paradigmas de Le Corbusier e suas Cite, Contemporaine (1922) e Ville Radieuse (1930) (fig.29) Dos textos críticos, resultantes de pesquisas mais "cientí- ficas" sobre os impactos negativos do Movimento Moderno no ambiente construído que influenciaram o desenvolvimento acadêmico do Desenho Urbano, alguns devem ser mencio- nados para situar nossa argumentação. Muitosdeles, como não poderia deixar de ser, abarcam mais especificamente o campo da Arquitetura que o do Urbanismo. Em artigo que se tornaria um clássico, Christopher ALEXAN- DER (1965) criticava a visão simplória com que o Modernismo interpretava o urbano e seu conhecido paradigma da cidade como uma estrutura em árvore. O pesquisador observava que esta visão ignorava a complexidade do fato urbano e a superposição de subsistemas da vida na cidade (fig. 30). A partir desta hipótese básica, nos anos 70, ele desenvolveria sua teoria da "pattern language" (linguagem de padrões) que se propunha a identificar diretrizes para projetos urbanos e arquitetõnicos intimamente ligadas à qualidade do ambiente e a uma "maneira intemporal de construir"; estágio do pro- cesso que garantiria permanência da qualidade no tempo, conferindo-lhe certa universalidade. Parte da argumentação de JACOBS (1961). já anteriormente comentada, seria retomada mais tarde por Oscar NEWMAN (1972). em um estudo clássico sobre as inter-relações entre a violência urbana e as características dos projetos urbanos, onde demonstrava a importância de usos diversificados e atividades constantes ao redor dos espaços livres públicos como garantia da segurança de seus usuários. Seguindo outra linha, MARTIN & MARCH (1972) demonstraram através de estudos geométricos e matemáticos que a escala e o padrão da malha viária afetam diretamente a eficiência dos arranjos edificados, comprovando a ilimitada capacidade de adaptação da malha em xadrez. Os prédios altos do modernismo nem sempre se apresentam eficientes, como mostrou MARTIN para trecho de Manhattan (fig. 31); o mesmo volume cons- truído, obtido com uma ocupação total semelhante a prédios Figura 30 - A estrutura em árvore, paradigma do urbanismo modernista, permite apenas associações simples dois a dois, enquanto a estrutura em semi-retícula representa melhor a complexidade das múltiplas associações encontradas em uma cidade tipo Seagram de 36 pavimentos, seria possível em edifica- ções lineares de apenas oito pavimentos se a malha viária fosse ligeiramente alterada, resultando em 28 áreas equiva- lentes a Washington Square, que por sua vez poderiam ser destinadas ao lazer ou, ainda, a escolas ou equipamentos comuns, As atenções principais no sentido de novas posturas e méto- dos em Desenho Urbano concentraram-se, no inicio dos anos 60, na obra de Kevin LYNCH, talvez o pesquisador mais in- fluente para seu desenvolvimento, em todo o mundo, LYNCH não exatamente criticava o Modernismo, mas chamaria a atenção para novas categorias de análise e atuação sobre a forma urbana ao introduzir a participação maior do usuário através da investigação no campo da psicologia, mais especi- ficamente na percepção do meio ambiente (LYNCH 1960, 1972, 1976 e 1981), Sempre desenvolvia suas idéias a partir da análise de comportamento, valores e imagens públicas, Em sua última obra, antes de seu precoce falecimento em 1984, LYNCH desenvolveu uma teoria para a promoção de "boas formas urbanas" através de dimensões de perfoman- ce. Suas teorias e métodos de atuação serão objeto de análise em nossa proposição metodológica. Incluiríamos também nesta categoria de influências, quatro importantes autores: Amos RAPOPORT, Christian NOR- BERG-SCHULZ, Aldo ROSSI e Rob KRIER. Já nos referimos ao primeiro, e sua obra mais influente para o nosso campo de estudo trata das dimensões culturais e antropológicas da cidade, o seu espaço perceptivo e cognitivo. Ele entende o Desenho Urbano como a organização das variáveis espaço, tempo significado e comunicação, criticando, assim, indireta- mente, as posturas do Movimento Moderno (RAPOPORT 1977) Tampouco NORBERG-SCHULZ (1971,1980) foi crítico direto mas seus trabalhos, de elevado valor teórico, destacam a noção de "espaço existencial" e a fenomenologia da Arqui- tetura em busca da produção do "Lugar", com toda sua carga de significados através dos tempos, produzindo uma qualidade e uma dimensão impalpáveis. Já os trabalhos de ROSSI (1966) e KRIER (1975) criticam diretamente o Modernismo e seus produtos. Eles estão entre os arquitetos e autores mais publicados da nova arquitetura, um representando a "nuova tendenza" itàliana, outro o pós- modernismo. Ambos defenderiam em suas obras o contex- tualismo nas intervenções urbanas, como já mencionamos e desenvolveremos com maior profundidade no capítulo dedi- cado à morfologia urbana. 575'~ 575'a _ ._----------_._---~..----~ê~..__ ._-~~~_._-=--~~:E_.__ • __ ~-§,$. o..w -------.,-----._---_ .•.---425._, 425' - I· . ~ Rockefeller Union Cantar Carbide Figura 31 - Se uma área de Manhattan totalmente ocupada por prédios de 21 pavimentos tivesse sua malha viária e tipologia arquitetónica alteradas, o mesmo volume construido poderia ser obtido com apenas sete pavimentos Igualmente importante foi a noção de "collage city" (cida- de colagem) em um livro onde seus autores afirmam que " a cidade da arquitetura moderna, tanto como produto psicológico quanto como modelo físico, tornou-se tragíca- mente ridícula" (ROWE & KOETTER 1978: 4). Baseiam seu argumento no que acreditam ser objetivos divergentes do arquiteto moderno, como atender ao mesmo tempo à "ciên- cia" e ao "povo", ao "despotismo da ciência" e à "tirania da maioria". Apresentam a noção da cidade moderna corno depositária da "desilusão construtiva" e buscam no urbano a valorização de contrastes corno entre simples e complexo, ordem e desordem, inovação e tradição. Para ilustrar estes argumentos, alguns casos podem ser cita- dos; eles já foram objeto de diversos estudos que ajudaram a demonstrar os problemas causados pela rigidez do urba- nismo Modernista. Primeiro, está o premiado projeto de 1925/1955 do arquiteto Minoru YAMASAKI, para o conjunto habitacional Pruitt-Igoe, em Saint Louis, EUA. Tratava-se de imenso complexo com 33 edifícios rigorosamente idênticos, com 11 pavimentos e abrigando 2.764 famílias. Em 1972 ele teve de ser totalmente implodido, como derradeira atitu- de, pois todas as medidas do governo foram incapazes de superar o estigma social, o abandono das unidades, o vanda- lismo instalado e a insegurança, gerados pela insatisfação dos moradores com o seu ambiente estéril, impessoal e dife- rente do resto da cidade "normal" (NEWMAN 1972, ROWE & KOETTER 1978, JENCKS 1977). O crítico Charles JENCKS, inclusive, chega a tomar a demolição deste conjunto como o momento morte simbólica da Arquitetura Modernista. Já no caso de Chandigarh, capital do Punjab. em 1951 Le Corbusier tratou de viabilizar toda a sua série de "ensina- mentos" urbanísticos modernistas e aplicar seus paradig- mas: forte hierarquia viária e unidades celulares definidas por setores retangulares de 800 x 1.200 metros. Os elemen- tos mais importantes da estrutura são os prédios da Assem- bléia. o Secretariado e a Corte Suprema. tratados de forma isolada e monumental. Entretanto, nos dizeres de GALANTA Y (1975: 17), a cidade foi mais projetada do que planeja- da; é um monumento ao gênio artístico de Le Corbusier. ..... uma miragem que não combina direito com a realidade da índia e é duvidoso se poderá moldar a índia do futuro". DE ARCE (1978) possui interessante estudo de redesenho e transformação de Chandigarh. através de seu adensamento e recuperação de um tecido mais tradicional (fig. 32l. Outro exemplo bastante estudado, a cidade de Brasília, espe- lha muito bem o urbanismo Modernista e possui fortes seme- lhanças com Chandigarh; também uma cidade tratada como um projeto de arquitetura, mais que planejada (EPSTEIN 1973. FEFERMAN 1976). De indiscutível importãncia histó- rica. Brasília também pode ser elogiada em diversas de suas soluções urbanísticas e seu desenho global. altamente coe- rente e de forte imageabilidade.As críticas maiores, no entan- to. referem-se à sua pouca eficiência na utilização do solo. encarecendo a infra-estrutura e todos os serviços e dimi- nuindo a acessibilidade (fig. 33) O Plano Piloto é reconhecidamente rígido na distribuição com- partimentada de funções e atividades. reproduzindo uma es- trutura em árvore tão criticada por ALEXANDER (1965). Em busca de sua utopia nacional-<Jesenvolvimentista. a ótica de Lucio COSTA privilegiou o formalista como síntese e refe- rência de uma conciliação entre tradição e modernidade (CAR- DOSO 1989). Nesta nova cidade, rompendo com as tradições que o urbanista não considerou dignas de permanecerem reproduzidas, não existe a possibilidade para ambientes urba- nos mais semelhantes ao que a população espera de vanta- joso em uma cidade normal: variedade. flexibilidade, oportuni- dades múltiplas, distãncias fáceis para o pedestre, tipologias Figura 32 - Redesenho de DE ARCE para o centro monumental de Chandigarh (Le Corbusier, 1951); a superposição de malha 50 x 50 m permitiria utilização mais intensa do solo, recuperando padrões tradicionais e revalorizando os prédios monumentais com novas relações espaciais arquitetônicas variadas e elementos sácio-eulturalmente vi- tais, como esquinas, botequins, praças e ruas com usos mis- tos e bastante animação urbana (HOLLANDA 1975, PAVIANI 1985) Dentro desta temática, cabe citar as palavras de Jonathan BARNETI, arquiteto durante muito tempo responsável pelo processo de Desenho Urbano na prefeitura de Nova lorque, sobre o Movimento Moderno: "O que começou com uma visão romântica da tecnologia moderna, libertando o indivíduo das limitações da tradição, revelou-se admiravelmente adaptável à repetição burocrática inconsciente e aos cortes de despesas de empresários ganan· ciosos" (BARNETI 1982: 8) li; " ";---', ',~ :: __ } ,"~__ '\ ---'1_- --I / ;- __ 1 , , , , ,, , / , " , 1)R~~IÚJ>, . $.Q.). lONl>l',itJ~ i<L~.CUlTRO 1'<0 IPANE.I'\ •••. D.B.I1.': 320li/H D.B.'1"'OO "/~ D.I\.I1. -= ?l~o"IH Figura 33 -A comparação simples de plantas figura-fundo de mesma escala de Brasília, Londrina (bairro central) e Rio (lpanema), permite uma avaliação da efici~ncia de seus padrões de ocupação espacial e uso do solo Foi também no final dos anos 60 e início dos 70 que se veriam expostos os resultados e limitações dos processos e práticas do Planejamento Urbano. Nos países do Primeiro Mundo, onde a institucionalização destes processos está alia- da a economias capitalistas avançadas, poderíamos identificar duas razões principais por trás destas dificuldades do Planeja- mento enquanto meio de implementar ambientes satisfa- tórios, tanto social quanto economicamente. A primeira razão estaria no plano político e, consequente- mente, nos próprios objetivos do Planejamento. Explica-se com o distanciamento dos políticos e seus programas de partido das reais necessidades e interesses imediatos das comunidades. Três são as causas principais apontadas por GOODEY (1981 : 17/18) para explicar o declínio do entusiasmo e esperança em assuntos políticos nos países europeus: des- facelamento da base comunitária das sociedades, controle centralizado dos serviços públicos e a submissão dos assun· tos locais aos interesses dos partidos políticos (fig. 34) o mesmo autor observa, ainda, que a situação de ineficiência dos governos de democracia representativa parecia ser a raiz do aumento do interesse do público em sistemas repre- sentativos e grupos de pressão fora do sistema polftico for- Proposta do orgao financiador Especificações do relatório Concepção do chefe coordenador da análise Projeto dos técnicos O que foi O que a comunidade e urbanistas implantado havia reivindicado Figura 35 -Diferentes interpretações de um problema e modelos de soluções conflitivo!: entre os técnicos e a população mal. Este fOI o caso da consolidação do Partido Verde, na Alemanha, que nasceu de um movimento de protesto. A situação era a mesma em outros países desenvolvidos, certa- mente nos EUA, e encontra paralelo também em nosso País. A segunda razão das dificuldades encontradas pelo Planeja- mento Urbano está no excessivo tecnocracismo que permea- va suas teorias e métodos de análise e implantação. Por um lado, a realidade viria a provar a dificuldade, se não a 1mpossi bi Iidade, do verdadei 1'0 "planejamento integ rado", com sua ambição de análise de absolutamente todos os as- pectos da realidade e de controle total do seu funcionamento. Por outro, a realidade sismava em não se amoldar aos mode- los rígidos idealizados pelos planejadores, nem era tão sim- pllsta quanto as suas visões profissionais idealistas faziam crer (fig. 35) Seguidamente verifica-se o dlstanciamento do planejado, fru- to de trabalhos tecnocráticos de gabinete, da realidade, princi- palmente quando da implantação dos planos, geralmente pre- vista a médio e longo prazos (GANS 1968, CASTELLS 1972, PRESSMAN & WILDAVSKY 1973) A dimensão política tam- bém ajudava a complicar a implantação, seus objetivos e programas, que ficavam, na verdade, a mercê dos interesses imediatistas ou eleitoreiros pois "planejadores e outros asses- sores técnicos têm influência apenas na medida em que puderem persuadir seus supenores políticos; o seu poder é o poder da idéia" (BECKMAN 1964 262) Além disto, na falta de um processo institucionalizado de participação real dos cidadãos na tomada de decisões, o pla- nejador estará sempre mergulhado no que SIMMIE (1974. 148) chama de um "paradoxo": por um lado, ele tem de justificar seu papel social e ser altruísta e neutro, por outro, ele possui dificuldades em assumir uma posição quanto à sua visão de eqüidade urbana. Ainda hOJe, em diversas situações e certamente no Brasil, quando o destino dos planos não é a gaveta dos políticos responsáveis por sua aprovação e implantação, suas partes aproveitadas são apenas aquelas que os interessam pessoal- mente ou para fins político-partidários. Nos anos 60 a avalia- ção do planejamento ja evidenciava a realidade da implan- tação e verificava-se que os resultados eram destoantes das reais necessidades das comunidades, que simplesmente não serviam aos objetivos propostos, ou que a devida integração entre os agentes nunca ( I'a alcançada. Evidentemente, a falta de processos de participação comu- nitária efetiva seria uma das maiores causas destes deman- dos, assim como a falta de sensibilidade quanto à dimensão temporal dos planos, tanto a política, relativa à continuidade administrativa, quanto a percebida pela população atingida, que espera resultados concretos em curtos espaços de tem- po. Assim, concordamos com CAULI (1982), quando afirma que contra as características típicas do Planejamento Urbano dos anos 60, tais como o formalismo, os modelos estáticos, a tecnocracia, a rigidez e a pretendida amplitude, víeram opor- se características do Desenho Urbano, como a informalidade, os modelos dinâmicos, a participação comunitária, a flexibili- dade e a especificidade. Indubitavelmente, uma das caracte- rísticas que mais minou a prática do Planejamento Urbano às vistas do público foi a sua falta de pragmatismo e de . resultados a curto prazo, ao que os processos de Desenho Urbano respondem com mais prontidão e consequência. EXistem diversas teorias e propostas metodológicas para o Desenho Urbano. Nenhuma delas é completa e suficiente por si própria e todas vêm complementar as metodologias de Planejamento Urbano e Arquitetura já conhecidas, que continuam sendo necessárias para a análise e o desenho do urbano. Como já comentamos, o Desenho Urbano não é uma disciplina mas define um campo disciplinar, para onde convergem, portanto, métodos de análise e atuação de várias disCiplinas. Diversas metodologias de Desenho Urbano, no entanto,nos levam a diferentes dimensões de análise da cidade e conse- quentemente a compreensões diferenciadas As diversas po- sições conceituais nos levam a identificar diferentes facetas das problemáticas analisadas que, por sua vez, solicitarão do "designer" diferentes posturas quanto ao desenvolvimen- to dos diversos caminhos para a elaboração das proposições de intervenção. Muitos afirmam estar aí a fragilidade do Desé· nho Urbano e a prova de que, por não possuir corpo teórico específico, ele não existiria corno uma disciplina indepen- dente. Entretanto, as suas necessidade e especificidade para a dimensão físico-ambiental das cidades já foram exaustiva- mente discutidas e comprovadas no desenvolver deste traba- lho. Sua alegada fragilidade tampouco existe porque é exata- mente da riqueza de dimensões analíticas e em sua comple- mentaridade que reside a sua força maior, possibilitando-nos uma maior oportunidade para uma melhor compreensão da complexidade do fato urbano. Evidentemente, seria um equívoco considerar única e inequí- voca qualquer das teorias existentes como, aliás, quer grande número de seus autores. Como em qualquer campo do co- nhecimento, teorias levam a análises e conclusões especí- Capítulo 5 Uma proposta metodológica ficas que, geralmente, só nos mostram certos ângulos da realidade. Nunca teremos, é verdade, uma teoria suficiente- mente holística para nos permitir uma compreensão completa do urbano. Devemos lembrar, como nos diz LANG (1987: 14), que "teorias bem-sucedidas consistem de generaliza- ções simples mas poderosas sobre o mundo e como ele funciona, de modo a nos permitir predizer com precisão as operações futuras" Por isto, acreditamos que para o Desenho Urbano necessi- tamos do conhecimento de diversas delas, utilizando-nos de cada uma conforme a especificidade do problema, e podendo fazer uso de diversas visando sua complementaridade. Na tentativa de compreensão do fato urbano os radicalismos teóricos são extremamente prejudiciais, às vezes tanto quan- to não possuir uma teoria e um procedimento metodológico embasando a atuação. Neste ponto observamos que não nos deteremos nos chama- dos "manuais" de Desenho Urbano ou projeto, pois são, em sua maioria, receitas metodológicas. Um dos mais antigos e conhecidos, chegando a levantar inúmeras considerações conceituais, é o de LYNCH (1962), que aborda o planejamento do sítio e a perfeita implantação do projeto em seu contexto urbano e natural. O mesmo autor nos apresentou, mais tarde, um excelente trabalho voltado para considerações extrema- mente pragmáticas sobre gerenciamento ambiental a nível regional e urbano, lidando com políticas, programas de ação para agências governamentais e técnicas de investigação e projeto (LYNCH 1976) Outros manuais são famosos, embora sem o mesmo peso conceitual, como o de CAMINOS & GOETHERT (1978), espe- cificamente destinado a projetos de lotes urbanizados em países de Terceiro Mundo, originado de um relatório elabo- rado pelos autores para o Banco Mundial; sua metodologia criteriosa aborda todos os aspectos, elementos e critérios da urbanização, inclusive os seus custos. Seguindo esta mes- ma linha, foi recentemente publicado por DAVIDSON & PAY- NE (org. 1983). baseado na experiência de uma firma consul- tora inglesa em projetos residenciais de baixa renda no Egito, um trabalho útil pelo enfoque didático e processual adotado para as fases da metodologia de trabalho. Finalmente, reme- temos os leitores para os trabalhos de PRINZ (1980) e BA- ZANT (1983). que apresentam todos os detalhes projetuais das diferentes fases do projeto urbano, verdadeiras receitas. Um interessante trabalho recentemente publicado como ma- nual didático foi o de BENTLEY et aI. (1985) que, no entanto, traz interessantes considerações conceituais. Para seus auto- res, o ambiente urbano deve ser "responsivo" às necessi- dades da população, o que se reflete em sete conceitos-meta de projeto para o meio ambiente, como a "permeabilidade" (capacidade da forma físico-espacial permitir a integração e acessibilidade). "apropriedade visual" (incorporar de apro- priar-se/incorporar repertórios simbólicos existentes) e "ro- bustez" (capacidade de responder bem a diferentes usos). Voltando à nossa temática principal. a maioria dos trabalhos publicados em nossa área partem de um corpo teórico-con- ceitual para definir os consequentes procedimentos metodo- lógicos de sua aplicação; muitas vezes partem de uma visão necessariamente limitadora da problemática. Neste sentido várias obras seriam dignas de nota por altamente influentes como as de LYNCH (1961). que viriam a ampliar o escopo de seu trabalho com suas diversas obras posteriores, CUL- LEN (1961) com a sua teoria do "townscape", ALEXANDER et aI. (1977) com sua trilogia de livros levando a uma lingua- gem de padrões para o desenho, ou, ainda, KRIER (1979) com sua visão contextualista e nostálgica. Comentaremos detalhada mente mUitos deles mais adiante. Muitos trabalhos em nossa área, previsivelmente comen- tados na Parte I, nos trazem basicamente preocupações e rebatimentos metodológicos oriundos da Arquitetura, alguns exagerada mente formalistas, como o clássico de SPREIRE- GEN (1965) que discutia o Desenho Urbano como a "arqui- tetura das cidades", uma possibilidade para o "embeleza- mento" dos espaços e conjuntos urbanos tomando por base apenas o "bom gosto" bastante subjetivo dos arquitetos. Este é também o caso de Rob e Leo KRIER, embora seus trabalhos possuam um embasamento histórico-morfológico bastante marcante, principalmente dentro do contexto euro- peu, como veremos. Nesta linha de preocupação que pode- mos chamar de mais formalista, remetemos o leitor para um trabalho interessante recentemente publicado por TRAN- CIK (1986). que propõe três teorias complementares no trata- mento do espaço urbano: a de figura-fundo. a das conexões e a do "lugar". Estas colaboram em sua proposta de enfoque integrado através de princípios de desenho, tais como "interll- gação do movimento sequencial" e "fechamento lateral e continuidade dos limites" (fig. 46); na verdade estes princí- pios mostram-se como sugestões de performance da forma urbana. Por outro lado, há trabalhos que buscam uma compreensão mais abrangente do urbano. buscando complementar seu embasamento em diversas disciplinas. Alguns estudos in- fluentes certamente caem nesta classificação, como os de RAPOPORT (1977. 1982). que partem da antropologia cultural e da comunicação não-verbal para analisar a forma urbana e seu significado. os de APPLEYARD (1981). com suas análi- ses do espaço da rua enquanto um sistema de atividades humanas. os de LYNCH (1981). com sua proposta de dimen- sões de performance para a boa forma urbana. Já mencio- nadas neste trabalho ou. ainda. o recente livro de GOSLlNG & MAITLAND (1984). um trabalho bastante abrangente sobre os conceitos de Desenho Urbano (DEL RIO 1987) Estes autores, assim como diversos outros. se detêm indiferen- I mente em várias disciplinas. como a psicologia. a sociologia. antropologia e a geografia, para embasar suas constatações. us conceitos e suas proposições metodológicas. I m aumentado consideravelmente a literatura dedicada a nálises mais fenomenológicas do espaço, importante como fortalecedora de nosso embasamento humanístico e concei- lual. Este caminho, sem dúvida. foi aberto pelo clássico do filósofo francês Gaston BACHELARD (1958). que discorria obre a poética dos espaços da casa-moradia. Diversos des- l trabalhos são oriundos da Geogrélfia, como os de TUAN (1974 e 1977). RELPH (1976) e WALTER (1988) Embora I UAN possa ser melhor situado. como veremos. na categoria nalítica da percepção do meio ambiente. podemos dizer ue estes trabalhos tentam uma compreensão da experiência humana mais amplado que permite nossas linguagens técni- cas, que não expressam a unidade e a coerência de nossa experiência holística dos "lugares" (WAL TER 1988) Neste sentido. destacam-se. na Arquitetura. os trabalhos de NORBERG-SCHULZ (1965. 1971. 1979). que desenvolvem conceitos fenomenológicos importantíssimos como "espaço Figura 46 (a, b) - Os enfoques de desenho destacados por TRANCIK: figura-fundo, conexão e lugar; sua aplicação em proposta de reestruturação física de Jarntorget, em Gotemburgo, Suécia, 1986 existencial" e "genius loci"; uma qualidade holística que ex- pressa a identidade, o caráter e a qualidade de um lugar. Sobre o "genius loci", APPLEYARD (1979: 22) observa que podemos gerar novos ambientes de qualidade "buscando inspiração no passado, no genius loei, nas necessidades e valores particulares das pessoas comuns ..." e que "muito disto vai depender em aprendermos como escutar as pessoas não-profissionais, compreender o que querem, como eles vêem, e realmente colaborar com eles ...". ,-"-~.._~" '.1 Gola Ríver ~--, ~,';'i.'~'" Walk 10 lhe . .". - Waler [->, Por estas razões, o leitor pode compreender porque venho tentando adotar para o Desenho Urbano um enfoque metodo- lógico que não se concentre em nenhuma teoria específica, mas que saiba buscar em várias delas a complementaridade necessária para a compreensão dos fenômenos urbanos. O que permeia as teorias adotadas talvez seja a tentativa de buscar sempre dimensões de análise e atuação sob a ótica do usuário. Ou seja, as formas com que ele vê, sente, com- preende, utiliza e se apropria da cidade, de sua forma, seus elementos e suas atividades sociais. Esta pustura é, sem dúvida, coerente com a definição para Desenho Urbano que propusemos na primeira parte deste trabalho. Para tanto, ajuda-nos o psicólogo-ambiental David CANTER (1977) sugerindo que o "sentido do lugar" (sense of place), aquela qualidade indiscritível mas que ao mesmo tempo diz tudo sobre a qualidade físico-ambiental dos espaços urbanos, é gerado na sobreposição de três esferas de nossa consciên- cia: atividades ou usos, atributos físicos propriamente ditos e as concepções e imagens. O modelo permite um diagrama que ajuda a compreender o conceito (fig. 47) e, realmente, para o ser humano o espaço e a forma só começam a fazer sentido a partir do momento em que nos conscientizamos desta qualidade através das três esferas de consciência. O enfoque metodológico que proponho a seguir busca isto e surgiu a partir da aceitação da hipótese básica das três esferas de vivência, com o Desenho Urbano atuando em seu "overlapping". Mas, para fins de facilidade de trabalho e por conformarem teorias e dimensões de análise bastante distintás, com distintos procedimentos metodológicos, pro- pomos a divisão da classificação da esfera "Concepções e Imagens" em duas: "ANÁLISE VISUAL" e "PERCEPÇÃO DO MEIO AMBIENTE". As outras seriam compreendidas através do "COMPORTAMENTO AMBIENTAL" e da "MOR- FOLOGIA URBANA". A Morfologia Urbana possui suas origens na Geografia, en- quanto as outras poderiam ser c1assificáveis dentro das" ciên- cias do comportamento" ou da nova classificação norte-ame- ricana de "meio ambiente-eomportamento" (environment- behavior). O leitor certamente notará a importãncia que da- mos às ciências do comportamento para o Desenho Urbano, e isto se justifica através da nossa busca por uma correta compreensão dos impactos e influências do meio ambiente sobre a ação, atitudes e valores de seus usuários, na busca da qualidade físico-ambiental. Neste sentido cabe citar excelente trabalho de LANG (1987). onde desenvolve a noção de uma teoria de arquitetura basea- da nas ciências comporta mentais. Ele está correto ao afirmar que "a qualidade da base do conhecimento para a ação do design necessita ser incrementada" e que as ciências com- portamentais nos oferecem muito para ajudar a desenvolver uma teoria "positivista" (explanatória de fenômenos e proces- sos) e teorias "normativas" (prescrições para a ação) (fig. 48). Os arquitetos, como já afirmamos, ainda possuem uma compreensão incompleta e inadequada sobre as inter-rela- ções entre o ambiente construído e o comportamento hu- mano. Quando na orientação teórica e metodológica para meus alu- nos de graduação e pós-graduação, venho também adotando esta sistemática. Não raro a turma é dividida em subgrupos que analisam a mesma área urbana sob o enfoque destas diferentes teorias e categorias de análise. Após o estudo e a discussão teórica de cada categoria, procede-se às visitas a campo para recolhimento de informações específicas. A análise e o intercâmbio dos achados entre os grupos tornam- se ricos e sua compreensão do urbano mais completa. Na fase de elaboração de propostas os alunos podem, então, utilizar-se deste rico conjunto de informações complemen- tares. Nosso objetivo, na discussão destas categorias de análise, é, antes de tudo, permitir ao leitor acesso a um enfoque AT~I:BVíO, fl,ICO} Figura 47 - Esquema representativo da formação do "sentido dos lugares", na confluência das dimensões física, comportamental e de percepções, sugerido por David CANTER --------- ---- - --- --- ---- ----- --, I 05JE.TO I ... . :I ""'PACTO; f--7 "'''o Al"lBI·'"11. I' ~ ,,, rRiNC(p(05' DE. : FO<.o Dt ATEN'..:b : B D~.Pl"IÊ.JJ(i "f'\biu.lTAL. : L ~ Figura 48 -Modelos conceituais sugeridos por LANG para teorias "normativa" (a) e "positiva" (b) da arquitetura metodológico possível para a atuação em Desenho Urbano. A discussão não será exaustiva, mas detalhada o suficiente para permitir a aplicação das categorias e o aprofundamento de seu estudo. A origem do conceito de Morfologia Urbana pode ser atribuída aos geógrafos alemães e franceses no primeiro quarto do século e, depois, aos ingleses (WHITEHAND 1981 e 1987, MERLlN 1988). Entendiam que "período morfológico" é uma "fase da história social e cultural que gera formas materiais distintas" (Wf-j:TEHAND 1981: 14) Sua aplicação no campo do Urbanismo e da Arquitetura pode, entretanto, ser identi- ficada primeiramente na Itália, na área da preservação histó- rica. Recentemente, um simpósio internacional na França não con- seguiu concluir uma definição consensual (MERLlN, 1988), entretanto, entendemos que a Morfologia Urbana deva ser vista como " ... o estudo analítico da produção e modificação da forma urbana no tempo" (SAMUELS c.1986: 2). Estuda, portanto, o tecido urbar.lo e seus elementos construídos for- madores através de sua evolução, transformações, inter-re- lações e dos processos sociais que os geraram. Os primeiros trabalhos nesta linha teriam surgido na Itália, precedidos pelas análises ditas tipológicas. Identifica-se Save- rio MURATORi como o primeiro a adotá-Ios para a análise e proJetação do urbano e da arquitetura, ainda nos anos 50. Ele registrava com seus alunos as tipologias do processo evolutivo e as mudanças ocorridas no tecido urbano de Vene- za. Deve-se ter em mente que os objetivos de estudos tipoló- gicos são de reduzir a algumas categorias analíticas a varie- dade das formas existentes, a partir da definição de critérios para sua identificação e classificação (MERLlN, 1988). A Morfologia Urbana surgiu a partir de um questionamento das atitudes modernistas em relação às cidades históricas e as relações sociais que as regem; por isto, SAMUELS (c. 1986) chega a afirmar ser inevitável que os pioneiros fos- sem os italianos devido à sua enorme herança urbanística e à contínua evolução e adaptação de suas cidades. Até hoje os italianos têm liderado nesta linha de trabalhos, muito bem representados pelos estudos para a cidade de Padova, desen- volvidos por um grupo de conhecidos pesquisadores, entre eles Aldo ROSSI e Carlo AYMONINO (AYMONINO et ai. 1970), seguidos pelos franceses, como
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