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Apostila ENEM - Liguagens e Códigos 19

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Curso Pré-ENEM Linguagens
Tema
A interação pela linguagem
Tópico de estudo
Recursos linguísticos e procedimentos argumentativos que contribuem, de forma incisiva, para que possamos reconhe-
cer, em um texto, quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo.
Entendendo a competência
Competência 7 – Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específi cas.
Você, provavelmente, já tentou convencer seus pais a deixá-lo ir a uma festa. Em algum momento, você também tentou 
ou vai tentar persuadir seu chefe a conceder-lhe um aumento. Se você atuar profi ssionalmente no comércio, pode ter a 
missão de seduzir os consumidores da qualidade de um produto ou de uma ideia. Embora parecidas, por envolverem 
em maior ou em menor grau a exposição dos nossos pontos de vista acerca de algo, as situações acima descritas não 
são exatamente iguais. Trata-se de experiências diversas, que se realizam linguisticamente de formas diversas. Essa 
competência da prova do Enem se propõe a avaliar a capacidade de percebermos os recursos, os argumentos e os 
valores de que alguém se utiliza para evidenciar a sua opinião. Entendendo as estratégias utilizadas, passamos a ter 
uma atuação mais crítica e mais livre diante do mundo.
Desvendando a habilidade
Habilidade 23 – Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos 
procedimentos argumentativos utilizados.
Você já deve ter acompanhado um discurso político de campanha eleitoral. Certamente, ao ver e ouvir um candidato, 
podemos logo deduzir que ideias ele defende e que tipo de imagem ele faz do nosso povo e dos nossos valores. A partir 
disso, podemos selecionar aqueles com quem mais nos identifi camos para dar nosso voto. Em outros momentos, so-
mos capazes de reconhecer certas inconsistências nesses mesmos discursos, quando percebemos que a imagem que 
emissor faz de si ou a que ele faz de seu público não é correta. O primeiro passo, portanto, para convencermos uma 
pessoa é sabermos a quem estamos nos dirigindo e que imagem de mundo queremos passar. Há diversos recursos 
na língua que podem nos esclarecer as intenções comunicativas do emissor e que podem reforçar, para o receptor, a 
função daquele texto específi co. Isso é importante porque a má gerência das imagens dos interlocutores pode levar a 
problemas de ordem comunicativa e a preconceitos diversos.
Situações-problema e conceitos básicos
Sempre que nos comunicamos, formamos uma imagem do que somos (o que pensamos, o que fazemos, qual o •
nosso papel no meio social e na relação comunicacional) e, também, uma imagem do outro, do receptor a quem 
se destina a nossa mensagem. Sem isso, a comunicação pode se tonar inefi ciente, impossibilitando a interação 
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necessária para que convençamos alguém do que queremos. Analise, por exemplo, a proposta de campanha pu-
blicitária abaixo:
Do site Desencannes
A peça publicitária acima nunca foi veiculada. Ela faz parte de um site que trata de forma irônica algumas possi-
bilidades linguísticas e imagéticas para determinados produtos e serviços. A quem, especifi camente, ela se dirige? 
Que recursos permitem essa dedução?
Sabemos que, de forma geral, a publicidade visa à venda de produtos e serviços, tendo como público-alvo o 
consumidor. A peça acima, porém, trabalha com a função conativa de uma maneira mais específi ca. Isso porque 
o interlocutor do texto não é o consumidor comum, mas um comerciante, que deve estar atento às exigências da 
Agência Nacional de Vigilância Sanitária para não ter seu negócio fechado. 
Para isso, foram utilizados alguns recursos expressivos. O slogan, por exemplo, paródia de uma frase conhecida, 
contribui não só para a realização da identifi cação cognitiva, como também para reforçar a competência do anun-
ciante. A junção do slogan com a imagem deixa claro qual é o público-alvo pretendido pelo emissor do texto.
Observe, agora, o seguinte trecho da música de Caetano Veloso: •
Língua [Trecho]
Gosto de sentir a minha língua roçar
A língua de Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar
A criar confusões de prosódias
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da rosa no Rosa
E sei que a poesia está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade
E quem há de negar que esta lhe é superior
E deixem os Portugais morrerem à míngua
“Minha pátria é minha língua”
Fala Mangueira! Fala!
Flor do lácio sambódromo
Lusamérica latim em pó
O que quer o que pode esta língua?
[…]
Nos cantos falamos como quem inveja negros
Que sofrem horrores nos guetos do Harlem
Livros, discos, vídeos à mancheia
E deixem que digam, que pensem, que falem.
VELOSO, Caetano. Língua. In: Velô.
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Você consegue compreender todas as palavras e referências utilizadas no texto? O que isso pode sugerir em 
relação ao público a que se dirige o poema?
Veja que, além da recriação dos versos de Castro Alves (penúltimo verso) e da inserção de múltiplos referentes 
da cultura ocidental (por exemplo, “fl or do lácio” para se referir à língua portuguesa), Caetano faz alusão a uma mú-
sica de Jair Rodrigues (último verso) e cita um fragmento de Camões (“Minha pátria é minha língua”). 
Isso permite identifi car características do público-alvo pressuposto pelo autor, que, ao que tudo indica, deve 
possuir um repertório cultural amplo para conseguir reunir todas as referências em um todo que seja coerente.
Segue abaixo trecho de mensagem de • e-mail trocada entre o Vice-Presidente Al Gore e o Governador George W. 
Bush, do Texas:
Do: Sr. Gore
Para: Sr. Bush
Assunto: Campanha eleitoral
Congratulações por sua indicação partidária. Penso que as vitórias mútuas desta noite nos proporcionam uma 
chance rara para a mudança no modo de se conduzir campanhas eleitorais e de se restabelecer a confi ança dos elei-
tores em nosso processo eleitoral.
Assim sendo, eu o desafi o a aceitar minha proposta de que nós dois rejeitemos o uso do chamado “dinheiro fácil” 
na veiculação de propaganda eleitoral. Eu darei o primeiro passo pedindo ao Comitê Nacional Democrático para não 
veicular nenhuma propaganda eleitoral não regulamentada através do uso de verbas de procedência ignorada, a me-
nos que o Partido Republicano passe a agir nesse sentido.
Portanto, está nas mãos do senhor e de seu partido o início eventual de uma guerra acirrada de propaganda; o 
senhor tem o poder de unir-se a mim na proibição do “dinheiro fácil”. Se o senhor estiver disposto a fazer a coisa certa, 
nós podemos mudar a política para sempre.
Traduzido do New York Times on line, 16/03/2000.
A mensagem-desafi o de Al Gore tem como destinatário o seu adversário político, mas é possível interpretar que 
ela tenha sido tornada pública propositalmente, para convencer o eleitor do caráter desonesto do outro candidato. 
Como isso se verifi ca?
Lembre-se de que discurso político é marcado por estratégias de distanciamento que ressaltam a autoridade 
do locutor, e por traços de solidariedade que buscam o envolvimento dos interlocutores. No fi nal da mensagem de 
Al Gore, lê-se: “Se o senhor estiver disposto a fazer a coisa certa, nós podemos mudar a política para sempre”. A 
primeira parte, introduzida por conectivo condicional, propõe um afastamento do emissor de uma postura que ele 
considera antiética; a segunda, no plural, inclui ambos dentro de uma mensagem positiva.
Em muitos casos, vemos que confusões e “ruídos” comunicativos são criados, quando fazemos uma imagem er- •
rada do nosso receptor. Veja o seguinte trecho, retirado da seção de comentários de um site, e analise a relação 
entre emissor e receptor:
Eunão acredito nos políticos porque eles não me dão importância. Na condição de povo, estou enjoado de ouvir 
promessas jamais cumpridas.
http://bit.ly/HQQIzP
Muitos são os políticos, por exemplo, que fazem discursos altamente sedutores, com promessas mirabolantes, 
achando que seu público não possui o senso crítico necessário para analisar a viabilidade do que se está propondo. 
O leitor que produziu o comentário acima transcrito é, certamente, um dos que não será mais atingido por candida-
tos que o imaginem assim ao discursarem.
Observe este outro exemplo:
“O que dói nem é a frase (Quem paga seu salário sou eu), mas a postura arrogante. Você fala e o aluno nem presta 
atenção, como se você fosse uma empregada.”
Entrevista dada por uma professora. Folha de S.Paulo, 03/06/01 (adaptado).
No trecho como se você fosse uma empregada, fi ca pressuposto algum tipo de discriminação social? 
Certamente, a imagem que a emissora do discurso possui do seu receptor (ou de seus receptores, já que se 
tratava de uma entrevista para um jornal) não levou em consideração, certamente, que isso feriria a dignidade de 
empregadas domésticas, como se elas não necessitassem de atenção.
Observe os três textos abaixo, que possuem o mesmo objetivo, mas se dirigem a públicos distintos, propondo •
perfi s também distintos de trabalhador:
Almeida e Costa comprão para remeterem para fora da Província, huma escrava que seja perfeita costureira, en-
gomadeira, e que entenda igualmente de cozinha, sendo mossa, de bôa fi gura, e afi ançada conduta para o que não 
terão duvida pagala mais vantajosamente; quem a tiver e queira dispor, pode dirija-se ao escriptorio dos mesmos na 
rua da fonte dos Padres, N. 91.
Gazeta Commercial da Bahia, 19 de setembro de 1832.
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Costureira
Fábrica de roupas precisa c/ experiência de 2 anos comprovada em carteira Comparecer c/ documentos na Rua 
São Cristóvão, 814. São Cristóvão, RJ.
EXTRA, 12/ 09/ 2002.
Anúncios classifi cados
Vendedoras. Ótima aparência, excelente salário. Rua tal, no tal. Recusada. Boutique cidade precisa moça boa apa-
rência entre 25 e 30 anos. Marcar entrevista tel. no tal. Recusada. Moças bonitas e educadas para trabalhar como 
recepcionistas. Garantimos ganhos acima de um milhão. Procurar D. Fulana das 12,00 às 20,00 horas, na rua tal, no tal. 
Recusada. Senhor solitário com pequeno defeito físico procura moça de 30 anos para lhe fazer companhia. Não precisa 
ser bonita. Endereço tal. Desta vez ela não disfarçou a corcunda nem pôs óculos escuros para esconder o estrabismo. 
Contratada.
CUNHA, Helena Parente. Cem mentiras de verdade, 1985.
Percebeu as semelhanças e diferenças existentes entre eles?
O primeiro texto, de 1832, em grafi a da época, traz o anúncio de compra de um escravo, trabalhador não remu-
nerado, portanto. O emissor dirige-se a possíveis donos, em linguagem cortês.
O segundo texto, em linguagem concisa, quase telegráfi ca, dirige-se a possíveis trabalhadores remunerados, 
com experiência em carteira. Parte-se do pressuposto de que é interesse do receptor o anúncio e, talvez por isso, 
não se propõe nenhuma estratégia linguística motivadora, que não seja o uso do imperativo.
O terceiro texto não é, de fato, um anúncio. Perceba a ausência de referente (rua, número, telefone) e a presença 
de personagens (anunciados nos dois últimos parágrafos). O emissor propõe uma refl exão sobre a valorização da 
aparência física em linguagem sugestiva.
Alguns recursos linguísticos e procedimentos argumentativos contribuem, de forma incisiva, para que possa-
mos reconhecer, em um texto, quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo. Veja os seguintes 
exemplos:
1. Ele não estudou, mas conseguiu aprovação em todos os exames.
O conectivo “mas” assume papel argumentativo importante nessa frase. Todos já sabemos que ele possui 
valor adversativo, unindo orações que apontam para conclusões opostas.
É preciso reconhecer também, no entanto, que essa conjunção está introduzindo o elemento mais forte da 
série. Para o emissor, a atenção deve recair sobre o fato de ele ter conseguido a aprovação em todos os exames, 
e não sobre o fato de ele não ter estudado.
Perceba que dessa forma o emissor adota o que se convencionou chamar de “estratégia de suspense”. Pri-
meiro ele argumenta a favor da não aprovação (“Ele não estudou”) para, em seguida, refutar essa ideia com “mas 
conseguiu aprovação em todos os exames”.
2. Embora ela tenha emagrecido mais de dez quilos, não conseguiu entrar no vestido.
O conectivo “embora” possui valor concessivo. Isso signifi ca que, a exemplo do “mas” (adversativo), ele tam-
bém pode unir orações que apontam para conclusões opostas. 
Todavia, enquanto o “mas” introduz o argumento mais forte da série, o “embora”, como toda conjunção con-
cessiva, introduz o argumento mais fraco.
A presença de conectivos assim, no início do discurso, provoca o que se convencionou chamar de “estratégia 
de antecipação”, pois o interlocutor sabe de antemão que o argumento introduzido pelo operador é fraco em 
relação ao próximo a ser enunciado.
Muitas vezes esses operadores são utilizados com intuito de transmitir de forma suave uma informação nega-
tiva. Imagine, por exemplo, que há necessidade de se reportar o atraso de um funcionário. Pode-se dizer:
Embora a faxineira tenha chegado atrasada, fez todo o serviço.
Dependendo do contexto, trata-se de uma forma linguística capaz de prejudicar ou de auxiliar a faxineira.
3. João deixou de beber.
A presença da locução “deixar de” nos permite pressupor que, antes, João bebia. Perceba, também, que o emis-
sor, ao proferir esse enunciado, parte do princípio de que seu receptor já domina esse conteúdo pressuposto, sob 
pena de a comunicação se tornar incoerente ou, no mínimo, pouco efi ciente.
Os marcadores de pressuposição são elementos linguísticos que nos permitem compreender informações se-
cundárias, adicionais, não explícitas nos enunciados.
Essa característica possibilita ao emissor trabalhar os conteúdos pressupostos para construir enunciados argu-
mentativamente interessantes. Analise, por exemplo, o segmento:
Lamentamos não aceitar cheques.
Nele, o emissor utiliza o verbo “lamentar” para inserir de forma pressuposta a ideia de que o estabelecimento 
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não aceita cheques. No entanto, constituído dessa forma, o enunciado sugere que o receptor já tinha domínio dessa 
informação (o estabelecimento não aceita cheques), o que atenua o tom desagradável dela. 
4. O presidente estaria disposto a enviar mais tropas para o campo de batalha.
Repare que a presença do futuro do pretérito, nesse caso, faz com que a informação “estar disposto a enviar 
mais tropas para o campo de batalha” seja atribuída a outra pessoa (uma outra “voz”, portanto), que não o emis-
sor: é como se ele se eximisse de responsabilidade sobre o conteúdo transmitido.
A polifonia é o fenômeno linguístico que ocorre quando, num mesmo texto, ouvem-se outras “vozes” (que não 
a do emissor), sejam elas explícitas, sejam elas implícitas. Trata-se de um fenômeno interessante porque permite 
que o emissor mostre perspectivas diversas da sua, para se identifi car com elas ou refutá-las. 
Determinados elementos gramaticais podem funcionar como índices da presença, no texto, de uma outra 
“voz”. Veja:
Maria não é relaxada. Pelo contrário, tem organizado muito bem a casa.
Repare que “tem organizado muito bem a casa” não se opõe a “Maria não é relaxada”. O que explica a presen-
ça do termo “pelo contrário”, que possui claro valor adversativo, é a presença de uma outra “voz” que afi rma ser 
Maria uma pessoa relaxada. O termo em questão, portanto, introduz uma oposição ao pensamento defi nido por 
essa outra voz, e não uma oposição ao enunciado anterior.
A moda do momento é a “inclusão” de alunos com necessidades especiais.Ótimo. Politicamente corretíssimo. 
Mas a verdadeira inclusão tem que começar pela melhora da qualidade do ensino de toda a população.
Ao se colocar a palavra “inclusão” entre aspas, o emissor quis atribuir essa fala a defensores de uma determi-
nada política da qual ele quer se distanciar.
5. Todos os candidatos devem levar documento de identidade.
O verbo “dever”, dependendo do contexto, pode indicar que o emissor trata a ação de “levar documento de 
identidade” como algo obrigatório, possível ou provável. Os indicadores modais (ou modalizadores) são elemen-
tos linguísticos capazes de determinar o modo como aquilo que se diz é dito, sendo, por isso, essenciais para a 
correta compreensão do texto.

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