Buscar

Jogos tradicionais e brincadeiras infantis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

DACOSTA, LAMARTINE (ORG.). A T L A S D O E S P O R T E N O B R A S I L . RIO DE JANEIRO: CONFEF, 2006 1. 35
Jogos tradicionais e brincadeiras infantis
ALEXANDRE MORAES DE MELLO
Definições Jogos e esportes tradicionais são atividades
lúdicas, competitivas e/ou cooperativas, que refletem a
identidade cultural de um determinado grupo étnico,
distinguindo-se dos esportes de apelo internacional sujeitos a
padrões organizacionais e regras universais. Já os jogos e
brincadeiras tradicionais infantis são atividades passadas de
geração a geração, em geral aprendidas pelas crianças mais
novas com as de mais idade, durante o próprio ato de brincar.
No Brasil, a denominação de jogo é mais apropriada quando
existe o caráter competitivo, enquanto que o termo brincadeira
engloba os jogos, mas também atividades não competitivas,
como o faz-de-conta, brincadeiras-de-roda, atividades com
areia, terra, água, etc. Embora o termo brinquedo tenha sido
utilizado por alguns autores em substituição a jogo ou
brincadeira – como, por exemplo, Câmara Cascudo desde a
primeira edição do Dicionário do Folclore Brasileiro, datada de
1954 –, os pesquisadores atuais indicam como brinquedo o
objeto utilizado na ação de brincar.
Os jogos tradicionais são também denominados de jogos
populares, sejam aqueles praticados por adultos ou pela
população infantil, principalmente por crianças integrantes de
famílias menos privilegiadas. Estes ocorrem com freqüência
em calçadas, ruas, quintais, terrenos baldios e pátios escolares,
ao passo que aqueles se tornam parte da vida cotidana de seus
praticantes em seus momentos de tempo livre e de oportunidade
de encontro grupal. Focalizando-se o grupo infantil, o de maior
proeminência no Brasil rural e rural-urbano, admite-se
geralmente que as brincadeiras de faz-de-conta são atividades
baseadas nas representações de situações adultas construídas
pelas crianças, em geral observadas no seu cotidiano. São
praticadas desde cedo, quando as crianças entram na etapa
das atividades simbólicas. Exemplos são as brincadeiras de
casinha, escolinha, ônibus, vendinha, etc. As brincadeiras-de-
roda são acompanhadas por cantigas e possuem certa
movimentação do grupo, geralmente disposto em círculo. São
exemplos: a canoa virou, atirei o pau no gato, carneirinho-
carneirão, ciranda-cirandinha, entrei na roda, fui no Itororó,
pirulito que bate-bate, o cravo brigou com a rosa, sambalelê,
Terezinha de Jesus e outras.
Origem Os jogos tradicionais são manifestações de criação
regional ou nacional mas com raízes de identificação entre
países de cultura similar ou mesmo distantes. O surgimento de
vários desses jogos e brincadeiras infantis está ligado à
apropriação pelas crianças e reprodução à sua maneira, de
práticas culturais observadas entre adultos. O jogo de
amarelinha ou academia parece ter origem na Roma e Grécia
antigas, a partir de práticas culturais de adultos. Na Grécia foi
registrado há séculos o jogo de pedrinhas (jogo das cinco pedras)
a partir de desenho numa ânfora exposta no Museu de Nápoles,
e anteriormente jogado com pequenos ossos ou em peças de
marfim e outros materiais.
Contudo, precisar a origem dessas atividades é impróprio dado a
que ela se confunde com a origem dos entes humanos. Daí na
obra intitulada “Homo Ludens – O jogo como elemento da cultura”,
Johan Huizinga indica que a origem do jogo antecedeu a origem
da cultura. Isso porque a constituição da cultura pressupõe a
existência da sociedade humana, enquanto o jogo já aconteceria
entre os animais antes do surgimento do homem. Portanto,
Traditional games and children’s games
Traditional sports and games (TSG) are playful activities,
competitive and/or cooperative, which reflect the cultural identity
of a particular ethnic group. This makes TSG distinct from sports of
international appeal that are subject to organizational standards
and to universal rules and regulations. Children’s traditional games
and plays are activities that are handed down from generation to
generation, picked up by young children during their play with
older children. In Brazil TSG have been either inherited from Native
Brazilians or acquired from European immigrants, especially Italian
and German. Italian bocce, for instance, is the traditional game
most practiced in the country today. Adult TSG have been kept
alive either as a form of leisure or as a way to preserve group and
community identity. It is possible to notice that there has been
some evident reduction in TSG practices in both versions – children’s
and adults’. However, there seems to be another way to preserve of
TSG brought to light by national and international studies: the
pedagogical use of TSG, which would include the development of
sport and physical education.
conhecer os jogos de um grupo humano é conhecer sua cultura e
a partir dela conhecer como seus participantes lidam com o jogo.
Século XVI e XVII No Brasil, jogos e brincadeiras na forma
encontrada em várias partes do mundo, na sua maioria, indicam
ter vindo com os colonizadores, muito embora fosse rica a cultura
lúdica infantil indígena como já observada quando da chegada
dos primeiros navegantes às costas brasileiras. Há registros de
brincadeiras naquele período, como por exemplo, o que expressa
o depoimento do Padre Fernão Cardin, descrito por Florestan
Fernandes na coletânea de textos sobre as práticas educacionais
na sociedade tupinambá: “(...) têm seus jogos, principalmente
os meninos, muitos vários e graciosos, em os quais arremedam
muitos gêneros de pássaros, e com tanta festa e ordem que não
há mais que pedir”.
Semelhante à cabra-cega praticada pelas crianças brasileiras,
Philippe Ariès identificou através da análise de uma tapeçaria do
século XVI, o jogo sendo realizado na França por adultos e, em
quadros holandeses da segunda metade do século XVII, observou
adultos e crianças que participavam conjuntamente desse mesmo
jogo. Verificou também, através do diário de um médico da corte de
Henrique IV de França, que ainda criança, Luis XIII (nascido em
1601) também brincava de cabra-cega, esconde-esconde e outros
jogos. A existência em alguns gráficos da amarelinha, desenhados
no chão pelas crianças e nos quais figuram o céu e o inferno,
significando o acesso ao céu resultado de uma jogada bem sucedida
e ao inferno de uma jogada errada, aparece em pinturas da Idade
Média, o que pode indicar ser o registro da influência marcante da
igreja católica naquele período.
A cultura brasileira possui fortes elementos de origem africana. O
Brasil é um dos países de maior contingente populacional negro do
mundo. Entretanto, provavelmente pela própria opressão imposta
à população negra, não se observam muitos registros quanto às
influências na prática dos jogos tradicionais tanto de adultos como
infantis ao longo do tempo. Através da oralidade, muitos jogos,
brincadeiras e brinquedos devem ter recebido influências africanas
que se incorporaram à cultura brasileira. Alguns estudos
sociológicos e antropológicos registram passagens sobre
brincadeiras entre meninos de engenho e meninos escravos nas
casas-grandes e senzalas, onde a dominação branca era reproduzida
na atividade infantil. No Maranhão, estado de significativa
população negra, há o registro do jogo capitão-de-campo-amarra-
negro, que retrata a captura de escravos foragidos, mas que, por
sua vez, possui um determinado espaço físico onde não podem ser
pegos – a mancha, que provavelmente representa a área de
resistência em que se constituíam os quilombos. Entre os jogos de
adultos, a capoeira é a herança mais evidente desta fuga lúdica e
emancipatória.
Século XIX e XX Em determinadas áreas do Brasil as
colonizações mais recentes, como, entre outras, a alemã e a
italiana no sul, a japonesa e a italiana em São Paulo, através
da sua cultura trouxeram influências para as atividades lúdicas
das crianças alémde introduzir na cultura local seus jogos de
adultos. Quanto maior a interação dos imigrantes com a
população brasileira, mais as atividades se enriqueceram. É o
caso da influência italiana em São Paulo, onde se pode citar a
capucheta, um tipo de pipa feita com jornal e sem varetas,
como resultante dessa interação entre as crianças. A bocha,
por sua vez, tem tido indicações de ser o jogo tradicional mais
praticado no país nos dias presentes, embora seja uma
manifestação típica italiana.
Situação Atual Com denominações diferentes e variações
em forma, jogos e brincadeiras tradicionais estão presentes em
todas as regiões geográficas do Brasil. Grande número está
concentrado nas áreas urbanas, principalmente nas periferias,
onde há mais espaços físicos disponíveis para adultos e crianças
interagirem de forma autônoma. No meio rural são registrados
também jogos e brincadeiras diversas, porém com estímulos
sazonais devido às suas características, como, por exemplo, a
pipa ou papagaio que depende da freqüência dos ventos, ou a
finca, jogo em que a criança desloca-se lançando um objeto
pontiagudo no solo, puxando linhas até completar um percurso,
e que depende do chão molhado do período de chuvas.
Os jogos infantis tradicionais mais praticados no Brasil têm sido
levantados e caracterizados por Alexandre de Mello com o apoio de
colaboradores de várias regiões do país, como se pode apreciar no
mapa deste capitulo. Vários jogos estão preservados nos dias atuais
por interesse de crianças e até de adolescentes. Entretanto, a redução
do número de quintais, as questões de segurança, os programas
televisivos e as novas opções de atividades lúdicas através da
informática têm reduzido a sua freqüência de modo sensível.
Como parte das atividades das instituições de educação infantil e
séries iniciais do ensino fundamental, as brincadeiras-de-roda são
em geral orientadas pelas professoras e professores e realizadas
com grande entusiasmo pelas crianças. Entretanto, mesmo na escola
e principalmente fora dela, a sua freqüência tem apresentado
redução. Quanto aos jogos de adultos, a sobrevivência no Brasil
tem ocorrido como uma alternativa de lazer, tanto quanto de
manutenção de identidade grupal e comunitária. E em ambas as
dimensões – infantil e adulta – a perspectiva revelada por estudos
internacionais (vide mapa) é a do uso educacional dos jogos, o que
incluiria no caso o desenvolvimento do esporte e da Educação
Física em qualquer país.
Fontes Mello, A. M. Psicomotricidade, educação física e jogos
infantis. São Paulo: Ibrasa, 2002; Mello, A M. Jogos Populares e
educação física. Boletim de Intercâmbio (SESC/AN) 1981, 8,
37-45; Aries, P. História social da criança e da família. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 1981; Cascudo, L. C. Dicionário do
folclore brasileiro. São Paulo: Melhoramentos, 1979; Fernandes,
F. Folclore e mudança social na cidade de São Paulo. Petrópolis:
Vozes, 1979; DaCosta, L.P. Mapping the wordwide trends of
traditional sports and games. Proceedings of Symposium on
Traditional Games, Duderstadt 2000; Holanda, S.B. Raízes do
Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1979; Huizanga, J. Homo
ludens – O jogo como elemento da cultura. São Paulo:
Perspectiva, 1971; Medeiros, E.B. Jogos para recreação infantil.
Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961; Melo, V. Folclore infantil.
Rio de Janeiro: Cátedra/INL, 1981; Miranda, N. 200 jogos
infantis. Belo Horizonte: Itatiaia, 1983; Souza, L.C. Concepção
da professora da pré-escola sobre a função dos brinquedos
cantados: um estudo descritivo e etnográfico. Rio de Janeiro:
EEFD/UFRJ, Dissert. de Mestrado, 1994; INDESP. Esporte como
identidade cultural – Coletânea. Brasília, 1996; Marina Vinhas
e Beatriz Ferreira (UNICAMP).
1.36 DACOSTA, LAMARTINE (ORG.). A T L A S D O E S P O R T E N O B R A S I L . RIO DE JANEIRO: CONFEF, 2006
Amarelinha
Boca de forno
Lenço-atrás
Queimada
Amarelinha
Chicotinho
queimado
Esconde-esconde
Queimada
MALHA
Amarelinha
Boca de forno
Esconde-esconde
Finca
Lenço-atrás
Queimada
Sela
BOCHA
MALHA
Amarelinha
Esconde-esconde
Lenço-atrás
Queimada
Sela
BOCHA
BOLÃO
Amarelinha
Boca de forno
Lenço-atrás
Mãe-da-rua
Pique bandeira
Queimada
Boca de forno
Queimada
Boca de forno
CAPOEIRA
CORRIDA DE ARGOLINHAS
Esconde-esconde
Lenço-atrás
BOCHA
BOLÃO
Sela
BOCHA
BOLÃO
BOCHA
MALHA
PETECA
MALHA
PETECA
PETECA
VAQUEJADA
Boca de forno
Chicotinho queimado
CAPOEIRA
Amarelinha
Boca de forno
CAPOEIRA
Boca de forno
Finca
Lenço-atrás
Boca de forno
Boca de forno
Esconde-esconde
JOGO DE PAU
Boca de forno
Queimada
Amarelinha
Boca de forno
Boca de forno
CORRIDA DE ARGOLINHAS
Boca de forno
CORRIDA DE ARGOLINHAS
Boca de forno
Chicotinho queimado
Amarelinha
Boca de forno
Queimada
Sela
BOCHA
MALHA
TRUCO
CORRIDAS A CAVALO,
COM APOSTAS
Nordeste
DADOS – COPO DE COURO
VAQUEJADA
REGATAS DE SAVEIROS E JANGADAS
Sul
TABULEIRO DE DAMAS
TRUCO
Centro-Sul
TABULEIRO DE DAMAS
DADOS – COPO DE COURO
Região do Pantanal
CORRIDAS A CAVALO,
COM APOSTAS
Todo o brasil,
em bares
QUEDA DE BRAÇO
SINUCA
Norte
VAQUEJADA
*Outros: praças, clubes, balneários, praias, açudes, lagos, rios, salões,
quadras de esportes, campos de futebol, áreas residenciais, etc.
Locais de maior freqüência dos jogos tradicionais
por Grande Região e Brasil
Preferred places of traditional games practices per region
Principais jogos infantis praticados no Brasil por estado
Major children’s games found in Brazil per state
Principais jogos tradicionais do Brasil
por estado e região
Major traditional games found
in Brazil per state and region
Tendências gerais dos esportes e jogos tradicionais (TSG), 2000
(n= 28 países de cinco continentes – 35 especialistas respondentes)
Traditional sports and games (TSG) – General trends – 2000 (n = 28 countries of five continents – 35 respondent experts)
Fonte / source: DaCosta, L.P. , Mapping the worldwide trends of traditional sports and games.
Proceedings of Symposium on Traditional Sport and Games, Duderstadt, 2000.
Número médio de crianças participantes
por jogo tradicional em Grandes Regiões e Brasil
Average number of participating children per game and region
Jogos tradicionais sazonais e não-sazonais
Seasonal and non-seasonal traditional games – %
Percentuais em Grandes Regiões e Brasil / per region
*População de crianças de 7 a 10 anos no Brasil: 13 182 595
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.
Idades de maior freqüência na participação
de jogos tradicionais por Grande Região e Brasil*
Ages of most participating children in TSG per region
(n = 13 million) – Brazil 2000

Continue navegando