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EA D 2 Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais A educação pode ajudar a nos tornarmos melhores, se não mais felizes, e nos ensinar a assumir a parte prosaica e viver a parte poé- tica de nossas vidas (MORIN, 2003, p. 11). 1. OBJETIVOS • Caracterizar a Educação de Jovens e Adultos e compreen- der suas especificidades. • Repensar e identificar o papel do educador atuante das classes de Educação de Jovens e Adultos sobre a prática pedagógica, especialmente como formador de cidadãos conscientes de seu papel na sociedade. • Reconhecer a importância dos aspectos socioafetivos en- tre professores e alunos da Educação de Jovens e Adultos na mediação da construção de conhecimentos. © Educação de Jovens e Adultos64 2. CONTEÚDOS • Educação de Jovens e Adultos. • Educador de Jovens e Adultos. • Aspectos socioafetivos. 3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que você leia as orientações a seguir: 1) Tenha sempre à mão o significado dos conceitos expli- citados no Glossário e suas ligações pelo Esquema de Conceitos-chave para o estudo de todas as unidades desta obra. Isso poderá facilitar sua aprendizagem e seu desempenho. 2) Para que você possa conhecer um pouco mais a respei- to da declaração mundial sobre a educação para todos, assunto que será estudado nesta unidade, recomenda- mos que você acesse o site disponível em: <http://unes- doc.unesco.org/images/0008/000862/086291por.pdf>. Acesso em: 17 set. 2010. 4. INTRODUÇÃO À UNIDADE Na Unidade 1, fizemos um breve histórico da Educação de Jovens e Adultos no Brasil e conhecemos as leis que garantem a oferta dessa educação, além de refletir criticamente sobre a in- tenção política que a permeia. Para dar continuidade aos nossos estudos, vamos repensar o papel dos educadores que atuam nes- sas classes. Iniciamos o século 21 com esperanças e possibilidades de um mundo melhor, e a todo momento surgem novas realizações nas quais os avanços tecnológicos, científicos e culturais aconte- cem em um pequeno espaço de tempo e em um imenso espaço geográfico, causando, assim, fortes impactos na sociedade. 65 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais Decorrente da globalização e dos recursos tecnológicos, o mer- cado de trabalho está cada vez mais exigente e seletivo, requerendo profissionais com capacidade de transferência de conhecimentos, capacidade crítica, iniciativa, além de relacionamento cooperativo. Assim, as pessoas com pouca ou nenhuma escolarização sentem, na pele, o crescimento das desigualdades e da injustiça social, uma vez que são duplamente exclusas, isto é, não têm acessibilidade à escola e, consequentemente, ao mercado de trabalho. O problema da exclusão social, no Brasil, ao longo de sua história, tem gerado nos sistemas educacionais grande impacto, pois, inacreditavelmente, milhões de brasileiros ainda não se be- neficiam do ingresso nem da permanência na escola. Relatório divulgado pelo Movimento Todos pela Educação aponta que, em 2008, quase 40% dos jovens com 16 anos ainda não ti- nham concluído o Ensino Fundamental, ainda que a idade esperada para o término dessa etapa seja 14 anos (TRIGUEIRO, 2010). Apresentando-se bastante diversa e, ao mesmo tempo, com- plexa, a EJA apresenta características e especificidades que não po- dem ser, de forma alguma, desconsideradas no cenário educacional. Os alunos dessa modalidade de ensino, de acordo com o Conselho Nacional de Educação (CNE) (2000, p. 9), podem ser de- finidos como: [...] homens e mulheres, trabalhadores/ras, empregados/das e de- sempregados/das ou em busca do primeiro emprego; filhos, pais e mães; moradores urbanos de periferias, favelas e vilas. São sujeitos sociais e culturais marginalizados nas esferas socioeconômicas e edu- cacionais, privados do acesso à cultura letrada e aos bens culturais e sociais, comprometendo uma participação mais ativa no mundo do trabalho, da política e da cultura. [...] Trazem a marca da exclusão social, mas são sujeitos do tempo presente e do tempo futuro, for- mados pelas memórias que os constituem enquanto seres tempo- rais [...] Muitos, nunca foram à escola ou dela tiveram que se afastar, quando crianças, em função da entrada precoce no mercado de tra- balho, ou mesmo por falta de escolas. Jovens e adultos que, quando retornam à escola, o fazem guiados pelo desejo de melhorar de vida ou por exigências ligadas ao mundo do trabalho. São sujeitos de di- reitos, trabalhadores que participam concretamente da garantia de sobrevivência do grupo familiar ao qual pertencem. © Educação de Jovens e Adultos66 5. EDUCANDOS JOVENS E ADULTOS E ESCOLA Para iniciarmos este tópico, é preciso conhecer quem é o alunado da EJA. São pessoas que, na idade considerada ideal de estar no Ensino Fundamental, foram impedidas por algum motivo de con- tinuar seus estudos. Os motivos para tal afastamento da escola são vários, como, por exemplo, alto índice de reprovação, falta de estímulo em permanecer na escola e, especialmente, necessidade de ingressar no mercado de trabalho para auxiliar no sustento da casa. A fim de melhor compreender o que estamos falando, va- mos conhecer a história de Josué e de Esmeralda: História de Josué e Esmeralda ––––––––––––––––––––––––– Josué tem 17 anos, nasceu num povoado perto de Paulo Afonso, no norte da Bahia. É o quarto dos seis filhos de um pequeno sitiante conhecido como Dô e de Das Dores, uma mulher decidida que acompanha o marido, todos os dias, no serviço da roça. Josué não foi à escola quando criança porque a família precisava da ajuda dele no cuidado com os animais: algumas galinhas, alguns porcos, dois cavalos e três vacas. Os irmãos mais velhos aprenderam a ler com uma professora que morava no povoado. Quando chegou a vez de Josué, a professora mudou de cidade e a escola mais próxima ficava muito longe. O irmão mais velho resolveu procurar trabalho numa cidade com mais recursos e foi para Itabuna. Josué, que na época tinha 14 anos, foi junto. Sem encontrar emprego, mudaram para Vitória da Conquista. Lá o irmão traba- lha como pedreiro e, dependendo do serviço, leva Josué para ser ajudante. Perto de onde moram há uma escola que todas as noites enche de jovens. Josué se animou porque sentia na pele como é dura a vida de quem nem sabe ler. Ele é agora um aluno da EJA. Esmeralda é mineira de Montes Claros. Foi criada pela avó, que só colocou a menina na escola quando ela já tinha 10 anos. Esmeralda parecia imensa ao lado de seus colegas de menos idade. Isso era motivo de muita gozação. A pro- fessora parecia ensinar bastante, mas ela aprendia pouco. Foi reprovada duas vezes na mesma série e sua avó achou que ela não dava para o estudo. Casou com 16 anos e logo vieram os filhos: Jacira, Helena, Selma, Geraldo, Benedito, Graça e Aparecida. Cuidar da casa e dos filhos consumiu todo seu tempo. Mas os meninos foram à escola: Graça é professora, Benedito e Geraldo são motoris- tas, Jacira trabalha num escritório como secretária e Aparecida está no colegial. Com os filhos criados e viúva, Esmeralda descobriu que podia realizar um dos seus sonhos: ir à escola para aprender o que sempre quis: ler, escrever, entender 67 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais tudo que escuta, fazer as contas do que gasta e muitas coisas mais. Ajudada pelos filhos saiu à procura da escola mais perto de sua casa. E está muito feliz, dizendo que estudar “é melhor do que podia imaginar (BRASIL, 2006, p. 3-4). ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––Ao retornar a seus estudos após um período afastada da escola, a visão de mundo dessa pessoa é bastante diferenciada. Como protagonistas principais de suas histórias e experiências vi- vidas, homens e mulheres chegam à escola com valores e crenças constituídos. A EJA recebe alunos e alunas: com traços de vida, origens, idades, vivências profissionais, históri- cos escolares, ritmos de aprendizagem e estruturas de pensamento completamente variados. A cada realidade corresponde um tipo de aluno e não poderia ser de outra forma, são pessoas que vivem no mundo adulto do trabalho, com responsabilidades sociais e familia- res, com valores éticos e morais formados a partir da experiência, do ambiente e da realidade cultural em que estão inseridos (BRA- SIL, 2006, p. 4). Jovens e adultos, ao escolher o caminho da escola, viabili- zam uma via oportuna para promover seu desenvolvimento pes- soal. Perceba a fala de Marcelo, aluno da EJA: O meu maior desejo é poder terminar meus estudos, fazer um cur- so técnico ou mesmo uma faculdade, pois já estou percorrendo metade do caminho dos meus desejos. Espero da vida a capacida- de infinita de realizar com êxito qualquer tarefa e decidir agir com otimismo e autoconfiança, porque dias prósperos não vêm por aca- so, nascem através de muita luta e persistência (BRASIL, 2006, p. 5). Podemos reconhecer, assim, que os alunos e as alunas da EJA têm uma visão de mundo influenciada por seus traços culturais de origem, entrelaçados à sua vivência social, familiar e profissional. Podemos dizer que eles trazem uma noção de mundo mais relacio- nada ao ver e ao fazer, uma visão de mundo apoiada numa adesão espontânea e imediata às coisas que vê. Ao escolher o caminho da escola, a interrogação passa a acompanhar o ver desse aluno, deixando-o preparado para olhar. Aberto à aprendizagem, eles vêm para a sala de aula com um olhar que é, por um lado, um olhar receptivo, sensível, e, por outro, é um olhar ativo: olhar curioso, ex- plorador, olhar que investiga, olhar que pensa (BRASIL, 2006, p. 5). © Educação de Jovens e Adultos68 Isso fica muito claro nas palavras de Diocrésio, aluno da EJA, conforme Brasil (2006, p. 5-6): Acredito que duas das minhas melhores qualidades são a perse- verança e a esperança, porque já passei por inúmeras dificulda- des, mas hoje sou melhor que ontem. Com as dificuldades a gente aprende a valorizar as conquistas. Especialmente no Brasil, a Educação de Jovens e Adultos está profundamente ligada à situação de extrema pobreza e ex- clusão social de vários setores da população. Todavia, esses alunos não devem e não podem ser caracterizados de forma única, pois a diversidade cultural de nosso país proporciona traços diferencia- dos de região para região. Geralmente, acreditamos que a motivação principal que leva os alunos jovens e adultos a querer retornar à escola seja somente a conquista de melhores oportunidades profissionais. Entretan- to, faz-se necessário salientar que essa não é única razão; outras oportunidades também são motivacionais para esse alunado. Con- forme Brasil (1996, p. 42), muitos alunos, quando questionados, referem-se, também, como motivação: [...] à vontade mais ampla de entender melhor as coisas, se ex- pressar melhor, de ser gente, de não depender sempre dos outros. Especificamente as mulheres, referem-se muitas vezes também ao desejo de ajudar os filhos com os deveres escolares ou, simples- mente, de lhes dar um bom exemplo. Com relação aos adolescentes, estes, normalmente, retor- nam à escola após um período de fracassos sucessivos e apresen- tam, portanto, conflitos com a rotina escolar. Nesse caso, é papel do educador a reconstrução de um vínculo favorável com a escola. Para isso, o professor deverá, em seu projeto pedagógico, privi- legiar os modos, os gostos e as expectativas característicos dessa etapa de vida. A imagem que os educandos têm da escola tem muito a ver com a imagem que têm de si mesmos dentro dela. Experiências de fra- casso e exclusão normalmente produzem nos jovens e adultos uma auto-imagem negativa. Nos mais velhos, essa baixa autoestima se traduz em timidez, insegurança, bloqueios. Nos mais jovens, é co- 69 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais mum que a baixa auto-estima se expresse pela indisciplina e auto- -afirmação negativa ("se não posso ser reconhecido por minhas qualidades, serei reconhecido por meus defeitos") (BRASIL, 1996, p. 43). Em qualquer um desses casos, ou seja, de pessoas mais jo- vens e de pessoas mais velhas, será fundamental que o educa- dor auxilie esses alunos a reconstruir sua imagem da escola, das aprendizagens escolares e, especialmente, de si próprios. Neste momento, gostaríamos de fazer uma reflexão com você sobre a letra da música a seguir, chamada É preciso saber viver, de Roberto Carlos (2010): É preciso saber viver ––––––––––––––––––––––––––––––––– Quem espera que a vida Seja feita de ilusão Pode até ficar maluco Ou morrer na solidão É preciso ter cuidado Pra mais tarde não sofrer É preciso saber viver Toda pedra do caminho Você pode retirar Numa flor que tem espinhos Você pode se arranhar Se o bem e o mal existem Você pode escolher É preciso saber viver É preciso saber viver É preciso saber viver É preciso saber viver Saber viver, saber viver! –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Nessa música, podemos reconhecer que a vida é um eterno aprendizado. Viver é aprender! Além de simplesmente viver, é pre- ciso saber viver e, para tanto, é necessário estar disposto a apren- der sempre, pois qualquer momento da vida é tempo de aprender. © Educação de Jovens e Adultos70 A vida, tanto nas sociedades anteriores como na sociedade contemporânea, oferece inúmeras oportunidades para desenvol- vermos aprendizagens e, consequentemente, formas de pensa- mentos autoconscientes e que transcendem nosso contexto de vivência. No entanto, não podemos negar que a escola é um lugar pri- vilegiado para desenvolvermos o pensamento reflexivo. Isso por- que, segundo Brasil (1996, p. 17), "a escola é o lugar onde as pes- soas vão para aprender coisas, tendo a oportunidade de pensar sem estarem premidas pela necessidade de resolver problemas reais imediatos". Portanto, a escola é um espaço privilegiado para que todos os que a frequentam tenham acesso à educação da cidadania, aprendendo a discutir e a participar democraticamente, bem como a desenvolver a responsabilidade pessoal pelo bem-estar comum. 6. CONHECIMENTOS JÁ ADQUIRIDOS Os alunos que procuram tardiamente a escola já adquiriram vários conhecimentos ao longo de sua trajetória de vida. Entre es- ses conhecimentos, destacamos o "saber sensível" e o "saber co- tidiano". Caracterizado pela Filosofia como um saber pré-reflexivo, o saber sensível refere-se ao saber do corpo, fundamentado na percepção das coisas e do outro. É um saber que todos nós pos- suímos, sustentado pelos cinco sentidos, embora na vida moderna seja pouco valorizado. Tanto para crianças como para jovens e/ou adultos, esse saber sensível viabiliza ao aluno abrir-se a um conhe- cimento mais formal e reflexivo. Os alunos jovens e adultos, pela sua experiência de vida, são plenos deste saber sensível. A grande maioria deles é especialmente re- ceptiva às situações de aprendizagem: manifestam encantamento com os procedimentos, com os saberes novos e com as vivências proporcionadas pela escola. Essa atitude de maravilhamento com o conhecimento é extremamente positiva e precisa ser cultivada e 71 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais valorizada pelo(a)professor(a) porque representa a porta de en- trada para exercitar o raciocínio lógico, a reflexão, a análise, a abs- tração e, assim, construir um outro tipo de saber: o conhecimento científico. Olhar, escutar, tocar, cheirar e saborear são as aberturas para nosso mundo interior. Ler e declamar poesia, escutar música, ilustrar tex- tos com desenhos e colagens, jogar, dramatizar histórias, conversar sobre pinturas e fotografias são algumas atividades que favorecem o despertar desse saber sensível (BRASIL, 2006, p. 7). Já o saber cotidiano, por sua própria natureza, configura-se, conforme Brasil (2006, p. 07), como um saber reflexivo, saber da vida vivida, saber amadurecido, fruto da experiência, nascido de valores e princípios éticos, morais já formados, anteriormente, fora da escola. Esse saber origina-se da produção de soluções que seres hu- manos criam em decorrência dos desafios que enfrentam no dia a dia, caracterizando-se, assim, como um saber aprendido e consoli- dado em modos de pensar e agir. [...] fundado no cotidiano, é uma espécie de saber das ruas, fre- quentemente assentado no "senso comum" e diferente do elabo- rado conhecimento formal com que a escola lida. É também um conhecimento elaborado, mas não sistematizado. É um saber pou- co valorizado no mundo letrado, escolar e, freqüentemente, pelo próprio aluno (BRASIL, 2006, p. 7). Relacionados às práticas sociais, estão os conhecimentos que os alunos trazem como bagagem cultural, que norteiam tanto os sa- beres cotidianos, como também os saberes aprendidos na escola. 7. EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA) A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade específica da Educação Básica que visa atender a um público ca- racterizado por não ter cursado, em sua infância ou adolescência, os Ensinos Fundamental ou Médio no período destinado a essa atividade, seja pela oferta irregular de vagas, seja pelas inadequa- ções do sistema educacional ou pelas condições socioeconômicas desfavoráveis. © Educação de Jovens e Adultos72 Ressaltamos que a Educação de Jovens e Adultos não é su- pletiva. A função suplência desapareceu desde que a Lei de Dire- trizes e Bases da Educação Nacional n. 9.394/96, compatibilizada com a Constituição Nacional, reconheceu que todo cidadão brasi- leiro, sem exceção de faixa etária, sexo, religião, etnia ou cor, tem direito a oito anos de ensino se assim o quiser. Dessa forma, essa modalidade de educação merece trata- mento diferenciado e necessita de uma metodologia específica. Nos cursos supletivos (com carga horária reduzida), é ainda mais difícil superar tais dificuldades, de modo a favorecer a inserção do aluno na cultura científica. No caso do jovem com mais de 14 anos, fica sob sua responsabilidade fazer ou não a opção pelo exercício da titularidade de seu direito. A motivação no ensino de adultos torna-se imprescindível e fundamental para seu êxito, uma vez que o adulto não é obrigado a estudar. Por esse motivo, a dificuldade para o aprendizado muitas vezes está associada à falta de motivação do aluno em virtude da falta de tempo dedicado ao estudo, da indiferença de professores quanto aos seus problemas pessoais e da falta de clareza e objeti- vidade dos docentes em apresentar os conteúdos na sala de aula. A educação para todos, tanto na Educação Básica como na educação continuada, no sentido de melhorar a qualidade de vida, deve oportunizar à pessoa o desenvolvimento de potencialidades, para que trabalhe com dignidade, saiba tomar decisões, resolver problemas e, em especial, continuar aprendendo. De acordo com a Declaração Mundial de Educação para To- dos: Na perspectiva de uma educação continuada, a escola deverá mo- ver-se em sintonia com os quatro pilares da educação para o século XXI, de modo a permitir, aos seus educandos, o desenvolvimento das habilidades de aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver, as quais possibilitarão o exercício de suas capacidades intelectuais e coletivas, ampliando as oportuni- dades educacionais e aperfeiçoando as suas qualificações técnicas 73 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais e profissionais, direcionando-as para a satisfação de suas necessi- dades e as da sua sociedade (DECLARAÇÃO MUNDIAL DE EDUCA- ÇÃO PARA TODOS in VÓVIO et al., 2000, p. 73). Nesse contexto, de acordo com Moretto (2000, p. 97a), a es- cola assume papel importantíssimo, [...] ao selecionar criteriosamente, dentre todos os conhecimentos desenvolvidos, aqueles relevantes para a iniciação dos jovens no mundo social. Ao mesmo tempo, exerce seu papel transformador ao preparar criticamente os jovens, capacitando-os a analisar sua sociedade, avaliar as relações existentes, equacionar seus proble- mas e propor transformações. À medida que concebe o conhecimento como historicamen- te construído, como mediadora entre o conhecimento e os alunos, bem como entre estes e o mundo social adulto, a escola almeja atuar como elo integrador no cotidiano escolar, no trabalho e no meio social. Desse modo, para o professor, torna-se relevante compreen- der a sala de aula como espaço privilegiado para as interações que nela ocorram, seja entre professor-aluno, seja entre aluno/aluno, viabilizando a construção do conhecimento. Lembramos que, na formação das capacidades cognitivas e afetivas de nossos alunos, as interações assumem papel importantíssimo. 8. EDUCADOR DE JOVENS E ADULTOS Algumas das qualidades indispensáveis ao educador de jovens e adultos são: a confiança na capacidade de todos em aprender e ensinar, a capacidade de solidarizar-se e a disposição de enfrentar as dificuldades como desafios estimulantes. Assumindo tal postura, torna-se imprescindível conhecer seus alunos, bem como suas ex- pectativas, sua cultura e suas necessidades de aprendizagem. Nessa modalidade de ensino, tanto o professor como o alu- no devem ser caracterizados como “trabalhadores". Essa condição se apoia nas raízes histórico-culturais em que se foram formando como "ser humano-social". © Educação de Jovens e Adultos74 No processo de apropriação dos resultados da prática social, a ação do professor deve ser mediadora, pois: [...] o indivíduo forma-se, apropriando-se dos resultados da história social e objetivando-se no interior dessa história, ou seja, sua for- mação realiza-se através da relação entre objetivação e apropria- ção. Essa relação efetiva-se sempre no interior de relações concre- tas com outros indivíduos, que atuam como mediadores entre ele e o mundo humano, o mundo da atividade humana objetivada. A formação do indivíduo é, portanto, sempre um processo educati- vo, mesmo quando não há uma relação consciente (tanto de parte de quem se educa, quanto de parte de quem age como mediador) com o processo educativo que está se efetivando no interior de uma determinada prática social (DUARTE apud BASSO, 1998, p. 8). Esclarecemos que esse processo de mediação, realizado pelo professor entre o aluno e a cultura, independe do nível de escolaridade e da idade do aluno. Contudo, cada modalidade de ensino tem sua própria especificidade. Para que essa mediação se torne efetiva, o educador da EJA precisa apropriar-se das condições sócio-históricas de produção em que os alunos e ele próprio se constituíram como seres sociais, ocu- pando uma posição na sociedade e no mundo do trabalho atual. Para a atividade docente, faz-se necessário conhecer o aluno e ter consciência daquilo que ele idealiza. Isso se torna ainda mais importante quando falamos de Educação de Jovens e Adultos, pois essa modalidade de ensino é destinada às pessoas para as quais a vida foi, de certa forma, injusta. Professores competentes e compromissadossão indispensá- veis para a universalização da educação, para o bom funcionamen- to da Educação Básica e para a erradicação do analfabetismo. Isso inclui a modalidade de ensino EJA. A formação docente e, especialmente, a qualificação para educar jovens e adultos têm sido incipientes, uma vez que, ainda hoje, há pessoas que acreditam que basta apenas ter a experiên- cia em ensinar crianças para desenvolver, em uma sala de aula de jovens e adultos, as mesmas metodologias e avaliações. 75 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais Nos cursos oferecidos pelas instituições formadoras, tanto em nível médio ou superior, sentimos a necessidade de aprofundamentos teórico-práticos no que se refere à educação de jovens e adultos, presente na fragilidade da formação do professor, devido à não in- clusão da EJA nos currículos das instituições, bem como a dificul- dade de colocar em prática os princípios políticos e pedagógicos defendidos pela EJA, por falta de subsídios que deveriam ter sido adquiridos no curso de formação (MOURA, 2003, p. 63). Não podemos negar que algo comum entre esses alunos, sejam jovens, sejam adultos, é o fato de eles serem alunos/traba- lhadores que têm somente o período noturno para se dedicar aos estudos. Desse modo, os professores que atuam nessa modalida- de devem buscar metodologias de ensino atraentes e apropriadas. Conforme Cury (2000, p. 56): não perceber o perfil distinto destes estudantes e tratar pedagogi- camente os mesmos conteúdos como se tais alunos fossem crian- ças ou adolescentes seria contrariar mais do que um imperativo legal. Seria contrariar um imperativo ético. Diante disso, como já foi dito, é importante que o professor da EJA seja capaz de se solidarizar com os alunos, demonstrando confiança tanto na capacidade de aprender e ensinar como a dis- posição de encarar dificuldades como desafios estimulantes. Coerentemente com essa postura, é fundamental que esse educa- dor procure conhecer seus educandos, suas expectativas, sua cul- tura, as características e problemas de seu entorno próximo, suas necessidades de aprendizagem. E, para responder a essas neces- sidades, esse educador terá de buscar conhecer cada vez melhor os conteúdos a serem ensinados, atualizando-se constantemente. Como todo educador, deverá também refletir permanentemente sobre sua prática, buscando os meios de aperfeiçoá-la (BRASIL, 1996, p. 46). Compreendendo seu próprio processo de aprendizagem, jovens e adultos estarão mais aptos a auxiliar outras pessoas a aprender, uma vez que muitas dessas pessoas já desempenham o papel de educadores na família, no trabalho e na comunidade. Ressaltamos que é de responsabilidade do educador da EJA favorecer acesso dos alunos aos diversos materiais educativos, © Educação de Jovens e Adultos76 como jornais, revistas, livros, cartazes, textos, vídeos etc., pois, muitas vezes, estes pertencem a grupos sociais desfavorecidos economicamente, tendo pouco acesso às fontes de informação. Para tanto, o educador deverá atualizar-se e refletir sobre sua prática, constantemente, a fim de compreender e conhecer melhor os conteúdos a serem ensinados. O educador deve, ainda, com relação aos objetivos e con- teúdos educativos, integrantes de um projeto pedagógico, definir com clareza as estratégias pretendidas, auxiliando os alunos em seu processo de aprendizagem; uma vez baseado no pressuposto da diversidade, encontrará em uma mesma turma alunos com ba- gagens culturais diferenciadas. Para que os alunos possam avaliar e compreender seu pró- prio processo de aprendizagem, é especialmente importante que o educador de jovens e adultos avalie, constantemente, seus pro- gressos e carências, a fim de colaborar efetivamente para sua au- tonomia. Finalmente, os educadores devem estar atentos, pautando- -se no princípio de que o processo educativo não se encerra no espaço e no período da aula propriamente dita. Isso significa que o convívio em uma escola ou em outro tipo de centro educativo, para além da assistência às aulas, pode ser uma importante fonte de desenvolvimento social e cultural. Perceba que a prática do professor representa o eixo central de sua formação continuada, uma vez que, com base nela e nos problemas que emergem na sala de aula, o conhecimento teórico se torna significativo como instrumento primordial na reflexão do seu fazer pedagógico. Há que se utilizar a vivência do adulto no trabalho, o que lhe per- mitiu condições de sociabilidade e aprendizado específico de de- terminados conteúdos, com base para o ensino dos conteúdos re- gulares a serem aprendidos, tornando a aprendizagem significativa para ele (CARVALHO; SENA, 2000, p. 102). 77 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais Assim, é importante que o professor traga para a sala de aula situações reais vividas por seus alunos, tendo em vista que a von- tade do adulto em aprender os conteúdos curriculares está vincu- lada à compreensão que tem de sua aplicabilidade para enfrentar melhor seus problemas pessoais e profissionais. Portanto, o adulto tem vontade de aprender o que está re- lacionado às suas próprias experiências, ou seja, seus interesses pessoais, pois "aprender é construir explicações para a realidade, num processo ativo e criativo de resolução de problemas" (ROCHA apud CAMPOY, 2002, p. 1). Isso significa que, para o professor de EJA, se torna necessá- rio problematizar as situações que os adultos trazem para a sala de aula, a fim de aguçar seu raciocínio e fomentar o interesse pela aprendizagem, evitando dizer que as respostas emitidas por eles estão erradas. Com essa postura, o professor tenta ver nos erros de seus alunos um importante instrumento mediador de aprendizagem. De acordo com Ribeiro (1997,p. 47-48), dentre os principais objetivos da Educação de Jovens e Adultos, podemos destacar que os alunos sejam capazes de: • Dominar instrumentos básicos da cultura letrada, que lhes per- mitam melhor compreender e atuar no mundo em que vivem. • Ter acesso a outros graus ou modalidades de ensino básico e pro- fissionalizante, assim como a outras oportunidades de desenvol- vimento cultural. • Incorporar-se ao mundo do trabalho com melhores condições de desempenho e participação na distribuição da riqueza produzida. • Valorizar a democracia, desenvolvendo atitudes participativas, além de conhecer direitos e deveres da cidadania. • Desempenhar, de modo consciente e responsável, seu papel no cuidado e na educação das crianças, no âmbito da família e da comunidade. • Conhecer e valorizar a diversidade cultural brasileira, respeitar di- ferenças de gênero, geração, raça e credo, fomentando atitudes de não-discriminação. © Educação de Jovens e Adultos78 • Aumentar a auto-estima, fortalecer a confiança na sua capacida- de de aprendizagem, valorizar a educação como meio de desen- volvimento pessoal e social. • Reconhecer e valorizar os conhecimentos científicos e históricos, assim como a produção literária e artística como patrimônios cul- turais da humanidade. • Exercitar sua autonomia pessoal com responsabilidade, aperfei- çoando a convivência em diferentes espaços sociais. Tal educação deve contribuir oferecendo alternativas de atua- ção e intervenção que proporcionem ao aluno condições de atingir um nível de desenvolvimento correspondente à sua faixa etária. 9. ASPECTOS SOCIOAFETIVOS Para Almeida (1999), a afetividade faz-se também presen- te quando o professor conhece, escuta e conversa com seus alu- nos. Esses são os componentes mais presentes nas práticas desses professores e, provavelmente,a motivação maior que seus alunos têm para não desistir de estudar. Compartilhando com o pensamento de Snyders (1993), de que, para o aluno, o conhecimento é trazido pela afetividade, Cunha (1994, p. 70) afirma que: [...] as atitudes e valores dos professores que estabelecem relações afetivas com os alunos repetem-se e intrincam-se na forma como tratam o conteúdo e nas habilidades de ensino que desenvolvem. É por meio da afetividade que têm com seus alunos que es- ses professores vêm conseguindo avanços na aprendizagem. Cada aluno traz sua história de cansaço, de tristezas e de decepções. São histórias vividas na aspereza, na pobreza, nos direitos negados, no salário que mal dá para sobreviver e, especialmente, na educação subtraída. Isso se reflete no emocional do professor, que se preo- cupa em saber por que seus alunos faltaram, em como foi o fim de semana etc. Essa relação cria vínculos de amizade e a certeza de que os alunos podem contar com uma palavra amiga, com um gesto de 79 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais solidariedade, bem como faz que esses adultos mantenham acesa a chama da esperança em melhores dias, sonhados e esperados pela conclusão de seus estudos. Reconhecer o adulto como pessoa autônoma, com experiên- cias de vida diferenciada do professor e (re)conhecer que, acima de tudo, em sua conquista cotidiana, há desafios sempre novos é mostrar-se afetivo com o adulto. 10. TEXTOS COMPLEMENTARES A leitura dos textos seguintes será de grande importância, pois ajudará você a compreender a importância da EJA na vida dos jovens e adultos. O Texto 1 revela a realidade da EJA: os alunos buscam a es- cola para satisfazer necessidades particulares e para se integrar à sociedade letrada da qual fazem parte por direito, mas da qual não podem participar plenamente quando não dominam a leitura e a escrita. Texto 1 A procura pela escola ––––––––––––––––––––––––––––––––– Sabemos que a procura de jovens e adultos pela escola não se dá de forma simples. Ao contrário, em muitos casos, trata-se de uma decisão que envolve as famílias, os patrões, as condições de acesso e as distâncias entre casa e escola, as possibilidades de custear os estudos e, muitas vezes, trata-se de um proces- so contínuo de idas e vindas, de ingressos e desistências. Ir à escola, para um jovem ou adulto, é antes de tudo um desafio, um projeto de vida. Além disso, a escola que os alunos têm em seu imaginário, aquela que conhe- cem porque já passaram por ela anos atrás ou porque acompanham o cotidiano de seus filhos, nem sempre é aquela com que se deparam nos primeiros dias de aula. Nesses casos, esperam encontrar o modelo tradicional de escola, ou seja, um lugar onde predominam aulas expositivas, com pontos copiados da lou- sa, onde o(a) professor(a) é o único detentor do saber e transmite conteúdos que são recebidos passivamente pelo(a) aluno(a). Esperam muita lição de casa porque acreditam que a quantidade de treino leva a boa aprendizagem. Espe- cialmente, os alunos mais velhos se mostram resistentes à nova concepção de escola que os coloca como sujeitos do processo educativo, que espera deles práticas ativas de aprendizagem. Muitos, ao se depararem com uma aula na qual © Educação de Jovens e Adultos80 são convidados a pensar juntos, em grupo; a resolver desafios diferentes dos exercícios mais convencionais; a ler textos literários; a aprender com a música, a poesia, o jornal; a fazer matemática com jogos e cálculos diversos, construir projetos; estranham, resistem e acreditam não ser esse o caminho para aprender o que a escola ensina. Neusa, uma aluna de EJA, descreve bem esse quadro: “Na primeira semana de aula, eu estava muito assustada, não entendia nada, tudo era diferente. Cheguei até a pensar em desistir, mas criei coragem e conti- nuei, e hoje estou muito feliz.” Este cenário poderá ser transformado na medida em que a escola investir no acolhimento desse(a) aluno(a), que é alguém especialmente receptivo à apren- dizagem, repleto de curiosidade e que vai para a sala de aula desejoso de novas experiências. Da parte do(a) aluno(a), como bem pudemos ver no depoimento de Neusa, ele(a) também precisa ajustar suas expectativas à realidade que en- contra quando volta para a escola, um desafio que, por vezes, mostra-se custoso demais, incorrendo, em muitos casos, no abandono, em nova desistência. A aluna Nilda, de 28 anos, ao ingressar numa escola de EJA, ficou surpresa ao saber que teria de assistir a aulas de artes. Com o tempo, através da experiência obtida no curso, seu olhar sobre a escola se transformou: “Quando estudei na escola, a educação artística era uma coisa mecânica, não dava prazer em estudar. Mas fui obrigada a mudar de opinião ao ingressar nesse colégio [...] De tudo que aprendi, sei que educação artística não se limita so- mente à régua e compasso. Existe muito além dos limites de simples traçados. Digamos que a arte é infinita e maravilhosa. Simples, completa e fascinante”. Nesse sentido, além do aumento da oferta de vagas, é preciso considerar as condições de permanência do(a) aluno(a) jovem e adulto na escola, bem como aquelas que lhe permitam concluir a escolarização. Grande parte dos alunos jovens e adultos que buscam a escola espera dela um espaço que atenda às suas necessidades como pessoas e não apenas como alunos que ignoram o conhecimento escolar. Por outro lado, todos eles acreditam que a escola possa imprimir-lhes uma marca importante e por isso apostam nela. [...]A professora Suemi, de São Paulo, começou o seu trabalho com uma grande conversa. Cada um falando de si, de suas histórias, de suas famílias. Num dado momento da conversa, a professora jogou a questão: por que procuraram a es- cola? Algumas das respostas que ouviu são bastante intrigantes. Vejamos um trecho do registro feito por ela, sobre essa conversa: “Por que procurei a escola? Nenhuma palavra era vã, cada uma vinha carregada e repleta de seu sentido essencial. O discurso era interior e todos estavam como num transe. A realidade de um se confundia com a diferença do outro numa busca comum: “... quero poder escrever o que eu penso”, 15 anos, mulher. “... quando tem um sistema novo pra pôr no carro, tenho que pedir pra alguém ler e explicar”, 22 anos, homem. “... ler as placas, os ônibus, sair da cidade”, 25 anos, homem. “...Não dá pra melhorar o meu negócio”, 32 anos, mulher. “...nas paradas da tropa, meu pai me ensina em pedaços de jornal”, 48 anos, homem. 81 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais “... saber o que está escrito num livro, numa placa, num bilhete”, 62 anos, mulher. “...poder escrever e ler uma carta. O que está escrito na nota fiscal que eu levo da loja”, 27 anos, homem. “... passar no teste para um emprego melhor”, 27 anos, homem. A escola aparece como um direito roubado nos tempos do esconde-esconde e hoje resgatado com o passo lento do reumatismo, com as noites sem namoro e com a ausência na mesa do jantar. Os homens voltaram mais cedo e as mulhe- res primeiro formaram seus filhos. Nas falas, aparece a própria sociedade na sua crueza e a esperança apesar e ainda um aleijão não saber ler e escrever, como uma dor, uma deformidade” (BRASIL, 2010). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– O Texto 2 propõe a diversidade de origens do alunado da EJA. Texto 2 As diferentes raízes culturais ––––––––––––––––––––––––––– Nos centros urbanos, um traço presente nas classes de educação de jovens e adultos é o da diversidade de origens. Encontram-se, nos espaços da sala de aula, pessoas que migraram de suas cidades de origem em buscade melho- res condições de vida, trabalho, moradia, estudos e de novas oportunidades. O movimento migratório, que data de décadas, teve seu auge nos anos de 1960 e 1970 e continua levando um sem-número de famílias ou pessoas a fincarem raízes noutros espaços, a mergulharem em outras culturas. Especialmente nas metrópoles das regiões Sul e Sudeste é comum que uma sala de EJA componha um retrato do Brasil: os traços físicos, modos de falar, agir e reagir, formas de lazer, preferências culinárias ou musicais dos alunos nos remetem a todos os cantos do país. Esse quadro é revelador, inclusive, da enorme riqueza da cultura brasileira marcada pela diversidade, pela pluralidade. Noutras regiões, é comum encontrarmos alunos e alunas que saíram do campo, de um espaço rural, e dirigiram-se para a cidade “para continuar os estudos” ou “para arrumar um trabalho fixo”. Se a origem de nossos alunos é diversa, naturalmente, o acúmulo e a bagagem cultural deles também são. Quando falamos em cultura estamos nos referindo ao conjunto de ações, elaborações, construções, produções e manifestações de um grupo de pessoas, que se dá por meio e através de múltiplas linguagens e pode ser identificado na forma de falar, atuar, reagir, pensar e expressar de cada pessoa desse grupo. Especificamente no caso dos alunos e alunas jovens e adultos, referimo-nos a uma cultura popular do fazer, que se aprende fazendo e vendo fazer. Ela possui uma dimensão muito pragmática, voltada para a ação, que gosta de se movimentar e fazer junto uma construção marcadamente com- partilhada e coletiva. O conjunto cultural formado pelas pessoas que se encontram numa mesma sé- rie, numa sala de aula, é, então, extremamente rico. A cultura marca a visão de mundo e é a base onde a construção de conhecimentos vai se dar. Para relembrar as raízes dos alunos e alunas, a professora Leda, de São Paulo, usou o tema alimentação e suas memórias afetivas como foco de interesse para © Educação de Jovens e Adultos82 estimular os jovens e adultos a escrever com naturalidade e fluência. Esses tex- tos, impregnados pelo poder sensorial da comida de infância, também resgatam tradições culinárias antigas, que se perdem na memória, pois Leda sente que os alunos migrantes se acostumam com os hábitos de São Paulo muito depressa. Com os textos produzidos, ela montou um livro de receitas da classe. Na apre- sentação do livro, Leda escreveu: “Neste livro estão reunidas algumas das memórias mais queridas e, por que não?, doloridas de nossa experiência alimentar de quando ainda éramos bastan- te jovens. Estas lembranças ajudam-nos a compreender os costumes caseiros do povo do qual fazemos parte, nascidos em diferentes regiões do país. [...] Essa memória gastronômica aqui registrada vai carinhosamente contando nossa vida e revelando-nos enquanto seres fazedores de História. Esperamos, com isso, trazer um pouco mais de felicidade para os momentos, hoje fugazes, em que parentes e amigos se reúnem em torno à mesa. Privilégio que vivemos naqueles tempos”. Abaixo estão alguns trechos dos textos escritos pelos alunos: “Prato bom era caranguejo servido com arroz e feijão com leite com farinha ado- çado, do lado. E eu gostava quando o caranguejo tinha ova. Era uma delícia.” “Comida boa, também, era quando minha mãe ganhava neném. Era um pirão de galinha caipira bem gostoso. Quem fazia era meu pai, mas ele fazia com tanto capricho que de longe se podia sentir o cheiro daquela comida. Quando ficava pronto, o pai me mandava levar a comida no quarto para a mãe. E ele já deixava a minha parte na panela. Eu voltava correndo para a cozinha e meu pai colocava um pouco de arroz naquela panela com o final do pirão. Eu pegava a panela e ia para o quarto fazer companhia para minha mãe. Não podia sentar na cama dela e ficava no chão, perto dos pés da cama.” “Bom também era carne-de-sol assada na brasa e piabinhas que eu mesmo pescava no córrego. E salada de folhas de couve crua, com arroz e feijão. Minha mãe fazia cortado de abóbora com quiabo e carne de sol picada em pedacinhos e minha avó, biju de tapioca com coco moído; e ficava delicioso, puro ou com margarina e café.” “Eu comia de tudo, até manga verde com sal ou açúcar. Ou leite com farinha de milho. A mãe levantava de manhã e tirava o leite da cabra, depois coava num pano e fervia numa panela. Com farinha bem torradinha e um pedaço de rapa- dura! Hum!” “O prato mais delicioso... virado de banana com queijo! Lembro-me que meu pai adorava. Mas tinha que ser com bastante queijo! Receita: oito bananas nanicas, bem maduras, três ovos, 1 xícara de açúcar, quilo de queijo meia-cura, três copos de farinha de milho e uma pitada de sal. Primeiro colocava uma colher de óleo na panela, depois as bananas e os ovos; mexia, juntava a farinha, mexia, até misturar tudo. Em seguida, os pedaços de queijo picado e, por último, o açúcar. Mexia tudo até o queijo derreter e desgrudar um pouco da panela. Servia ainda um pouco quente.” “O que me lembro do bolo de milho é que ela colocava milho no pilão e socava com a mão do pilão até que se tornasse fubá. Passava pela peneira várias vezes até obter um fubá bem fino. Depois colocava em uma panela de barro leite de coco, ovos, açúcar, cravo e canela e levava ao fogão que era de lenha, até se transformar em angu. Feito isso, colocava toda aquela massa em uma assadeira 83 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais e levava ao forno de barro, que havia no fundo do quintal. Para assar. Eu me lem- bro que ela tirava aquela assadeira do forno e regava o bolo com leite de coco. O bolo ficava com uma casquinha dourada! Comíamos as fatias de bolo com café.” “Se minha mãe ou meu pai convidassem alguém importante para almoçar na mi- nha casa, era preciso matar um peru para satisfazer os convidados. Além do peru era preciso fazer um frango ou uma galinha caipira para fazer galinha cabidela, que é o nome do prato feito lá em Pernambuco.” “A galinha, a gente pegava na hora, viva, e cortava o pescoço dela e aparava o sangue em uma vasilha e reservava. Enquanto isso, preparava a galinha com vários tipos de tempero. De preferência, coentro, sal, cebola e vinagre. Depois batia o sangue da galinha num liqüidificador e colocava por cima da galinha já na panela e misturava até o caldo ficar escuro. Feito isso, era só tampar a panela e esperar a galinha cozinhar. Depois, servir com feijão, arroz e salada. De pre- ferência com tomatinhos pequenos, como os que a gente plantava e colhia na hora que ia comer.” “Acho que a professora conseguiu o que queria, deixei para trás montes de exemplos, ninguém resiste à lembrança de um lambari sequinho passado na farinha ou fubá e frito na hora” (BRASIL, 2010). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– O Texto 3 aborda o fracasso escolar e como o papel do(a) professor(a) de EJA é determinante para evitar que esse fracasso ocorra novamente. Texto 3 As marcas da exclusão ––––––––––––––––––––––––––––––– A condição socioeconômica Os homens, mulheres, jovens, adultos ou idosos que buscam a escola perten- cem todos a uma mesma classe social: são pessoas com baixo poder aquisitivo, que consomem, de modo geral, apenas o básico à sua sobrevivência: aluguel, água, luz, alimentação, remédios para os filhos (quando os têm). O lazer fica por conta dos encontros com as famílias ou dos festejos e eventos das comunidades das quais participam, ligados, muitas vezes, às igrejas ou associações. A televi- são é apontada como principal fonte de lazer e informação. Quase sempre seus pais têm ou tiveram uma escolaridade inferior à sua. A compreensão dessa realidade levou Paulo Freire, ainda nos anos de 1960, a reconhecer o analfabetismo como uma questão não só pedagógica, mas tam- bém sociale política. É a mesma sabedoria de Freire que nos mostra que educar a favor dos pobres é educar para a transformação da sociedade geradora da pobreza. A baixa auto-estima Uma característica freqüente do(a) aluno(a) é sua baixa autoestima, muitas vezes reforçada pelas situações de fracasso escolar. A sua eventual passagem pela es- cola, muitas vezes, foi marcada pela exclusão e/ou pelo insucesso escolar. Com um desempenho pedagógico anterior comprometido, esse aluno volta à sala de © Educação de Jovens e Adultos84 aula revelando uma auto-imagem fragilizada, expressando sentimentos de inse- gurança e de desvalorização pessoal frente aos novos desafios que se impõem. Luciane, 34 anos, aluna de EJA, abandonou a escola ainda criança, depois de sucessivas reprovações. Ela lembra como se sentia numa sala de aula da 4ª série, quando tinha 10 anos: “Eu tinha medo de ir à escola, me dava um frio na barriga. Tentava prestar aten- ção na aula, mas entendia tudo pela metade. Tentei participar das aulas, algumas vezes, mas minhas perguntas sempre causavam risos e a professora nunca fa- lava nada. Tinha vergonha de não saber!” Será que o fracasso escolar está na inaptidão dos alunos ou é gerado pela pró- pria escola? Esta não é uma pergunta fácil de responder. O fracasso escolar é hoje objeto de estudos das áreas da Educação e da Psicologia. Suas causas apontam para uma diversidade e complexidade de fatores, ligados ao psiquismo do aluno: for- ma como ele interage com o ambiente escolar, modo como estabelece relações com o saber e com o aprender, seu relacionamento com os professores e com os colegas, suas relações familiares, os vínculos que constrói com o conhecimento etc.; à estrutura da escola: as características, o modelo pedagógico adotado, o perfil dos professores etc.; a uma dimensão social ampla: políticas públicas de educação e a secular desigualdade econômica e social da sociedade brasileira. O que se sabe, ao certo, é que o fracasso escolar tece uma espécie de teia, onde o(a) aluno(a) se enreda e custa a sair. Na maioria dos casos, a teia torna-se tão emaranhada que não oferece saída e o desfecho dessa situação, tão comum na realidade brasileira, é o abandono da escola. Mais tarde, quando retornam aos bancos escolares, os jovens e adultos ficam extremamente suscetíveis a enredarem-se novamente, a vivenciarem outro fracasso escolar. Como evitar que isso ocorra? Qual é o papel do(a) professor(a) de EJA nesse processo? Se vasculharmos nossas próprias lembranças da escola, tanto as boas quanto as más, veremos que o que fica na nossa memória não são só os conteúdos, mas marcantemente os professores. A figura do(a) professor(a) aparece, em nossas lem- branças, como aquela que marcou uma predileção por determinada área do co- nhecimento, como alguém que nos influenciou em nossas escolhas profissionais, mesmo como alguém com quem nada aprendemos ou até como aquela pessoa com quem não gostaríamos de nos encontrar na rua. Isso nos ajuda a compreender que o(a) professor(a) exerce um papel determinante e de responsabilidade tanto pelo sucesso quanto pelo fracasso escolar de qualquer um de seus alunos. Mais uma vez, é a aluna Luciane quem descreve a professora que contribuiu decisivamente para o seu abandono da escola: “Foi nesse tempo assim tumultuado e confuso que conheci a professora Dona Pedrina, da qual eu nunca me esqueci e acho nunca me esquecerei. Quando um aluno escrevia alguma coisa errada, por exemplo, ela falava bem alto para todos na classe ouvirem. E como costuma ser, todas as crianças começavam a rir do erro cometido por alguém. Ela adorava pôr de castigo o aluno que não fazia a lição de casa. Colocava-o de pé na frente da classe. Gostava, também, de dar uma de todo-poderosa, dizendo com voz firme: – Luciane, vou comprar uma cartilha para você aprender a escrever. Eu vou con- versar com sua mãe para pôr você no primário de novo!!! 85 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais Com toda essa experiência, o meu comportamento, hoje vejo, só piorava. Pois eu fingia não estar nem aí, demonstrando isso com palavras e atitudes. Achava que daquela forma as pessoas não mais ririam de mim.” As representações que o(a) aluno(a) faz da escola e de seu desempenho na cul- tura escolar são construídas não somente dentro da própria escola, mas também no âmbito da família e das relações sociais, através de expectativas próprias e de expectativas de outros, pais, colegas, amigos, professores que nele são de- positadas. Muitas vezes, os alunos com dificuldades são preconceituosamente tachados pelos professores, pais e colegas de “burros”, “preguiçosos”, “deficien- tes”, “lentos”. Estas palavras são corrosivas e imprimem cicatrizes profundas, causando efeitos devastadores na autoestima do sujeito. Sabemos que o sucesso escolar produz auto-estima e um grande efeito de se- gurança no(a) aluno(a), enquanto o fracasso causa grandes estragos na relação consigo mesmo. O comportamento de indiferença, que Luciane diz ter adotado quando criança, muitas vezes, perdura no aluno por mais tempo, até a sua volta à escola, derivando também em atitudes de indisciplina e agressividade. Desse modo, as situações de fracasso escolar produzem marcas que afetam profunda- mente a identidade e ferem a auto-imagem do(a) aluno(a) jovem e adulto. Nas salas de aula de EJA, estas marcas se evidenciam, de um lado, por atitu- des de extrema timidez e, por outro, por atitudes de irreverência e transgressão. Esses alunos e alunas demonstram vergonha em perguntar ou em responder perguntas, nervosismo exacerbado nas situações de avaliação, ou então se mostram agitados e indisciplinados. Muitos não conseguem nem olhar nos olhos do professor e da professora. O papel do(a) professor(a) de EJA é determinante para evitar situações de novo fracasso escolar. Um caminho seguro para diminuir esses sentimentos de inse- gurança é valorizar os saberes que os alunos e alunas trazem para a sala de aula. O reconhecimento da existência de uma sabedoria no sujeito, proveniente de sua experiência de vida, de sua bagagem cultural, de suas habilidades pro- fissionais, certamente, contribui para que ele resgate uma auto-imagem positiva, ampliando sua auto-estima e fortalecendo sua autoconfiança. O bom acolhimento e a valorização do aluno, pelo(a) professor(a) de jovens e adultos, possibilitam a abertura de um canal de aprendizagem com maiores ga- rantias de êxito, porque parte dos conhecimentos prévios dos educandos para promover conhecimentos novos, porque fomenta o encontro dos saberes da vida vivida com os saberes escolares (BRASIL, 2010). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– O Texto 4 revela como o tema trabalho tem lugar especial na EJA, pois os alunos, em sua maioria, são trabalhadores e, muitas vezes, a experiência do trabalho foi iniciada precocemente em suas vidas. Texto 4 A marca do trabalho –––––––––––––––––––––––––––––––––– As alunas e alunos da EJA, em sua maioria, são trabalhadores e, muitas vezes, a experiência com o trabalho começou em suas vidas muito cedo. Nas cida- © Educação de Jovens e Adultos86 des, seus pais saíam para trabalhar e muitos deles já eram responsáveis, ainda crianças, pelo cuidado da casa e dos irmãos mais novos. Outras vezes, acom- panhavam seus pais ao trabalho, realizando pequenas tarefas para auxiliá-los. É comum, ainda, que, nos centros urbanos, estes alunos tenham realizado um sem-número de atividades cuja renda completava os ganhos da família: guardar carros, distribuir panfletos, auxiliar em serviços na construção civil, fazer entre- gas, arrematar costuras, cuidar de crianças etc. Nas regiões rurais, a participação no mundo do trabalho começa ainda mais cedo: cuidar da terra, das plantaçõesou da criação de animais; auxiliar nos ser- viços caseiros. Muitas vezes, acompanhando os pais e irmãos mais velhos, é comum encontrar um grande número de crianças e jovens já mergulhados no trabalho. Nessas regiões, os horários, os períodos de colheita, de chuva e de seca marcam a vida cotidiana das pessoas e isto, aliado às grandes distâncias, configura condição bastante precária para a escolarização. Se cada região de nosso país tem suas particularidades em relação às demais, todas as salas de EJA se unificam em torno deste fato: a grande maioria dos alunos são trabalhadores que chegam para as aulas após um dia intenso de tra- balho. É claro que estas mesmas salas apresentam um número significativo de desempregados e de trabalhadores temporários ou informais. Mas, sempre que pensamos em EJA, temos que considerar que nossa atividade conta com mulheres e homens trabalhadores. Vale notar, ainda, que em todas as regiões do país, o trabalho é apontado pelos alunos de EJA tanto como motivo para terem deixado a escola, como razão para voltarem a ela. Sem dúvida alguma, o tema trabalho tem um lugar especial na EJA e deve impor- tar ao trabalho dos professores, das professoras e da escola. Entretanto, é preciso lembrar que o trabalho experimentado pelas alunas e alu- nos não passa nem de longe pelo trabalho como atividade fundamental pela qual o ser humano se humaniza e se aperfeiçoa. O trabalho que conhecem é na maior parte das vezes repetitivo, cansativo e pouco engrandecedor. Apesar de tudo, vale pensar, por exemplo, na quantidade de saberes que cada um destes alunos-trabalhadores possui em função das atividades que realizam ou realizaram. Saberes, certamente, não-escolares, mas saberes. Saberes a partir dos quais novos conhecimentos poderão ser construídos. Uma tarefa fundamental para o(a) professor(a) é conhecer que saberes e habili- dades os alunos e alunas desenvolveram em função do seu trabalho. [...]O mundo do trabalho se caracteriza hoje pela diversidade de atividades e vínculos. Nossos alunos, das classes de EJA, são muitas vezes pessoas que ad- ministram sua sobrevivência econômica: fazem “bicos”, são autônomos, circulam por diferentes profissões como auxiliares ou ajudantes de pintura, construção, serviços domésticos, venda ambulante etc. Possuir um certificado escolar ou profissionalizante não implica em garantia de trabalho, haja vista a quantidade de profissionais que formados numa área atuam em outra. Pode ser interessante pensar sobre as habilidades que a escola pode ajudar a desenvolver e que contribuam para uma atuação mais eficiente nesse universo diversificado e competitivo que é o do trabalho. Não queremos dizer com isto que a escola deva tomar para si a responsabilidade da preparação do trabalhador, nem deixar a responsabilidade da conquista de um “emprego melhor” nas mãos do(a) aluno(a). Como já sabemos, esta é uma responsabilidade social mais am- pla e mais próxima das políticas governamentais e empresariais. 87 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais O que queremos pensar é justamente nas formas da escola potencializar essa competência que os jovens e adultos já desenvolvem em sua vida cotidiana de administrar suas finanças e sua sobrevivência. Comunicar-se de forma competente com clareza, ordenação de idéias, argu- mentação; conhecer as diferentes formas de trabalho da nossa sociedade nos dias atuais, o trabalho formal e o informal, por exemplo; dominar os caminhos possíveis para a obtenção de empregos, a procura por agências, a preparação de currículos; ver na construção de uma pequena fábrica, na abertura de um comércio em sua região um possível canal de trabalho; conhecer, em sua região ou comunidade, os espaços gratuitos de formação técnica cursos de eletricidade, pintura, computação, confecção e outros são saberes passíveis de serem apren- didos na escola. Ela funcionaria, assim, como espaço de conhecimentos ligados ao mundo do trabalho. Vale destacar que outras motivações levam os alunos jovens e adultos para a escola. Uma delas é a satisfação pessoal, a conquista de um direito, a sensação de capacidade e dignidade que traz satisfação pessoal (BRASIL, 2010). ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 11. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Por meio das questões autoavaliativas propostas a seguir, você poderá refletir sobre a aprendizagem que obteve nesta uni- dade. 3) uComo se apresenta a Educação de Jovens e Adultos? Por que ela não pode ser desconsiderada no cenário educacional? 4) Qual seria a motivação principal que leva os alunos jovens e adultos a querer retornar à escola? 5) Podemos dizer que a vida é um eterno aprendizado? Por quê? 6) A vida, tanto nas sociedades anteriores como na sociedade contemporânea, oferece inúmeras oportunidades para desenvolvermos aprendizagens e, consequentemente, formas de pensamento autoconscientes e que trans- cendem nosso contexto de vivência. Nesse sentido, qual o local privilegiado para desenvolvermos o pensamento reflexivo? 7) Para a atividade docente, torna-se imprescindível conhecer o aluno e ter consciência do que ele idealiza. Isso se torna ainda mais importante quando falamos de Educação de Jovens e Adultos, pois essa modalidade de ensino é destinada às pessoas para as quais a vida foi de certa forma injusta. Assim, que tipo de professor se faz necessário para a Educação de Jovens e Adultos para a universalização da educação? Além de favorecer a autonomia dos jovens e adultos, qual é outra responsabilidade importante do educador de jovens e adultos? © Educação de Jovens e Adultos88 12. CONSIDERAÇÕES Ao longo desta unidade, pudemos perceber que a cada dia está mais visível a dificuldade de os jovens e adultos ingressarem e/ou per- manecerem no campo de trabalho e, especialmente, acompanharem as bases tecnológicas no mundo globalizado em que vivemos. Por isso, cada vez mais, é importante incentivar jovens e adultos a voltar a estudar. Na escola, eles vão perceber e encon- trar um ambiente prazeroso, que viabilizará a (re)construção de conhecimentos. Trata-se de um processo cauteloso, considerando que, além da necessidade de estimulação, há a necessidade de oferecer aos alunos participantes da EJA atividades que os levem à aquisição do saber. Podemos perceber tristemente que, em pleno século 21, a alfabetização ainda não é uma apropriação de todo cidadão, o que exclui grande massa da população brasileira de ter acesso ao mun- do da leitura e da escrita. 13. E-REFERÊNCIA BRASIL. Trabalhando com a educação de jovens e adultos: alunas e alunos da EJA. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me4549.pdf>. Acesso em: 20 maio 2010. CARLOS, R. É preciso saber viver. Disponível em: <http://www.vagalume.com.br/roberto- carlos/e-preciso-saber-viver.html >. Acesso em: 25 ago. 2010. RIBEIRO, V. M. M. Educação de jovens e adultos: proposta curricular para o 1º segmento de Ensino Fundamental. São Paulo: Ação Educativa; Brasília: MEC, 1997. Disponível em: <http://www.acaoeducativa.org.br/downloads/parte1.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2007. TRIGUEIRO, F. 40% dos jovens com 16 anos não concluíram o ensino fundamental. Disponível em: <http://www.educacionista.org.br/jornal/index.php?option=com_conten t&task=view&id=4721&Itemid=28>. Acesso em: 17 set. 2010. 14. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEISIEGEL, C. R. Estado e educação popular: um estudo sobre a educação. São Paulo: Pioneira, 1974. 89 Claretiano - Centro Universitário © U2 – Caracterização do Alunado da Educação de Jovens e Adultos em Face das Determinantes Pedagógicas e Sociais ______. Questões de atualidade na educação popular. Trabalho apresentado na 22ª Reunião Anual da ANPED, Caxambu, 1999. BRASIL. MEC.Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996. DEMO, P. Desafios modernos da educação. 3. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1995. FUCK, I. T. Alfabetização de adultos. Relato de uma experiência construtivista. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1994. FREIRE, P. A importância do ato de ler. São Paulo: Vozes, 1985. ______. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. MOURA, T. M. M. A prática pedagógica dos alfabetizadores de jovens e adultos: contribuições de Freire, Ferreiro e Vygotsky. Maceió: INEP; EDUFAL, 1999. Claretiano - Centro Universitário
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