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2 CAPÍTULO I DIREITO CONSTITUCIONAL I – DIREITO CONSTITUCIONAL 1 – Noção: “configura-se como Direito Público fundamental por referir-se diretamente à organização e funcionamento do Estado, à articulação dos elementos primários do mesmo e ao estabelecimento das bases da estrutura política” (José Afonso da Silva, p. 36). 2 - Objeto da disciplina: “A constituição política do Estado, no sentido amplo de estabelecer sua estrutura, a organização de suas instituições e órgãos, o modo de aquisição e limitação do poder, através, inclusive, da previsão de diversos direitos e garantias fundamentais” (MORAES, p. 01). 3 - Objetivos da disciplina Estudar a organização de um Estado determinado. Ex: Dir. Constitucional Brasileiro. Descrever e analisar a constituição política de um Estado. Analisar a estrutura, organização das instituições e órgãos de um Estado. Analisar o modo de aquisição e limitação dos poderes estatais. Analisar a previsão de direitos e garantias fundamentais expressos em um texto constitucional. II - CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO - Segundo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (in Novo Dicionário Aurélio, 3. ed. Curitiba: Positivo, 2004) a palavra constituição possui vários sentidos, sendo o seguinte conceito interessante ao Direito: Lei fundamental e suprema dum Estado, que contém normas respeitantes à formação dos poderes públicos, forma de governo, distribuição de competências, direitos e deveres dos cidadãos, etc.; carta constitucional, carta magna. - Outras definições: o José Celso de Mello Filho: “Constituição é o nomen juris que se dá ao complexo de regras que dispõem sobre a organização do Estado, a origem e o exercício do Poder, a discriminação das competências estatais e a proclamação das liberdades públicas” (Constituição Federal Anotada, 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1986, p. 6-7). o José Afonso da Silva: “A Constituição do Estado, considerada sua lei fundamental, seria então, a organização dos seus elementos essenciais; um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos e os limites de sua ação.” (Curso de Direito Constitucional Positivo. 5. ed. São Paulo: RT, p. 37). o Para David Araújo e Vidal Serrano (p. 02), o conceito de Constituição se constrói da seguinte maneira: o Sentido político: é algo que emana de um ato do poder soberano, que determina a estrutura mínima do Estado, ou seja, as regras que definem a titularidade do poder, a forma de seu exercício, os direitos individuais, etc. O sentido político tem base nas teorias de Carl Schmitt. o Sentido sociológico (Ferdinand Lassalle, no livro O que é uma Constituição?): a Constituição precisa ser o reflexo das forças sociais que estruturam o poder, sob pena de encontrar-se apenas uma folha de papel. o Sentido formal e jurídico: é o conjunto de normas que se situa num plano hierarquicamente superior a outras normas. Dessa maneira, pouco importa o conteúdo, mas a formalização em posição hierárquica superior. 3 o A Constituição deve ser vista ainda como o documento básico do Estado, regulamentando seus elementos estruturantes, ou seja, território, governo, povo e finalidade. o Os autores conceituam então Constituição como “a organização sistemática dos elementos constitutivos do Estado, através do qual se definem a forma e a estrutura deste, o sistema de governo, a divisão e o funcionamento dos poderes, o modelo econômico e os direitos, deveres e garantias fundamentais, sendo que qualquer outra matéria que for agregada a ela será considerada formalmente constitucional.” (ARAÚJO, p. 03). 4 CAPÍTULO II FORMAÇÃO CONSTITUCIONAL DO BRASIL I - HISTÓRICO DAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS 1. A carta imperial de 1824. 2. A primeira constituição da República - 1891. 3. A Constituição de 1934. 4. A Constituição de 1937 – Polaca. 5. A Constituição de 1946. 6. A Constituição de 1967. - A Constituição de 1969 / Emenda de 1969. 7. A Constituição da República Federativa do Brasil – 1988. 1 - A CONSTITUIÇÃO DE 1824 Contexto histórico: - Predominância de ideias liberais, advindas da Revolução Francesa e Americana, no fim do século XVIII e início do XIX, trazidas pela classe dominante. - O homem, individualmente, no centro do alicerce social. - O Estado tem suas atividades limitadas, enquanto a sociedade tem ampla liberdade. - Buscavam o fim da monarquia absolutista. - O país estava sob a regência de D. Pedro I e antes mesmo da independência já se pensava em adotar uma constituição jurídica. Principais características: - Outorgada (imposta sem consentimento do povo por meio de seus representantes). - Divisão quádrupla de poderes: Executivo, Judiciário, Legislativo e Moderador. - O Poder Moderador: - Exercido pelo monarca para realizar a arbitragem entre os demais poderes. - Estava acima dos demais poderes e não impunha responsabilidades ao monarca. - Sobre o legislativo: nomeação de senadores, sanção de leis, dissolução da Câmara dos Deputados. - Sobre o executivo: O Imperador era o chefe do executivo e também detentor do Poder Moderador. Dirigia o executivo por meio dos ministros de Estado, que podia nomear e destituir livremente. - Sobre o judiciário: Destituía os magistrados e podia alterar ou extinguir as penas aplicadas. - Rol extenso de garantias individuais (bastante avançado para época). - A Constituição era semirrígida, possuindo dispositivos de fácil alteração em contrapartida à dispositivos rígidos (Obs: As constituições, quanto à forma de alteração, podem ser: rígidas, semirrígidas e flexíveis). - Por exemplo, a forma de poder poderia se tornar republicana sem ao menos a necessidade de uma nova Carta. - Foi a Constituição de maior duração no Brasil. 2 - A CONSTITUIÇÃO DE 1891 Contexto histórico: - Em 15 de novembro de 1889 acontece o fim da monarquia, destituindo-se o Imperador, uma vez que é proclamada a República Federativa. - A proclamação da república foi um movimento de pouca participação social, tendo acontecido dentro dos quartéis militares. - O exército tinha força porque foi organizado pelo Império para deter as anteriores tentativas de revolução para formação da república. - O Brasil era, à época, a única monarquia do continente. - Houve profunda influência norte-americana, que propunha o sistema republicano presidencialista. - O primeiro ato jurídico após o golpe foi redigido por Rui Barbosa e expressava a nova forma de governo da nação brasileira. 5 - As províncias passaram a Estados autônomos e também poderiam editar suas Constituições. - O principal participante da Assembleia Constituinte foi Rui Barbosa. Alguns autores, como Wilson Accioli, dizem que Barbosa redigiu a Carta sozinho. Principais características: - Promulgada (realizada de forma popular, ou seja, com a participação dos parlamentares). - Instituição da República Federativa, com a consequente criação da União. - Os princípios de perpetuidade e indissolubilidade da União não eram objeto de mudanças na Carta, nem mesmo por emenda constitucional. - A Constituição era rígida e exigia árduo trabalho para as modificações possíveis. - Tripartição de Poderes. - Fortalecimento do Judiciário: vitaliciedade aos magistrados e irredutibilidade de vencimentos. - Eleições: sufrágio direto, mas não universal. - Abrandamento das penas criminais, suprimindo-se as penas de galés (trabalhos forçados), banimento judicial e morte. - Introdução do Habeas Corpus1: garantia da liberdade de locomoção. - Criação do Supremo Tribunal Federal2. - Em 1926, após diversas crises e levantes sociais, o Texto sofre uma reforma,nitidamente racionalista e autoritária. As capacidades do Executivo da União aumentam, facilitando a intervenção no Executivo dos Estados e no Legislativo em geral. 3 - A CONSTITUIÇÃO DE 1934 Contexto histórico: - A crise da Bolsa de Nova Iorque em 1929 abala a economia brasileira, principalmente de São Paulo que vivia da exportação do café. - O Presidente Washington Luiz designa Júlio Prestes para sua sucessão sem prévia consulta aos outros Estados (política café-com-leite). Fez isto, pois precisava proteger os cafeicultores de São Paulo, e Prestes era o mais indicado. - Os governos de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba discordam da designação feita pelo Presidente Washington Luiz. Formam assim a Aliança Liberal que propõe Getúlio Vargas para Presidente e João Pessoa para Vice. - Em 1930, após a derrota nas urnas, Getúlio Vargas lidera o movimento armado que encerra a denominada Primeira República, assumindo o poder da nação. - Em 11 de novembro de 1930 o Decreto 19.398 institui o Governo Provisório. - Uma das primeiras medidas do Governo Provisório foi a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública e do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Principais características da Carta: - Promulgada. - Introdução do nome de Deus no preâmbulo - Incorporação de preceitos do direito civil, social e administrativo. - Voto feminino e secreto. - Justiça Militar e Eleitoral como órgãos do Poder Judiciário. - Previsão constitucional do Ministério Público3. Criação do Tribunal de Contas. 1 Já existia o HC no Código Penal de 1830, no entanto, somente com a Carta de 1891 é que foi erigido à norma constitucional. 2 No período colonial, após a vinda da família real, a instância máxima do Judiciário era a Casa de Suplicação do Brasil. Após a Independência, foi criado o Supremo Tribunal de Justiça pela Constituição de 1824. No governo do Marechal Deodoro da Fonseca, em 11 de outubro de 1890, publicou o Decreto nº 848, que dispunha sobre a organização da Justiça Federal (Supremo Tribunal Federal e Juízes de Seção). Em 24 de fevereiro de 1891, a Constituição Federal da República dos Estados Unidos do Brasil consolidou a criação, composição e competência da Corte, composta por 15 Ministros, que seriam nomeados pelo Presidente da República. O Supremo Tribunal Federal foi instalado pelo Decreto nº1, de 26 de fevereiro de 1891. 3 No período colonial não havia previsão do Ministério Público como instituição. Mas as Ordenações Manuelinas de 1521 e as Ordenações Filipinas de 1603 já faziam menção aos promotores de justiça, atribuindo a eles o papel de fiscalizar a lei e de promover a acusação criminal. Em 1832, com o Código de Processo Penal do Império, iniciou-se a sistematização das ações do Ministério Público. Na República, o decreto nº 848, de 11/09/1890, ao criar e regulamentar a Justiça Federal, retrata a estrutura e atribuições do Ministério Público no âmbito federal. 6 - Normas reguladoras da ordem econômica, social, da família, educação, cultura, funcionalismo público e segurança nacional. - Competência ao Senado para coordenar os demais poderes. Era quase a volta do Poder Moderador, só que nas mãos do Senado. 4 - A CONSTITUIÇÃO DE 1937 Contexto histórico: - A extrema esquerda e a extrema direita não permitiram a plena aplicação da CF de 1934, possibilitando assim o Golpe de 1937. - A grave crise mundial (Segunda Guerra) e interna geravam crise política. - Nas disputas entre a direita integralista e a esquerda comunista, com ameaças de séria crise (talvez insuflada pelo próprio Vargas), estava preparado o cenário para o golpe. - Em 10 de novembro de 1937 Getúlio Vargas outorga nova Carta: inicia-se o Estado Novo. Principais características: - Outorgada. - Também conhecida com Constituição Polaca (por ser inspirada na Carta polonesa). - O Presidente se torna o poder supremo da nação. Cria-se um regime autoritário. - Os demais poderes, apesar de existentes, perdem autonomia e força, concentrada no executivo. - A figura do Senado é substituída pelo Conselho Federal. - O Poder Legislativo poderia entrar em recesso por ordem do Presidente, que neste caso assumiria suas funções. - A orientação ideológica era fascista4, claramente contrária ao comunismo e a democracia liberal. - A CF jamais entrou em vigor, pois seu artigo 187 rezava que a vigência seria submetida ao plebiscito nacional, fato que nunca aconteceu. Na verdade, prevaleceu o Estado Novo, eivado de arbitrariedade e sem qualquer controle jurídico, no qual Vargas era o poder supremo. - Nunca foram convocadas eleições para a composição do Congresso Nacional. - A censura ao pensamento e à impressa era comum. 5 – A CONSTITUIÇÃO DE 1946 Contexto histórico: - Com o fim da Segunda Guerra Mundial o fascismo já não podia persistir. - Vargas, preocupado com a situação, convoca no início de 1945 eleições para 02 de dezembro daquele mesmo ano. O objetivo não era uma nova Carta, mas apenas algumas modificações. - Escândalos políticos, como previsibilidade no resultado das eleições, provocam a queda de Vargas que é substituído no poder pelo Presidente do STF José Linhares, em outubro de 1945. - Disto decorre a convocação de uma nova Constituinte e não simplesmente congressistas para uma mínima emenda constitucional, como queria Vargas. Aspectos fundamentais: - Promulgada. - Alguns a tratam como a melhor Carta de todos os tempos no Brasil (Celso Bastos). - Divisão harmônica dos 3 Poderes. Para tanto os poderes do Executivo sofrem diminuição em relação à Carta anterior. - Eleições diretas para Presidente da República para mandato de 5 anos. O Vice-Presidente da República acumulava a função de Presidente do Senado. - Só o Legislativo podia legislar, com exceção das leis delegadas. - O Judiciário tem suas competências alargadas e passa a ser julgador da constitucionalidade das leis. - O caráter democrático da CF era visível. Nenhuma lesão poderia se subtraída da apreciação do Judiciário. - Acaba a perseguição aos partidos políticos com a consagração do princípio da liberdade de criação de organizações partidárias, desde que não buscassem o autoritarismo. 4 Fascismo: Sistema político nacionalista, imperialista, antiliberal e antidemocrático, liderado por Benito Mussolini (1883-1945) na Itália. 7 - Fim das penas de banimento e confisco. Inexistência da pena de morte. - Aumenta a autonomia dos municípios. 6 – A CONSTITUIÇÃO DE 1967 Contexto histórico: - Guerra Fria: Capitalistas X Comunistas. - Em agosto de 1961 o Presidente Jânio Quadros renuncia. Em setembro João Goulart, o Jango, assume a presidência. - Ainda em setembro de 1961 a Emenda nº 4 institui o sistema parlamentarista no país, deixando de lado o presidencialismo. Fruto do medo do militares e influência dos EUA por causa da aproximação de Jango com o comunismo. - Em 1963, após desaprovação popular ao parlamentarismo por meio de plebiscito, retorna-se ao presidencialismo. - Em 31 de março de 1964 ocorre o golpe militar (que alguns chamam de Revolução de 64) que há quase dez anos vinha se armando. Motivo: “o espectro do comunismo”. - É convocado o Congresso Nacional para uma nova Assembleia Constituinte. Principais aspectos: - Outorgada (há divergência na doutrina, uma vez que o Congresso Nacional foi convocado). - Permite a desapropriação da propriedade, mediante indenização, para fins de reforma agrária. - Enorme preocupação com a segurança nacional, através de um conceito bastante vazio que possibilitava a dissolução do Congresso com grande facilidade. - Reuniu na União diversas competências dos Estados e municípios. - Existia a divisão tripartida de poderes,no entanto, não vigia na prática, uma vez que o Presidente da República tinha poderes concentrados. - Foi a CF que mais poderes deu ao Presidente da República, situação que se agravou com a Emenda Constitucional nº 01 de 1969. - As liberdades e garantias individuais foram praticamente mantidas, mas a todo tempo eram suspensas pelo Executivo. - Após diversos anos de revoltas e manifestações populares o Ato Institucional nº 5 (AI-5, de 13 de dezembro de 1968) demonstra o ápice do autoritarismo. Era impossível juridicamente conjugá-lo às disposições da CF. Com isso, pode-se dizer que o AI-5 passou a ter superioridade ao texto constitucional. - Pelo AI-5 o Presidente da República poderia, por exemplo, fechar Assembleias Legislativas estaduais e Câmaras de Vereadores, assumindo suas funções. - Mandatos parlamentares foram cassados, garantias do judiciário suspensas (vitaliciedade e inamovibilidade). - O AI-5 possibilitava até mesmo a suspensão do Habeas Corpus nos casos de crimes políticos contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular. - O Poder Judiciário estava proibido de julgar casos decorrentes do AI-5. - Com o Presidente Costa e Silva doente quem assumiria seria o Vice-Presidente Pedro Aleixo. No entanto, por ser o vice um civil e não um militar, em agosto de 1969, pelo AI-12, os militares outorgam para si o governo do país sem a figura do Presidente. Quem governava era a Junta do Exército, Marinha e Aeronáutica. - Costa e Silva morre em dezembro de 1969. Já prevendo o fato, os militares editaram, em novembro daquele ano, o AI-16 que determinava como cargos vagos a Presidência e Vice. A Constituição ou Emenda Constitucional de 1969: - O Executivo, dirigido pela Junta Militar, edita Emenda Constitucional. O raciocínio é simples: estando o Congresso em recesso quem assume suas funções é o Executivo. O Congresso pode emendar a Carta, portanto o Executivo assumindo tais funções também pode. - Para uma doutrina minoritária, entre eles Eugenio Franco Montoro, tal emenda não cria uma nova Constituição, a Constituição de 1969. - Para uma doutrina majoritária, entre eles José Afonso da Silva, Celso Bastos e o próprio STF, trata-se de uma nova Constituição. Prevalece o entendimento de que a emenda só serviu como mecanismo de outorga de uma nova Carta, uma vez que 8 verdadeiramente se promulgou texto integralmente reformado, a começar pela denominação da própria CF. Principais aspectos: - Novo nome: passou de Constituição Brasileira para Constituição da República Federativa do Brasil. - Estipulava perda de mandato eletivo quando houvesse atentado contra as instituições estatais. - Institui o Tribunal de Contas Municipal para cidades com mais de 2 milhões de habitantes. - Os empréstimos do exterior tinham que passar pelo crivo do Executivo. - Os decretos-leis (competência do Executivo) tinham validade para os atos do período de sua vigência, mesmo que depois fossem rejeitados pelo Legislativo. - O Conselho de Segurança Nacional era competente para definir as bases e objetivos da política nacional. - Criou a figura da lei complementar para regrar os direitos políticos, bem como seu gozo, fruição, suspensão, perda e reaquisição. - Proibiu a reeleição para o Executivo. - Estabeleceu eleições indiretas para o cargo de Governador do Estado; ampliou o mandato presidencial para cinco anos e extinguiu a imunidade dos parlamentares. - Impôs censura para as publicações contrárias à moral e bons costumes. 7 – A CONSTITUIÇÃO DE 1988 Contexto histórico: - Movimento “Diretas Já”, que pretendia eleições diretas para os cargos políticos no Brasil. - Decadência do governo militar no Brasil. - Pressões da comunidade internacional contra as ditaduras militares. - Instalação da Assembleia Nacional Constituinte em fevereiro de 1987, sob a presidência do Ministro do STF José Carlos Moreira Alves. O Presidente da Constituinte eleito foi Ulisses Guimarães. - Como não havia projeto para CF, foram criadas 24 subcomissões, que posteriormente se reuniram em 8 comissões temáticas. O erro estava em produzir um trabalho sem diretrizes determinadas, com comissões atuando em separado e sem conhecimento do restante da produção. Além disso, outro problema era o total despreparo da grande maioria dos deputados acerca da tarefa constitucional. - Em 25 de julho de 1987 as comissões juntam seus trabalhos num anteprojeto de 551 artigos apelidado de “Frankenstein”. - Dados da desorganização: o primeiro projeto apresentado recebeu 5.615 emendas. Foi apresentado então novo projeto que recebeu 20.790 emendas de plenário e 122 populares. Novo projeto substitutivo é apresentado e recebe 14.320 emendas. - Havia um entendimento de que as matérias produzidas pela Comissão de Sistematização estariam pré-aprovadas, ou seja, não precisariam ser votadas em plenário. No entanto, os demais constituintes percebendo que estavam fora da votação, realizaram uma emenda, com 319 votos, de um total de 561 constituintes, para que todos os termos da CF fossem alvo de votação em plenário. Alguns consideram o fato uma vitória da democracia. - Após uma primeira votação do projeto definitivo da CF, começa em julho de 1988 o 2o turno de votação. No 2o turno quase não aconteceram discussões e o procedimento teve caráter meramente homologatório. Além disso, os conchavos políticos e a falta de assiduidade da grande maioria dos constituintes impediam mudanças no texto anterior por falta de quórum. - Em 05 de outubro de 1988 é promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil. Aspectos principais: - Possui 250 artigos e o ADCT (que também é parte integrante da CF). - Consagra a República Federativa, com divisão tripartida do Poder: Judiciário, Legislativo e Executivo. - O Ministério Público encontra-se definido no mesmo título da CF que os demais poderes, no entanto, está em capítulo próprio. Isto leva muitos autores a argumentarem que o MP seria um quarto poder. No entanto, existem correntes doutrinárias que classificam o MP com pertencente ao Judiciário ou ao Executivo. - Extenso rol de garantias e direitos fundamentais. 9 - Fim dos Atos Institucionais, substituídos de certa forma pelas Medidas Provisórias de competência do Presidente da República, mas como o próprio nome diz, de caráter provisório, somente para casos e relevância e urgência e com necessária apreciação de conteúdo pelo Congresso (art. 62). - Eleva diversos direitos sociais à hierarquia constitucional: saúde, previdência social, assistência social, educação, cultura, desporto, ciência e tecnologia, comunicação, meio ambiente, família e o índio. - A CF é marcada por ser rígida, uma vez que há cláusulas pétreas (art. 60, § 4o), que impedem reforma de certos pontos, bem como, para reforma-se as outras partes, somente por meio de procedimento especial (Emendas à Constituição), o que demonstra claramente a especial proteção ao Texto. II – CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES Nota: A classificação varia de autor para autor e tem como principal objetivo realçar características dos textos constitucionais. Existem outras classificações além das aqui expostas. 1 – Quanto à origem - Promulgada ou votada (popular ou democrática): é fruto de um processo democrático e elaborada por um Poder Constituinte exercido por uma Assembleia Constituinte. - Exemplos no Brasil: 1891, 1934, 1946 e 1988. - Outorgada: é fruto do autoritarismo, sendo geralmente imposta pelo(s) governante(s), sem a participação do povo. - Exemplos no Brasil: 1824, 1937, 1967 (quanto à esta CF há divergência na doutrina sobre se foi promulgada ou outorgada) E 1969. - Cesarista: é a formada por referendo popular, sobre um projeto previamente elaborado pelo governante. Esta classificação é de José Afonso da Silva.2 – Quanto à mutabilidade, alterabilidade, consistência ou estabilidade - Flexível: a Constituição que não exige, para sua alteração, qualquer processo mais solene, tendo-se em vista o critério da lei ordinária. - Rígida: a Constituição que exige para sua alteração um critério mais solene e difícil do que o processo de elaboração da lei ordinária. É o caso da CF/88. A presença de cláusulas pétreas, traduzem-se, para alguns autores (Michel Temer), no grau máximo de rigidez, que para alguns é classificada como superrígida. - Semirrígida: é a Constituição que apresenta uma parte que exige mutação por processo mais difícil e solene do que a lei ordinária e outra parte que não possui tal exigência, podendo ser alterada pelo mesmo mecanismo das leis ordinárias. É o caso da Constituição do Império de 1824. - Imutável: não admite mudanças em seu texto. Ex: Finlândia (atual). 3 – Quanto à forma - Escrita ou dogmática: aquela que é representada por um texto completo e organizado, são codificadas em um texto único ou não, sistematizando as ideias e princípios fundamentais de teoria política e Direito predominantes no nomento de sua elaboração (dogmas). - As constituições escritas podem conviver com fenômeno denominado bloco de constitucionalidade. A própria constituição escrita pode definir valor de norma constitucional a atos e documentos que estão fora da própria Carta. Ex: Constituição da França de 1958 (vigente) que atribuiU valor de norma constitucional à parte da Constituição anterior da Franca, que era de 1946, no que tange a ordem social, bem como atribui valor de constituição à Declaração de Direitos do século XVIII. - Este assunto se tornou importante no Brasil após a EC/45, que criou o § 3º do art. 5º: tratados internacionais de direitos humanos votados como emendas, equivalerão às emendas, terão 10 status constitucional. Isso significa o reconhecimento da figura do bloco de constitucionalidade. A CF não se resumirá ao codificado no texto único da CF/88, mas também aos tratados com força constitucional. - Já tivemos a aprovação da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007 (Decreto 6949/2009), através do sistema previsto no § 3º do art. 5º, dando ao tratado força constitucional. - Quem cunhou a expressão foi Louis Favoreu, referindo-se a todas as normas do ordenamento jurídico francês que tivessem status constitucional. José Gomes Canotilho, por sua vez, ao tratar do bloco de constitucionalidade dá-lhe sentido de referência, ou seja, apenas as normas que servem de parâmetro (referência) fariam parte deste bloco. Aqui a expressão é tomada em sentido restrito. - Existem outros autores, entretanto, que a tomam no sentido amplo. Para estes, o bloco de constitucionalidade engloba não apenas as normas formalmente constitucionais, mas todas aquelas que versem sobre matéria constitucional, alcançando, assim, a legislação infraconstitucional (como o Tratado Internacional de Direitos Humanos, por exemplo). - Costumeira ou histórica: aquela que é formada a partir de textos esparsos, sendo sedimentada em costumes derivados das decisões jurisprudenciais. São juridicamente flexíveis, porque podem ser facilmente alterados pelo legislador ordinário, mas são política e socialmente rígidas, posto que cristalizadas ao longo de vários anos. Por exemplo, a atual Constituição da Inglaterra. 4 – Quanto ao conteúdo - Material: pelo conceito político de Constituição, é possível identificar matérias tipicamente constitucionais. São então aquelas regras que identificam a forma e a estrutura do Estado, o sistema de governo, a divisão e o funcionamento dos Poderes, o modelo econômico e os direitos, deveres e garantias fundamentais (povo). Na CF/88 são materialmente constitucionais, por exemplo, os artigos 1º, 2º e 18. - Formal: possui normas no texto constitucional que não são materialmente constitucionais, não guardando relação com a estrutura mínima e essencial do Estado. As normas só são constitucionais porque estão formalmente colocadas no Texto. Por exemplo, o artigo 217 da CF que trata do desporto. - Manoel Gonçalves classifica ainda em: o Constituição-garantia: aquela que visa garantir a liberdade, limitando o poder do Estado. o Constituição-balanço: reflete o compromisso socialista. Assim, a cada novo estágio da evolução socialista, haveria um novo texto constitucional. Exemplos: Constituições soviéticas de 1924, 1936 e 1977. o Constituição-dirigente: Teoria desenvolvida por José Joaquim Gomes Canotilho. A Constituição traz um projeto de Estado, apresenta compromissos sociais e fornece meios para sua execução (programa econômico). Vincula o legislador ordinário à realização do projeto social. III – CONSTITUCIONALISMO CONTEMPORÂNEO - Atualmente o Direito Constitucional não abrange somente a organização do Estado, havendo interferências diretas nos ramos do Direito Privado. - Fica claro na atual CF brasileira, que seguimos em nosso constitucionalismo contemporâneo, aquilo que Uadi Lâmego Bulos denominou de “totalitarismo constitucional”, produtor de uma Constituição programática, de uma Constituição Dirigente (como anota Canotilho), com importante conteúdo social, garantidora dos direitos humanos. - Podemos assim classificar nossa CF/88 como promulgada, escrita, rígida, formal (toda Constituição tem regras materiais), dirigente e garantia. 11 - Pela apresentação do Neoconstitucionalismo, podemos dizer que a Constituição : É o centro do sistema jurídico e organizacional do Estado. É norma jurídica superior e de natureza imperativa. Possui carga valorativa: dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Eficácia irradiante em relação aos Poderes e aos particulares. Concretiza valores ao constitucionalizá-los. Garante condições mínimas de dignidade humana. 12 CAPÍTULO III A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 I – A ORGANIZAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 1 – Introdução - A Constituição da República Federativa do Brasil foi promulgada em 05 de outubro de 1988. - Foi dividida da seguinte forma: preâmbulo, nove títulos e, ao final, o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). - Estão espalhados pela Carta princípios que permitem a conclusão que o constituinte elegeu como meta para o Brasil o Estado de bem-estar social. Por garantir direitos individuais e coletivos para toda a sociedade, parece inquestionável que foi instituído um Estado Democrático Social de Direito, no qual o Estado é: criado e regulado pela CF; os agentes públicos são eleitos pelo povo devendo governar para o povo; o poder político é exercido, em parte diretamente pelo povo, em parte por órgãos estatais (Executivo, Judiciário e Legislativo); os cidadãos, por serem titulares de direitos constitucionais, podem opor tais direitos entre si e em face do Estado. Por causa disso a CF/88 é chamada de Carta-cidadã; o Estado deve atuar positivamente para gerar desenvolvimento e justiça social. Obs: atualmente é possível verificar tendências neoliberais. Exemplo disso é a revogação quase completa do artigo 192 da CF, que tratava do sistema financeiro – agora com atuação mais livre e regrada apenas em leis ordinárias. 2 – Preâmbulo - O preâmbulo não é elemento obrigatório, muitos autores nem lhe dão caráter jurídico, apenas de manifestação sociopolítica. - No Brasil prevalece a tese de que o preâmbulo não possui força normativa, refletindo apenas a posição ideológica do constituinte. - No entanto, é certo que o preâmbulo deve ser utilizado para a integração e interpretação do texto constitucional. De toda forma, as normas constitucionais expressasprevalecem sobre o conteúdo do preâmbulo. 3 - Fundamentos do Estado brasileiro (art. 1º) - O art. 1º da CF estabelece um regime republicano do tipo federalista, e enumera como fundamentos do Estado brasileiro: A – Soberania - É o caráter supremo de um poder, que não admite outro que lhe seja imposto. Assim, a República brasileira deve pautar suas relações internacionais pela soberania. B - Cidadania - É o direito dos cidadãos de participar dos destinos do Estado e também de usufruir dos direitos civis fundamentais previstos na CF. - É o direito do cidadão ter direitos e possuir o atributo da dignidade da pessoa humana. Assim, o Direito deve garantir ao cidadão um posicionamento digno na sociedade. - Mas o cidadão não possui somente direitos, deve cumprir também com seus deveres. Portanto, precisa exercer um papel positivo perante a sociedade. C – Dignidade da pessoa humana - É uma referência constitucional unificadora dos direitos fundamentais inerentes à espécie humana, ou seja, daqueles direitos que visam garantir o conforto existencial das pessoas, protegendo-as de sofrimentos evitáveis na esfera social. - Assim são, por exemplo, as ações afirmativas, que visam garantir oportunidades iguais aos desiguais. Exemplo: art. 37, VIII, CF c/c art. 5º, § 2º da Lei 8.112/90 (§ 2o Às pessoas 13 portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso). D – Valores sociais do trabalho e da livre iniciativa - Foram expressos em conjunto para que haja uma harmonia e cooperação entre a atividade dos trabalhadores e a atividade dos detentores do capital. - Os direitos sociais do trabalho permitem a exteriorização de liberdades positivas (poder de exigir prestações positivas do Estado). Tais princípios, expressos, por exemplo, nos arts. 6º, 7º e 193 a 230, têm por objetivo o bem-estar e a justiça social. - Exemplos de princípios relativos à livre iniciativa: art. 170, II, IV, IX e parágrafo único. E – Pluralismo político - É caracterizado pela convivência harmônica dos interesses contraditórios e das diversas ideologias, permitindo a liberdade de pensamento, religião, posicionamento político, etc. - Garante-se com isso a democracia. O art. 17 da CF reflete tal orientação. II - PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO 1 - Noções - Os princípios servem como regras-matriz (fonte, fundamentação) para a elaboração, interpretação e integração de todo sistema jurídico nacional. - Os princípios constitucionais têm aplicabilidade imediata e seguimento obrigatório para todo o ordenamento jurídico brasileiro, estando espalhados por todo texto constitucional. - Qualquer norma infraconstitucional que viole o contido nos princípios é norma inconstitucional. Para alguns autores violar um princípio é muito pior do que atingir norma constitucional. - A Carta está sujeita a uma análise sistemática e valorativa de suas expressões e princípios. Ao se ponderar os preceitos constitucionais como um todo de um sistema harmônico, percebe- se que um princípio não pode sobrepor-se à outros, para que não haja contradições no mecanismo total e para que não existam disposições sem função na Constituição. Com isto, percebe-se que não há na Constituição contradições intransponíveis, sendo sempre possível interpretá-la conciliando a aplicação de todos os dispositivos referentes ao caso concreto. - A aplicação de uma regra infraconstitucional colidente com outra exclui uma delas. Já para os princípios o sistema é diferente, uma vez que, pela força de sua dimensão de pesos, cada princípio terá seu aspecto valorativo em determinada circunstância, não havendo conflito. Portanto, para valoração de princípios, deve-se ponderá-los para encontrar a solução fática correta. 2 – Princípio Republicano - É elemento essencial da CF, determinando a forma de governo e a organização do Estado e seu relacionamento com os cidadãos. - O princípio republicano garante: Tripartição de funções; Mandatos políticos eletivos e sua periodicidade (eletividade e alternância de poder); Responsabilidade dos agentes públicos; Impeachment do Presidente da República e demais autoridades elencadas pelo art. 52, I e II; Prestação de contas, publicidade dos atos e transparência administrativa; Mecanismos de fiscalização (ação popular – art. 5º, LXXIII, e ação civil pública); Proteção aos Direitos Fundamentais; Submissão dos agentes públicos ao princípio da legalidade. Titularidade do poder pelo povo (parágrafo único do artigo 1º). 3 – Princípio da separação de Poderes 14 - O art. 2º da CF estabelece: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.” - Nesse sentido, a independência e harmonia dos Poderes do Estado permite visualizar que cada um deles, por princípio constitucional, tem esfera própria de atuação. - A independência dos poderes confere aos seus membros algumas prerrogativas funcionais, para que esses atuem também com independência. Assim, podem ser citadas as imunidades parlamentares, a vitaliciedade e a irredutibilidade de remuneração aos membros do Judiciário. III – OBJETIVOS FUNDAMENTAIS DA REPÚBLICA - O art. 3º arrola os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, determinando que todo o sistema legal brasileiro deve permitir a realização da justiça social. - Nesse sentido, são objetivos fundamentais: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. IV - OS PRINCÍPIOS REGENTES DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS - Tais princípios regem o posicionamento do Estado brasileiro perante os demais países e órgãos internacionais. - A tarefa de representar o Brasil foi conferida pelo art. 84, VII e VIII ao Presidente da República que é o Chefe de Estado (e também de Governo). - Contudo, os tratados e acordos internacionais deverão ser referendados pelo Congresso Nacional, para posterior sanção pelo Presidente da República. Caso o acordo internacional seja custoso ao patrimônio nacional, o Congresso resolverá com competência exclusiva sobre sua aplicabilidade ou não no país, sem sanção pelo Presidente da República (art. 49, I). - Em resumo: a. Os tratados internacionais serão assinados pelo Chefe de Estado perante a comunidade internacional (art. 84, VIII). b. O Congresso Nacional deverá então referendar o texto, por meio de Decreto Legislativo. c. Após isso o Presidente da República poderá ou não ratificar o tratado, em nome da soberania nacional (o Decreto Legislativo não vincula a atuação do Presidente). Exceto para os casos do art. 49, I. d. A ratificação do tratado representa a adesão do país ao tratado internacional. e. Após ratificado o tratado, deve haver sua promulgação por intermédio de um Decreto (forma de ato administrativo) do Presidente da República. - Os princípios que regem o relacionamento brasileiro no cenário internacional estão contemplados pelo art. 4º. 15 CAPÍTULO IV ORGANIZAÇÃO DO ESTADO I - CARACTERÍSTICAS DA FEDERAÇÃO - Dalmo de Abreu Dallari, em Elementos de Teoria Geral do Estado (11. ed., São Paulo: Saraiva, 1985, p. 227), define federação como uma aliança ou união de Estados, baseada numa Constituição, na qual “os Estados que ingressam na federação perdem sua soberania, preservandocontudo uma autonomia política limitada”. - Dessa maneira, guarda diferenças com o Estado unitário, pois este tem um só poder centralizado. - Por sua vez, difere da confederação de Estados, pois esta é organizada por um tratado internacional entre países que pode ser dissolvido. - Alexandre de Moraes (p. 266/267), citando Geraldo Ataliba (in República e constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985, p. 10), apresenta a seguinte definição de Federação: 1. Associação de Estados 2. Para a formação de novo Estado (o federal) 3. Com repartição rígida de atributos da soberania entre eles. 4. Há autonomia recíproca entre Estados e União, tudo sob a égide da CF. 5. Tal autonomia caracteriza a igualdade jurídica, dado que ambos extraem suas competências da mesma norma. 6. Cada um dos entes federativos (Estados e União) é supremo em sua esfera. - Assim, estabelecido o princípio federativo, os Estados-membros renunciam de certas parcelas de competências administrativas, legislativas e tributárias. No Brasil, esta renúncia está pactuada nos arts. 1º e 18 da CF, que positivam o princípio federativo. - No Brasil, segundo a doutrina, o federalismo classifica-se como: 1. Federalismo por desagregação5, pois seu surgimento é oriundo de um Estado unitário que se descentralizou com a proclamação da República em 1891. 2. Federalismo cooperativo, no qual há competências comuns ou concorrentes para atuação em conjunto pelos entes federativos6. 3. Federalismo equilíbrio, no qual todos os entes federativos devem conviver harmonicamente. 4. Federalismo de 2º grau: há 3 ordens (União – ordem central; Estados – ordens regionais, e municípios – ordens locais), que deverão observar dois graus para auto-organização: a Constituição Federal e as Constituições Estaduais. Obs.: há posicionamento doutrinário e em provas de concurso que entende que a CF/88 possui federalismo de 3º grau (Constituição Federal, Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais). II - PRINCÍPIOS DA FEDERAÇÃO - Os cidadãos dos diferentes Estados-membros constituintes da União, a partir da criação da federação, devem ter a mesma nacionalidade, caracterizando a Soberania do Estado Federal. - Repartição constitucional de competências entre a União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios (estas são as ordens jurídicas estabelecidas no modelo brasileiro). - Cada ente federativo tem sua própria competência tributária, garantindo-lhe renda própria. - Competência para auto-organização legal, respeitando-se a atribuição constitucional. - Possibilidade constitucional de intervenção federal, de forma excepcional e taxativa (numerus clausus), para manutenção do equilíbrio federativo. - Participação dos Estados-membros no Poder Legislativo Federal. - Possibilidade de criação de novos Estados ou modificação territorial de Estado existente, desde que haja concordância da população afetada. - Existência de órgão de cúpula do Poder Judiciário para interpretação e proteção da Constituição Federal. - No Brasil o legislador constitucional impediu emenda tendente a abolir a Federação. - Inexistência do direito de secessão. - Idioma oficial e símbolos da República: art. 13 (exceção art. 210, § 2º). 5 O contrário seria o federalismo por agregação, no qual vários Estados criam um novo Estado Federal, como nos EUA. 6 Diferentemente do federalismo dual, em que cada ente federativo tem competências distintas. 16 A IMPORTÂNCIA DO PRINCÍPIO FEDERATIVO. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2001, título III: Da organização do Estado, Capítulo 1: A Federação, p. 289/291. O princípio federativo é uma das vigas mestras sobre as quais se eleva o travejamento constitucional. É mesmo tão encarecido e enfatizado pela lei maior, a ponto de ser subtraído da possibilidade de ser alterado até mesmo por via de emenda constitucional. No entanto, a realidade não confirma a significação dada à federação. E muito provável que nenhum princípio tenha sido tão fortemente degradado quanto o federativo. A autonomia estadual é, sob muitos aspectos, uma irrisão7. Fatores diversos têm demonstrado que muitos Estados-Membros não têm condições de sobreviver financeiramente se lhes faltar o apoio do governo federal. Por outro lado, a partilha constitucional de competências não aquinhoa, devidamente, Estados e Municípios, centralizando, ainda, na mão da União a determinação, ao menos nos seus princípios gerais, das diretrizes a prevalecerem em todos os campos legislativos. Uma questão fundamental se coloca preliminarmente, qual seja saber porque a federação ainda é importante. Se ela é algo que nasceu nos EUA, tendo em vista as peculiaridades do processo de unificação daquele país, será que não estaria também restrita à realidade das instituições americanas? Será ainda que outros países não teriam importado o federalismo por mero mimetismo? Será que não seria mais fácil nos deixarmos levar pela corrente avassaladora que ruma no sentido da centralização do poder do que lutar por um federalismo mais retórico do que prático? A resposta é muito simples. O federalismo é, ainda em nossos dias, um princípio rector8 que encontra grande receptividade e ressonância na vida de muitos países. Ele não se desatualizou porque soube encontrar novos fundamentos em substituição àqueles que lhe deram origem. Com efeito, quando se criou a primeira Federação conhecida, a americana, o que se tratou de resolver na época era o problema resultante da convivência entre si das treze colônias inglesas tornadas Estados independentes e desejosas de adotarem uma forma de poder político unificado. De outra parte, não queriam perder a independência, a individualidade, a liberdade e a soberania que tinham acabado de conquistar. Com tais pressupostos surgiu, assim, a federação como uma associação de Estados pactuada por meio da Constituição. Em síntese, foi a forma mais imaginosa já inventada pelo homem para permitir a conjugação das vantagens da autonomia política com aquelas outras defluentes da existência de um poder central. O problema fundamental a ser resolvido então era o da unificação política de comunidades que não se haviam integrado num todo nacional. Ora, entendida a partir desse fundamento, a federação perdeu a razão de ser. No Brasil, poder-se-ia mesmo dizer, nunca teria tido razão de existir, porque a nossa unidade nacional precedeu à própria implantação do federalismo. Faz-se, então, necessário que busquemos os princípios da federação noutros propósitos, metas, ideais e valores. Dentre esses há um que sobreleva a todos os demais e serve, inclusive, para explicar a Federação americana moderna. A federação é, igualmente, a forma mais sofisticada de se organizar o poder dentro do Estado. Ela implica uma repartição delicada de competências entre o órgão do poder central, denominado "União", e as expressões das organizações regionais, mais frequentemente conhecidas por "Estados-Membros", embora, por vezes, seja usado, por igual forma, o nome província e, até mesmo, cantão. Essa partilha de competências entre a União e os Estados é bastante rígida, visto que se apresenta esculpida na própria Constituição Federal, razão pela qual só por intermédio de emenda à Constituição pode ser alterada. Outrossim, os Estados-Membros participam na formação da União através dos senadores que compõem uma Casa do Congresso Nacional. Constata-se, portanto, que na federação — e aqui estamos a falar da federação de outros países, com exceção do Brasil, visto que este previu um terceiro nível, qual seja, o municipal —, os cidadãos se apresentam submetidos a dois poderes políticos diferentes: o regional e o central. Em outras palavras, sobre o mesmo território há a incidência de duas ordensjurídicas diferentes, cada uma atuando no âmbito específico de suas competências. É importante notar que o Estado federal legisla diretamente para os Estados-Membros, sem necessidade da intervenção desses para que suas normas se tornem eficazes. De outra parte, os Estados-Membros não podem retirar-se da federação. O vinculo associativo é indissolúvel. Note-se, ainda, que a significação do fenômeno federativo se exaure dentro do mesmo Estado, ou seja, o direito internacional não faz diferença entre o Estado unitário e o federal. Este só 7 Piada, chacota. 8 Princípio fundamental. 17 tem realidade do ponto de vista do direito constitucional. Isso porque a federação, embora levando ao extremo a possibilidade da descentralização do poder, toda ela transcorre dentro dos limites de um único Estado. Eis aqui o seu traço distintivo específico: ser, por um lado, uma reunião ou uma associação de Estados, mas, de outra parte, dar também lugar a um novo Estado que é o único, de fato, reconhecido pela Ordem Jurídica Internacional. III - UNIÃO - Conceito de União (Moraes, p. 269): é entidade federativa autônoma em relação aos Estados- membros e municípios, constituindo pessoa jurídica de Direito Público Interno, cabendo-lhe exercer as atribuições da soberania do Estado Brasileiro. - A União não se confunde com o Estado Federal: este é pessoa jurídica de Direito Internacional e formada pelo conjunto de União, Estados-membros, DF e municípios. - Na prática, quem age em nome do Estado Federal é a União. - Bens da União: art. 20 IV - ESTADOS-MEMBROS - A autonomia dos Estados se caracteriza pela: A. Capacidade de auto-organização e normatização própria; B. Autogoverno; C. Autoadministração. A) Auto-organização e normatização própria - Tal capacidade se caracteriza pelo exercício do poder constituinte derivado-decorrente: possibilidade da edição de Constituições Estaduais e, consequentemente, de legislação estadual (art. 25). - Contudo, a capacidade de auto-organização e normatização própria precisam respeitar os (a) princípios constitucionais sensíveis, (b) princípios federais extensíveis e (c) princípios constitucionais estabelecidos. a) Princípios constitucionais sensíveis: são aqueles que, quando desrespeitados, podem acarretar em intervenção federal. Tais princípios são aqueles previstos no artigo 34, VII, da CF. b) Princípios federais extensíveis: são as normas centrais comuns à União, Estados, DF e municípios, ou seja, todos devem respeitá-los. Exemplos: art. 1º, I a V; art. 3º , I a IV; art. 4º, I a X; art. 2º; art. 5º, I, II, III, VI, VIII, IX, XI, XII, XX, XXII, XXIII, XXXVI, LIV E LVII, arts. 6º a 11, art. 93, I a XI; art. 95, I a III. c) Princípios constitucionais estabelecidos: determinadas normas espalhadas pelo texto da CF, que organizam a federação e estabelecem preceitos centrais de observância obrigatória aos Estados-membros em sua auto-organização. Subdividem-se em normas de competência (Ex: arts. 23; 24; 25; 27, § 3º) e normas de preordenação (Ex: arts. 27; 28; 37, I a XXO, §§ 1º a 6º; arts. 39 a 41). B) Autogoverno - É o próprio povo do Estado quem escolhe seus representantes no Executivo e Legislativo locais. - A CF prevê, no âmbito estadual, os três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário (arts. 27, 28 e 125 respectivamente). C) Autoadministração - Os Estados têm poder de autoadministração no exercício de suas competências administrativas, legislativas e tributárias. - Regiões de desenvolvimento: medidas administrativas que a União pode tomar dentro dos territórios dos Estados-membros (art. 43 e 174, § 1º). V - MUNICÍPIOS 18 - Pela CF brasileira os municípios fazem parte da Federação como entidades federativas indispensáveis, tendo plena autonomia (ver arts. 1º; 18; 29; 30 e 34, VII, c). - Dentre as Constituições contemporâneas, nenhuma outra no mundo deu tão grande importância ao município. A autonomia municipal caracteriza-se de forma semelhante à autonomia estadual: 1. Capacidade de auto-organização e normatização própria; a. Lei Orgânica Municipal (ver art. 29, CF) e edição de leis municipais (ver art. 30). 2. Autogoverno a. Eleição de prefeito, vice-prefeito e vereadores sem ingerência da União ou do Estado. 3. Autoadministração. a. Realiza autonomamente as competências administrativa, tributária e legislativa. VI - DISTRITO FEDERAL - Também é um ente da federação (arts. 1º e 18), possuidor da tríplice capacidade de 1. auto-organização e normatização própria: lei orgânica e edição de leis distritais (art. 32 caput); 2. autogoverno: eleição de governador e vice, bem como de deputados distritais para a Câmara Legislativa (art. 32, §§ 2º e 3º). 3. autoadministração: o DF exerce suas capacidades legislativas, administrativas e tributárias sem ingerência da União. - Ao Distrito Federal é defeso dividir-se em municípios (art. 32, caput). - Apesar de não ser Estado-membro ou município, o DF tem competências legislativas e tributárias reservadas aos Estados e municípios (arts. 32, § 1º; 147 e 155), com a exceção do art. 22, XVII (o Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública no DF são organizados pela União, havendo assim uma diminuição da autonomia desse ente federativo). VII - TERRITÓRIOS - Territórios não são entes independentes da federação, pois são descentralizações administrativas da União. - Os territórios podem ser criados por lei complementar: art. 18, § 3º. - Atualmente não há mais territórios. Quando a CF foi promulgada havia três: Amapá, Roraima e Fernando de Noronha. - Amapá e Roraima transformaram-se em Estados Federados (art. 14, ADCT ). - Fernando de Noronha foi reincorporado ao Estado de Pernambuco (art. 15, ADCT). VIII - FORMAÇÃO DOS ESTADOS - A CF prevê a possibilidade da transformação dos Estados, podendo haver a criação de novos Estados (art. 18, § 3º). - Hipóteses de alterabilidade divisional interna do território brasileiro: 1. Incorporação ou fusão: dois ou mais Estados se unem com outro nome. Extinguem-se as personalidades jurídicas primitivas e cria-se uma nova. 2. Subdivisão: o Estado originário subdivide-se em duas ou mais partes, extinguindo-se a personalidade jurídica primitiva e criando-se novas (novos Estados). 3. Desmembramento – anexação: consiste em separar-se uma parcela territorial e populacional de um Estado, sem que este perca sua personalidade originária. Neste caso um Estado perde uma parcela territorial e populacional que é anexada a um outro Estado já existente. Assim, não há modificações de personalidade. 4. Desmembramento – formação: consiste em separar-se uma parcela territorial e populacional de um Estado, sem que este perca sua personalidade originária. Diferentemente da anexação, forma-se um novo Estado ou território com a parcela desmembrada. Assim, o Estado originário permanece como antes, contudo com menos território e população, e surge um novo Estado, criando-se uma nova personalidade jurídica. Na prática foi o que ocorreu com o Estado de Tocantins (art. 13, ADCT). Outro exemplo foi a tentativa de subdividir o Estado do Pará com a criação de dois novos Estados (Carajás e Tapajós), mas que foi recusada por 66,6% dos cidadãos após plebiscito com os cidadãos da região realizado em dezembro de 2011. 19 IX - FORMAÇÃO DE MUNICÍPIOS - A CF prevê em seu art. 18, §4º, as formalidades para a formação de municípios. - Procedimento: 1. Criação de Lei Complementar Federal que estabeleça de forma geral o período possível para a formação de novos municípios. Tal lei ainda não foi editada9, portanto a norma constitucional do § 4º do art. 18 tem eficácia limitada, dependendo de complementação. 2.Lei ordinária federal que determine os requisitos genéricos exigíveis, bem como a apresentação e publicação dos Estudos de viabilidade Municipal. 3. Consulta prévia, mediante plebiscito, da população diretamente interessada, ou seja, da população do distrito que se emancipa e se torna município, bem como da população do município desmembrado. 4. Lei ordinária estadual criando especificamente o novo município. Obs: A EC 57/2008 inseriu no ADCT o artigo 96: “Ficam convalidados os atos de criação, fusão, incorporação e desmembramento de Municípios, cuja lei tenha sido publicada até 31 de dezembro de 2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legislação do respectivo Estado à época de sua criação.” Isso foi feito porque a redação original do artigo 18, § 4º, CF assim determinava: criação de município por meio de lei estadual. - De toda forma, atualmente Lei Complementar Federal se faz necessária para a criação de novos municípios, sendo exato que o artigo 96 do ADCT atingiu apenas àqueles municípios criados por lei publicada até 31/12/2006. X - VEDAÇÕES CONSTITUCIONAIS DE NATUREZA FEDERATIVA - O art. 19 prevê tais vedações. - Acabam por decorrer de tais vedações algumas limitações no poder de tributar: 1. Imunidade constitucional recíproca das esferas públicas: art. 150, VI, a. XI - REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS 1 - CONCEITO - Para que haja autonomia entre os entes federativos, necessário se faz a repartição de competências legislativas, administrativas e tributárias. - Segundo José Afonso da Silva, competência é a “faculdade juridicamente atribuída a uma entidade, órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões. [...] são as diversas modalidades de poder de que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções.” - A competência na federação é repartida pela própria CF. 2 - PRINCÍPIO DA PREDOMINÂNCIA DO INTERESSE - O princípio da predominância do interesse é observado para a distribuição de competências. Tal princípio se manifesta da seguinte maneira: Ente federativo Interesse União Geral Estados-membros Regional Municípios Local Distrito Federal Regional + Local10 - Diante de tal princípio, estabelecem-se quatro pontos básicos: A – Reserva de campos específicos de competência administrativa e legislativa: Ente federativo Campo União Poderes enumerados (arts. 21 e 22) Estados-membros Poderes Remanescentes (art. 25, § 1º) 9 A Lei 10.521/2002 assegurou a instalação dos Municípios criados por Lei Estadual, cujo processo de criação teve início antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 15 do ano de 1996, desde que o resultado do plebiscito tenha sido favorável e que as leis de criação tenham obedecido à legislação anterior. 10 Com a exceção da organização do Judiciário, MP e Defensoria Pública (art. 22, XVII). 20 Municípios Poderes enumerados (art. 30) Distrito Federal Poderes dos Estados + Municípios (art. 32, § 1º) B – Possibilidade de delegação => segundo o art. 22, par. ún., CF, por meio de Lei complementar federal a União poderá delegar matérias de sua competência privativa aos Estados, possibilitando que estes legislem sobre o assunto delegado. C – Áreas comuns de atuação administrativa paralela => art. 23. D – Áreas de atuação legislativa concorrente => art. 24. 3 – REPARTIÇÃO EM MATÉRIA ADMINISTRATIVA Competência Administrativa Exclusiva Poderes Enumerados União (art. 21) Municípios (art. 30) Poderes Reservados Estados (art. 25, § 1º) Comum Cumulativa ou Paralela União/Estados/ DF/Municípios (art. 23) A) Competências administrativas exclusivas 1 – Competências administrativas da União (poderes enumerados) => art. 21. 2 - Competências administrativas dos Estados-membros (poderes reservados) Aos Estados cabe a competência remanescente, ou seja, o que não for da União (art. 21), o que não for dos municípios (art. 30) e o que não for de competência comum (art. 23), é competência reservada dos Estados. Dessa maneira, defere-se ao Estado maior autonomia, pois a competência da União é numerus clausus e a dos Estados é aberta, excetuando-se assim, apenas o constitucionalmente previsto (lista rígida). Tal preceito é adotado pela Constituição estadunidense e também foi adotado em todas as CFs brasileiras, com a intenção de propiciar maior autonomia e controle administrativo ao Governo Estadual. 3 - Competências administrativas dos Municípios (poderes enumerados) Art. 30. Soma-se às tais competências constitucionalmente deferidas a regra geral do interesse local. 4 – Competências administrativas do Distrito Federal 32, § 1º => competências estaduais + competências municipais. B) Competência administrativa comum => art. 23 4 – REPARTIÇÃO EM MATÉRIA LEGISLATIVA 1 – Competência privativa da União Art. 22 Fica claro que a União tem supremacia em relação aos demais entes da federação nos assuntos legislativos. Trata-se de uma necessidade teórica e prática para preservação da federação. Isto confere ainda hierarquia superior das leis federais sobre as estaduais e municipais 21 1.2 – Delegação de competência da União para os Estados - A União, conforme art. 22, par. ún., pode delegar assuntos legislativos privativos de sua competência aos Estados. Para tanto precisa respeitar três requisitos: a. Requisito formal: a delegação deve acontecer via lei complementar (votada por maioria absoluta no Congresso Nacional); b. Requisito material: somente pode ser delegado um ponto específico, assim a lei complementar que delega a competência não pode ter caráter geral e sim particular, ou seja, deve haver identificação de matérias específicas. c. Requisito implícito: o art. 19, III, veda a possibilidade de favorecimentos entre os entes federativos. Por assim ser, a União, quando realizar delegação de competência legislativa, deve fazer para todos os Estados-membros, sem distinções, sob pena de ferir o princípio da igualdade. 2 – Competência concorrente entre União, Estados e DF Art. 24. A doutrina divide a competência concorrente em cumulativa (não há limites entre os entes – todos legislam livremente sobre as questões concorrentes) e não cumulativa ou vertical (há reserva de um nível superior de competência à União, que fixa os princípios e normas gerais, deixando-se aos Estados-membros a complementação). A CF brasileira adotou a competência concorrente não-cumulativa ou vertical, de forma que a competência da União está limitada ao estabelecimento de normas gerais para as previsões do art. 24, devendo os Estados e DF especificá-las, através de suas respectivas leis às necessidades regionais. É a chamada competência suplementar (art. 24, § 2º). Dessa maneira, reduzem-se as incompatibilidades entres as legislações regionais e nacional. As matérias previstas no art. 24 não poderão ser delegadas aos demais entes, bem como o rol é taxativo. Havendo inércia por parte da União na edição da lei sobre as matérias do art. 24, terão os Estados e DF a competência supletiva, para poder editar livremente a lei necessária. A superveniência de lei federal sobre assuntos do art. 24 suspende a eficácia das leis regionais no que forem contrárias, prevalecendo a hierarquia da legislação federal. 3 – Competência dos Estados-membros 3.1 – Competência remanescente ou reservada Cabe ao Estado legislar sobre o que não lhe é vedado. São vedações explícitas: art. 22 (União) e 30 (municípios). São vedações implícitas as necessidade de observar os princípios sensíveis (quando desrespeitados, podem acarretar em intervenção federal- art. 34, VII), estabelecidos (são determinadas normas espalhadas pelo texto da CF, que organizam a federação e estabelecem preceitos centrais de observância obrigatória - Ex: arts. 23; 24; 27; 28, etc.) e federais extensíveis (normas centrais comuns à União, Estados, DF e municípios - Ex: art. 1º, I a V; art. 3º , I a IV, etc). Excepcionalmente a CF enumerou algumas competências para os Estados: art. 18, § 4º; art. 25, § 2º e 3º. 3.2 – Competência delegada pela União => art. 22. 3.3 – Competência concorrente suplementar ou supletiva => art. 24. 3.4 - O caso dos transportes - À União é deferida a competência exclusiva sobre a legislação sobre comércio internacional e interestadual, trânsito e transportes (art. 22, VIII e XI). - Por sua vez, o art. 21, XII, “e”, confere à União possibilidade de explorar os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional. 22 - Nessa sede, o art. 30, V, defere aos municípios a exploração dos serviços de transporte coletivo local, ou seja, dentro do município. - Consequentemente, caberá à União organizar a política nacional de transportes, ao município as regras de interesse local de transportes coletivos. Assim, por previsão do art. 25, § 1º, aos Estados caberá a edição de normas de trânsito e transporte intermunicipal (competência remanescente). 4 – Competência exclusiva e suplementar do Município 4.1 - Competência genérica em virtude da predominância do interesse local Art. 30, I; O interesse local muitas vezes pode ser concomitante ao interesse regional e nacional. Assim, devem ser analisadas caso a caso as situações de legislação conflitante, prevalecendo o princípio da predominância do interesse. Exemplos: o polícia das edificações o coleta de lixo o ordenação de uso do solo urbano o horário de funcionamento do comércio local o Nota: O STF e STJ já decidiram que o horário de funcionamento dos bancos é de competência da União. 4.2 - Competência para estabelecimento de Plano Diretor - Cada município pode estabelecer sua política de desenvolvimento urbano, conforme dispuser a lei local => Art. 182 e § 1º. Daí decorre a competência municipal para determinar o cumprimento da função social da propriedade imobiliária => art. 182, §§ 2º e 4º. 4.3 - Competências enumeradas Art. 30, III a IX Art. 144, § 8º 4.4 - Competência suplementar Art. 30, II. Contudo, a competência suplementar do município estará sempre sujeita ao princípio do interesse local. 5 – Competência reservada do Distrito Federal Art. 32, § 1º. Cabe então ao DF as competências de Estado e município cumuladas, ressalvado o disposto no art. 22, XVII e 21, XIII. Assim sendo, compete ao DF: o Editar sua própria lei orgânica (art. 32, caput). o A competência remanescente dos Estados-membros (art. 25, § 1º). o A competência que pode ser delegada pela União (art. 22, par. ún.). o A competência concorrente-suplementar dos Estados-membros (art. 24, §§ 2º e 3º). o A competência enumerada do município (art. 30, I, II a IX). o A competência suplementar do município (art. 30, II). 23 CAPÍTULO V ORGANIZAÇÃO DOS PODERES I – INTRODUÇÃO - A teoria da separação de poderes tornou-se matéria constitucional por influência de Montesquieu, com intuito de assegurar a liberdade dos indivíduos. O Espírito das Leis, em seu Livro XI, capítulo VI, retrata que se os poderes (legislativo, executivo e judiciário) se concentrarem nas mãos de um mesmo organismo ou pessoa, não haverá liberdade para os cidadãos, uma vez que o governante poderá fazer leis tirânicas, executando-as sem maiores problemas. - A teoria da separação dos poderes, preventiva de governos absolutos, com raízes bem lançadas no século XVIII11 teve o reforço, no século XIX, da ideia de que poderes separados e especializados trariam maior eficiência ao Estado. II - O SISTEMA NO BRASIL 1 - Introdução - Segundo explicita Alexandre de Moraes, a CF brasileira previu a tripartição para evitar abusos e desrespeitos aos direitos fundamentais do homem. Temos assim o Executivo, Legislativo e Judiciário. - Previu ainda, além do executivo, legislativo e do judiciário, a figura da Instituição do Ministério Público, que é independente dos demais poderes. - O Ministério Público, segundo preceitua o artigo 127, da Carta, “é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. - Com a criação do MP, preserva-se a inércia do Judiciário, pois o MP é atuante o Judiciário não, depende de impulso dos interessados. Se o Judiciário se movimentasse para preservar ou garantir direitos, deixaria de ser imparcial. - No Brasil a separação de poderes é cláusula pétrea, não podendo ser abolida (art. 60, § 4º, III). 2 – Funções estatais, imunidades e garantias em face do princípio da igualdade. - Para que um sistema de governo composto por uma pluralidade de órgãos funcione corretamente, é necessário que o relacionamento entre os órgãos seja pautado por normas de lealdade constitucional (os órgãos devem cooperar na medida necessária para realizar os objetivos constitucionais e evitar ao máximo atritos + os titulares dos poderes devem respeitar-se mutuamente). - Para tanto, são criadas imunidades e garantias para os membros do Legislativo, Executivo, Judiciário e MP. As imunidades e garantias criadas pela CF são decorrentes do princípio da igualdade: garantir tratamento isonômico entre os membros dos Poderes e do MP. Pode contudo, haver diferenciações entre tais poderes, desde que sejam necessárias ao desenvolvimento de suas atividades (tratar desigualmente aos desiguais), criando-se assim para cada uma das divisões garantias e imunidades próprias, desde que justificadas no pleno funcionamento do órgão. Garante-se assim o célebre sistema de freios e contrapesos (um poder tem lastro para resistir às influências negativas dos outros, bem como coibir os exageros dos demais). Isto tudo garante a perpetuidade da separação de poderes e, consequentemente, o regime democrático (evita-se autoritarismos de um só poder). 11 Época em que se buscava um liberalismo (redução do intervencionismo estatal nas atividades particulares). 24 CAPÍTULO VI PODER LEGISLATIVO 1 – FUNÇÕES - A CF, ao repartir os poderes, deu a cada um deles funções específicas e predominantes (art. 2º). Assim, os poderes têm funções típicas e atípicas. - As funções típicas do Poder Legislativo são legislar e fiscalizar, tendo ambas a mesma importância. O Congresso Nacional deve editar as normas jurídicas (legislar) bem como fiscalizar as áreas contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Poder Executivo (art. 70). - Funções atípicas: administrar e julgar. É o próprio Congresso quem determina sua administração interna, ditando as regras sobre sua operacionalidade interna, cargos, promoções. A atividade julgadora do Congresso ocorre, por exemplo, quando julga o Presidente da República por crime de responsabilidade. 2 – CONGRESSO NACIONAL - O Poder Legislativo, no âmbito federal, é bicameral e exercido pelo Congresso Nacional que se compõe da Câmara dos Deputados (representantes do povo) e do Senado Federal (representantes dos entes federativos: Estados e DF) – art. 44. - No âmbito dos Estados e Municípios é consagrado o unicameralismo (Assembleia dos Deputados e Câmara dos Vereadores respectivamente). - O Congresso se reunirá anualmente na Capital Federal de 02 de fevereiro até 17 de junho e de 1º de agosto até 22 de dezembro de cada ano (art. 57). - Contudo, o art. 57, § 6º prevê a convocação extraordinária.Nessa reunião extraordinária o Congresso deliberará sobre os assuntos que motivaram a convocação, incluídos também a análise das medidas provisórias em vigor no período de sua convocação. - O órgão administrativo de direção do Congresso Nacional é a Mesa. A Mesa será presidida pelo Presidente do Senado Federal, e os demais cargos serão exercidos, alternadamente, pelos ocupantes de cargos semelhantes na Câmara e no Senado, conforme dispuserem seus regimentos internos. - As mesas da Câmara e do Senado serão eleitas por e com seus membros, para mandato de dois anos, sem possibilidade de reeleição para o mesmo cargo. - Atribuições do Congresso Nacional: Com participação do Poder Executivo, por meio de sanção presidencial: art. 48. Por meio de decreto legislativo (competências exclusivas): art. 49. 3 – CÂMARA DOS DEPUTADOS - São os representantes do povo eleitos pelo sistema de representação proporcional ao número de eleitores de cada Estado ou do DF, para um mandato de quatro anos. - Lei complementar n. 79/1993 dispõe: máximo de 513 deputados (mínimo oito por Estado). Quatro deputados por Território. O Estado mais populoso será representado por 70 deputados. - Há, contudo, ajustes que destoam a proporcionalidade (máximo 70 e mínimo de oito deputados por Estado), desconstruindo o princípio da igualdade do voto do art. 14, caput (um homem um voto). Adotou-se, portanto, o método do quociente eleitoral. - Competências privativas da Câmara dos Deputados – art. 51. 4 – SENADO FEDERAL - São os representantes dos entes federativos (Estados e DF), garantindo, dada sua igualdade em número, da isonomia de opiniões entre os entes. Assim, cada Estado ou o DF tem igual número de representantes, elegendo três Senadores cada (art. 46, § 1º). - O Senado Federal apresenta representação federativa (não importa o número de habitantes). - Os representantes do Senado são eleitos pelo sistema do princípio majoritário (mais votados em cada Estado ou DF). Atualmente com o total de 81 Senadores. - Cada Estado e o DF elegerão três Senadores com mandato para duas legislaturas (oito anos - art. 46, § 1º). Os representantes serão renovados de quatro em quatro anos, de forma alternada (art. 46, § 2º). 25 - As competências exclusivas do Senado estão dispostas no art. 52. 5 - FUNÇÕES TÍPICAS DO PODER LEGISLATIVO 5.1 – Fiscalização: Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) e Tribunal de Contas da União. - Classificação: I. Controle político-administrativo: fiscalização dos atos do Poder Executivo – análise da gestão da coisa pública por meio de CPIs (art. 58, § 3º). A CPI pode ser prorrogada, mas deve ter fim até o término da legislatura de seus membros. Pode haver CPI em conjunto (Congresso) ou independente (somente Senado ou somente Câmara). II. Controle financeiro orçamentário: arts. 70 a 75 = Tribunal de Contas da União. I – Comissão Parlamentar de Inquérito - Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) é formada para conduzir uma investigação a partir da tomada de depoimentos e análise de documentos, pelo prazo máximo de seis meses (120 dias + 60 dias de prorrogação). A CPI precisa investigar um fato específico, não genérico. - O pedido de instalação de CPI deve conter a assinatura de 1/3 dos membros da Casa. - Dada a falta de precisão do texto constitucional no § 3º, do art. 58 (por exemplo, fala em poderes de investigação próprios da autoridade judicial – a autoridade judicial no Brasil não tem poderes de investigação, quem investiga são as Polícias e o MP), é preciso estabelecer melhor o âmbito das atividades das CPIs. - As CPIs devem respeitar os limites constitucionais e buscar apenas os objetivos determinados na sua criação (podendo investigar situações paralelas desde que úteis ao objetivo final), podendo realizar a mesma atividade de busca pela provas do juízes no âmbito penal = poderes instrutórios. Precisam justificar seus atos e jamais agir com arbitrariedade. - Assim, os poderes de investigação das Comissões Parlamentares correspondem: Possibilidade de quebra de sigilo bancário (exceto CPI de âmbito municipal). Oitiva de testemunhas, inclusive com a possibilidade de condução coercitiva. Oitiva de investigados ou indiciados, preservando-se o direito ao silêncio (ninguém será obrigado a produzir prova contra si mesmo). Determinação de buscas e apreensões: podem determinar às polícias a realização de buscas de elementos probatórios. Convocar ministro de Estado. Tomar depoimento de autoridade federal, estadual ou municipal. Ir a qualquer ponto do território nacional para investigações e audiências públicas. Prender em flagrante delito. Requisitar informações e documentos de repartições públicas e autárquicas. Requisitar funcionários de qualquer poder para ajudar nas investigações, inclusive policiais. Pedir perícias, exames e vistorias, inclusive busca e apreensão (vedada em domicílio). Determinar ao Tribunal de Contas da União (TCU) a realização de inspeções e auditorias. Quebrar sigilo fiscal e de dados (inclusive telefônico, ou seja, extrato de conta e não escuta ou grampo). - Contudo, por não serem órgãos judiciais, as CPIs não poderão: Decretar quaisquer hipóteses de prisão, salvo em flagrante. Determinar quaisquer medidas cautelares, como indisponibilidade de bens, arrestos, sequestros, hipoteca judiciária, proibição de ausentar-se da Comarca ou do Município. Proibir ou restringir a assistência judiciária aos investigados. Determinar invasão de domicílio e interceptação telefônica. Impedir a presença de advogado do depoente na reunião (advogado pode: ter acesso a documentos da CPI; falar para esclarecer equívoco ou dúvida; opor a ato arbitrário ou abusivo; ter manifestações analisadas pela CPI até para impugnar prova ilícita - Os abusos praticados pelas CPIs são controlados pelo STF. 26 II – Tribunal de Contas - É órgão auxiliar do Poder Legislativo, embora a ele não subordinado, que pratica atos de natureza administrativa com intuito fiscalizatório. - O Tribunal de Contas da União tem sede no DF e terá as funções descritas no art. 71. - Quando o TCU rejeita as contas apresentadas pelo Chefe do Executivo, caberá apresentar parecer ao Congresso Nacional, para que este realize o julgamento das contas (art. 49, IX). - Composição do TCU – artigo 73. 6 – PROCESSO LEGISLATIVO A - Noções Gerais - Conceito: mecanismo pelo qual os representantes eleitos pelo povo elaboram as normas a serem aplicadas no território abrangido. - O processo legislativo no Brasil está previsto na CF. O descumprimento pelo Poder Legislativo do processo previsto torna a lei editada inconstitucional. - A CF, no artigo 59, prevê quais as espécies legislativas: I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções. Obs: o termo a “lei”, como referido no artigo 5, II, da CF, refere-se à todas as espécies previstas pelo artigo 59, ou seja, a todo norma prevista constitucionalmente para criação de regras que estabelecem permissões, obrigações ou proibições. - Cabe saber três importantes conceitos sobre o processo legislativo: Desconstitucionalização: é nome técnico que se dá à manutenção em vigor, perante uma nova ordem jurídica, da Constituição anterior, que perderá sua hierarquia constitucional, passando a operar como legislação comum. Não há esse instituto no Direito brasileiro. o Com a edição de uma nova constituição as antigas leis permanecem válidas, desde que compatíveis com o novo ordenamento. Recepção: é o acolhimento que uma nova Constituição posta em vigor dá às leis e atos normativos editados sob o manto da
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