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A HIERARQUIA DOS TRATADOS NA ORDEM JURÍDICA BRASILEIRA

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A HIERARQUIA DOS TRATADOS NA ORDEM JURÍDICA BRASILEIRA
RESUMO
Os Tratados são acordos internacionais que foram concluídos por escrito entre Estados ou entre Estados e Organizações, estes, são regidos pelo Direito Internacional. Eles podem conter um único instrumento, assim como pode ter dois ou mais instrumentos conexos, independente de sua denominação específica. Em outras palavras, temos que o tratado é um meio pelo qual sujeitos de direito internacional – especialmente os Estados nacionais e as organizações internacionais – estipulam direitos e obrigações entre si.
A partir do desenvolvimento da sociedade internacional e a intensificação das relações entre as nações, os tratados, os costumes, assim como os princípios norteadores de Direito, passaram a serem as principais fontes de Direito internacional existentes. Recentemente os Tratados Internacionais passaram a assumir funções semelhantes às exercidas pelas leis e contratos no direito interno dos Estados, pois passaram a regulamentar as mais variadas relações jurídicas entre países e organizações internacionais, bem como entre outros sujeitos de direito internacional, quando celebram um determinado tratado as partes são denominados de “Partes Contratantes” ou simplesmente de “Partes” a este acordo.
Os tratados se assentam sobre os princípios costumeiros materializados e, desde o inicio do Século XX, as normas escritas, em especial a uma das primeiras reuniões internacionais que culminaram na Convenção de Viena sobre Direitos dos Tratados (CVDT) no ano de 1960. Dentre os princípios costumeiros, destaca-se o principio lógico que rege os pactos negociais até os dias atuais, o principio-logico pacta sunt servanda, traduzindo-se literalmente do latim como “os acordos devem ser cumpridos”, bem como o principio da boa fé, onde ambos encontram-se dispostos no costume internacional, assim como no artigo 26 da Convenção de Viena Sobre Direitos dos Tratados. No ano de 1986 durante a nova Convenção de Viena, a convenção passou a regular o direito dos tratados celebrados por Estados e Organizações Internacionais.
Uma das melhores doutrinas que abordam o conceito e demais características dos tratados internacionais é a do doutrinador Louis Henkin, no que tange:
“acordos obrigatórios celebrados entre sujeitos de Direito Internacional, que são regulados pelo Direito Internacional. Além do termo ‘tratado’, diversas outras denominações são usadas para se referir aos acordos internacionais. As mais comuns são Convenção, Pacto, Protocolo, Carta, Convênio, como também Tratado ou Acordo Internacional. Alguns termos são usados para denotar solenidade (por exemplo, Pacto ou Carta) ou a natureza suplementar do acordo (Protocolo)”
 EFEITOS JURÍDICOS NA ORDEM INTERNACIONAL
O acordo passa a vigorar para as partes a partir da manifestação de vontades do poder Executivo, que pode decorrer mediante a assinatura, aceitação e aprovação, gerando assim, efeitos para todos os pactuantes e, esse é o efeito jurídico na ordem internacional, gerando efeitos entre um Estado e os demais pactuantes.
Os tratados apenas produzem efeitos na ordem interna depois de aprovado pelo Legislativo, ou seja, a mera assinatura do representante do poder executivo do País não gera direitos ou deveres para os cidadãos deste País, ou seja, enquanto não for ratificada pelo poder legislativo a convenção não será inserida no Direito regulador do país.
No Brasil cerca de 90% dos tratados exigem aprovação pelo Legislativo, assim que a ratificação é a aprovação pelo Congresso Nacional, sendo que o art. 49, inciso I da CF prevê que "é da competência exclusiva do Congresso Nacional: I – resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional".
HIERARQUIA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS
Quando abordamos o estudo da hierarquia dos tratados internacionais, buscamos compreender o impacto gerado no ordenamento jurídico interno, pela referida convenção, em outras palavras, o Estado signatário. De outro modo, a convenção conecta-se ao poder de superar as leis internas do Estado incorporador, dificultando seus efeitos em casos de desordens normativas. Sendo assim, se podem caracterizar os tratados como sendo de hierarquia supraconstitucional, constitucional e infraconstitucional, toda via, tais tratados ainda são supralegais, infraconstitucionais legais.
Sob esta abordagem, podemos apreciar a teorização da hierarquia dos acordos em três diferentes momentos, ou seja, dividiu-se no período anterior a vigência da Constituição de 1988, o momento após o advento desta Carta Magna, todavia antes do surgimento da Emenda Constitucional nº45/1004 e, posteriormente a promulgação da respectiva emenda.
Antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 45/04 a Constituição não trazia em seu artigo 5º o parágrafo 3º sendo necessária a utilização exclusiva do parágrafo 2º para explicar o status dos tratados internacionais de direitos humanos o que provocava desordem na doutrina, bem como na jurisprudência. O parágrafo 2º do artigo 5º ocasionou a fenda do bloco de constitucionalidade, ao garantir aos sujeitos diversos direitos além dos expressos na Constituição Federal. Todavia, apenas a utilização de tal medida não resolveu o problema do grau normativo dos tratados internacionais de direitos humanos promulgados no Brasil. Neste seguimento o doutrinador Ingo Wolfgang Sarlet (2013, p. 1522):
A norma contida no § 2º do art. 5º da CF traduz o entendimento de que, além dos direitos expressamente positivados no capítulo constitucional próprio (dos direitos e garantias fundamentais), existem direitos que, por seu conteúdo e seu significado, integram o sistema da Constituição, compondo, em outras palavras, na acepção originária do direito constitucional francês, o assim chamado bloco de constitucionalidade, que não se restringe necessariamente a um determinado texto ou mesmo conjunto de textos constitucionais, ou seja, não se reduz a uma concepção puramente formal de constituição e de direitos fundamentais. Assim, a despeito do caráter analítico do Título II da CF, onde estão contidos os direitos e garantias como tal designados e reconhecidos pelo constituinte, cuida-se de uma enumeração não taxativa. O art. 5º, § 2º, da CF, representa, portanto, uma cláusula que consagra a abertura material do sistema constitucional de direitos fundamentais como sendo um sistema inclusivo e amigo dos direitos fundamentais.
Mesmo antes da chegada da EC 45/04 alguns doutrinadores asseguravam que o conteúdo materialmente fundamental dos tratados internacionais de direitos humanos, contudo, devido a falha existente na transcrição do parágrafo 2º esta corrente recebeu diversas críticas, mesmo antes da emenda parte da doutrina nacional já acreditava que, além disso, a redação do parágrafo 1º do artigo 5º não era necessário o decreto de promulgação para 	que ocorre-se a validação interna do tratado internacional de direitos humanos, bastando para isso apenas a ratificação do mesmo. Para os autores ligados a tal corrente, a dignidade humana era utilizada como base pra a teoria exposta. É nítido este entendimento nas palavras do doutrinador André de Carvalho Ramos, quando o mesmo aponta que:
Por outro lado, o art. 5º, § 2º da CF dispõe que “os direitos garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. A expressão “não excluem outros decorrentes (...) dos tratados” fez com que parte da doutrina defendesse que a Constituição havia adotado a hierarquia constitucional dos tratados de direitos humanos.
Já Canotilho apoiava a teoria da constitucionalidade dos tratados internacionais de direitos humanos com base na interpretação do artigo 16 da Constituição Portuguesa de 1976 o qual o conteúdo se assemelha ao do artigo 5º, parágrafo 2º da Carta de 1988, contudo até mesmo Canotilho admitiu a dupla interpretaçãoda Constituição Portuguesa ao considerar a probabilidade de os direitos básicos emanados de tratados internacionais penetrarem no ordenamento interno com status ordinário.
Ate o ano de 2008, era o entendimento da jurisprudência que os tratados de direitos humanos eram nivelado as leis ordinárias do País Incorporador. No entanto, no ano de 2000 o Ministro José Paulo Sepúlveda Pertence apontou em seu entendimento, visionário, acerca da matéria em discussão, que tais tratados possuiriam caráter supra legal. Todavia, apenas no ano de 2008, através do julgamento do RE 466.343-SP que o Supremo Tribunal Federal mudou seu entendimento com voto precursor do Ministro Gilmar Ferreira Mendes que, aliás, citou o Ministro Sepúlveda Pertence.
A promulgação da Emenda Constitucional nº 45/1004, trouxe com ela a chamada reforma do Poder Judiciário, ao introduzir o parágrafo 3º do artigo 5º da Constituição da Republica Federativa do Brasil o qual dispõe:
Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes a emendas constitucionais”; desta forma o que a emenda 45 fez foi tentar resolver a problemática da hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos. (BRASIL, Constituição Federal de 1988).
Este paragrafo foi uma tentativa de sanar as contendas doutrinárias e jurisprudenciais que incidiam à época em deferência da hierarquia dos tratados de direito internacional incorporados no ordenamento jurídico interno brasileiro, agrupando para tanto o parágrafo anterior, porém o poder reformador não conseguiu associar o entendimento a importância da aludida problemática.
O entendimento doutrinário tem sido no sentido de que os tratados internacionais ligados aos direitos humanos compõem o bloco de constitucionalidade, independentemente do seu quórum de aprovação, além de também possuírem aplicação imediata. Nesse sentido Mazzuoli explica que:
Em suma, a conclusão que se chega é que quaisquer tratados internacionais em vigor no Brasil têm, no mínimo, nível supralegal, estando abaixo da Constituição e acima de todas as leis nacionais (ordinárias, complementares e etc). Já os tratados de direitos humanosguardam nível constitucional no Direito brasileiro, independentemente da aprovação qualificada do art. 5º, § 3º, da Constituição, resolvendo-se o eventual conflito entre tais tratados e as normas constitucionais pelo princípio pro homine, que preza pela aplicação da norma mais favorável ao ser humano.
Assim, para Valério Oliveira Mazzuoli, os tratados internacionais de direitos humanos ou são materialmente constitucionais, devido a sua interpretação do art. 5º, § 2º, ou são formalmente e materialmente constitucionais, quando obedecidos os requisitos do art. 5º, § 3º. Deste modo a doutrina aponta dois grandes grupos de direitos fundamentais, os quais sejam: 1) os direitos positivados no ordenamento jurídico interno tais quais os implícitos àqueles previstos na Constituição e 2) os direitos emanados do direito internacional provenientes de tratados internacionais.
Pode-se concluir ao observar a explanação acerca da matéria estudada, aponta que a expansão dos tratados internacionais ocasionou uma mudança de paradigma do Supremo Tribunal Federal quanto à utilização de tais instrumentos normativos. Deste modo, a partir do julgamento de um caso concreto de prisão civil de depositário infiel, o direito brasileiro passou a ter três graus hierárquicos no que tange aos tratados internacionais: lei ordinária, supralegalidade e no caso de tratados sobre direitos humanos que tenham observado aos requisitos formais terão o status de emendas constitucionais.
Quanto à questão acerca da hierarquia entre as leis complementares e as leis ordinárias, considera-se a tese que sustenta que a hierarquia entre as primeiras sobre as ultimas devido a três elementos básicos: a autonomia normativa da lei complementar, o quórum qualificado para aprovação e a possibilidade de revogação de uma lei complementar sobre uma lei ordinária.
Pode-se concluir também, que não o que se falar em limitar o que pode tornar a ser matéria de uma lei complementar, uma vez que, se o legislador constituinte não dispôs sobre qualquer limite, bem como não abriu margem para qualquer interpretação nesse sentido, não há que se considerar que as leis complementares somente possam tratar de conteúdo previsto de maneira prévia no texto constitucional.
Por fim, reputamos que o Código Tributário Nacional, entrou em vigor possuindo o status de Lei ordinária e após o advento da Constituição Federal de 1988 o mesmo acabou por ser recepcionado como lei complementar e, portanto prevalece sobre a legislação ordinária.
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar F.; SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L. (Coords). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de direito internacional público. 7. Ed. Rev. Atual. Ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
MELLO, Celso de Albuquerque. Curso de direito internacional público, volume I. 15. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.
RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014.
VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. 4º. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

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