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CAPÍTULO 2 O LúdicO e a arte na aprendizagem A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Conhecer o papel da arte na educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental. 3 Compreender a arte como meio de comunicação e expressão na infância. 32 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 32 33 O LúdicO e a arte na aprendizagem 33 Capítulo 2 cOntextuaLizaçãO A Arte está presente na vida das pessoas desde o início da humanidade como forma de comunicação e expressão. Desde a pré-história o homem já se comunicava através dos desenhos e códigos impressos na rocha. Por meio das expressões artísticas é possível, além de manifestar sentimentos, perceber o mundo de forma poética, sensível e contextualizada. Sabemos que tanto a Arte, como o lúdico, os brinquedos e brincadeiras, são fatores fundamentais para o desenvolvimento da criança. Brincar, jogar e trocar experiências artísticas e lúdicas com seus pares permite interação, socialização e aprendizagem. Nesse capítulo, apresentaremos a você, caro(a) aluno(a), algumas possibilidades e reflexões acerca do trabalho com a arte e a ludicidade com crianças na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental. O papeL da arte na infância: educaçãO infantiL e anOs inciais dO ensinO fundamentaL Para iniciar nossa conversa sobre o papel da arte na infância, convidamos você, caro(a) aluno(a), a relembrar momentos da sua infância através de uma das linguagens da Arte: a poesia. (apud MAGALHÃES JÚNIOR, 1972, p. 268). MEUS OITO ANOS (Casimiro de Abreu) Oh que saudades que tenho Da aurora da minha vida, Da minha infância querida Que os anos não trazem mais Que amor, que sonhos, que flores, Naquelas tardes fagueiras, A sombra das bananeiras, Debaixo dos laranjais. 34 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 34 Como são belos os dias Do despontar da existência Respira a alma inocência, Como perfume a flor; O mar é lago sereno, O céu um manto azulado, O mundo um sonho dourado, A vida um hino de amor! Que auroras, que sol, que vida Que noites de melodia, Naquela doce alegria, Naquele ingênuo folgar O céu bordado de estrelas, A terra de aromas cheia, As ondas beijando a areia E a lua beijando o mar! Oh dias de minha infância, Oh meu céu de primavera! Que doce a vida não era Nessa risonha manhã Em vez das mágoas de agora, Eu tinha nessas delicias De minha mãe as carícias E beijos de minha, irmã! Livre filho das montanhas, Eu ia bem satisfeito, Pés descalços, braços nus, Correndo pelas campinas A roda das cachoeiras, Atrás das asas ligeiras Das borboletas azuis! 35 O LúdicO e a arte na aprendizagem 35 Capítulo 2 Naqueles tempos ditosos Ia colher as pitangas, Trepava a tirar as mangas Brincava beira do mar! Rezava as Aves Maria, Achava o céu sempre lindo Adormecia sorrindo E despertava a cantar! Oh que saudades que tenho Da aurora da minha vida Da, minha infância querida Que os anos não trazem mais Que amor, que sonhos, que flores, Naquelas tardes fagueiras, A sombra das bananeiras, Debaixo dos laranjais! As palavras de Casimiro de Abreu nos permitem refletir sobre a importância desta fase tão importante da vida das pessoas: A infância. Fase da vida em que a fantasia, as brincadeiras e o faz de conta andam de mãos dadas, quando a aprendizagem acontece em meio a tantas possibilidades e vivências históricas, culturais e lúdicas. Como afirma o poeta, fase que deixa saudades e, em que o tempo não volta. Iniciar nossa reflexão sobre o papel da arte na infância, apreciando uma obra de arte, neste caso, o poema de Casimiro de Abreu, é oportunizar a você, caro(a) aluno(a), momento de contextualização cultural e histórica. São esses momentos que compreendemos como fundamentais para a construção humana sensível. Você que é educador costuma apreciar obras de arte? Qual o seu contato com a arte, como educador e sujeito cultural ou histórico? Quais as obras que você já teve a oportunidade de apreciar? Já oportunizou este contato com obras de arte aos seus alunos? 36 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 36 Levantamos esses questionamentos para provocar em você a reflexão sobre o modo como a Arte está presente na vida das pessoas; porém, nem sempre nos apropriamos dos conhecimentos que a própria Arte nos oferece. Antes de apresentar sobre o papel da Arte na infância é importante refletir sobre o papel da Arte em nossas vidas. Diariamente nos deparamos com imagens como se fôssemos bombardeados por elas o tempo inteiro. Ouvimos diferentes músicas, apreciamos encenações, filmes, novelas, performances em diferentes pontos da cidade e muitas vezes deixamos que esses momentos, essas manifestações das diferentes linguagens artísticas passem despercebidas. Nem sempre aproveitamos estas oportunidades como momento de conhecimento artístico e cultural, valorizando a Arte que a própria realidade da sociedade contemporânea nos oferece. Você já parou para analisar a função da Arte na sua vida? Já pensou no conhecimento adquirido no momento de fruir e contextualizar imagens? Você já se perguntou qual a real importância da Arte na vida das pessoas? O termo Fruir, muito utilizado no campo das Artes, diz respeito a apreciação, leitura e interpretação da obra de Arte. Barbosa (2002) atenta que é impossível conhecer a cultura de um país, sem conhecer sua arte, pois é importante compreender que a Arte é a representação do país por seus próprios membros. É por meio da Arte que podemos conhecer e entender a cultura do nosso tempo, sendo este um processo fundamental para a construção humana sensível. Quando falamos de construção humana sensível, não estamos generalizando a Arte como forma de despertar apenas sentimentos, pois desta forma estaríamos reduzindo seu real papel enquanto área de conhecimento presente na vida das pessoas. Estamos aqui, referindo-nos a todos os elementos que permeiam esta construção de conhecimento cultural e histórico por meio da Arte, pois “[...] a arte como linguagem, expressão e comunicação, trata da percepção, da emoção, da imaginação, da intuição, da criação, elementos fundamentais para a construção humana sensível” (PILLOTTO, 2004, p. 38). Como vetor de construção humana sensível, a Arte possibilita contato com o mundo e consigo mesmo. Permite que, por meio dela, a criança conheça e compreenda o contexto onde está inserida, bem como desenvolva conhecimentos artísticos, culturais e históricos. É impossível conhecer a cultura de um país, sem conhecer sua arte. 37 O LúdicO e a arte na aprendizagem 37 Capítulo 2 Já o valor da arte para Ferraz e Fusari (2009, p.18) “[...] está em ser um meio pelo qual as pessoas expressam, representam, e comunicam conhecimentos e experiências”. Deve ser compreendida como forma de expressão e representação humana, como vetor de reflexão, crítica e conhecimento pessoal e social. Arte é conhecimento! Arte é cultura! É o modo pelo qual o ser humano manifesta-se em diferentes linguagens, em diferentes meios, atravessado pela cultura da qual pertence ou na qual está inserido. No que se refere à arte/educação, esta proporciona aos alunos o contato direto com imagens e objetos artísticos. Este contato e o trabalho com as produções artísticas desenvolvido por professores de arte no contexto escolar permitem, além do contato com a Arte, momentos de criação e de expressão individuais e coletivos. Permitem ao aluno conhecer a realidade do seu tempo, a sua cultura e a sua história. Se pretendemos de fato uma educação para a cidadania,que entenda os sujeitos como construtores de suas histórias, temos que garantir a educação estética e artística nos espaços das instituições educacionais, talvez o único para a maioria das crianças, a única possibilidade para adentrarem no universo poético e estético. (PILLOTTO, 2004, p. 59). A escola é o espaço institucional onde o aluno tem a oportunidade de conhecer de forma intencional ou não, os conhecimentos históricos e culturais construídos pela sociedade no decorrer dos tempos. É o espaço que permite uma relação entre história, cultura e Arte. Ao conhecer a arte produzida em diversos locais, por diferentes pessoas, classes sociais e períodos históricos e as outras produções do campo artístico (artesanato, objetos, design, audiovisual etc.), o educando amplia sua concepção da própria arte e aprende dar sentido a ela. (FERRAZ; FUSARI, 2009, p.19) Mas afinal, qual a função da arte na escola? Pesquisas indicam que a Arte desenvolve a cognição de crianças e adolescentes, proporcionando conhecimento e expressão não apenas racional, mas também afetivos e emocionais. “A função da Arte na Educação é essa, desenvolver as diferentes inteligências” (BARBOSA, 2009). Ana Mae Barbosa, foi uma das pioneiras da Arte-educação no Brasil. 38 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 38 ARTE, EDUCAÇÃO E CULTURA Profª Ana Mae Barbosa [...] O papel da arte no desenvolvimento cultural Através das artes temos a representação simbólica dos traços espirituais, materiais, intelectuais e emocionais que caracterizam a sociedade ou o grupo social, seu modo de vida, seu sistema de valores, suas tradições e crenças. A arte, como uma linguagem presentacional dos sentidos, transmite significados que não podem ser transmitidos através de nenhum outro tipo de linguagem, tais como as linguagens discursivas e científicas. Não podemos entender a cultura de um país sem conhecer sua arte. Sem conhecer as artes de uma sociedade, só podemos ter conhecimento parcial de sua cultura. Aqueles que estão engajados na tarefa vital de fundar a identificação cultural, não podem alcançar um resultado significativo sem o conhecimento das artes. Através da poesia, dos gestos, da imagem, as artes falam aquilo que a história, a sociologia, a antropologia etc., não podem dizer porque elas usam um outro tipo de linguagem, a discursiva, a científica, que sozinhas não são capazes de decodificar nuances culturais. Dentre as artes, a arte visual, tendo a imagem como matéria-prima, torna possível a visualização de quem somos, onde estamos e como sentimos. A arte na educação como expressão pessoal e como cultura é um importante instrumento para a identificação cultural e o desenvolvimento. Através das artes é possível desenvolver a percepção e a imaginação, apreender a realidade do meio ambiente, desenvolver a capacidade crítica, permitindo analisar a realidade percebida e desenvolver a criatividade de maneira a mudar a realidade que foi analisada. Fonte: Extraído e adaptado de: BARBOSA, Ana Mãe. Arte, Educação e Cultura. <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/ mre000079.pdf>. Acesso em: 12 maio 2010. Diante dos dizeres de Ana Mae Barbosa, apresentados no texto anterior, perguntamos a você caro(a) aluno(a): Qual a função da arte na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental? 39 O LúdicO e a arte na aprendizagem 39 Capítulo 2 Segundo Pillotto (2007, p. 19), [...] se entendemos o processo de construção de conhecimento da criança pela via do lúdico, do jogo e das relações entre o brincar, abriremos um grande espaço para a arte e suas possibilidades de leituras e interação. Vivemos num mundo repleto de sons, formas, cores, materialidade: como ficar alheio a tudo isso? Como se comunicar sem a expressão do corpo, sem a possibilidade do sentir/ver/ouvir? Ainda segundo a autora, o conhecimento se dá através da interação entre pares, nos momentos lúdicos de jogos e brincadeiras. A comunicação e a expressão estão presentes nesses momentos em que a criança utiliza as diferentes linguagens artísticas para construir seu conhecimento cultural e histórico. Um dos papéis da Arte na construção do conhecimento infantil é possibilitar a aprendizagem cultural e histórica através da construção humana sensível. “A arte é, por conseguinte, uma maneira de despertar o indivíduo para que este dê maior atenção ao seu próprio processo de sentir.” (DUARTE JÚNIOR, 1988, p. 65). Ouvir uma música, uma poesia, apreciar um quadro, uma fotografia, uma apresentação de teatro ou dança, são modos de sentir Arte. Sentir Arte é um processo pelo qual a criança conhece a respeito de si e do mundo. Assim, o trabalho com a Arte está relacionado à percepção, à emoção, à intuição, à sensibilidade. Para Pillotto (2004, p. 38), “A arte como linguagem, expressão e comunicação, trata da percepção, da emoção, da imaginação, da intuição, da criação, elementos fundamentais para a construção humana sensível”. Como vetor de construção humana sensível, a Arte possibilita contato com o mundo e consigo mesmo. Permite que, por meio dela, a criança conheça e compreenda o contexto onde está inserida, bem como desenvolva conhecimentos artísticos, culturais e históricos. Em se tratando desse contato da criança com o mundo, há muito tempo, Vigotsky (1998) já atentava para a importância de aprender por meio das relações com o outro, pois é por meio dessas relações que a criança desenvolve seu potencial, passa a observar-se e a perceber-se como sujeito de sua própria história. Para o autor, o conhecimento se dá no momento das relações e interações entre pares. Momento em que a criança troca experiências, cultura e conhecimento. A arte é, por conseguinte, uma maneira de despertar o indivíduo para que este dê maior atenção ao seu próprio processo de sentir. 40 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 40 Que tal mais um pouco de Arte? Pense agora, na infância através do Poema “Criança”: CRIANÇA Tatiana dos Santos da Silveira Eis a riqueza de nossas vidas... No primeiro momento de vida, Tão pequenina e indefesa Pequenos olhos brilhantes e esperançosos Aguardam descobrir o mundo a sua volta... A cada toque de carinho A revelação do novo. A cada fase avançada a busca pela autonomia, Estica, rola, engatinha... Descobre o mundo através do toque, Através do cheiro, Através da alma! No primeiro passo, A satisfação de uma nova conquista. E nas primeiras palavras... A possibilidade de conhecer e sentir de diferentes maneiras... Vai crescendo, vai descobrindo, vai criando... Cria as primeiras letras, lê as primeiras letras... Desperta para o mundo! Brinca, brinca e brinca! Cresce, aprende e Vive! Seu tempo é o Agora... Pois... Não será eternamente criança... 41 O LúdicO e a arte na aprendizagem 41 Capítulo 2 Seu tempo é AGORA! Agora é o tempo de aproveitar sua infância! Vá... Voe e viva criança! Figura 5 – Brincando de Roda (Ivan Cruz) Fonte: Disponível em: <http://4.bp.blogspot.com/_fvvGvfxiwPE/S_1mgpiiuiI/ AAAAAAAAAGQ/iKt02U0i4lQ/s1600/brincando_de_roda.jpg>. Acesso em: 15 maio 2010 Conforme sugere o poema, a infância é uma fase que passa muito rápida. Cada fase avançada pela criança é uma nova descoberta, é uma nova aprendizagem, cabe ao professor possibilitar essa descoberta de forma lúdica e contextualizada nos espaços educacionais. Cabe a nós, o trabalho com a construção humana sensível, citada anteriormente por Pillotto (2004). A função da Arte na educação não deve ser compreendida como meio de repetição e trabalho com desenhos prontos, cópias feitas em série que não possibilitam a criação da criança. A Arte é possibilidade,é imaginação, é criação, é expressão. Quem consegue criar quando recebe a proposta pronta? Vejamos, na sequência, alguns exemplos claros do que estamos apresentando: 42 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 42 Figura 6 – Abelha para colorir Figura 7 – Árvore para colorir Fonte: As autoras. Fonte: As autoras. Por vezes, os professores acabam limitando a capacidade de criação das crianças, por não permitirem a autonomia e a expressão individual no momento das propostas metodológicas. Neste momento é importante você, caro(a) aluno(a), compreender que muitas dessas atitudes, também fazem parte da nossa trajetória como alunos e professores. Pensem rapidamente: Se neste momento solicitássemos que você desenhasse uma árvore; como ela seria? E, se de repente solicitássemos o desenho de uma flor ou de uma pessoa? Apresentamos para você um texto muito comum no meio educacional, para que você reflita sobre o papel da arte e da linguagem do desenho na infância: CONTO POPULAR... Era uma vez um menininho bastante pequeno que contrastava com a escola bastante grande. Uma manhã, a professora disse: - Hoje nós iremos fazer um desenho. “Que bom!” - pensou o menininho. 43 O LúdicO e a arte na aprendizagem 43 Capítulo 2 Ele gostava de desenhar leões, tigres, galinhas, vacas, trens e barcos... Pegou a sua caixa de lápis-de-cor e começou a desenhar. A professora então disse: - Esperem, ainda não é hora de começar! Ela esperou até que todos estivessem prontos. - Agora, disse a professora, nós iremos desenhar flores. E o menininho começou a desenhar bonitas flores com seus lápis rosa, laranja e azul. A professora disse: - Esperem! Vou mostrar como fazer. E a flor era vermelha com caule verde. - Assim, disse a professora, agora vocês podem começar. O menininho olhou para a flor da professora, então olhou para a sua flor. Gostou mais da sua flor, mas não podia dizer isso... Virou o papel e desenhou uma flor igual a da professora. Era vermelha com caule verde. Num outro dia, quando o menininho estava em aula ao ar livre, a professora disse: - Hoje nós iremos fazer alguma coisa com o barro. - “Que bom! Pensou o menininho. Ele gostava de trabalhar com barro. Podia fazer com ele todos os tipos de coisas: elefantes, camundongos, carros e caminhões. Começou a juntar e amassar a sua bola de barro. Então, a professora disse: - Esperem! Não é hora de começar! Ela esperou até que todos estivessem prontos. - Agora, disse a professora, nós iremos fazer um prato. “Que bom!” - pensou o menininho. Ele gostava de fazer pratos de todas as formas e tamanhos. A professora disse: - Esperem! Vou mostrar como se faz. Assim, agora vocês podem começar. E o prato era um prato fundo. O menininho olhou para o prato da professora, olhou para o próprio prato e gostou mais do seu, mas ele não podia dizer isso. Amassou seu barro numa grande bola novamente e fez um prato fundo, igual ao da professora. E muito cedo o menininho aprendeu a esperar e a olhar e a fazer as coisas exatamente como 44 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 44 a professora. E muito cedo ele não fazia mais coisas por si próprio. Então aconteceu que o menininho teve que mudar de escola. Essa escola era ainda maior que a primeira. Um dia a professora disse: - Hoje nós vamos fazer um desenho. “Que bom!” - pensou o menininho e esperou que a professora dissesse o que fazer. Ela não disse. Apenas andava pela sala. Então veio até o menininho e disse: - Você não quer desenhar? - Sim, e o que é que nós vamos fazer? - Eu não sei, até que você o faça. - Como eu posso fazê-lo? - Da maneira que você gostar. - E de que cor? - Se todo mundo fizer o mesmo desenho e usar as mesmas cores, como eu posso saber o que cada um gosta de desenhar? - Eu não sei. E então o menininho começou a desenhar uma flor vermelha com o caule verde... Fonte: disponível em: <http://pcdec.sites.uol.com.br/ciranda/ ternurinha.htm>. Acesso em: 16 maio 2010. Pillotto (2007) sugere o trabalho com as categorias do conhecimento sensível: percepção, emoção, imaginação, intuição e criação. Perguntamos a você: Qual das categorias, citadas pela autora, estamos trabalhando ao oferecer desenhos prontos ou direcionar a construção do desenho das crianças? Podemos afirmar que este é um momento de criação, emoção e imaginação? Lidamos quase que o tempo todo com as linguagens da arte: desenho, modelagem, corporeidade, sonoridade, pintura, gravura, escultura, cinema, desenho animado e tantas outras. Mas de que forma nos apropriamos dessas linguagens? (PILLOTTO, 2007, p.19). A preocupação da autora está no modo como nos apropriamos das diferentes linguagens da Arte, presente no nosso dia a dia e trabalhamos com Lidamos quase que o tempo todo com as linguagens da arte: desenho, modelagem, corporeidade, sonoridade, pintura, gravura, escultura, cinema, desenho animado e tantas outras. 45 O LúdicO e a arte na aprendizagem 45 Capítulo 2 estas linguagens em sala de aula. O modo como levamos a Arte para dentro da esfera escolar. Qual a função da arte na escola? Deixar as paredes das escolas bonitinhas, enfeitadas com desenhos estereotipados? Desenvolver a coordenação motora das crianças, através de atividades pontilhadas com diferentes linhas e formas? Atividade de Estudo: Para você, qual deve de ser o papel da arte na escola? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ a arte cOmO fOrma de cOmunicaçãO e expressãO Aprofundar o campo da imaginação e do papel que pode ter na criação de significados pessoais e na transmissão da cultura torna-se o ponto e o propósito para se ter artes na educação. Arthur Efland As palavras de Efland nos permitem reafirmar a importância do trabalho com a arte na educação, a valorização da cultura e as categorias do campo da imaginação e criação infantil. A criança quando cria, o faz de forma lúdica, ou seja, brincando. Porém, costumamos oferecer para as crianças nos espaços educacionais, propostas pedagógicas baseadas no nosso gosto pessoal, nossos desejos e vontades. Poucas são às vezes em que os professores permitem o ato criativo infantil. 46 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 46 Preste atenção nas seguintes obras: Figura 8 – Autorretrato (Romero Brito) Fonte: Disponível em: <http:// www.romerobritto.com.br/index2. htm>. Acesso em: 16 maio 2010. Figura 10 – Autorretrato (Tarsila do Amaral) -1924 Fonte: Disponível em: <http://www. tarsiladoamaral.com.br/index_frame. htm>. Acesso em: 19 maio 2010. Figura 9 – Autorretrato (Candido Portinari) - 1957 Fonte: Disponível em: <http://www. proa.org/exhibiciones/pasadas /portinari/salas/portinari_auto_retrato. html>. Acesso em: 16 maio 2010. Figura 11 – Autorretrato (Anita Malfatti) Fonte: Disponível em: <http://4. bp.blogspot.com/_k4zG_ZMp6gY/ SAJ2egXN5yI/AAAAAAAABr4/ OcMC3_Mkiac/ s400/anita+autoretrato.jpg >. Acesso em: 19 maio 2010. 47 O LúdicO e a arte na aprendizagem 47 Capítulo 2 Todasestas obras são o que chamamos de autorretrato. Este é um momento de criação do próprio artista. A representação de si mesmo, um ato individual de criação, imaginação e expressão. Assim como o artista, a criança representa o mundo de acordo com a sua realidade e com o seu contexto histórico. As informações existentes nas suas produções são fruto do trabalho que desenvolvemos e que apresentamos a elas. Quanto mais rica a experiência humana, tanto maior será o material disponível para a imaginação. Desta lei, portanto, extrai-se a importante conclusão pedagógica de ampliar a experiência cultural da criança, caso se pretenda fornecer-lhe uma base sólida para que venha a desenvolver sua capacidade criadora. (JAPIASSU apud PILLOTTO, 2007, p. 21) Ampliar a experiência cultural dos alunos é oportunizar momentos de contato com a arte e com diferentes contextos. É na troca de informações com seus pares e nos momentos de fruição das linguagens da arte que a criança amplia o seu repertório visual e cultural. Neste sentido, a Arte como forma de expressão e comunicação é fundamental nos espaços educacionais e nas vivências infantis. Talvez a única possibilidade de contato com a arte para muitas dessas crianças. As vivências artísticas, estéticas e culturais, como fazer bolinhos e utensílios de barro, desenhar na terra, na areia do mar, cantarolar, dramatizar a partir de personagens imaginários, movimentar o corpo nas brincadeiras e danças, ouvir o violeiro, histórias, lendas e contos, são práticas do cotidiano das crianças, ou pelo menos deveriam ser, pois nesses momentos em que o simbólico se faz presente elas também estão aprendendo. (PILLOTTO, 2007, p. 2). Figura 12 – Modelagem em argila Fonte: Disponível em: <http://pt.dreamstime. com/imagem-de-stock-modelagem-com-argila- image8674021>. Acesso em: 19 maio 2010. Figura 13 – Peças de argila Fonte: Disponível em: <http://belavista.pt/ index.php?area=actividades_externas _show&title=Workshop%20-%20 Brincar%20com%20o%20Barro&id=10>. Acesso em: 19 maio 2010. 48 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 48 Essas vivências artísticas mencionadas por Pillotto (2007) proporcionam a criança o contato com a cultura, com o contexto histórico onde está inserido, além da possibilidade de pesquisa sobre diferentes situações. Nesses momentos as crianças acabam se apropriando de novas informações e conhecimentos, aumentando o seu próprio repertório cultural e a própria maneira de sentir. Sentir Arte. Quando nos referimos em diferentes contextos estamos mencionando as diferentes representações artísticas que podem ser pesquisadas com as crianças. Por exemplo: a presença do lúdico dentro da grande diversidade cultural em que vivemos. Vamos exemplificar isto através da obra de Arte: Figura 14 – Dança indígena Fonte: Disponível em: <http://www.passeiweb.com>. Acesso em: 19 maio 2010. Figura 15 – Dança de Prenda Fonte: Disponível em: <www.zumblick.com.br>. Acesso em: 19 maio 2010. Essas vivências artísticas proporcionam a criança o contato com a cultura, com o contexto histórico onde está inserido, além da possibilidade de pesquisa sobre diferentes situações. 49 O LúdicO e a arte na aprendizagem 49 Capítulo 2 Figura 16 – Pau de fitas Fonte: Disponível em: <www.iade.art.br>. Acesso em: 19 maio 2010. Figura 17 – Dança alemã Fonte: Disponível em: <www.zumblick.com.br>. Acesso em: 19 maio 2010. Figura 18 – Jongo no quilombo Fonte: Disponível em: <http://www.umbandafest.com.br>. Acesso em: 19 maio 2010. 50 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 50 Esses são alguns exemplos frente a grande diversidade cultural na qual estamos inseridos, representados por diferentes artistas. O contato com a arte nos permite conhecer esta diversidade no decorrer dos tempos e espaços, além do modo particular de representação de cada artista dentro do seu contexto, dentro da sua época, marcando e contribuindo com a nossa história. Estes contatos com a arte devem acontecer em todos os espaços educacionais, principalmente nos espaços de educação infantil, lugar onde iniciamos a trajetória escolar. Espaço que deve ser compreendido como lugar de ensino e aprendizagem: aprendizagem da Arte e da Ludicidade. Atividade de Estudo: Diante das informações sobre o papel da arte na infância, sugerimos que você faça a leitura do artigo que segue: Proposta para a arte na Educação Infantil, da autora Silvia Sell Duarte Pillotto. Após realizar a leitura, nossa sugestão é que você reflita e escreva sobre a proposta de ensino de arte na instituição que você trabalha. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ PROPOSTAS PARA A ARTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL Silvia Sell Duarte Pillotto A linguagem da arte na educação infantil tem um papel fundamental, envolvendo os aspectos cognitivos, sensíveis e culturais. Até bem pouco tempo o aspecto cognitivo não era considerado na a educação infantil e esta não estava integrada na educação básica. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9.394/96 veio garantir este espaço à educação infantil, bem como o da arte neste contexto. 51 O LúdicO e a arte na aprendizagem 51 Capítulo 2 Para compreender a arte no espaço da educação infantil no momento atual, mesmo que brevemente, é preciso situar o panorama histórico das décadas de 80 e 90. Os referenciais que fundamentavam as práxis do profissional da educação infantil eram os Cadernos de Atendimento ao Pré-escolar (1982), criados pelo Ministério da Educação e Cultura – MEC. Os textos destes Cadernos para aquele momento histórico tiveram contribuição fundamental como subsídio para as ações dos educadores atuantes na educação infantil. Entretanto, vale ressaltar que pouco priorizavam o conhecimento, centrando-se apenas nas questões emocionais, afetivas e psicológicas e nas etapas evolutivas da criança. Com relação à arte na educação, os pressupostos eram muito mais voltados à recreação do que às articulações com a arte, a cultura e a estética. Como exemplo, é possível citar a ênfase em exercícios bidimensionais que priorizava desenhos e pinturas chapadas. Ou seja, os conceitos sobre arte resumiam-se a simples técnicas. De acordo com PILLOTTO (2000, 61) “é interessante observar que esse Caderno, embora tenha uma fundamentação teórica voltada às concepções do ensino da arte modernista, na sua essência é muito mais tecnicista no que diz respeito aos exercícios repetitivos, mecânicos e sem a preocupação com a reflexão dos conceitos”. Na década de 90, o MEC lança o Caderno do Professor da Pré-Escola, com uma abordagem contextualista, na qual a arte deixa de ser tratada apenas como atividade prática e de lazer, incorporando o ato reflexivo. Apesar dessas transformações, a arte permanecia ainda com foco em abordagens psicológicas e temáticas. A arte na educação infantil nesta década ainda buscava uma consistência teórica, conceitual e metodológica. A partir de 2000 as discussões reflexivas sobre a arte na educação infantil ganham novos espaços na literatura, nas propostas curriculares e especialmente na pesquisa. É com este propósito que em 2002 iniciou-se na Universidade da Região de Joinvillea pesquisa “O Programa Institucional Arte na Escola e sua dimensão no ensino e aprendizagem da arte”. O objetivo desta pesquisa é avaliar reflexivamente as ações dos programas de educação continuada para profissionais da educação, no intuito de perceber os aspectos frágeis com relação a arte no contexto escolar, diagnosticando a realidade para construir coletivamente novas proposições. A pesquisa tem apontado a necessidade de novos constructos* para a arte na educação infantil, no sentido de desenvolver práxis nas quais haja a total integração do profissional da educação 52 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 52 infantil, do profissional da arte na educação, das crianças, da instituição e da comunidade. Esta abordagem tem se mostrado eficiente e consolidada para a educação infantil na Itália, sendo disseminada em outros países. Obviamente, entende-se que cada espaço possui especificidades próprias que devem ser respeitadas. Portanto, a idéia não é a de adotar modelos estrangeiros, mas de tê-los como possibilidade de referência. A partir desta pesquisa, a proposta é apontar constructos (a curto, médio e longo prazos), nos quais cada instituição de educação infantil tenha um profissional habilitado no ensino da arte, capaz de desenvolver projetos pedagógicos em parceria com os demais educadores, enfatizando os aspectos cognitivos, sensíveis e culturais em arte. Nesta perspectiva, entende-se por novos constructos propostas que partem de uma visão de currículo não linear ou sistêmico, considerando o contexto histórico-social, as necessidades e interesses das crianças, no qual educadores, crianças, instituição e comunidade desenham um currículo que parte do trabalho coletivo. O planejamento no currículo, a partir da perspectiva sistêmica, pressupõe como método de trabalho no qual professores “apresentam objetivos educacionais gerais, mas não formulam objetivos específicos para cada projeto ou atividade de antemão. Em vez disso, formulam hipóteses sobre o que poderia ocorrer com base em seu conhecimento das crianças e das experiências anteriores.” (RINALDI: 1999,113). A partir desta visão, especificamente para a arte na educação infantil está o educador em arte, que atua em consonância com os demais educadores da instituição, aprofundando conceitos e linguagens da arte. A função do profissional em arte na educação não é simplesmente ministrar aulas fragmentadas de arte, mas, sobretudo de organizar um espaço de cultura que possibilite a ampliação das expressões e das linguagens da criança. No que este espaço contribui? “Ajuda que os professores compreendam como as crianças inventam veículos autônomos de liberdade expressiva, de liberdade cognitiva, de liberdade simbólica e vias de comunicação”. (VECCHI: 1999, 129) Como historicamente pode-se observar, a arte na educação infantil possuía um perfil de recreação e de desenvolvimento emotivo e motor. Hoje, a arte na educação infantil está em processo de rupturas e transformações, exigindo das políticas educacionais, 53 O LúdicO e a arte na aprendizagem 53 Capítulo 2 dos cursos de Formação de Professores, especialmente das Licenciaturas em Arte, um comprometimento com os aspectos cognitivos, sensíveis e culturais. Cabe então, a todos os profissionais que atuam direta ou indiretamente com o ensino da arte, uma reflexão não somente dos processos de sala de aula, mas também do seu papel como cidadãos, protagonistas de uma história. REFERÊNCIAS EDWARDS, C., GANDINI, L., FORMAN, G. As cem linguagens da criança: abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira infância. Porto Alegre: ArtMed, 1999. GANDINI. Lella; & EDWARDS, Carolyn. Bambini: a abordagem Italiana à educação infantil. Trad. Daniel Etcheverry Burguño. Porto Alegre: ArtMed, 2002. PILLOTTO, Silvia S.D. A trajetória histórica das abordagens do ensino e aprendizagem da arte no contexto atual. Revista Univille, v.5, n.1, abr, 2000. RINALDI, Carlina. O Currículo Emergente e o Construtivismo Social. IN: EDWARDS, C., GANDINI, L., FORMAN, G. As cem linguagens da criança: abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira infância. Porto Alegre: ArtMed, 1999. VECHI, Vea. O Papel do Atelierista. IN: EDWARDS, C., GANDINI, L., FORMAN, G. As cem linguagens da criança: abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira infância. Porto Alegre: ArtMed, 1999. * Silvia Sell Duarte Pillotto, Mestre em Educação pela Universidade Federal do Paraná e Doutoranda em Engenharia da Produção (Gestão) na Universidade Federal de Santa Catarina, é professora dos Departamentos de Artes Visuais e Pedagogia na Univille, além de coordenadora pedagógica do Pólo Arte na Escola e coordenadora da pesquisa “O Programa Institucional Arte na Escola na região de Joinville e sua dimensão no ensino e aprendizagem da arte”. Letícia Mognol, Mestranda em Educação na Universidade do Vale do Itajaí, é professora do Departamento de Artes Visuais da Univille e pesquisadora do mesmo projeto. Fonte: PILLOTTO, Silvia Sell Duarte. Propostas para a arte na educação infantil. Disponível em: <http://www.artenaescola.org.br/pesquise_ artigos_texto.php?id_m=24>. Acesso em: 22 maio 2010. 54 Arte e Ludicidade na Educação Infantil e Anos Iniciais 54 aLgumas cOnsiderações Nesse segundo capítulo, estudamos um pouco sobre o papel da arte na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental e a arte como forma de comunicação e expressão. Apresentamos para você leitor, a importância do trabalho com a arte como forma de construção humana sensível, exercício de sensibilidade e criatividade dos seres humanos. Refletimos sobre o trabalho com estereótipos e desenhos prontos apresentados aos alunos e as influências culturais nas suas produções. No próximo capítulo apresentaremos a metodologia triangular do ensino da Arte e o modo como podemos resgatar os brinquedos, jogos e brincadeiras infantis por meio do trabalho com a arte e a valorização da cultura. MAGALHÃES JÚNIOR, R. Poesia e vida de Casimiro de Abreu. 2 ed. Rio de Janeiro: INL, 1972. p. 268. referências BARBOSA, Ana Mae Tavares Bastos. John Dewey e o ensino da arte no Brasil. 5.ed. São Paulo : Cortez, 2002. ______. A função da Arte. 2009. Disponível em: http://www.dominiopublico. gov.br/download/texto/mre000079.pdf> Acesso em: 21 mai 2010. DUARTE JÚNIOR, João Francisco. Por que arte-educação? 5. ed. Campinas: Papirus, 1988. FERRAZ, Maria Heloísa C. de T.; FUSARI, Maria F. de Rezende. Metodologia do ensino da Arte. 2. Ed. São Paulo: Cortez, 2009. PILLOTTO, Silvia Sell Duarte. O Conhecimento sensível: uma contribuição para o aprendizado humano. In: PILLOTO, Silvia Sell Duarte; SCHRAMM, Marilene K.; CABRAL, Rozenei W. (Orgs.). Arte e o ensino da arte. Blumenau: Nova Letra, 2004. ______. (Org.). Linguagens da arte na infância. Joinvile: Univille, 2007. VIGOTSKY, Lev Semenovich. Pensamento e linguagem. Tradução de Jefferson L. Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
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