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Antropologia Cultural de Moçambique Universidade Pedagógica Moçambique Antropologia Cultural de Moçambique i Direitos de autor (copyright) É proibida qualquer reprodução parcial ou total deste obra sem a permissão do autor ou da entidade proponente. Ficha Técnica Título: Manual de Antropologia Cultural de Moçambique Autor: Gregório Zacarias Vilanculo Maquetização: Gregório Zacarias Vilanculo Coordenação: Departamento de Ensino Aberto e a Distância – UP-Maxixe Universidade Pedagógica/ Sagrada Família-Maxixe Inhambane-Moçambique Fax: (+258)293-30354/30359 E-mail:info@unisaf.ac.mz Website: www.unisaf.ac.mz Antropologia Cultural de Moçambique ii Agradecimentos À Universidade Pedagógica, pela oportunidade que nos concedeu para a elaboração deste material diáctico. À todos os que de forma directa ou indirecta contribuiram para a elaboração deste módulo. Antropologia Cultural de Moçambique iii Indice Visão geral 1 Benvindo ao Módulo de Antropologia Cultural de Moçambique .................................... 1 Objectivos do curso .......................................................................................................... 2 Quem deveria estudar este módulo ................................................................................... 3 Como está estruturado este módulo .................................................................................. 3 Ícones de actividade .......................................................................................................... 4 Habilidades de estudo ....................................................................................................... 4 Precisa de apoio? .............................................................................................................. 5 Tarefas (avaliação e auto-avaliação) ................................................................................. 5 Avaliação .......................................................................................................................... 5 Unidade I. Introdução geral à Disciplina 7 Lição nº 1. Definição de Antropologia, objecto de estudo e objectivos ........................... 9 Sumário ........................................................................................................................... 11 Exercícios ........................................................................................................................ 12 Lição nº 2. Áreas de estudo da Antropologia ................................................................. 13 Sumário ........................................................................................................................... 20 Exercícios ........................................................................................................................ 22 Lição nº 1. Métodos da Antropologia ............................................................................. 23 Sumário ........................................................................................................................... 27 Exercícios ........................................................................................................................ 27 Unidade II. O Pensamento Antropológico 29 Lição nº 1.Periodizição do Pensamento Antropológico ................................................. 31 Sumário ........................................................................................................................... 35 Exercícios ........................................................................................................................ 36 Lição nº 2.As correntes do pensamento antropológico: o evolucionismo ...................... 38 Sumário ........................................................................................................................... 41 Exercícios ........................................................................................................................ 41 Lição nº 3.As correntes do pensamento antropológico: o difusionismo ......................... 43 Sumário ........................................................................................................................... 47 Exercícios ........................................................................................................................ 48 Lição nº 4.As correntes do pensamento antropológico: o funcionalismo ....................... 51 Sumário ........................................................................................................................... 55 Exercícios ........................................................................................................................ 56 Lição nº 5.As correntes do pensamento antropológico: o estruturalismo ....................... 58 Sumário ........................................................................................................................... 60 Exercícios ........................................................................................................................ 61 Unidade III. A Cultura e as Culturas 63 Lição nº 1.O conceito antropológico de cultura .............................................................. 64 Sumário ........................................................................................................................... 67 Exercícios ........................................................................................................................ 67 Antropologia Cultural de Moçambique iv Lição nº 2.Elementos da cultura ..................................................................................... 69 Sumário ........................................................................................................................... 73 Exercícios ........................................................................................................................ 73 Lição nº 3.Características da Cultura .............................................................................. 75 Sumário ........................................................................................................................... 79 Exercícios ........................................................................................................................ 80 Lição nº 4.O conceito dinamismo cultural e os processos deenculturação, aculturaação, desculturação e inculturação ........................................................................................... 83 Sumário ........................................................................................................................... 87 Exercícios ........................................................................................................................ 88 Lição nº 5.Os factores da cultura .................................................................................... 89 Sumário ........................................................................................................................... 91 Exercícios ........................................................................................................................ 91 Lição nº 6. Etnocentrismo versus Relativismo Cultural ................................................. 92 Sumário ........................................................................................................................... 95 Exercícios ........................................................................................................................96 Lição nº 1.As origens da cultura moçambicana .............................................................. 97 Sumário ......................................................................................................................... 102 Exercícios ...................................................................................................................... 103 Unidade IV. O Parentesco e a Família 104 Lição nº 1.Parentesco, casamento e família em Moçambique ...................................... 105 Sumário ......................................................................................................................... 110 Exercícios ...................................................................................................................... 111 Lição nº 2.O lobolo em Moçambique: um velho idioma para novas vivências ........... 113 Sumário ......................................................................................................................... 117 Exercícios ...................................................................................................................... 118 Lição nº 3. Ritos, rituais e ritos de passagem ............................................................... 119 Sumário ......................................................................................................................... 122 Exercícios ...................................................................................................................... 122 Lição nº 4. A religião como fenómeno sócio-cultural .................................................. 125 Sumário ......................................................................................................................... 129 Exercícios ...................................................................................................................... 130 Antropologia Cultural de Moçambique 1 Visão geral Benvindo ao Módulo “Antropologia Cultural de Moçambique” O Homem, para além, da sua biologia, é produto da cultura. É a cultura que faz do Homem um ser de relações. Cada sociedade, cada povo, possui as suas manifestações culturais. O módulo de Antropologia Cultural de Moçambique ajudar-nos-á a compreender que, longe de haver somente uma formação cultural que dê sentido às acções dos homens, toda e qualquer cultura é coerente em si mesma quando vista de forma total e a partir de seus próprios pressupostos. Mais ainda, podemos aprender que nossa cultura e sociedade não são as únicas, nem as mais verdadeiras, originais e autênticas. A antropologia pode nos ensinar uma importante lição: nossa sociedade não é superior a qualquer outra, seja ela uma tribo do Sudão, na África, ou uma tribo indígena da américa latina. Enfim, a antropologia nos ensina a nos descentrarmos de nós mesmos assim como de nossa própria sociedade e cultura. Isso é um exercício fantástico e que nos abre as portas para novos universos, novas possibilidades e alternativas de aprendermos com os outros e de nos vermos através dos outros, conhecendo-nos mais profundamente. Antropologia Cultural de Moçambique 2 Afinal, como disse Sahlins “o homem apreende o mundo a partir de esquemas simbólicos que ordenam o mundo, mas que jamais são os únicos possíveis”. Com isto pode se perceber que esta disciplina participa na formação humana, social e cívica do indivíduo, através do desenvolvimento de conhecimentos básicos sobre a cultura no geral, e a cultura moçambicana, em particular. Objectivos do Módulo Quando terminar o estudo do Módulo de Antropologia Cultural de Moçambique o estudante deverá ser capaz de: Objectivos Identificar as trajectórias do pensamento antropológico desde a emergência à actualidade. Conhecer o saber e o fazer antropológicos actuais. Familiarizar-se com as abordagens da noção de cultura do clássico ao pós-moderno. Reconhecer as linhas de homogeneidades e heterogeneidades do território etnográfico nacional. Apresentar algumas das novas questões e paradigmas da antropologia, com reflexos em Moçambique. Ter capacidade de aplicar os conceitos e os conhecimentos adquiridos na análise das dinámicas e factos socioculturais dos diferentes contextos moçambicanos. Antropologia Cultural de Moçambique 3 Quem deveria estudar este módulo Este Módulo foi concebido para todos aqueles que estão inscritos nos Cursos de Licenciatura em Ensino Básico e Administração e Gestão Escolar (AGE) à distância, oferecidos pela Universidade Pedagógica. São estudantes que possuem 12ª classe ou equivalente. Como está estruturado este módulo Todos os módulos dos cursos a Universidade Pedagógica encontram-se estruturados da seguinte maneira: Páginas introdutórias Um índice completo. Uma visão geral detalhada do curso / módulo, resumindo os aspectos-chave que você precisa conhecer para completar o estudo. Recomendamos vivamente que leia esta secção com atenção antes de começar o seu estudo. Conteúdo do módulo O curso está estruturado em unidades. Cada unidade incluirá uma introdução, objectivos da unidade, conteúdo da unidade incluindo actividades de aprendizagem, um sumário da unidade e uma ou mais actividades para auto-avaliação. Antropologia Cultural de Moçambique 4 Outros recursos Para quem esteja interessado em aprender mais, apresentamos uma lista de recursos adicionais para você explorar. Estes recursos podem incluir livros, artigos ou sites na internet. Tarefas de avaliação e/ou Auto-avaliação Tarefas de avaliação para este módulo encontram-se no final de cada unidade. No final de cada lição são apresentadas tarefas de auto-avaliação. Ícones de actividade Ao longo deste manual irá encontrar uma série de ícones nas margens das folhas. Estes icones servem para identificar diferentes partes do processo de aprendizagem. Podem indicar uma parcela específica de texto, uma nova actividade ou tarefa, uma mudança de actividade, etc. Habilidades de estudo Caro estudante! Para tirar maior proveito deste módulo terá de buscar através de uma leitura cuidadosa das obras de consulta a maior parte da informação ligada ao assunto abordado. Para o efeito, no fim de cada lição apresenta-se uma sugestão de livros para leitura complementar. Uma pergunta bem compreendida representa meia resposta, por isso, antes de resolver qualquer tarefa ou problema, o estudante deve certificar se compreendeu a questão colocada. Deve fazer sempre que possível, uma sistematização das ideias apresentadas na lição corrente. Antropologia Cultural de Moçambique 5 Precisa de apoio? Em caso de necessidade de apoio o estudante poderá procurar o tutor de especialidade, os tutores locais dentro dos parâmetros a serem acordados para efeitos de acompanhamento. Tarefas (avaliação e auto- avaliação) A avaliação será contínua e sistemática. No final de cada unidade temática encontrará uma série de perguntas que poderão servir para a sua auto-avaliação. Em caso de recomendar-se trabalhos de pesquisas, apela- se ao estudante a evitar todas as formas de plágio, sendo por isso, necessário que faça referência às obras consultadas. Uma leitura constante deste módulo e da bibliografia complementar patente no final de cada unidade temática é fundamental para o sucesso do seu processo de aprendizagem. Avaliação A avaliação será feita através de testes escritos.Será admitido ao exame final o estudante que obtiver uma média de frequência igual ou superior a dez valores. Será aprovado o estudante que obtiver dez valores aproximados ou mais no exame. Poder-se-á recorrer à trabalhos de investigação caso delibere-se necessários para o aprofundamento de algumas temáticas aqui abordadas. Antropologia Cultural de Moçambique 7 Unidade I Introdução geral à Disciplina Introdução Nesta unidade far-se-á uma discussão a volta dos principais conceitos e das definições da disciplina. Serão discutidos os conceitos básicos de Antropologia, Antropologia Cultural, o objecto de estudo e os principais métodos usados em antropologia. Ao terminar esta unidade será capaz de: Objectivos Definir o conceito de antropologia e o seu objecto de estudo; Identificar os principais métodos usados em antropologia; Explicar as áreas de estudo da antropologia.~ Demonstrar a relação que existe entre a educação e a antropologia. Terminologia Antropologia, antropologia linguistica, antropologia biológica, antropologia pré-histórica, antropologia psicológica, antropologia social e cultural, educação. Antropologia Cultural de Moçambique 9 Lição n˚ 1 Definição de Antropologia, Objecto de estudo e objectivos Introdução Esta lição vai abordar sobre o conceito de antropologia, seu objecto de estudo e seus objectivos. Ao completer esta lição, você será capaz de: Objectivos Definir o conceito de antropologia; Identificar o objecto de estudo da antropologia; Explicar o objectivo da antropologia. Terminologia Antropologia. Antropologia Cultural de Moçambique 10 Antropologia: o que é? A nossa disciplina chama-se Antropologia Cultural de Moçambique. Antes de definirmos o que é antropologia cultural, e mais ainda, antes de fazermos uma contextualização, a nível de Moçambique é importante que tenhamos em consideração a definição do próprio termo antropologia. No sentido etimológico, o termo Antropologia deriva do grego άνθρωποςantrophos (homem) e λόγος (logos - razão / pensamento, tratado). No sentido lato, a Antropologia costuma ser definida como uma ciência social preocupada em estudar o homem e a humanidade de maneira totalizante, ou seja, abrangendo todas as suas dimensões. É uma ciência social porque faz parte do conjunto das chamadas ciências sociais, isto é, aquele conjunto de ciências que estudam os aspectos sociais do mundo humano, ou seja, a vida social de indivíduos e grupos humanos, tais como: Sociologia, Ciência Política, a História, a Geografia, Economia, Administração, Direito, etc. Preocupa-se em estudar cientificamente o ser humano, isto é, aplicando os métodos de estudo científico. O que diferencia a perspectiva antropológica sobre o homem das outras ciências sociais ou humanas, em primeiro lugar, é que a antropologia busca uma explicação totalizadora do homem, que leve em conta a dimensão biológica, psicológica e cultural; em segundo lugar, a perspectiva antropológica possui uma dimensão temporal muito mais abrangente, abarcando tanto o momento actual quanto o passado da humanidade. Antropologia Cultural de Moçambique 11 Objecto de estudo A antropologia como ciência do biológico e do cultural tem seu objecto de estudo: o homem e as suas obras. O objecto de estudo da antropologia engloba o conhecimento de sociedades humanas, letradas ou ágrafas, extintas ou vivas, existentens nas várias regiões da terra. O antrópologo tem a tarefa de explicar os princípios da formação e do desenvolvimento das sociedades e culturas humanas. Toda a investigação antropológica vale-se do método comparativo em busca de respostas para os problemas que se levantam, na tentativa de compreender as semelhanças e as diferenças físicas, psíquicas, culturais e sociais entre os grupos humanos. Exemplo: brancos e negros; língua diversificadas; a indumentária do índio e do não-índio; o culto do sol e a presença da pirâmide no Egipto e nas civilizações pré-colombianas... Objectivo da antropologia A antropologia fixa como seu objectivo o estudo da humanidade como um todo, visando ao homem como expressão global – biopsicosociocultural – isto é, o homem como ser biológico pensante, produtor de culturas e participante da sociedade, tentando chegar, assim, à compreensão da existência humana. Sumário A antropologia é a ciência que estuda o Homem na sua totalidade. Difere-se de outras ciências sociais e humanas porque ela busca uma expplicação totalizadora do homem. Ela fixa como seu objectivo o estudo do homem como Antropologia Cultural de Moçambique 12 expressão global, ou seja, como um ser biopsicosociocultural. Exercícios Auto-avaliação 1. Das afirmações que seguem, diga se são verdadeiras ou falsas. a. A antropologia é uma ciência que estuda o Homem na sua totalidade. b. O objecto de estudo da antropologia é a cultura. c. Explicar o homem em todas as dimensões é o objectivo último da antropologia. Bibliografia Básica ERICKENS, Thomas Hylland. NIELSEN, Fin Sivert. História da Antropologia. 4ª ed. Editora Vozes, Petrópolis, R J, 2010. SANTOS, Armindo dos. Antropologia Geral: etnografia, Etnologia, Antropologia Socal. Universiadade Aberta, 2002. COLLEYN, Jean-Paul. Elementos de Antroplogia Social e Cultural. Edições 70, Lisboa, 2005. TITIEV, Mischa. Introdução à Antropologia Cultural. 9ª ed. Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2002. LAPLANTINE, François. Aprender Antropologia. São Paulo, Brasiliense, 2003. Antropologia Cultural de Moçambique 13 Lição n˚ 2 Áreas de estudo da Antropologia Introdução Nesta lição far-se-á uma abordagem relacionada com os seguintes conceitos: antropologia biológica, antropologia pré-histórica, antropologia linguística, antropologia psicológica, antropologia social e cultural. Ao completer esta lição, você será capaz de: Objectivos Definir os conceitos de antropologia ; antropologia biológica, antropologia pré-histórica, antropologia linguística, antropologia psicológica, antropologia social e cultural. Discriminar os diferentes ramos ou áreas de estudo da antropologia. Terminologia Antropologia, antropologia linguística, antropologia biológica, antropologia pré-histórica, antropologia psicológica e antropologia social e cultural. Antropologia Cultural de Moçambique 14 Se é verdade que todas as ciências encontram-se fragmentadas em diferentes ramos de estudo que permitem um estudo mais exaustivo e significativo não é menos verdade que a Antropologia segue a mais lógica. Assim, a Antropologia tal como outras ciências, subdivide-se em áreas de estudo específicos que permitem uma melhor compreensão do objecto em causa. Evocar aqui os campos de estudo da Antropologia, torna-se aqui imperioso, pois, permite-nos perceber a Antropologia como uma ciência integrante a qual no seu desenvolvimento inicial não fazia a distinção entre os diferentes domínios de conhecimento, considerados na perspectiva de uma problemática teórica geral sobre o Homem. Na visão de SANTOS (2002: 35) a designação genérica antropologia cobria grosso modo no mínimo– e continua a integrar mas de forma independente – cinco domínios de estudo fundamentais: a) a antropologia biológica (que substitui a antiga antropologia física); b) a antropologia pré-histórica; c) a antropologia psicológica; d) a antropologia linguística; e) a antropologia social e cultural. É importante realçar que esta ordem de anunciação não reflecte realmente uma qualquer hierarquia subordinativa entre elas, mas tão somente uma forma arbitrária de apresentação. A antropologia biológica No século XIX e nos princípios do século XX, a palavra antropologia era empregue exclusivamente no sentido de antropologia física, a ciência cujo objecto se centrava em especial nos caracteres biológicos dos homens segundo a noção de raça, a hereditariedade, etc. A antropologia física designa-se hoje de antropologia biológica e não se Antropologia Cultural de Moçambique 15 preocupa especialmente com as raças e a sua anatomia comparada (com as formas e mensurações dos cránios e esqueletos, da cor da pele, dos olhos e do cabelo). A antropologia biológica, diz essencialmente respeito ao estudo das variações dos caracteres biológicos do homem no espaço e no tempo. Por outras palavras, est ciência debruça-se sobre o estudo das relações entre o património genético humano e o meio geográfico e social, relacionando as particularidades morfológicas e fisiológicas com o contexto ambiental e com a evolução destas particularidades. Em consequência do meio físico, a antropologia biológica toma em consideração os factores culturais que influenciam o crescimento e o conjunto das transformações ou fases sucessivas pelas quais passam os individuos desde a sua concepção biológica até à maturidade. O actual domínio da antropologia biológica, na sua contribuição mais directa para evidenciar a relação entre factores sócio-culturais e caracteres biológicos do homem, debruça-se em particular sobre a genética das populações e participa, cada vez mais –directa ou indirectamente – no debate sobre o derivado do inato e o dependente do adquirido assim como sobre a sua contínua interacção. A antropologia histórica Aantropologia histórica corresponde a um vasto programa de investigação sobre o passado das sociedades desaparecidas e das actuais. A a ela pode acrescentar-se a antropologia pré-histórica e a etno-história. A antropologia pré-histórica, estuda a existência do homem num passado muito remoto, relativamente ao qual não existem documentos escritos. Por esta razão, a Antropologia Cultural de Moçambique 16 investigação faz-se recorrendo à busca de vestígios materiais deixados por sociedades muito antigas e conservados no solo. Encontrar ossadas humanas em determinados lugares, resulta em provas da existência do homem nesses locais, mas também objectos de todo o género podem indiciar a sua actividade passada. Pelo que acaba de ser dito se pode compreender que a antropologia pré-histórica tem por finalidade a reconstituição das sociedades desaparecidasnos seus diferentes aspectos. A diferença entre a etno-história e a antropologia pré- histórica reside no facto de o etno-historiador trabalhar directamente com o tempo da oralidade local e o antropólogo pré-historiador recolher o seu material de investigação em escavações feitas no solo. A palavra etno-história foi criada pelos etnólogos americanos para referir os seus trabalhos relativos às tentativas de reconstituição da história dos índios, a partir das tradições e factos recolhidos. Por esta altura, era corrente dizer-se que onde não havia documentos escritos não havia história. Obviamente, a falta de documentos não evidencia a falta de história, mas tão somente a falta. Assim, na origem, a etno- história correspondia ao estudo das sociedades sem escrita, dependentes da memória oral, e ditas sem história. Ora não existem sociedades sem história e a escrita não constitui um dado informativo evidente quanto à revelação do passado. A antropologia linguística Este domínio corresponde ao confronto entre a antropologia e a linguística enquanto ciência que estuda a linguagem como parte integrante do património cultural de uma sociedade. Com efeito, a linguagem corresponde a uma realidade social fundamental através da qual os membros de Antropologia Cultural de Moçambique 17 uma sociedade comunicam e exprimem as suas ideias, o seus valores, as suas preocupações, etc. Pela sua amplitude, a linguagem constitui um domínio cuja problemática pressupõe uma abordagem necessariamente interdisciplinar. Sem o estudo da língua não seria possível compreender as suas categorias afectivas e cognitivas, as quais constituem precisamente o campo de estudo da etno- linguística. Segundo Claude Lévi-Strauss (1958), a linguagem pode ser encarada, nas suas relações com a cultura, segundo três aspectos. Todos eles são fundamentados na observação e levantam problemas particulares, para além de constituírem o ponto de partida de concepções explicativas sobre as relações entre a linguagem e a cultura: 1) a linguagem corresponde a um dos aspectos da cultura; 2) a linguagem é igualmente uma produção cultural, na medida em que reflecte, pela natureza e projecção dos seus sistemas simbólicos, certas características de uma cultura; 3) finalmente, a linguagem corresponde a uma condição da cultura. É um facto observado, que a linguagem assume, totalmente ou em parte, a permanência de certos aspectos da cultura. Num plano teórico, ela própria é uma cultura se a considerarmos um sistema de comunicação priviligiado que fornece a chave de acesso aos sistemas particulares de comunicação como aos diversos aspectos da cultura. Através do estudo da língua é possível esperar compreender, por exemplo, as categorias mentais do parentesco, cristalizadas nas nomenclaturas dos termos de parantesco e reconstituir as sagas genealógicas que permitem retraçar as histórias familiares e identificar as categorias parentais operatórias. Antropologia Cultural de Moçambique 18 O estudo da língua na forma oral é o único meio obrigatório que o investigador tem para aceder à sociedade e à cultura em observação. Diga-se incidentemente que alguns dos quadros linguísticos referidos, exclusivamente orais, se alteraram quando os antropólogos iniciaram o estudo destas sociedades e obrigatoriamente as suas línguas, começando a transcrevê-las foneticamente e em seguida a fixar a sintaxe. A antropologia psicológica A antropologia psicológica define-se como o domínio que se interessa pelo estudo dos mecanismos do psiquismo humano, na sua interacção com a permância social. O presente domínio não tem por objectivo o indivíduo, enquanto actor particular, o qual pertence ao domínio da psicologia, mas define o encontro entre a antropologia e a psicologia no que corresponde à necessidade de compreensão da subjectividade que preside à acção dos indivíduos em sociedade. Ou seja, corresponde à necessidade de passar do objectivismo ao subjectivismo. Neste campo, entronca o fenómeno de representação sobre a realidade social e a acção derivada da percepção desta mesma realidade pelos diferentes acores sociais. A antropologia social e cultural Se avançarmos do estudo do passado para o presente da dimensão cultural, entramos no campo de estudos da antropologia socialou cultural; o objeto desta área da antropologia são as formas em que as sociedades percebem o mundo e como organizam o seu cotidiano. Antropologia Cultural de Moçambique19 A antropologia social e cultural estuda a cultura de um grupo tanto na sua dimensão instrumental, chamada de cultura material, que se refere às coisas que os homens produzem e com as quais intervêm na natureza, quanto na sua dimensão cosmológica-cognitiva-organizacional, que abrange os sistemas de idéias e de valores, através dos quais se organiza a percepção do mundo. Esta dimensão diz respeito aos elementos ideológicos que compõem a definição de cultura (que posteriormente estudaremos), a saber, a língua, a religião, o sistema de direito, etc. A parte organizacional da antropologia social ou cultural diz respeito às formas que os grupos humanos concebem para estabelecer a circulação dos indivíduos no seu interior, isto é, as regras de casamento e de parentesco, as divisões em grupos menores como clãs, fratriase linhagens. Em outras palavras, a antropologia social e cultural diz respeito a tudo que constitui uma sociedade: seus modos de produção econômica, suas técnicas, sua organização política e jurídica, seus sistemas de parentesco, seus sistemas de conhecimento, suas crenças religiosas, sua língua, sua psicologia, suas criações artísticas, suas técnicas,etc. Para terminar com esta diferenciação das áreas da antropologia temos que nos referir rapidamente por que denominamos a dimensão cultural no presente como antropologia social ou cultural. Basicamente, é uma diferenciação derivada de interesses distintos das escolas antropológicas inglesa e americana. Os antropólogos ingleses se interessaram pela organização social e política dos grupos que estudavam, e assim, focaram seus estudos na idéia de sociedade, por isto a Antropologia Cultural de Moçambique 20 escola foi chamada de antropologia social (embora alguns, como Malinowski, tenham utilizado na sua produção o conceito de cultura). Já os americanos se interessavam pelas variações culturais, pela sua difusão e como os indivíduos são moldados pela cultura; por isto se denominou a essa escola como antropologia cultural ouculturalismo. Sumário A Antropologia tal como outras ciências, subdivide-se em áreas de estudo específicos que permitem uma melhor compreensão do objecto em causa. A designação genérica antropologia cobria e continua a integrar mas de forma independente – cinco domínios de estudo fundamentais: a) a antropologia biológica: a ciência cujo objecto se centrava em especial nos caracteres biológicos dos homens segundo a noção de raça, a hereditariedade, etc; b) a antropologia histórica que estuda o passado das sociedades desaparecidas e das actuais e pode ramificar-se em antropologia pré-histórica e etno-historia; c) a antropologia psicológica que se constitui como aquele domínio que se interessa pelo estudo dos mecanismos do psiquismo humano, na sua interacção com a permância social.; d) a antropologia linguística sendo aquele domínio correspondente ao confronto entre a antropologia e a linguística enquanto ciência que estuda a linguagem como parte integrante do património cultural de uma sociedade e) a antropologia social e cultural cujo objeto de estudo são as formas em que as sociedades percebem o mundo e como organizam o seu cotidiano. Antropologia Cultural de Moçambique 21 Exercícios Auto-avaliação 1. Identifique as áreas de estudo da antropologia. 2. Demonstre que a antropologia socio-cultural é diferente da antropologia psicológica. 3. Discuta a antropologia linguística. 4. Haverá alguma diferença entre a antropologia física e a antropologia biológica? 5. A antropologia histórica estuda, também, as sociedades mais remotas. a. Na tua opinião, qual seria o contributo desta área científica para a reconstrução da história socio-cultural de Moçambique. Bibliografia Básica ERICKENS, Thomas Hylland. NIELSEN, Fin Sivert. História da Antropologia. 4ª ed. Editora Vozes, Petrópolis, R J, 2010. SANTOS, Armindo dos. Antropologia Geral: etnografia, Etnologia, Antropologia Socal. Universiadade Aberta, 2002. COLLEYN, Jean-Paul. Elementos de Antroplogia Social e Cultural. Edições 70, Lisboa, 2005. TITIEV, Mischa. Introdução à Antropologia Cultural. 9ª ed. Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2002. LAPLANTINE, François. Aprender Antropologia. São Paulo, Brasiliense, 2003. Antropologia Cultural de Moçambique 23 Lição n˚ 3 Métodos da Antropologia Introdução Nesta lição abordar-se-á os métodos antropológicos e as premissas antropológicas que devem guiar o trabalho de pesquisa do antropológo. Ao completer esta lição, você será capaz de: Objectivos Identificar os principais métodos da antropologia; Caracterizar as premissas antropológicas; Explicar discriminando os métodos da antropologia e as premissas antropológicas. Terminologia Método histórico, método comparativo, método estatístico. Antropologia Cultural de Moçambique 24 Do estudo teórico “na mesa” à “pesquisa no campo” Os primeiros antropólogos evolucionistas da segunda metade do século XIX, foram designados, no âmbito da história da antropologia, estudiosos da “mesa” (Tylor, Frazer, Morgan): esses trabalhavam sobre narrativas e descrições de realidades efectuadas por observadores não profissionais. Portanto, eles trabalhavam, com um material de “segunda mão”, recolhido, às vezes, sem critérios científicos ou para finalidades diferentes, que porém permitia-lhes colherem elementos para reflectirem sobre a diversidae dos “costumes” humanos. Este tipo de fontes consentia-lhes que elaborassem uma escala evolutiva das formas de vida humanas e do desenvolvimento das culturas. A partir dos últimos anos do século XIX os antropólogos experimentavam uma nova modalidade de fazer a pesquisa: a pesquisa de campo, isto é, observação directa dos modos de vida dos outros efectuada concretamente nos lugares pre-seleccionados para a pesquisa. Nos primeiros decénios do século XX a prática da pesquisa no campo se consolida e é a partir deste momento e desta nova modalidade de pesquisa que a antropologia define os seus métodos, os seus objectos e o seu estatuto científico e académico. São as pesquisas dos primeiros antropólogos funcionalistas britânicos e de alguns culturalistas americanos que marcam o início da prática etnográfica, mudando a atenção do “estudo na mesa” ao estudo da “sociedade” no campo e na sua inteireza. A etnografia como método e como prática de pesquisa No trabalho antropológico se entende comumente com o termo “etnografia” a fase da recolha dos dados num determinado lugar pré-escolhido para a pesquisa (conhecido como “terreno etnográfico”, ou simplesmente “terreno” ou macbookpro Highlight Antropologia Cultural de Moçambique 25 “campo”). O que distingue a antropologia das outras disciplinas científicas é examente esta modalidade de investigar, que prevê períodos de longa permanência no terreno, a imersão no contexto de pesquisa, o conhecimento da língua ou do dialecto do lugar, a observação aprofundada, a compartilha de práticas quotidianas com pessoas que constituem “o objecto” pesquisa. Bronislaw Malinowki que efectuou as suas pesquisas nas ilhas Trobiand da Melanésia entre 1915 e 1918, não foi o primeiro antropólogo a colocar em prática uma pesquisa etnográfica do tipo “moderno”. Foi, porém, um dos primeiros a indicar conscientemente nas práticas acima indicadas os elementos característicosda pesquisa de campo e, portanto, a pesquisa antropológica. A ele, se deve, o facto de ter sido o primeiro a teorizar e colocar em prática a centralidade do método de observação partecipante no processo de compreensão e explicação antropológica e ter construido, a partir de tal consciência, aquela figura do etnógrafo profissional. A expressão observação participante sintetiza as modalidades de interacção do antropólogo com o campo de pesquisa durante a fase etnográfica da pesquisa: ele tem a obrigação de viver dentro da comunidade pesquisada, de participar na vida quotidana deles e, ao mesmo tempo, aquela de estudá-la, de observá-la (e observar mesmo a si no decurso da pesquisa). O antropólogo no campo, através da imersão no contexto estudado, procura adquirir as competências e os conhecimentos de um “nativo”, sem no entanto, beliscar a sua posição de observador externo. A prática etnográfica não constitui simplesmente o método de base da pesquisa antropológica. Para além desses diversos argumentos teóricos, a pesquisa antropológica é constituida do tipo de conhecimento que o antropólogo procura aprofundar. É exactamente a relação prolongada e macbookpro Highlight macbookpro Highlight macbookpro Highlight macbookpro Highlight Antropologia Cultural de Moçambique 26 quotidiana com homens e mulheres de sociedades diversas e com os contextos culturais em que estes vivem, que confere aos “dados” etnográficos um carácter “qualitativo” e a cada pesquisa antropológica uma dimensão “interpretativa”. No esforço contínuo de compreender a lógica interna do contexto pesquisado, o antropólogo, reformulará continuamente as suas questões: durante a etnografia, o problema não é tanto o de encontrar respostas às próprias questões, mas de identificar questões e problemas que tenham sentido para as pessoas a que se dirige a pesquisa. Por esta razão, os objectos da pesquisa antropológica não são objectos concretos e predefinidos, mas se constituem constantemente no decurso da pesquisa (Kilani, 1994, p.51). Com isto, queremos dizer que a análise antropológica de dados pode ser qualitativa mas também quantitativa. Ademais, é necessário salientar que a antropologia vale-se, também do seguintes métodos: Método Histórico: Consiste em investigar eventos do passado, a fim de compreender os modos de vida do presente, que só podem ser explicados a partir da reconstrução da cultura e da observação das mudanças ocorridas ao longo do tempo. Método Estatístico: Os dados, depois de coletados, são reduzido a termos quantitativos, demonstrados em tabelas, gráficos, quadros etc. Método Comparativo: Permite verificar diferenças e semelhanças apresentadas pelo material coletado. A Antropologia Física compara fósseis ou grupos humanos existentes, analisando características anatômicas: cor de pele, do cabelo, dos olhos, índice cefálico etc. macbookpro Highlight macbookpro Highlight macbookpro Highlight Antropologia Cultural de Moçambique 27 Sumário Os primeiros antropólogos evolucionistas da segunda metade do século XIX, foram designados, no âmbito da história da antropologia, estudiosos da “mesa” (Tylor, Frazer, Morgan) porque eles trabalhavam com um material de “segunda mão”. A partir dos últimos anos do século XIX os antropólogos experimentavam uma nova modalidade de fazer a pesquisa: a pesquisa de campo, isto é, observação directa dos modos de vida dos outros efectuada concretamente nos lugares pre-seleccionados para a pesquisa. Assim, a prática etnográfica passou a ser o método mais priviligiado para a investigação antropológica. Além disso, a antropologia vale-se do método histórico, do método comparativo e do método estatístico. . Exercícios Auto-avaliação 1. O que entendes por etnografia? 2. Porque os primeiros antropólogos evolucionistas eram considerados “antropólogos da mesa”? 3. Na sua opinião, acha que seja pertinente que o antropólogo conheça a cultura, sobretudo, a língua do povo em estudo? 4. Em que consiste o método histórico? 5. Justifique a pertinência da análise qualitativa na pesquisa antropológica. Antropologia Cultural de Moçambique 28 Bibliografia Básica MARTINEZ, Francisco Lerma. Antropologia Cultural: guia para estudo.Paulinas Editorial, 5ª edição, Maputo, 2007. SINISCALCHI, Valeria. Antropologia Culturale. Un’introduzione. Carocci, Italia, 2008. Antropologia Cultural de Moçambique 29 Unidade II O Pensamento Antropológico Introdução Esta unidade traz à tona o historial do pensamento antropológico e as correntes que sustentaram o desenvolvimento científico da antropologia até aos nossos dias. Far-se-á uma análise da periodização do pensamento antropológico e das principais ideias peculiares. Serão discutidas as principais correntes que influenciaram o desenvolvimento da antropologia tais como: o evolucionismo, o difusionismo, o funcionalismo e o estruturalismo. Ao completar esta unidade, você será capaz de: Objectivos Discriminar os quatros períodos que caracterizam a história da antropologia; Descrever cada período e identificar os principais pensadores que influenciaram o pensamento antropológico; Identificar as principais correntes antropológicas; Descrever cada uma das correntes mostrando as principais ideias defendidas por cada. Antropologia Cultural de Moçambique 30 Terminologia Período de formação, período de convergência, período de construcção, período crítico, evolucionismo, difusionismo, funcinalismo, estruturalismo. Antropologia Cultural de Moçambique 31 Lição n˚ 1 Periodização do pensamento antropológico Introdução Nesta lição falar-se-á dos principais períodos ou etapas históricas que caracterizam o pensamento antropológico. Assim, ao completar esta lição, você será capaz de: Objectivos Identificar os principais períodos do pensamento antropológico. Descrever justificando os quatro períodos do pensamento antropológico; Identificar os principais expoentes que influenciaram o pensamento antropológico em cada um dos períodos. Terminologia Período de formação, período de convergência, período de construcção, período crítico. Antropologia Cultural de Moçambique 32 Parece-nos arbitrária qualquer divisão da história da antropologia, no entanto, a pertinência da periodização histórica desta disciplina repousa na necessidade de obtermos um mínimo de rigor e sitematização metodológicos que permitem a caracterização teórica das abordagens dos vários pensadores. Mello e Lerma, debruçam-se sobre a divisão histórica apresentada por T.K Penniman, que segundo este último, o pensamento antropológico obedece à quatro períodos, a saber: período de formação, período de convergência, período de construção e período crítico. I. Período de formação (...até 1835) Começa com a história da própria humanidade e diz respeito a toda a reflexão do Homem sobre si e sobre o universo que o rodeia. Neste período esteve presente a preocupação com a origem, a realidade e o destino do homem, procurando explicar o seu passado, sua história e suarelação com o mundo do além. Neste contexto, podemos dizer que todas as manifestações culturais do homem ao longo do tempo, desde as mais longíquas, contribuiram para a efectiva formação da antropologia, nomeadamente as pirâmides do Egipto, as pinturas ruperestres encontradas em várias regiões do mundo, o sistema de parantesco, os sistemas sociais da antiguidade, os fósseis, sistemas religiosos, etc. Este período corresponde ainda à epoca de grandes descobertas e expansões dos europeus pelo mundo, que permitiu colectar dados etnográficos para compreender a complexidade das manifestações culturais o que mais tarde iria incidir na separação da Antropologia em vários ramos (arqueologia, linguísitica, biologia, etcc.), mercê da Antropologia Cultural de Moçambique 33 acumulação de conhecimentos vastos que por si exigiam uma especialização dos estudiosos. II.Período de convergência (1835-1869) Este período é assim designado porque existe nele uma unidade em torno do conceito de evolução.(processo de desenvolvimento natural, biológico e espiritual no qual toda a natureza , com seus seres vivos ou inanimados, se aperfeiçoa progressivamente, realizando novas capacidades, manifestações e potencialidades. Do ponto de vista meramente biológico, a evolução pode ser definida como descendência com variações).Este conceito neste período anima as pesquisas e reflexões nos domínios da Biologia, Filosofia, Sociologia e da própria Antropologia. O período é ainda marcado por debates ardentes, surgimento de várias revistas e numerosas associações científicas e humanitárias como: a) Sociedade de etnografia (1839) e sociedade de antropologia (1843) ambas em París. b) Sociedade de Etnologia de Londres (1843). Estas sociedades eram tidas como humanitárias porque o motivo que deu a sua origem estava ligado a um sentimento humanistas em relação aos povos “primitvivos” face às depredações coloniais. As sociedades em si eram tidas como amigas dos povos primitivos. Através da linha evolutiva se podia classificar toda a humanidade desde os primeiros estágios, chamados de selvageria, passando pela barbárie, até a civilização. Antropologia Cultural de Moçambique 34 III.Período de construção (1869 -1900) Este período é uma simples consolidação do anterior, o número de associações e sociedades cresceu vertiginosamente por toda a Europa e pelos E.U.A. O período de convergência distingue-se do da construção pelo facto de neste último, o evolucionismo ter alcançado o seu apogeu com a teoria de Charles Darwin sobre a origem das espécies, descrita em uma obra clássica intitulado Sobre a Origem das Espécies. Ainda neste período, a Antropologia moderniza-se com o surgimento de grandes publicações de Edward Tylor como “A cultura Primitiva” (1871), onde através do método comparativo o autor tenta explicar a evolução pela qual passou a religião ao longo dos tempos. Outra obra marcante é a de Lewis Morgan “Sociedade Primitiva” (1877), que procurou estabelecer o caminho seguido pela instituição familiar através de vários estádios do desenvolvimento. Se tormarmos como exemplo, a organização familiar, a evolução começaria com a família consanguínea (casamento entre irmãos dentro de um grupo), passando pela família por pares, ou sindiásmica (um homem e uma mulher sem coabitar); o próximo estágio seria o da famíliapatriarcal, um homem e várias mulheres; até chegar no último estágio, que é o da família monogâmica, de um homem e uma mulher coabitando juntos na mesma casa. Taylor é considerado um dos principais expoentes desse período, pois, foi quem definiu o termo antropológico de cultura e o apresentou como objecto da Antropologia. Outros estudiosos: Bachofen, Sumner, Maine, Milennan, etc. Antropologia Cultural de Moçambique 35 IV. Período crítico (1900 à...) Este período vai até aos nossos dias, tendo se caracterizado pelos avanços em vários domínios do saber, progresso dos meios de comunicação, democratização da educação e institucionalização da Antropologia como uma disciplina universitária. Estes factores permitiram a publicação de escritos que puseram a ciência antropológica ao serviço não só do colonialismo, como também das universidades. Os povos outrora objectos de estudo de antropólogos europeus e norte-americanos começaram a cultivar também estudos de Antropologia. A realidade sociocultural tomou novos rumos e passou a ser analisada por olhares diversos. Alguns antropólogos também começaram a dedicar-se aos estudos na área da psicologia, da linguística, de folcloristica e dos efeitos perversos do urbanismo. Sumário A história do pensamento antropológico pode ser subdividida em quatro períodos fundamentais, tais são: o período de formação, o período de convergência, o período de construção e período crítico. O período de formação (...até 1835) refere-se aquele que começa com a história da própria humanidade extende-se até à época das descobertas e expansões dos europeus pelo mundo e diz respeito a toda a reflexão do Homem sobre si e sobre o universo que o rodeia. O período de convergência (1835 -1869) centraliza seus debates em torno do conceito de evolução e que influenciou para o surgimento de acesos debates, criação de várias revistas e numerosas associações científicas. O período de construção (1869 -1900) constitui-se como um período de consolidação do anterior e distingue-se pelo facto de neste Antropologia Cultural de Moçambique 36 último, o evolucionismo ter alcançado o apogeu com a teoria de Charles Darwin sobre as espécies e a publicação de obras clássicas da antropologia. O último período, ou seja, o período crítico (1900 à...) caracteriza-se pelos avanços em vários domínios do saber, progresso dos meios de comunicação, democratização da educação e institucionalização da Antropologia como uma disciplina universitária. Exercícios Auto-avaliação 1. Identifique os períodos fundamentais do pensamento antropológixco. 2. Refira-te às principais diferenças entre o perídio de construção e o período de convergência. 3. Caracterize o período crítico. Bibliografia básica DE MELLO, Luiz Gonzaga. Antropologia cultural, pgs 220- 277. MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. 6ª ed., São Paulo: Atlas, 2006. TOMÁS, Adelino Esteves. Manual de Antropologia Sócio- Cultural. Universidade Pedagogica Sagrada Família, sd. ERICKENS, Thomas Hylland. NIELSEN, Fin Sivert. História da Antropologia. 4ª ed. Editora Vozes, Petrópolis, R J, 2010. Antropologia Cultural de Moçambique 37 GONÇALVES, António Custódio. Trajectórias do Pensamento Antropológico. Universidade Aberta, 2002. SANTOS, Armindo dos. Antropologia Geral: etnografia, Etnologia, Antropologia Socal. Universiadade Aberta, 2002.pgs. 123-170. COLLEYN, Jean-Paul. Elementos de Antroplogia Social e Cultural. Edições 70, Lisboa, 2005. LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 14ª ed., Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 2001. Antropologia Cultural de Moçambique 38 Lição n˚ 2 As correntes do pensamento antropológico: o evolucionismo Introdução A antropologia desenvolveu-se graças a existência de diversas correntes antropológicas que se debruçaram sobre diversos temas referentes à ciência antropológica: o evolucionismo, o difusionismo,o funcionalismo, o estruturalismo. Na lição de hoje vamos centralizar a nossa discussão em volta da corrente evolucionista. Ao completer esta lição, você será capaz de: Objectivos Descrever o evolucionismo enquanto corrente antropológica; Identificar os principais expoentes do evolucionismo. Identificar as principais características do evolucionismo. Terminologia Evolucionismo, factor tempo, tempo cultural, paralelismo cultural, evolução.. Antropologia Cultural de Moçambique 39 O evolucionismo de acordo com alguns autores (Colleyn, 2005; Gonzaga, 000; Santos, 2002) foi influenciado pelo darwinismo e pela teoria da evolução das espécies. Esta escola ou corrente antropológica afirma que a espécie humana evolui lentamente e que se podem classificar todas as sociedades existentes em função do estádio de desenvolvimento alcançado. A ideia parte do princípio enunciado por Charles Darwin, segundo o qual, o mundo vivo é resultado de uma longa acumulação de mutações e evolução das espécies, isto é, na visão dos autores representantes desta corrente antropológica, tal como as espécies animais evoluem, as culturas também evoluem com o tempo. As culturas evoluem através de mutações, interagindo ou não com o meio exterior. Etward Taylor, Lewis Morgan e Herbert Spencer são alguns dos autores associados ao evolucionismo oficial e as suas teorias consituiram-se como uma tentativa de formalizar o pensamento antropológico com linhas científicas modeladas conforme a teoria biológica da evolução, ou seja, se os organismos podem se desenvolver com o passar do tempo com leis compreensíveis e deterministas, parece então razoável que sociedades também o possam. Assim sendo, para MELLO, as principais caracterísiticas do evolucionismo resumem-se em: I. Vastidão do objecto: o objecto do evolucionismo é tão vasto que se confude com o da Antropologia no geral, pois, abrange a cultura como um todo ligado à espécie humana. O evolucionismo não trata sobre manifestações culturais de um povo particular, mas diz respeito à cultura como um património comum a toda a humanidade, procurando explicar os aspectos culturais comuns aos povos. Antropologia Cultural de Moçambique 40 II. Factor tempo: o evolucionismo levou em consideração o factor cronológico, tendo criado uma temporização nova designada “tempo cultural” por meio do qual são caracterizados os estádios de cultura vividos pelos povos, daí resulta a utilização do conceito “paralelismo cultural” que assenta no pressuposto de que tanto os povos primitivos como os civilizados têm uma origem cultural simultânea, diferindo no facto de os povos primitivos terem-se retardo na evolução cultural devido ao facto de se terem apegado aos valores e tradições do passado. III. Uso do método comparativo: o evolucionismo faz interpretações das instituições do passado através da reconstrução do próprio passado, por intermédio do método comparativo, explicando o desconhecido por aquilo que se conhece. IV. Introdução de novos temas e conceitos: os principais temas abordados pelo evolucionismo são a religião e a família e em qualquer destes temas a preocupação é explicar que a cultura obedece a uma evolução universal, isto é, que a cultura surgiu simultaneamente em todas as partes. O evolucionismo teve o seu mérito de trazer para a Antropologia uma série de neologismo que enriqueceu o quadro conceptual desta disciplina e que até hoje se mantém actualizado, por exemplo, o conceito de cultura, religião, patriarcado, magia, clã, tribo, incesto, totem, matriarcado, parentesco, evolução cultural, etc. Antropologia Cultural de Moçambique 41 Sumário O evolucionismo foi influenciado pelo darwinismo e pela teoria da evolução das espécies. Esta escola ou corrente antropológica afirma que a espécie humana evolui lentamente e que se podem classificar todas as sociedades existentes em função do estádio de desenvolvimento alcançado. As principais caracterísiticas do evolucionismo resumem-se em: vastidão do objecto, factor tempo, uso do método comparativo e a introdução de novos temas e conceitos. Exercícios Auto-avaliação 1. Quem são os representantes desta corrente antropolóigca. 2. Debruce-se sobre as principais características do evolucionismo. 3. Em linhas gerais, qual é a ideia central desta corrente antropológica. Bibliografia básica DE MELLO, Luiz Gonzaga. Antropologia cultural, pgs 220- 277. MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. 6ª ed., São Paulo: Atlas, 2006. TOMÁS, Adelino Esteves. Manual de Antropologia Sócio- Cultural. Universidade Pedagogica Sagrada Família, sd. Antropologia Cultural de Moçambique 42 ERICKENS, Thomas Hylland. NIELSEN, Fin Sivert. História da Antropologia. 4ª ed. Editora Vozes, Petrópolis, R J, 2010. GONÇALVES, António Custódio. Trajectórias do Pensamento Antropológico. Universidade Aberta, 2002. SANTOS, Armindo dos. Antropologia Geral: etnografia, Etnologia, Antropologia Socal. Universiadade Aberta, 2002.pgs. 123-170. COLLEYN, Jean-Paul. Elementos de Antroplogia Social e Cultural. Edições 70, Lisboa, 2005. LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 14ª ed., Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 2001. Antropologia Cultural de Moçambique 43 Lição n˚ 3 As correntes do pensamento antropológico: o difusionismo Introdução Nesta lição faremos abordagem de uma outra corrente que influenciou o pensamento antropológico: o difusionismo. Ao completer esta lição, você será capaz de: Objectivos Identificar os principais expoentes desta corrente antropológica. Descrever o difusionismo mencionando as suas principais características. Diferenciar as três escolas que sustentam a corrente difusionista. Terminologia Difusionismo, historicismo, difusão cultural, difusionismo inglês, difusionismo alemão, difusionismo americano. Antropologia Cultural de Moçambique 44 O difusionismo, também conhecido por historicismo, opunha- se à corrente evolucionista partindo da ideia segundo a qual, na história da humanidade, as verdadeiras inovações são em número reduzido e propagam-se a partir de centros culturais, ou seja, sustenta que as inovações são iniciadas numa cultura específica, para só então serem difundidas de várias maneiras a partir desse ponto inicial. É evidente que existe a difusão cultural: o nosso alfabeto veio dos fenícios, os nossos algarismos são árabes, o cristianismo veio do Médio Oriente, etc. A influência da escola difusionista foi, porém, efémera por causa dos exageros de alguns dos seus promotores, que faziam da difusão o factor único da evolução das sociedades. Os principais autores difusionistas são alemães ou austríacos (o padre Schmidt, 1868 – 1954; F. Graebner, 1877-1934; L. Frobenius, 1873 -1938), mas houve também um “hiperdifusionismo” inglês com G. Elliot-Smith (1871- 1937) e o seu discípulo W. J. Perry. Os difusionistas tinham tendência para ignorar o fenómeno de convergência que faz com que uma mesma instituição ou um mesmo traço cultural se encontre em civilizações diferentes, sem que haja uma origem comum. Por exemplo, em todos os sistemas económicos de auto-subsistência em que o parantescoé importante, o estatuto de um homem será menos avaliado pelo número e raridade de bens que possui, do que pelo número maior ou menor de parentes dedicados com que pode contar. Características importantes podem ser historicamente produzidas sem que se deva pensar numa origem comum. Se os Maias do Iucatão e os Hindus conheciam o zero, é claro que não houve difusão deste traço entre essas duas culturas. Antropologia Cultural de Moçambique 45 Actualmente considera-se vã a procura das origens; no que respeita à história remota dos povos sem escrita, só se podem estabelecer algumas referências prudentes; e, sobretudo, um elemento de um sistema social é ininteligível quando extraído do conjunto que o contém e o explica. Há historicamente três linhas de pensamento difusionistas a que chamaremos escolas: a) O difusionismo inglês ou a escola inglesa: defende a difusão como sendo a única causa da expansão e dinâmica cultural, nega a teoria do paralelismo cultual exposta pelo evolucionismo e considera a existência apenas de um centro cultural (difusão heliocentrica), desde o qual todos os traços culturais foram difundidos. Este centro cultural era o Egipto Antigo. Os principais proponentes dessa teoria foram Grafton Elliot Smith (1871-1937) e William James Perry (1887 -1949), ambos estudaram o Egipto Antigo intensamente, resultando na sua crença que o Egipto era o único centro cultural. As teorias destes pensadores passaram a ser designadas de pan- egiptismo b) O difusionismo alemão ou escola alemã: os seus fundadores são Father Wilhelm Schmidt e Fritz Graebener, os quais defenderam a teoria dos círculos culturaisde difusão que surgiram em determinados espaçoes e épocas e daí se difundiram. Estes teóricos acreditavam que o progresso da difusão seria a via mais eficiente para o avanço da civilização e advogavam a necessidade de fortalecer os contactos dos povos menos civilizados com os círculos culturais. O que em certo modo procurava legitimar a exploração colonial da Europa pelo mundo. O difusionismo é importante ainda hoje. O conceito de Antropologia Cultural de Moçambique 46 difusionismo explicaa como alguns traços culturais adquiridos e difundidos. c) O difusionismo americano ou escola americana. Considerou as culturas particulares como sendo o principal campo de estudo da Antropologia. Segundo Franz Boas, a cultura é tão complexa que não permite um levantamento histórico de carácter universal. A antropologia deve centrar os seus estudos em pequenas comunidades culturais, nomeadamente clãs, tribos, castas e outras formas primitivas de organização social. Acrescenta Boas que a difusão não é um processo linear e mecânico, mas pressupõe uma elaboração complexa por parte dos povos que apreende certos traços culturais. Considera que para a compreensão das culturas é importante o seu levantamento histórico, pois o facto de determinados traços culturais terem origem diversas condiciona a compreensão da cultura, ou seja, precisa-se conhecer a história de uma dada cultura para compreender a cultura em si. Em síntese, o difusionismo ajuda a explicar a aculturação, mas não é a capaz de explicar todos os aspectos culturais como os primeiros difusionistas acreditavam. Existem exemplos de culturas em contactos próximos, mas que não partilham muitos traços. Por isso, o difusionismo aparece como uma corrente problemática por várias razões. Primeiro, é difícil demonstrar que uma inovação teve um ponto de partida único. Segundo, muitas invenções e ideias culturais podem ter sido descobertas ou ter evoluído isoladamente. Terceiro, as adaptações às necessidades humanas sociais podem facilmente ter tomado formas similares em diversas culturas, caso tenham sido as melhores soluções possíveis para problemas similares. Por exemplo, o aparecimento de Antropologia Cultural de Moçambique 47 pirâmides no Egipto e na América Central se que, até hoje, nada tenha provado que a técnica de edificação de pirâmides se tenha difundido do Egipto à America Central, o mesmo se pode afirmar em relação ao fogo que já era utilizado pelos índios americanos e pelos africanos sem que estes povos tenham tido contacto algum no passado. Sumário O difusionismo, também conhecido por historicismo, opunha- se à corrente evolucionista. O difusionismo sustenta que as inovações são iniciadas numa cultura específica, para só então serem difundidas de várias maneiras a partir desse ponto inicial. Há historicamente três linhas de pensamento difusionistas a saber: a) o difusionismo inglês que defende a difusão como sendo a única causa da expansão e dinâmica cultural; b) o difusionismo alemão que defendia a teoria dos círculos culturais de difusão. Os defensores acreditavam que o progresso da difusão seria a via mais eficiente para o avanço da civilização e advogavam a necessidade de fortalecer os contactos dos povos menos civilizados com os círculos culturais e; c) o difusionismo americano representadopor Franz Boas que sutenta que a difusão não é um processo linear e mecânico, mas pressupõe uma elaboração complexa por parte dos povos que apreende certos traços culturais. Antropologia Cultural de Moçambique 48 Exercícios Auto-avaliação 1. Identifique as três escolas de pensamento antropológico que podemos encontrar na corrente difusionista. 2. Debruce-se sobre o difusionismo, não se esquecendo de olhar para a principal ideia defendida por esta correne antropológica. 3. “as inovações são iniciadas numa cultura específica, para só então serem difundidas de várias maneiras a partir desse ponto inicial” a. Concordas? Justifique.. Bibliografia Básica DE MELLO, Luiz Gonzaga. Antropologia cultural, pgs 220- 277. MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. 6ª ed., São Paulo: Atlas, 2006. TOMÁS, Adelino Esteves. Manual de Antropologia Sócio- Cultural. Universidade Pedagogica Sagrada Família, sd. ERICKENS, Thomas Hylland. NIELSEN, Fin Sivert. História da Antropologia. 4ª ed. Editora Vozes, Petrópolis, R J, 2010. GONÇALVES, António Custódio. Trajectórias do Pensamento Antropológico. Universidade Aberta, 2002. SANTOS, Armindo dos. Antropologia Geral: etnografia, Etnologia, Antropologia Socal. Universiadade Aberta, 2002.pgs. 123-170. COLLEYN, Jean-Paul. Elementos de Antroplogia Social e Cultural. Edições 70, Lisboa, 2005. Antropologia Cultural de Moçambique 49 LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 14ª ed., Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 2001. Antropologia Cultural de Moçambique 51 Lição n˚ 4 As correntes do pensamento antropológico: o funcionalismo Introdução Dando continuação ao que vimos nas lições anteriores, nesta lição, discuteremos a corrente antropológica funcionalista. Ao completer esta lição, você será capaz de: Objectivos Distinguir as duas escolas do pensamento funcionalista; Identificar os principais expoentes desta corrente antropológica. Descrever o funcionalismo mencionando as suas principais características. Terminologia Funcionalismo, função, instituição, estrutura, organização, indivíduo, estatuto, normas e sanções, necessidades, significado, função social. Antropologia Cultural de Moçambique 52 O funcionalismoopõe-se ao evolucionismo e ao difusionismo priviligiando, já não uma abordagem diacrónica (ao longo do tempo), mas sim uma abordagem sincrónica da sociedade. Trata-se de compreender como funciona uma sociedade. Para isso, o conhecimento da sua história pode ser útil, mas não necessário. Para se compreender como funciona uma língua, estuda-se a gramática, a fonética, a fonologia, etc.; mas não é necessário estudar a história das palavras. Dois são os pólos mais salientes do funcionalismo: o funcionalismo de Bronislaw Malinowski e o funcionalismo de Radcliffe-Brown. A. O Funcionalsimo de Bronislaw Malinowski Bronislaw Malinowski foi um dos expoentes da antropologia funcionalista britânica da primeira metade do século XX. Para ele, devido à influência de Wilhelm Wundt, cada sociedade deveria ser estudada como um “todo”, como um organismo possuidor de uma lógica interna e singular, subdividido através de de uma complexa rede de relações entre os indivíduos. Ele também acreditava que a análise antropológica deveria se realizar de forma sincrônica, imediata e levando em conta os factores sociais, psicológicos e biológicos dos nativos. Para compreender a complexidade social das diferentes sociedades o funcionalismo de Malinowski, conhecido como biopsicológico, defende que as instituições sociais têm como função satisfazer as necessidades biológicas dos indivíduos. Ou seja, segundo a definição de Laplantine (2003), cada pessoa possui um conjunto de precisões, cabendo a cultura desenvolver diferentes maneiras de resolver essas necessidades, de forma colectiva, através das instituições. Antropologia Cultural de Moçambique 53 No livro Uma Teoria Científica da Cultura, Malinowski (1970) afirma que a cultura representa a totalidade social, o conjunto de todas as instituições, um “ambiente artificial”, uma forma de resolver as necessidades humanas. O mesmo define função como uma acção colectiva responsável por satisfazer uma necessidade (fome, procriação, protecção, etc.). Mas, para que isso ocorra, é preciso que haja cooperação, organização entre os indíviduos. A organização, por sua vez, precisa de um arranjo, de uma estrutura bem definida, a qual se chama instituição. Para que uma instituição possa existir, um conjunto de valores tradicionais que dizem respeito a essa instituição necessita ser aceite pela colectividade, bem como é necessário que haja uma relação entre as pessoas e com o ambiente físico e com a cultura. Para o autor há um conjunto de elementos que caracterizam a instituição, a saber: O Pessoal: pois toda a instituição funciona graças aos indivíduos que a compõem cada um dos quais realizando uma função determinada. O Estatuto: éparao autor a posição que cada indivíduo ocupará na instituição e em função da qual espera um certo reconhecimento por parte dos outros integrantes da instituição. A Função: é justamente o papel que cada indivíduo irá desempenhar na instituição, isto é, o conjunto de expectativas que os membros da instituição têm para com cada um dos seus membros. As normas e sanções: Malinowski observa que qualquer instituição só cumpre os propósitos para os quais ffoi criada se cada membro do grupo cumprir as suas funções, isto é, se obedecer as normas da instituição. Observa ainda que fazer cumprir essas funções, o grupo institui um conjunto de Antropologia Cultural de Moçambique 54 sanções ou de recompensas que orientam as actuações dos seus membros. A satisfação de necessidades: Malinowski observa que qualquer instituição só cumpre os propósitos para os quais foi criada se cada membro do grupo cumprir as suas funções, isto é, se obedecer as normas da instituição. Observa ainda que para fazer cumprir essas funções, o grupo institui um conjunto de sanções ou de recompensas que orientam as actuações dos seus membros. O pesquisador da área de antropologia, na visão de Malinowski, dentro da perspectiva funcionalista, deve observar cada detalhe da cultura estudada, por mais simples que possa parecer, a fim de reconstruir de forma precisa a lógica daquela cultura. Por isso, é importante a observação participante, uma metodologia desenvolvida por Malinowski, resultante do aperfeiçoamento do trabalho de campo, onde o observador convive durante um longo período com a colecctividade por ele estudada, participando de todas as actividades, do dia-a-dia, no intuito de apreender toda a complexidade da cultura. B. O Funcionalismo de Radcliffe-Brown Alfred Reginald Radcliffe-Brown (1881-1995) foi discípulo de Malinowski, os seus estudos centram-se nos conceitos de estrutura e função em que apela para a analogia com os organismos vivos. A estrutura deve ser entendida como uma série de relações entre entidades. Assim, como a estrutura da célula realiza um sem-número de relações entre moléculas complexas, a estrutura da sociedade também o faz em relação às várias partes que a compõem, cada uma das quais cumprindo uma função específica. Antropologia Cultural de Moçambique 55 Radcliffe-Brown fundou uma abordagem teórico- antropológica conhecida como estruturo-funcionalismo. Cada sociedade estudada era considerada como uma “totalidade”, como um organismo cujas partes eram integradas e funcionavam de um modo mecânico para manter a estabilidade social. Como estruturo-funcionalista, as preocupações de Radcliffe-Brown estavam ligadas à descoberta de princípios comuns entre as diversas estruturas sociais, o significado dos rituais, dos tabus e mitos e suas funções exercidas na manutenção da sociedade. Radcliffe-Brown introduziu dois conceitos básicos na literatura antropológica: significado e função social. Segundo o autor, para compreender um determinado ritual é necessário, inicialmente, encontrar seu significado, isto é, os sentimentos que ele expressa e as razões que os nativos apontam, para em seguida identificar sua função social naquilo que é importante para assegurar a coesão social necessária para a subsistência do grupo. O sistema de parantesco foi um dos elementos fundamentais de sua análise. Considerava-o, mesmo, como elemento fundamental para a compreensão da organização social em sociedades de pequena escala, já que expressava um sistema jurídico de normas e regras que impõem direitos e deveres. Sumário A escola antropológica inglesa da primeira metade do século XX se dividiu praticamente entre grupos encabeçados por dois antropólogos: Malinowski e Radcliffe-Brown. Apesar de ambos serem adeptos do funcionalismo, existem especificidades que definiam cada um. A ideia de função do Antropologia Cultural de Moçambique 56 primeiro, que recebeu influência de Wilhem Wundt, estava relacionada à satisfação de necessidades individuais enquanto o segundo, o seguidor de Durkheim, acreditava que a função existe independente dos “actores individuais”, estando ligada à manutenção da vida social, das redes de conexões entre pessoas. As concepções também eram diferentes no sentido de que, para Malinowski, o indivíduo era responsável pela existência das instituições da sociedade, sendo o “motor” que fazia que as mesmas se movimentassem, mas, para Radcliffe-Brown, as instituições e a estrutura social eram autónomas com relação ao indivíduo, que apenas possuía um papel secundário, sendo mais importante o estudo da estrutura. Exercícios Auto-avaliação 1. Qual é a ideia principal defendida pelos funcionalistas. 2. Quem são os principais expoentes desta corrente do pensamento
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