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ANTROPOLOGIA SOCIOLOGIA DAEDUCAÇÃO

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ANTROPOLOGIA
SOCIOLOGIA
EDUCAÇÃODA
E
GRAZIELLA ROLLEMBERG
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O
ISBN 978-65-5821-114-3
9 786558 211143
Código Logístico
I000510
Antropologia e 
Sociologia da 
Educação 
Graziella Rollemberg
IESDE BRASIL
2022
Todos os direitos reservados.
IESDE BRASIL S/A. 
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 
Batel – Curitiba – PR 
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
© 2022 – IESDE BRASIL S/A. 
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito da autora e do 
detentor dos direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: askproject/envato elements
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO 
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
R656a
Rollemberg, Graziella
Antropologia e sociologia da educação / Graziella Rollemberg. - 1. ed. 
- Curitiba [PR] : IESDE, 2022.
150 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-5821-114-3
1. Antropologia educacional. 2. Sociologia educacional. 3. Cultura. 4. 
Abordagem interdisciplinar do conhecimento na educação. I. Título.
22-75824 CDD: 306.43
CDU: 316.74:37
Graziella Rollemberg Mestre em Educação Profissional e Tecnológica pelo 
Instituto Federal de Sergipe (IFS). Especialista em 
Docência do Ensino Superior pela Universidade Norte do 
Paraná (Unopar). Licenciada em Sociologia pelo Centro 
Universitário Leonardo da Vinci (Uniasselvi). Bacharel 
em Ciências Sociais com habilitação em Antropologia 
pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). 
Docente e coordenadora editorial de coleções didáticas 
e paradidáticas para Ensino Fundamental e Ensino 
Médio. Autora de obras didáticas para Educação Básica 
e Educação Superior e de obras paradidáticas para 
Educação Básica das redes pública e privada há 25 anos.
Agora é possível acessar os vídeos do livro por 
meio de QR codes (códigos de barras) presentes 
no início de cada seção de capítulo.
Acesse os vídeos automaticamente, direcionando 
a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet 
para o QR code.
Em alguns dispositivos é necessário ter instalado 
um leitor de QR code, que pode ser adquirido 
gratuitamente em lojas de aplicativos.
Vídeos
em QR code!
SUMÁRIO
1 Introdução ao pensamento antropológico 9
1.1 Natureza e cultura 9
1.2 Alteridade, etnocentrismo e relativismo cultural 14
1.3 O pensamento antropológico 20
2 Antropologia, educação e sociedade 28
2.1 Indivíduo, cultura e sociedade 28
2.2 Socialização, cultura e educação 35
3 Antropologia da Educação e formação docente 48
3.1 Antropologia Educacional 48
3.2 A educação como prática simbólica 51
3.3 Pesquisa em Antropologia da Educação 62
4 Introdução à sociologia 71
4.1 A sociologia: surgimento, objetos e métodos 71
4.2 Indivíduo, vida social e categorias sociológicas 75
4.3 Componentes da vida social 85
5 Educação, sociedade e poder 97
5.1 Instituições educativas 97
5.2 Processos educativos e reprodução social 103
5.3 Estado, ideologia e educação 111
6 Sociologia da Educação e formação docente 123
6.1 A construção social da escola 123
6.2 A construção social do docente 130
6.3 A cultura digital e as novas relações com o saber 135
 Resolução das atividades 145
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Vídeos
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Este livro tem como objetivo proporcionar um panorama 
geral sobre a antropologia e a sociologia, duas áreas das 
ciências sociais que contribuem muito para os estudos na 
área da educação, tanto sob o ponto de vista teórico e de 
pesquisa quanto das práticas pedagógicas, visando promover 
a compreensão das bases teórico-metodológicas do que 
chamamos de Antropologia da Educação e de Sociologia da 
Educação. 
Nos três primeiros capítulos, abordaremos as 
especificidades da antropologia enquanto ciência 
humana, por meio da oposição natureza x cultura, e 
compreenderemos as principais tendências da Antropologia 
Contemporânea, analisando as origens da antropologia e o 
seu desenvolvimento. Conheceremos, ainda, os conceitos de 
alteridade, etnocentrismo e relativismo cultural, bem como as 
suas aplicações às realidades culturais e à vida cotidiana. 
Também exploraremos a investigação antropológica das 
diversas culturas humanas, as suas manifestações simbólicas 
e materiais, os seus nexos e as suas práticas, as relações 
que se estabelecem entre diferentes culturas e os processos 
culturais e educacionais que se desenvolvem dentro e fora 
da escola, os quais podem e devem ser analisados mediante 
o olhar antropológico, este que traz abordagens úteis às 
reflexões sobre os contextos e as relações de aprendizagem.
Ao longo dos três primeiros capítulos, você perceberá que 
a antropologia pode ser usada como uma das ciências de apoio 
aos estudos voltados à educação e à formação dos indivíduos, 
no sentido de analisar os universos culturais que integram 
tanto a instituição escolar como os contextos informais de 
educação. Além disso, compreenderá a relevância da análise 
sistemática dos processos de socialização na constituição 
do indivíduo e como dimensão importante de quaisquer 
processos educativos. 
APRESENTAÇÃOVídeo
8 Antropologia e Sociologia da Educação
Nos três últimos capítulos da obra, conheceremos como se deram o 
surgimento da sociologia e o seu desenvolvimento, por meio das principais 
linhas teóricas e de seus autores, compreenderemos quais são os objetos e 
os métodos de estudo dessa área do conhecimento e entenderemos vários 
de seus principais conceitos e categorias – indivíduo, sociedade, grupos sociais, 
estrutura social e estratificação, entre outros. 
Entenderemos, também, como a sociologia aplicou sua análise aos fenômenos 
ligados aos processos educacionais, contribuindo para a construção da 
Sociologia da Educação. Ainda, compreenderemos a origem, o desenvolvimento 
e as contribuições da Sociologia da Educação, que busca empreender uma 
visão sociológica sobre os processos educativos e tem a importante tarefa 
de fundamentar várias outras disciplinas, tanto as integrantes dos cursos de 
Pedagogia quanto as que fazem parte das pós-graduações ligadas à área 
educacional, promovendo a compreensão da realidade educacional brasileira. 
Nesse sentido, abordaremos as origens e o funcionamento das instituições 
educativas no Brasil e os processos educativos formais e informais, para analisar 
o papel social da escola, considerando-a não só como lócus de reprodução social, 
mas também de transformação social. Da mesma forma, para compreender as 
relações entre educação, Estado e poder, veremos as políticas educacionais, as 
teorias e as práticas pedagógicas sob a perspectiva sociológica. 
Finalmente, analisaremos as contribuições da Sociologia da Educação para a 
formação e a prática docente, além do modo como ela pode subsidiar a reflexão 
do professor sobre os seus próprios saberes, a sua trajetória como profissional 
e as suas práticas no cotidiano escolar, auxiliando-o a analisar de maneira crítica 
suas concepções de mundo e de ensino e a transformar suas práticas, no sentido 
de promover uma formação para a cidadania plena para seus estudantes e de 
imbuir suas ações e relações no contexto escolar de um caráter crítico, humano 
e emancipador. Com isso, evita-se a reprodução mecânica e pouco consciente 
de concepções e práticas incorporadas durante sua trajetória, as quais, por 
vezes, não refletem verdadeiramente seu posicionamento docente. 
Introdução ao pensamento antropológico 9
1
Introdução ao pensamento 
antropológico
Neste capítulo, vamos entender as especificidadesda antropologia 
enquanto ciência humana por meio da oposição natureza x cultura e 
compreender as principais tendências da antropologia contemporâ-
nea analisando as suas origens e seu desenvolvimento. Conheceremos 
também os conceitos de alteridade, etnocentrismo e relativismo cultu-
ral e suas aplicações às realidades culturais e à vida cotidiana.
A antropologia é uma ciência humana dedicada a investigar as di-
versas culturas humanas, suas manifestações simbólicas e materiais, 
seus nexos e práticas, e as relações que se estabelecem entre diferen-
tes culturas. 
Os processos culturais e educacionais que se desenvolvem dentro 
e fora da escola podem e devem ser analisados por meio do olhar an-
tropológico, que traz abordagens úteis às reflexões sobre os contextos 
e as relações de aprendizagem, e uma das discussões fundamentais 
para a delimitação da antropologia como área do conhecimento espe-
cífica é a oposição entre natureza e cultura.
1.1 Natureza e cultura 
Vídeo Para iniciar a discussão sobre as categorias de natureza e de cul-
tura e sua importância para a consolidação do pensamento antro-
pológico, vamos analisar uma situação histórica. Imagine esta cena 
(que ocorreu de verdade): no século XVI, o rei da França na época, 
Carlos IX, acompanhado de parte de sua corte, em Rouen, teve um 
encontro com um chefe Tupinambá e dois guerreiros dessa tribo, 
levados do Brasil para a Europa para que seus “hábitos estranhos” 
fossem conhecidos pela realeza. 
Entender as especifici-
dades da antropologia 
enquanto ciência humana 
por meio da oposição 
natureza x cultura.
Objetivo de aprendizagem
Entre os cortesãos do rei estava o filósofo Michel de Montaigne, 
autor importante para a antropologia 1 . Ele relatou a situação em 
sua obra Ensaios, informando aos leitores que, nesse encontro de 
culturas, os “selvagens” ficaram tão admirados quanto os nobres, e 
perceberam, ao observar a sociedade francesa, que havia pessoas 
bem alimentadas, que pareciam usufruir de todas as comodidades 
da vida – como era o caso dos cortesãos –, enquanto outras, de 
aparência miserável, magros em virtude da fome e das privações, 
mendigavam à porta dos privilegiados que tudo tinham.
O mesmo encontro foi relatado de maneira bem diferente pelo 
conquistador Nicolas Durand de Villegagnon (1510-1571): 
Só havia gente selvagem, afastados de toda cultura e hu-
manidade; diferenciados de nós pelos costumes e regras de 
vida, sem religião, sem conhecimento nenhum do que seja 
honra e a virtude; incapazes de distinguir o justo do injusto; 
tanto que me veio a dúvida se tínhamos encontrado feras 
revestidas de aparência humana. (SAMESHIMA, 2004, p. 7) 
Esses dois relatos indicam as duas visões opostas que permearam 
o encontro dos europeus com os povos da América. Uma delas é a 
visão colonizadora do conquistador, favorável à exploração das rique-
zas naturais do território recém encontrado. Uma visão etnocêntrica 
que considerava a Europa como civilização superior aos “selvagens”, 
o que dava aos colonizadores o direito de subjugá-los e explorá-los. A 
outra era a visão expressa por Montaigne, que defendia que o certo 
e o errado seriam conceitos relativos, a depender do contexto cultu-
ral, e que, por isso, o encontro entre culturas tão diferentes poderia 
promover um maior conhecimento sobre a espécie humana e sobre a 
própria civilização europeia.
As ciências naturais, como a físi-
ca, a química, a biologia, a geologia, 
entre muitas outras, ocupam-se 
do estudo da natureza e seus fe-
nômenos, e a antropologia, uma 
ciência humana, tem como objeto 
Antropologia significa 
literalmente estudo do 
homem, estudo do ser 
humano.
1
Para saber mais sobre a 
história do encontro de 
Carlos IX, acompanhado 
de parte de sua corte, em 
Paris, com um chefe Tupi-
nambá e dois guerreiros 
dessa tribo, acesse o link 
e leia essa história e muito 
mais sobre o tema Natu-
reza x cultura no texto. 
Disponível em: https://super.abril.
com.br/historia/o-pensamento-
selvagem-de-levi-strauss/. Acesso 
em: 21 out. 2021.
Dica
Mulher indígena Pataxo com criança no colo 
durante jogos indígenas na aldeia Coroa 
Vermelha, em Santa Cruz de Cabrália – 
Bahia, 2009.
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1010 Antropologia e Sociologia da EducaçãoAntropologia e Sociologia da Educação
Introdução ao pensamento antropológico 11
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de estudo a cultura, que define a própria área do conhecimento 
antropológico. O pensamento antropológico clássico é caracteriza-
do pela separação entre natureza e cultura, como duas categorias 
opostas, mas também complementares. 
Outras oposições complementares também estão entre as re-
flexões da antropologia, como ambiente e civilização, animal e hu-
mano, entre outras, que estão no centro do debate sobre o que 
torna o ser humano especificamente humano, ou seja, o que é 
próprio apenas dos seres humanos. Seriam elementos instintivos, 
naturais do ser humano, ou características do ambiente em que 
o indivíduo se insere, elementos sociais e culturais, que tornam 
alguém humano?
A oposição entre natural ou “selvagem” e civilizado é antiga, não 
só na antropologia, mas, antes disso, na filosofia e demais áreas 
do conhecimento que buscam compreender os seres humanos e 
sua vida em sociedade; desde os filósofos chamados de contratua-
listas, como Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e Thomas Hobbes 
(1588-1679), ainda no século XVIII, que discutem a oposição entre 
natureza e cultura. A teoria do contratualismo propunha a existên-
cia de um tipo de acordo ou contrato social entre os indivíduos que 
tirava o ser humano de seu estado de natureza e o inseria em um 
estado de convivência com outros seres humanos em sociedade, 
em um movimento de superação da condição “selvagem” e funda-
ção da civilização. Para esses autores, é a partir desse momento 
que é criado o Estado, com a função de garantir a continuidade do 
contrato social.
A libertação da natureza é a con-
dição essencial da formação da visão 
moderna de indivíduo, que enfatiza 
as faculdades racionais do ser hu-
mano como meio de superar o mun-
do natural, “selvagem” ou limitado, 
e alcançar o patamar da cultura, da 
sociedade civilizada, do desenvolvi-
mento e do “progresso”. O debate 
natureza x cultura foi materializado 
Recorte de um selo postal 
impresso em Cuba, que 
representa o encontro de 
Cristóvão Colombo com os 
nativos no Novo Mundo (1942).
12 Antropologia e Sociologia da Educação
em torno de alguns casos clássicos de seres humanos que foram 
criados apartados da sociedade, em ambientes naturais isolados, 
como florestas. 
Tais casos eram chamados de crianças selvagens e dominaram a 
imprensa e o imaginário coletivo por bastante tempo. Um dos 
mais famosos é o do menino Victor de Aveyron, um meni-
no que foi encontrado, em 1798, vivendo sozinho em uma 
floresta após anos de isolamento social. Ele foi levado à 
“civilização” e tratado por um conhecido médico francês 
da época.
Naquele tempo, a discussão sobre a visão inatista – 
que afirma que o conhecimento é inato, já nasce com 
o ser humano – e a ambientalista – que defende que o 
conhecimento é adquirido por meio das experiências no 
meio em que a pessoa está inserida – estava a pleno vapor 
na Europa, e o caso do “menino selvagem” parecia não ser 
explicável pelas ideias predominantes no debate científico. Os 
inatistas argumentavam que Victor era naturalmente sem inteli-
gência, que tinha nascido assim, e os ambientalistas afirmavam que 
sua condição intelectual era reduzida por falta de estímulos adequa-
dos do ambiente onde tinha vivido.
Em 1969, no filme O Garoto Selvagem, de François Truffaut 
(1932-1984), a história de Victor de Aveyron foi narrada com base 
no livro The wild boy, found in the woods near Aveyron, do psiquiatra 
Jean Itard (1774-1838), que acompanhou o menino após o resgate. 
O tema da adaptação social ou socialização é recorrente na obra 
desse famoso cineasta francês, que se preocupava em analisar a 
possível “naturezahumana intocada”, à qual se referia Rousseau, 
que poderia estar presente em crianças como Victor de Aveyron.
O caso de Victor marcou a história polêmica sobre as relações 
entre natureza e cultura. Outros casos semelhantes foram relata-
dos, como o do biólogo Carl von Linnéc, mais conhecido como Lineu 
(1707-1778), criador da classificação das espécies, e o do médico ale-
mão Elias Rudolf Camerarius (1641-1695), os dois registraram casos 
de resgate de crianças sem contato com seres humanos, como o de 
Figura 1
Retrato de Victor de 
Aveyron
O que você acha que 
acontece com uma crian-
ça que é criada desde o 
nascimento sem contato 
com seres humanos, 
totalmente isolada da 
sociedade?
Para refletir
Victor de Aveyron, o “menino 
selvagem”. França, final do 
século XVIII.
Veja um trecho do filme 
O garoto selvagem no link 
a seguir:
Disponível: https://www.youtube.
com/watch?v=b5CKltq3Uf4. Acesso 
em: 26 nov. 2021.
Vídeo
https://www.youtube.com/watch?v=b5CKltq3Uf4
https://www.youtube.com/watch?v=b5CKltq3Uf4
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Jean de Liége (1361-1382), o menino-urso da Lituânia (1657); o de 
Hesse (com variação entre 1544 e 1744), o menino-lobo (1872), que 
inspirou a história de Mogli; o da garota de Kranenburg (1717); o do 
menino-bezerro de Bamberg (século XVIII); o da menina selvagem 
de Champagne (1731), e o de Peter (1724), o Selvagem, da cidade 
de Hanover.
As “crianças selvagens” apresentavam semelhanças entre si: não 
falavam, andavam do mesmo modo que os animais quadrúpedes, 
e manifestavam vários comportamentos próximos aos de animais 
selvagens. Cientistas que estudaram tais casos apontaram que as 
crianças teriam deficiências cognitivas e motoras, o que justificaria 
a causa desses comportamentos. 
Mas para antropólogos, sociólogos e teóricos da educação, a ex-
plicação estaria na ausência de socialização primária, o que teria 
impossibilitado a aquisição de linguagem e outras aprendizagens 
socioculturais. Na maioria das vezes, as crianças inseridas no con-
vívio social não conseguiam adquirir padrões de linguagem ou de 
comportamento compatíveis com o esperado de crianças da mes-
ma faixa etária que tinham sido criadas em sociedade. 
Os antropólogos, em geral, afirmam que o que diferencia os 
seres humanos dos demais seres vivos é a cultura, a capacidade 
de produzir conhecimentos e tradições que são transmitidos entre 
gerações. Um elemento cultural fundamental é a linguagem. Vimos 
que uma das características comuns às crianças “selvagens”, que 
não passaram pelos processos de socialização e não participaram 
ativamente de uma cultura humana, é não terem aprendido nenhu-
ma linguagem verbal, não se comunicarem verbalmente usando 
códigos de uma língua, tal como as crianças criadas na “civilização” 
fazem desde pequenas, pois 
estas, ao contrário daquelas 
que foram isoladas do con-
vívio em sociedade, apren-
dem por meio da família e 
da escola a língua usada na 
comunidade em que vivem.
Rousseau defendia que o 
ser humano é natural-
mente bom, e que, em 
“estado de natureza”, 
isolado da sociedade, 
ele poderia viver em 
liberdade e felicidade ple-
nas, na inocência e sem 
capacidade de cometer 
nenhuma maldade. Esse 
conceito é chamado de 
o bom selvagem e foi ins-
pirado em uma expressão 
criada por Michel de 
Montaigne (1533-1592). 
Saiba mais
Assista ao filme O enigma 
de Kaspar Hauser que con-
ta a história real de um 
adolescente de 15 anos 
encontrado na Alemanha, 
na cidade de Nuremberg, 
em 1928. Ele tinha vivido 
desde o nascimento sem 
nenhum contato humano, 
isolado em um porão. 
Kaspar não sabia falar, 
não andava e não parecia 
apresentar comportamen-
tos humanos.
Direção: Werner Herzog. Alemanha: 
Versátil Home Vídeo, 1974.
Filme
Introdução ao pensamento antropológicoIntrodução ao pensamento antropológico 1313
14 Antropologia e Sociologia da Educação
1.2 Alteridade, etnocentrismo e 
relativismo cultural Vídeo
No texto de abertura deste capítulo, vimos o relato sobre um en-
contro entre o rei e alguns nobres da corte francesa do século XVI e 
um chefe e guerreiros indígenas de um povo originário do Brasil, os 
Tupinambás, que viviam em um vasto território, que hoje correspon-
de a grande parte do sudeste brasileiro, e foram praticamente exter-
minados pelos conquistadores portugueses. Vamos relembrar alguns 
trechos do texto:
Os dois relatos indicam as duas visões opostas que permearam o encontro 
dos europeus com os povos da América. Uma delas é a visão colonizadora 
do conquistador, favorável à exploração das riquezas naturais do território 
recém encontrado. Uma visão etnocêntrica que considerava a Europa como 
civilização superior aos “selvagens”, o que dava aos colonizadores o direito 
de subjugá-los e explorá-los. A outra era a visão expressa por Montaigne, 
que defendia que o certo e o errado seriam conceitos relativos, a depender 
do contexto cultural, e que, por isso, o encontro entre culturas tão diferentes 
poderia promover um maior conhecimento sobre a espécie humana e sobre 
a própria civilização europeia.
A experiência do encontro entre culturas, entre o “eu” e o “ou-
tro”, pode ser expressa pela noção de alteridade, que se refere à 
condição de ser um outro, um diferente, distante, um forasteiro ou, 
como no encontro narrado no texto, um exótico alter, que em latim 
significa outro. Note que costuma haver confusão entre o conceito 
de alteridade e o de empatia. São conceitos complementares, mas 
não idênticos. 
Empatia é a capacidade de se sensibilizar com a condição do outro, 
colocar-se em seu lugar, tentar ajudá-lo ou confortá-lo de algum modo. 
Para exercer empatia, é necessário antes se movimentar na alteridade, 
ou seja, estar aberto a conhecer o diferente de si mesmo e a relativizar 
a própria visão de mundo. Vejamos um resumo dos dois conceitos:
Compreender con-
ceitos centrais para 
a antropologia, como 
alteridade, etnocentrismo 
e relativismo cultural.
Objetivo de aprendizagem
Introdução ao pensamento antropológico 15
Empatia Alteridade
Capacidade de se 
sensibilizar com a 
condição do outro, 
de se colocar em 
seu lugar, de tentar 
ajudá-lo ou confortá-
lo de algum modo.
Estar aberto a 
conhecer o diferente 
de si mesmo e 
relativizar a própria 
visão de mundo.
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Nos primórdios dos estudos antropológicos, os pesquisadores se 
dedicavam a investigar a alteridade distante, isto é, grupos humanos, 
comunidades ou sociedades que viviam em localidades remotas ou 
bastante afastadas da Europa, cujos habitantes eram chamados de bár-
baros ou de primitivos, tais como os indígenas brasileiros pareciam aos 
colonizadores europeus. 
A vivência da alteridade costuma promover a percepção das dife-
renças e do diferente, levando à relativização do que é familiar, conhe-
cido ou natural, ou seja, permitindo que se perceba que o que parece 
familiar e conhecido para nós, parece diferente ou estranho para o 
outro, e vice-versa, e que tais percepções são relativas a cada ponto 
de vista, não sendo verdades absolutas. Os comportamentos, regras, 
crenças etc. que nos parecem tão naturais e familiares podem passar a 
ser questionados se nos deparamos com a alteridade, com as diferen-
tes práticas e tradições do outro. 
Podemos perceber, nos trechos citados, duas visões: a do conquis-
tador europeu e a de Montaigne, que, na verdade, é considerado um 
dos precursores do pensamento antropológico – apesar de a antropo-
logia ainda não existir como campo autônomo de conhecimento até 
meados do século XIX –, pois ele se interessava por compreender cultu-
ras de outros povos. A visão do conquistador representa o pensamento 
colonizador predominante na Europa naquela época, que considerava 
os indígenas como “selvagens”, pois tinham outros costumes, outra lín-
gua, outras crenças e tradições, outros valores, e uma visão de mundo 
totalmente diferente da dos povos europeus.
Esse pensamento, que valoriza apenas a própria cultura e desvalori-
za a dos outros,e que se julga superior ao de outros povos, aos quais, 
por isso, teria o “direito” de subjugar, tratar como inferior, explorar, 
escravizar ou até exterminar, é chamado de etnocentrismo. Por outro 
16 Antropologia e Sociologia da Educação
lado, Montaigne tem uma postura nada etnocêntrica, pois não conside-
ra que uma cultura seja superior a outra, ou a única “correta”, ou que 
um povo seja o “civilizado” e o outro seja o “selvagem”, o que demons-
tra uma posição relativista, buscando conhecer outras culturas, pro-
curando a experiência da alteridade e objetivando, no limite, conhecer 
melhor a própria cultura e a humanidade como um todo.
Figura 2
Representação cultural dos Tupinambás
Indígenas Tupinambás em um ritual. Observados por Hans Staden durante sua viagem ao Brasil 
em 1552. Gravura de Theodore de Bry, 1631.
O etnocentrismo é uma visão de mundo que afirma que o grupo ao 
qual nós pertencemos é considerado como o centro de tudo e parâ-
metro para o resto do mundo, ou seja, tudo é visto e filtrado com base 
em nossos próprios valores, e os outros são percebidos com base em 
nossos próprios modelos sobre o que é a vida, sobre como as pessoas 
devem pensar, agir, acreditar etc. Podemos dizer que o etnocentrismo 
é um fenômeno que se origina devido a uma enorme dificuldade em 
conceber e conviver com a diferença, gerando estranhamento, reações 
hostis e conflito. Ele agrega, portanto, aspectos racionais e emocionais 
simultaneamente, e não se manifestou apenas no passado, em deter-
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Introdução ao pensamento antropológico 17
minados momentos históricos, mas se expressou ao longo da história 
humana, incluindo os tempos atuais.
Assim como no caso do encontro entre a corte francesa e os in-
dígenas brasileiros, o etnocentrismo se manifesta em experiências de 
choque cultural, isto é, o impacto gerado quando representantes de 
culturas muito diferentes entre si se encontram, quando há o choque 
entre o “eu” e o “outro”, totalmente diferente de mim. 
O choque cultural surge justamente com a identificação das diferen-
ças, consideradas intransponíveis, e com a falta de compreensão das 
lógicas, das motivações e dos modos de ser e de estar no mundo do 
outro grupo. Esse choque leva a não compreensão/aceitação e à desva-
lorização do outro, que estaria supostamente “errado”, seria “primitivo” 
ou “atrasado”, no seu modo de ser e de viver, confirmando a valoriza-
ção do próprio grupo como o único “correto” e “civilizado”, superior a 
todos os outros grupos, que seriam os “selvagens”, os “bárbaros” etc.
Ser etnocêntrico não é uma característica exclusiva de determina-
da sociedade, não são apenas os europeus colonizadores os únicos 
etnocêntricos da história. A postura, a visão de mundo e as atitudes 
etnocêntricas estão presentes em muitas sociedades na atualidade, in-
cluindo a brasileira. 
Por exemplo, podemos identificar componentes de etnocentrismo 
na violência contra o outro, que não existe apenas contra os povos in-
dígenas e comunidades tradicionais, mas também se revela nas intera-
ções com grupos considerados “diferentes”, com culturas percebidas 
como “erradas”, seja sob aspecto dos padrões morais ou religiosos do 
grupo etnocêntrico, como é o caso muitas vezes do não reconhecimen-
to da identidade e da violência que marcam o tratamento dos grupos 
LGBTQIA+, seja sob aspecto da desvalorização cultural e étnica dos gru-
pos não brancos por parte de grupos brancos. 
O etnocentrismo se manifesta no cotidiano das sociedades e regula 
parte das relações socioculturais. Se de início os antropólogos busca-
vam uma alteridade distante, aos poucos foram se voltando para uma 
alteridade mais próxima e começaram a realizar pesquisas em socie-
dades conhecidas, ou mesmo na própria sociedade, o que aponta um 
movimento feito pelo pensamento antropológico contemporâneo de 
buscar estranhar o que é familiar, natural ou conhecido e de conceber o 
diferente, o estranho, como algo natural. Para o antropólogo brasileiro 
18 Antropologia e Sociologia da Educação
Roberto DaMatta (1936-), o antropólogo deve transformar o exótico em 
familiar e o familiar em exótico, em uma experiência de alteridade que 
relativize os conteúdos culturais e, em seguida, sob um olhar antropo-
lógico sobre a própria cultura, que desnaturalize sua realidade.
Outra noção relacionada ao debate sobre as culturas que temos es-
tudado até aqui é o relativismo cultural, proposto como teoria pela 
primeira vez no século XIX pelo antropólogo Franz Boas (1858-1942), 
um pioneiro da antropologia moderna. Boas defendia que não existem 
verdades culturais, pois não existem padrões para medir o comporta-
mento humano e compará-lo a outro. Cada cultura mede e julga a si 
mesma. Meneses, um cientista social brasileiro contemporâneo, afir-
ma, no mesmo sentido que Boas, que a base do interesse da antropo-
logia pela diversidade de povos e culturas é o relativismo cultural:
é o relativismo cultural que considera, como sociedades alterna-
tivas e culturas tão válidas quanto as nossas, esses povos cuja 
própria existência questiona nossa maneira de ser, quebrando 
o monopólio, que comumente nos atribuímos, da autêntica rea-
lização da humanidade no planeta. [...] Enquanto o etnocentris-
mo é um preconceito, e suas derivações doutrinárias (racismo, 
evolucionismo cultural etc.) são ideologias (consciência falsa e 
falsa ciência), o relativismo cultural pertence à esfera da ciência. 
(MENESES, 2020, p. 6)
Meneses (2020, p. 6) afirma que a noção de relativismo cultural en-
volve três significados:
“Todo e qualquer 
elemento de uma cultura 
é relativo aos elementos 
que compõem aquela 
cultura e só tem sentido 
em função do conjunto, 
sendo sua validade 
dependente do contexto 
em que está inserido, 
de sua posição em 
meio a outros níveis e 
elementos da cultura da 
qual faz parte.”
“Percepção de que as 
culturas são relativas, isto 
é, não há cultura – nem 
elemento dela – que 
tenha caráter absoluto, 
perfeito. Não existe, 
portanto, um padrão 
único para julgar de 
antemão o certo e o 
errado entre as culturas, 
pois cada uma traz em si 
seu padrão de medida.” 
“Relativismo cultural 
remete à ideia de que as 
culturas são equivalentes 
e, logo, não se pode 
criar uma escala em 
que a cada cultura seja 
atribuída uma ‘nota’, de 
acordo com o critério de 
‘mais ou menos perfeita’.”
1º1º 2º2º 3º3º
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Introdução ao pensamento antropológico 19
O autor destaca, entretanto, que o relativismo não é só uma “sus-
pensão de juízo”, já que não se consegue aplicar nenhum critério de-
cisivo para classificar as culturas; o relativismo afirma positivamente 
que uma cultura é tão válida como qualquer outra, por ser uma ex-
periência diversa que o ser social faz de sua humanidade. Para ele, as 
repercussões da aplicação da noção de relativismo cultural à pesquisa 
são várias: 
• Respeito sincero pela cultura e sociedade dos outros povos. 
• Cuidado extremo com a objetividade.
• Cuidado com cada traço cultural sendo estudado em seu contexto. 
• Recusa de interferir e de modificar costumes e tradições de um 
povo.
Sob perspectiva diferente, vários autores das ciências humanas em 
geral e, em especial, da antropologia criticam o uso irrestrito do concei-
to de relativismo cultural, contrapondo-o à natureza universalista dos 
direitos humanos, por exemplo. Nesse sentido, algumas práticas cultu-
rais tradicionais, como o infanticídio entre alguns grupos indígenas bra-
sileiros e a mutilação genital em algumas regiões da África e do Oriente 
Médio, são alvo de debates que envolvem, de um lado, as noções de 
relativismo cultural e, de outro, os direitos humanos universais.
Vamos nos aprofundar um pouco sobre um dos exemplos apre-
sentados anteriormente. A antropóloga Marianna Assunção Fi-
gueiredo Holanda, que estuda o tema do infanticídio indígena 
no Brasil, aponta que “esse é um dos pontos centrais do es-
tudo: o que nós, brancos, entendemos como sendo vida ehumano é diferente da percepção dos índios. Um bebê in-
dígena, quando nasce, não é considerado uma pessoa – ele 
vai adquirindo pessoalidade ao longo da vida e das relações 
sociais que estabelece” (ESTUDO CONTESTA..., 2009).
Sob uma visão relativista, que procura compreender essa prá-
tica cultural em seu contexto e sob a lógica das crenças e dos costumes 
desses grupos indígenas (que representam uma parte bem pequena dos 
povos originários do Brasil), a partir dos significados que dão a suas ações, 
leva-se em conta que, nessas tribos, as crianças que não são percebidas 
como adequadas aos padrões aceitáveis pela comunidade não poderão 
Você pensa que todas as 
práticas culturais devem ser 
sempre respeitadas ou há algumas 
delas que violam os direitos 
humanos e, por isso, 
precisariam 
ser confrontadas?
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20 Antropologia e Sociologia da Educação
ser inseridas no grupo e não serão socializadas pela coletividade, o que 
significa, muitas vezes, que não poderão ser mantidas vivas. 
Os mitos que regem essas ações são muito presentes na cultura des-
ses grupos indígenas e trazem a crença de que, por exemplo, crianças de-
ficientes significam maldição ou castigo àquela tribo. Além disso, há ainda 
os motivos práticos, relacionados à necessidade de que as crianças se tor-
nem adultos úteis ao grupo, capazes de caçar, pescar etc.
Por outro lado, sob a perspectiva dos direitos humanos, considera-se 
que, apesar de a cultura ser um elemento essencial de construção da iden-
tidade humana e dos valores fundamentais, é crucial proteger os direitos 
humanos mais básicos, como o direito à vida, independentemente das di-
ferenças culturais, e garantir um padrão ético mínimo universal.
O debate entre essas duas vertentes de pensamento está longe de ter-
minar. A visão relativista considera que a perspectiva universalista dos di-
reitos humanos seria uma imposição de determinados valores e padrões 
ocidentais específicos a todas as culturas do mundo, elegendo um código 
de ética específico como aplicável a todos os grupos humanos, desconsi-
derando suas especificidades culturais, suas tradições, crenças etc.
Já a visão universalista vê no relativismo cultural uma aceitação 
conformada de que toda e qualquer prática cultural deve ser respeita-
da sem questionamentos, como se as diferenças culturais validassem 
completamente qualquer crença, valor ou prática cultural, independen-
temente de suas consequências éticas.
1.3 O pensamento antropológico 
Vídeo
Para compreender o pensamento antropológico, vamos conhecer 
um pouco sobre o surgimento e o desenvolvimento da antropologia e 
sobre os caminhos que essa área do conhecimento tem traçado, sob 
alguns aspectos, desde a modernidade até a contemporaneidade. 
No contexto de expansão marítima das nações europeias, da explo-
ração colonial e dos relatos dos viajantes europeus à América, e sob a 
necessidade de justificar a conquista dos territórios e a exploração dos 
povos lá encontrados pela necessidade de “humanizar os selvagens”, 
surgem as primeiras teorias que buscam explicar as diferenças cultu-
Introdução ao pensamento antropológico 21
rais entre os povos, além disso já vimos que as concepções europeias 
nessa época eram etnocêntricas e consideravam inferiores as culturas 
dos povos indígenas. 
1.3.1 Origens da antropologia
Nesses primórdios da antropologia, a busca por compreender as 
diferenças étnicas culturais recentemente encontradas levou a concep-
ções como o determinismo geográfico e o determinismo biológico. Os 
teóricos do determinismo geográfico defendiam que as especificida-
des do ambiente em que um povo vivia determinavam a sua cultura. 
Essa seria a razão de existirem culturas diferentes: ambientes diferen-
tes, com climas, solos e vegetação diferentes. Já os teóricos do deter-
minismo biológico afirmavam que existiam diferenças fundamentais 
entre as “raças” que determinariam o comportamento de brancos, in-
dígenas, negros etc. Esse modelo biológico determinista influenciou o 
surgimento das doutrinas raciais.
Com a publicação da obra A Origem das Espécies, de Charles Darwin 
(1809-1882), surge a teoria evolucionista, que acabou por inspirar a an-
tropologia física ou biológica, que utilizava o modelo determinista bio-
lógico como base e afirmava que os comportamentos humanos, suas 
características intelectuais etc. eram transmitidas de maneira hereditá-
ria e aplicava técnicas de medida de tamanhos e proporções de pessoas 
provenientes de diferentes “raças” e relacionavam tais medidas, como 
as do crânio e outras partes do corpo, a determinadas características.
Ancorada no debate evolucionista, a antropologia do século XIX con-
solidou o darwinismo social, ligado a uma análise biológica 
do ser humano, e não a uma análise cultural e social, to-
mando a sociedade europeia como o auge da evolução 
humana, a “civilização”, e as sociedades aborígines e 
indígenas como etapas “primitivas” do ser humano. 
Figura 3
Craniometria
A craniometria era uma técnica usada 
pelos teóricos do determinismo biológico 
para, por meio de dados referentes aos 
crânios de diferentes “raças” de pessoas, 
determinar a inteligência, considerada como 
relacionada ao tamanho do cérebro e aos 
detalhes na formação do crânio.
Conhecer os princípios do 
pensamento antropológi-
cos e seu desenvolvimen-
to teórico.
Objetivo de aprendizagem
As teorias advindas do 
determinismo biológico, 
que originaram uma 
classificação das raças em 
superiores e inferiores, 
influenciaram a teoria 
da Eugenia, uma teoria 
profundamente racista e 
discriminatória que pro-
punha a limpeza étnica 
com vistas ao “branquea-
mento” das populações. 
Essa teoria foi uma das 
bases do Nazismo e 
influenciou a formação 
do Movimento Eugenista 
Brasileiro, que pretendia 
acabar com a miscigena-
ção racial no país e coibir 
o aumento da população 
não branca, por meio da 
seleção de imigrantes 
e de esterilização em 
massa, por exemplo. 
Curiosidade
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22 Antropologia e Sociologia da Educação
O darwinismo social foi usado como justificativa para a dominação de 
outros povos por parte dos europeus.
A partir da segunda metade do século XIX, com o avanço da indus-
trialização e as transformações nas sociedades europeias, começam a 
surgir na antropologia teóricos que propunham conceitos e métodos 
realmente próprios à disciplina e alinhados a uma ciência do ser huma-
no. Nessa época surgiram os estudos de três autores clássicos da área 
que representam essa tendência científica do pensamento antropo-
lógico: Lewis Henry Morgan (1818-1881), Edward Burnett Tylor (1832-
1917) e James George Frazer (1854-1941). Tais autores fazem parte do 
chamado evolucionismo cultural, que defendia que a evolução das so-
ciedades, o progresso e o desenvolvimento técnico eram as referências 
para analisar as diferenças culturais entre os povos. 
Para Morgan, a observação das sociedades primitivas, que estariam 
em níveis evolutivos inferiores à civilização e identificando as etapas e 
conquistas tecnológicas de tais povos, como a descoberta do fogo, o 
processo de fixação no território etc., permitiria reconstruir a história 
dos seres humanos. Já Tylor foi o responsável por propor o primeiro 
conceito de cultura no contexto da antropologia: “cultura ou civiliza-
ção, tomada em seu mais amplo sentido etnográfico, é aquele todo 
complexo que inclui conhecimento, crença, arte, moral, lei, costume 
e quaisquer outras capacidades e hábitos adquiridos pelo homem na 
condição de membro da sociedade” (TYLOR apud CASTRO, 2005, p. 69).
Esse autor propunha que o trabalho do antropólogo era o de ca-
talogar os artigos culturais, tal qual um botânico faria. Ele também 
acreditava que as diferenças nos costumes, manifestações artísticas, 
conjuntos de regras e crenças dos povos se originavam de diferentes 
estágios evolutivos – que se ligam ao progresso tecnológico “mais evo-
luído” e “menos evoluído”, e não a raças ou característicasbiológicas.
Frazer, por sua vez, delimitou o escopo da antropologia social, que 
teria como objeto de estudo exclusivamente as origens da humanida-
de, as chamadas na época sociedades primitivas, com desenvolvimento 
primário, e não envolveria o estudo das “sociedades civilizadas”. Esse 
escopo foi bastante ampliado mais à frente, por antropólogos do início 
do século XX, que, ao contrário dos evolucionistas, chamados de pes-
quisadores de gabinete, por produzirem suas análises fechados em suas 
Introdução ao pensamento antropológico 23
salas, sem ir a campo, e usando dados recolhidos por outras pessoas, 
faziam pesquisa de campo e coletavam dados pessoalmente.
1.3.2 A antropologia moderna
As teorias do evolucionismo cultural passaram a ser refutadas a 
partir dos estudos difusionistas, que apontavam outra explicação para 
as diferenças culturais entre os povos: sua distribuição geográfica e a 
migração de traços culturais de um povo para outro. Para eles, cada 
cultura era um caleidoscópio de traços culturais com diferentes origens 
e trajetórias históricas. 
As trocas culturais permitiriam casos como o das sociedades que 
tinham, por exemplo, tecnologias muito básicas, mas um sistema 
de crenças complexo, invalidando a noção de que haveria uma ho-
mogeneidade nos elementos culturais determinados por um estágio 
de desenvolvimento. Influenciado por essas ideias, Franz Boas cons-
trói um pensamento antropológico crítico ao caráter etnocentrista 
do evolucionismo cultural, fazendo nascer a antropologia moderna 
(DURAN; DURAN, 2020, p. 34).
Boas não concordava com o pressuposto evolucionista de que a 
semelhança dos elementos culturais de povos que viviam em regiões 
distantes umas das outras seria a evidência de que a mente do ser hu-
mano funcionaria exatamente do mesmo modo em todos os lugares 
e de que sociedades no mesmo “estágio de desenvolvimento” se com-
portariam de maneira idêntica. 
O que ele acreditava era que os contatos entre as culturas, como 
as migrações, proporcionariam diferentes desenvolvimentos históricos 
em cada local e os mesmos eventos ou fenômenos poderiam se de-
senvolver de maneira totalmente diferente em cada cultura, cada uma 
com suas particularidades. Em 1896, Franz Boas publica a obra As li-
mitações do método comparativo em antropologia, desmontando a tese 
das diferenças biológicas entre povos primitivos e civilizados, e defen-
de que as diferenças entre as sociedades são culturais, não raciais. Na 
década de 1930, o autor publica obras que complementam essa teoria.
Durante o Primeiro Congresso Brasileiro de Eugenia, em 1929, 
sob influência das ideias de Franz Boas, intelectuais brasileiros, como 
Gilberto Freyre (1900-1987), confrontaram as teorias raciais, denun-
ciaram as péssimas condições da saúde pública para as populações 
24 Antropologia e Sociologia da Educação
negras no Brasil e destacaram as contribuições dos africanos na forma-
ção social e cultural brasileira.
Leia o artigo Eugenia no Brasil: reflexões sobre raça, miscigenação e Direitos 
Humanos para a educação científica e entenda como incorporar o tema da 
eugenia no contexto da educação científica escolar. 
Acesso em: 21 out. 2021.
https://www.16snhct.sbhc.org.br/resources/anais/8/1534354260_ARQUIVO_AndersonRicardoCarlos_
trabalhocompleto.pdf
Artigo
A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) foi um marco em relação à 
reflexão intelectual sobre o determinismo biológico/racial no mundo 
após a tragédia humanitária representada pelo Holocausto (1941-1945), 
que culminou no extermínio de milhões de judeus, além de ciganos, ne-
gros e outros grupos considerados “inferiores” pelos nazistas. Poucos 
anos após seu término, na década de 1950, a UNESCO reuniu intelec-
tuais de várias partes do mundo para produzir uma declaração sobre 
o tema raça, no sentido de recusar qualquer tipo de determinismo ou 
classificação racial. O antropólogo francês Claude Lévi-Strauss (1908-
2009) integrou a força-tarefa da declaração e publicou pouco depois 
sua célebre obra Raça e História, de cunho antirracista. 
Recuando um pouco ao início do século XX, vamos encontrar um 
outro aspecto do desenvolvimento da antropologia, no campo meto-
dológico, quando a observação direta dos grupos humanos passa a ter 
grande importância para a produção do conhecimento antropológico, 
e a pesquisa do antropólogo polonês Bronislaw Malinowski (1884-1942) 
foi determinante para essa nova perspectiva. 
Em sua clássica obra Os Argonautas do Pacífico Ocidental, de 1922, 
Malinowski reúne as diretrizes metodológicas para a pesquisa antro-
pológica que se tornariam o “manual” de investigação de campo dos 
futuros antropólogos: afastamento da própria cultura, aproximação do 
nativo do grupo pesquisado, vivência da cultura do outro, postura re-
lativista, evitando o etnocentrismo. Essas diretrizes constituem o cha-
mado método etnográfico, cuja base é a “observação participante”, uma 
técnica de interação entre o pesquisador e a cultura pesquisada.
O desenvolvimento da antropologia moderna foi marcado por duas 
perspectivas teóricas bastante distintas, a da chamada antropologia so-
cial, desenvolvida na Inglaterra e na França, e da qual já conhecemos 
O livro Pequeno manual 
antirracista, da filósofa e 
ativista Djamila Ribeiro, 
apresenta caminhos de 
reflexão para quem dese-
ja ter uma nova percep-
ção sobre discriminações 
com base no racismo 
estrutural e assumir a 
responsabilidade pela 
transformação do estado 
das coisas. 
RIBEIRO, D. Rio de Janeiro: 
Companhia das Letras, 2019. 
Livro
Introdução ao pensamento antropológico 25
vários teóricos, e a antropologia cultural, ligada aos antropólogos esta-
dunidenses, como Talcott Parsons (1902-1979). 
Foi Parsons quem delimitou, em meados do século XX, como ob-
jeto da antropologia, enquanto campo científico autônomo, a cultura, 
legando os sistemas social, político e econômico para os sociólogos. O 
antropólogo considerava que os estudos antropológicos deveriam se 
voltar para a análise dos comportamentos dos indivíduos, pois estes 
refletiriam as culturas nas quais estavam inseridos.
Tanto a antropologia social quanto a antropologia cultural se dedi-
cam ao mesmo objeto e aplicam o método etnográfico para investigá-lo, 
mas, na antropologia social, a ênfase estaria na análise e comparação 
de sistemas de relações sociais, e na antropologia cultural, estaria na 
análise a partir da compreensão de comportamentos dos integrantes 
de um grupo determinado da sociedade. 
Essa diferença não faz mais sentido atualmente e parece reducio-
nista, pois os objetos de pesquisa são fenômenos socioculturais varia-
dos, complexos, que demandam olhares transdisciplinares, recorrendo 
muitas vezes ao arcabouço teórico-metodológico de outras áreas. 
De modo resumido, podemos verificar os seguintes marcos na an-
tropologia ao longo do tempo:
Figura 3
Linha do tempo sobre o desenvolvimento da antropologia
1922 
Método 
etnográfico, 
de Bronisław 
Malinowski
1929
Primeiro 
Congresso 
Brasileiro 
de Eugenia: 
intelectuais 
brasileiros, como 
Gilberto Freyre, 
confrontam as 
teorias raciais.
1930
Franz Boas 
desmonta a tese 
das diferenças 
biológicas entre 
povos primitivos e 
civilizados.
1939-1945
Segunda Guerra 
Mundial é um 
marco em 
relação à reflexão 
intelectual sobre 
o determinismo 
biológico/racial.
1950
UNESCO 
produz uma 
declaração 
antirracista.
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Fonte: Elaborada pela autora.
26 Antropologia e Sociologia da Educação
Atualmente a delimitação da antropologia como área autônoma 
passa pelo modo como são articuladas as dimensões da teoria e da 
prática, com a pesquisa de campo iluminando conceitos teóricos, e 
pelo desenho metodológico, quase sempre qualitativo e etnográfico. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante muito tempo a antropologia se voltou para os povos que eram 
chamados de primitivos, estudando o que era distante ou “exótico”, mas 
atualmente esse campo se dedica a estudar as mais diferentes culturas 
e experiênciasde alteridade, incluindo inúmeros grupos integrantes das 
sociedades complexas – que possuem suas próprias culturas – e os mais 
diferentes fenômenos sociais, como sociabilidades urbanas, relações in-
terétnicas, dinâmicas entre comunidades e meio ambiente, gênero e se-
xualidade, globalização e consumo, processos educativos, entre muitos 
outros objetos.
A aplicação de conceitos e métodos da antropologia aos processos 
educativos pode contribuir tanto para o ensino de conteúdos específicos 
relacionados às ciências humanas quanto para a abordagem de temas 
transversais e saberes e práticas ligadas à formação do cidadão, com o 
desenvolvimento de conceitos como cultura, etnocentrismo, alteridade e 
relativismo cultural.
ATIVIDADES
Atividade 1
O que os casos das crianças selvagens nos revelam sobre o peso 
das culturas humanas e das relações sociais na construção do 
que chamamos de indivíduo? 
Atividade 2
Partindo do pressuposto de que os valores se originam das con-
cepções de mundo e essas concepções variam conforme cada 
cultura, como se poderia estabelecer valores universais?
Introdução ao pensamento antropológico 27
Atividade 3
Por que não é viável aplicar as ideias evolucionistas de Darwin, 
concebidas no contexto das ciências naturais, às análises sociais 
e culturais? 
REFERÊNCIAS
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ago. 2003. Disponível em: https://super.abril.com.br/historia/o-pensamento-selvagem-de-
levi-strauss/. Acesso em: 21 out. 2021.
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criminalizacao-do-infanticidio-indigena. Acesso em: 26 nov. 2021.
HOLANDA, M. A. F. Quem são os humanos dos direitos? Sobre a criminalização do infanticídio 
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Departamento de Antropologia, Universidade de Brasília. Disponível em: https://www.
repositorio.unb.br/handle/10482/5515. Acesso em: 8 nov. 2021. 
MENESES, P. Etnocentrismo e relativismo cultural: algumas reflexões. Revista Gestão e 
Políticas Públicas, v. 10, n. 1, p. 1-10, 2020. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/
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SAMESHIMA, M. C. A. As cartas da França Antártica. Revista Intellectus, v. 2, p. 1-8, 2004. 
Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/5860312.pdf. Acesso em: 26 
nov. 2021.
https://unbciencia.unb.br/humanidades/50-antropologia/340-estudo-contesta-criminalizacao-do-infanticidio-indigena
https://unbciencia.unb.br/humanidades/50-antropologia/340-estudo-contesta-criminalizacao-do-infanticidio-indigena
28 Antropologia e Sociologia da Educação
2
Antropologia, educação 
e sociedade
A antropologia pode ser usada como uma das ciências de apoio aos 
estudos voltados para a educação e a formação dos indivíduos, no sentido 
de analisar os universos culturais que integram tanto a instituição esco-
lar quanto contextos informais de educação. A análise das relações entre 
indivíduo, cultura e sociedade, bem como da socialização de crianças e jo-
vens sob a perspectiva antropológica, pode ser bastante útil para analisar 
os contextos e os processos de ensino e aprendizagem.
Podemos considerar que uma questão antropológica fundamental da 
educação é o modo como o processo de constituição do indivíduo é ana-
lisado, que varia conforme o processo de socialização pelo qual ele passa, 
posto que a escola é uma das mais importantes instâncias de socialização. 
A depender da perspectiva teórica adotada, tal análise produzirá resulta-
dos diferentes. Neste capítulo, vamos abordar tais perspectivas, buscando 
compreendê-las.
2.1 Indivíduo, cultura e sociedade 
Vídeo Os conceitos de indivíduo, de cultura e de sociedade são 
complexos e polissêmicos, isto é, assumem variados sentidos de-
pendendo da área do conhecimento e da linha teórica pelas quais 
estão sendo utilizados. Para a antropologia, o indivíduo é tratado so-
bretudo em suas relações com a cultura e com os processos sociais 
que permitem a aquisição dos elementos culturais do seu grupo, 
tornando-o parte da sociedade, ao que chamamos de socialização.
A cultura, sob a perspectiva antropológica, reúne um amplo com-
plexo de costumes, crenças, valores e tradições de um grupo huma-
no que envolve desde a linguagem, a religião, os hábitos, as normas 
e as leis até hierarquias, relacionamentos, sistemas de parentesco, 
noções de espaço e tempo, noção de certo e errado, práticas sociais, 
Compreender os con-
ceitos de indivíduo e de 
cultura para a antropolo-
gia e analisar as relações 
desses conceitos com a 
vida em sociedade.
Objetivo de aprendizagem
Li
gh
ts
pr
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ritos, mitos, conhecimentos, saberes e visão de mundo, incluindo 
aspectos materiais e simbólicos. Então, temos a seguinte relação:
Figura 1
Cultura na perspectiva 
antropológica
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of
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Costumes
Valores
Crenças
Tradições
Cultura
A educação escolar está imersa na cultura de uma sociedade, e uma 
de suas funções é garantir a transmissão de elementos culturais, como 
linguagem, conhecimentos, regras e saberes. Há certo consenso, na 
área da antropologia, de que o conceito de cultura não admite uma 
definição fechada, assim como o conceito de indivíduo, que pode se 
referir à identidade sob determinada perspectiva antropológica e ao 
agente social sob determinada visão sociológica.
Embora a aprendizagem faça parte de todas as cul-
turas humanas, a relação ensino-aprendizagem, do 
modo como é considerada na sociedade moderna, 
com uma separação e especialização relativas ao 
indivíduo que ensina e ao indivíduo que aprende, 
não é universal. A noção própria de indivíduo é 
também uma noção moderna, construída histó-
rica e socialmente ao longo da modernidade, na 
qual o ser humano adquiriu centralidade na visão 
de mundo predominante. Influenciadas pelo 
movimento iluminista, as sociedades ociden-
tais passaram por profundas transforma-
ções, que modificaram também as relações 
que as pessoas mantinham entre si.
Várias delas se relacionavam ao prota-
gonismo que passou a ser dado ao indivíduo 
na sociedade. A palavra indivíduo, em latim 
individuus, quer dizer “não dividido”, indivisível, e 
Antropologia, educação e sociedadeAntropologia, educação e sociedade 2929
30 Antropologia e Sociologia da Educação
aparece em registros do século XVII se referindo ao ser humano isolado, 
singular. Mas, independentemente do período, não há como conceber 
o indivíduo desligado da sociedade em que ele vive, de suas relações 
com seu grupo social, da cultura, das dinâmicas e relações sociais que 
caracterizam a sociedade de seu tempo.
A antropologia tem abordagens específicas sobre o indivíduo e suas 
relações com a cultura e com a sociedade, e, para compreendê-las e 
poder aplicá-las à análise dos processos educacionais, é preciso conhe-
cer um pouco melhor as origens e o desenvolvimento do pensamento 
antropológico.
2.1.1 Abordagens antropológicas
As ciências humanas como um todo têm como objeto de estudo 
os seres humanos e suas relações entre si e com o ambiente em que 
vivem sob os mais diversos aspectos – culturais, sociais, psicológicos, 
econômicos, educacionais etc. O indivíduo, as diferentes culturas hu-
manas e as relações entre indivíduo e sociedade são os focos de inte-
resse dessa grande área do conhecimento e são objetos de estudo das 
ciências sociais (sociologia, antropologia e ciência política).
A antropologia especificamente estuda o ser humano, sobretudo 
sob seus aspectos culturais, mas também sociais e até biológicos, dedi-
cando-se,em uma acepção ampla, ao conhecimento sobre a diversida-
de cultural, buscando compreender o que somos, enquanto indivíduos 
imersos em uma cultura e vivendo em sociedade, com base no reflexo 
que nos é devolvido pelo “outro”. O pensamento antropológico é um 
modo de reconhecer as fronteiras dos diversos mundos sociais e cul-
turais, abrindo passagens entre eles e alargando nosso conhecimento 
sobre os outros e sobre nós mesmos.
Para obtermos um panorama resumido dessa área do conhecimen-
to, é interessante saber que a antropologia é estruturada em campos 
ou ramos do conhecimento que definem seus objetos e abordagens 
específicas de estudo. As classificações, no entanto, variam de acordo 
com a época e a perspectiva teórica. A classificação por áreas consi-
derada pelo Departamento de Antropologia do Instituto de Filosofia e 
Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP) é a seguinte:
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Antropologia física 
ou biológica
Antropologia social Antropologia 
cultural
Arqueologia
Pouco influente na 
tradição intelectual 
brasileira, dedica-se ao 
estudo dos aspectos 
biológicos e genéticos do 
ser humano e tem sua 
origem marcada pelas 
teorias raciais sobre 
miscigenação, biotipologia 
e eugenia, hoje bastante 
ultrapassadas. É uma das 
bases da medicina legal e 
da antropologia jurídica, 
bastante desenvolvida nos 
EUA, por exemplo.
Pesquisa sobretudo as 
organizações e relações 
sociais e políticas, os 
sistemas de parentesco e 
as instituições sociais. Em 
suas origens, definiu os 
fenômenos sociais como 
objetos de investigação 
socioantropológica.
Estuda sistemas 
simbólicos (religião, 
comportamentos etc.) 
e temas relacionados 
às diversas culturas, 
incluindo os pertencentes 
às culturas das sociedades 
complexas, como 
antropologia da arte, da 
ciência e da tecnologia, 
das relações de gênero, 
da etnicidade e racismo, 
etnologia indígena etc.
Investiga os vestígios 
materiais que revelam as 
condições de existência 
dos grupos humanos, 
do passado remoto, 
já desaparecidos ou 
recentes, tais como 
objetos, estruturas 
arquitetônicas, pinturas 
etc.
Podem ser aplicados, ainda, os termos antropologia, etnologia e 
etnografia para nomear diferentes níveis de análise ou diferentes tradi-
ções acadêmicas. Segundo Lévi-Strauss (1970, p. 377):
 a etnografia se refere aos primeiros estágios da pesquisa, nos quais 
são realizados a observação e a descrição, o trabalho de campo.
 a etnologia seria uma etapa inicial em direção à síntese.
 a antropologia seria a segunda e última etapa da síntese, feita 
com base nas conclusões da etnografia e da etnologia.
Há, no entanto, quem se refira à etnologia como sinônimo de antro-
pologia cultural, e à etnografia como um método específico de pesquisa.
O pensamento e os estudos antropológicos têm origem muito antes 
da institucionalização do campo da antropologia como área do conhe-
cimento e objeto de ensino, o que só ocorreu a partir do século XIX. 
Muito antes disso, já no século XVI, os relatos de viagens de viajantes, 
Antropologia, educação e sociedadeAntropologia, educação e sociedade 3131
32 Antropologia e Sociologia da Educação
missionários, exploradores, mercadores, oficiais militares e administra-
dores coloniais já traziam descrições dos diferentes povos descobertos 
nos “novos” territórios conquistados e explorados durante a expansão 
marítima e comercial europeia.
As características naturais dos territórios e seus ambientes apare-
ciam em minuciosas descrições da fauna, da flora, do solo, dos rios 
etc., assim como costumes, aparência, hábitos, crenças e organização 
dos povos nativos de tais territórios também eram relatados. São dessa 
época (século XVI) os primeiros relatos dos encontros entre culturas e 
as reflexões sobre alteridade na relação com o outro, por exemplo a:
 “Carta do Descobrimento”, de Pero Vaz de Caminha (c. 
1450-1500).
 “Viagem à Terra do Brasil”, do missionário francês Jean de Léry 
(c. 1534-1611).
 “Duas viagens ao Brasil”, do viajante e mercenário alemão Hans 
Staden (c. 1525-1576).
 “Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil”, do pintor francês Jean 
Baptiste Debret (1768-1848), no século XIX, em sua viagem in-
tegrando a Missão Artística Francesa.
A partir do século XIX, o campo da antropologia começa a se insti-
tucionalizar com trabalhos de sistematização do conhecimento reco-
lhidos até ali sobre os chamados, naquela época, de povos primitivos. 
No início desse período, os antropólogos produziam seus conceitos 
e teorias fechados em seus gabinetes com base em estudos dos ma-
teriais recolhidos pelos viajantes, não realizando eles mesmos ne-
nhum estudo de campo.
Uma das correntes de pensamento dessa época era chamada de 
escola do evolucionismo social, cujos expoentes eram: Herbert Spencer 
(1820-1903), Edward B. Tylor (1832-1917), Lewis Morgan (1818-1881) e 
James Frazer (1854-1941). Ela defendia a ideia de uma evolução das so-
ciedades, das mais “primitivas” para as mais “civilizadas”, e investigava 
as origens humanas, sob a perspectiva diacrônica (da evolução ao lon-
go do tempo), voltando-se aos estudos dos temas parentesco, religião 
e organização social.
Nesse contexto, gradativamente os antropólogos passaram do con-
ceito de raça para o de cultura. São expoentes do evolucionismo social: 
Spencer, Tylor, Morgan e Frazer.
Hans Staden é o premiado 
drama biográfico baseado 
na obra de Hans Staden, 
Duas viagens ao Brasil. 
Narra a história do via-
jante e sua captura pelos 
Tupinambá.
Hans Staden. Direção: Luiz Alberto 
Pereira. Lapfilme do Brasil: Brasil/
Portugal, 2000.
Filme
Antropologia, educação e sociedade 33
Ainda no século XIX, desenvolveu-se outra corrente de pensamento 
bastante influente nos primórdios da antropologia, a escola sociológica 
francesa, que delimitou como objetos de pesquisa socioantropológica 
os fenômenos sociais (dando origem à linha teórica mais tarde ligada à 
área de antropologia social), além de se preocupar com a definição de 
regras para o método de estudo dos fenômenos da sociedade.
Os temas de estudo dessa tendência eram as representações cole-
tivas, as noções de solidariedade orgânica e mecânica que manteriam 
a coesão social nas sociedades – conceitos de Émile Durkheim (1858-
1917) – e as formas primitivas de classificação das sociedades, como 
o totemismo, buscando esclarecer o chamado fato social total nas so-
ciedades (conceito de Marcel Mauss (1872-1950) que reuniria aspectos 
biológicos, psicológicos, sociológicos, políticos, econômicos, religiosos 
etc.), fenômenos da troca e da reciprocidade, base da vida social.
Nos anos 1920, a escola funcionalista predominou no pensamen-
to antropológico. Ela usava um modelo de etnografia clássica, o qual 
procurava empreender estudos descritivos das diversas culturas e et-
nias humanas, produzidos com base em estudos de campo realizados 
sob a perspectiva da observação participante (técnica de pesquisa e co-
leta de dados em que o pesquisador não só observa, mas compartilha 
o cotidiano da comunidade estudada).
Os temas de investigação do funcionalismo eram a cultura enquanto 
totalidade e as instituições sociais e suas funções na manutenção da tota-
lidade cultural, sob a perspectiva das dinâmicas entre a dimensão diacrô-
nica e a dimensão sincrônica, que estuda um fenômeno em um momento 
específico. Os principais antropólogos funcionalistas foram: Bronislaw 
Malinowski (1884-1942), Radcliffe Brown (1881-1955), Evans-Pritchard 
(1902-1973), Raymond Firth (1901-2002), Max Gluckman (1911-1975), 
Victor Witter Turner Glasgow (1920-1983) e Edmund Leach (1910-1989).
Na década de 1930, nos Estados Unidos, surge o culturalismo, ten-
dência antropológica que privilegiava o método comparativo nos es-
tudos culturais e que buscava leis no desenvolvimentodas culturas. 
Essa tendência foi uma das bases da área de antropologia cultural 
e se dedicava ao estudo das relações entre cultura e personalidade, 
preocupando-se em estabelecer e identificar padrões culturais ou es-
tilos de cultura. Os principais antropólogos dessa corrente de pensa-
mento foram Franz Boas, Margaret Mead (1901-1978) e Ruth Benedict 
(1887-1948).
Para Durkheim, a so-
ciedade está acima e é 
exterior aos indivíduos, 
perpetuando-se por meio 
de normas, convenções 
sociais e valores que con-
tribuem para estabelecer 
uma sensação de coleti-
vidade e são transmitidos 
às novas gerações por 
meio das instituições, 
como a família e a escola. 
Para ele, a socialização 
faz parte de um processo 
coercitivo da sociedade 
para garantir a perpe-
tuação de seus valores e 
regras.
Importante
totemismo: sistema de 
classificação, presente 
em várias sociedades, 
que busca preservar a 
complementaridade entre 
natureza e cultura, sepa-
rando os seres humanos 
da natureza (conside-
rando-os na esfera da 
cultura) e simultaneamen-
te identificando-os com 
elementos da natureza, 
como animais.
Glossário
34 Antropologia e Sociologia da Educação
Nos anos 1940, emerge, na França, o estruturalismo, que se inte-
ressa por investigar as regras estruturantes das culturas, que estariam 
na mente humana. Os temas de pesquisa dessa tendência teórica fo-
ram propostos essencialmente por Lévi-Strauss e abordavam os prin-
cípios de organização da mente humana, como os pares de oposição 
e códigos binários e a reciprocidade (a oposição natureza e cultura, a 
teoria do parentesco, a lógica do mito e a classificação primitiva). Para 
Lévi-Strauss não existiriam civilizações “primitivas” ou civilizações “evo-
luídas”, mas sim respostas diferentes a problemas fundamentalmente 
idênticos.
Na década de 1960, a antropologia interpretativa, também chama-
da de simbólica, se estabelece como corrente de pensamento. Essa 
tendência, inspirada na hermenêutica filosófica, compreende a cul-
tura como hierarquia de significados e propõe que se empreenda uma 
densa descrição interpretativa das culturas, ao invés de buscar identi-
ficar leis gerais, buscando compreender a leitura que os nativos fazem 
de sua própria cultura.
O principal autor dessa corrente é o antropólogo estaduni-
dense Clifford Geertz (1926-2006). Sua obra A interpretação das 
culturas, em que privilegiava a análise da prática simbólica, é re-
ferenciada até hoje por autores mais recentes. Geertz considera-
va que a cultura humana é como um conjunto de textos a serem 
“lidos” e propunha que o objeto da antropologia é descobrir, em 
cada formação cultural, quem as pessoas acham que são, o que 
elas fazem e quais motivos elas acham ser os que as levam a 
fazer o que fazem. Para Geertz, cultura é um padrão de signi-
ficados transmitidos historicamente e incorporados em formas 
simbólicas por meio das quais os homens se comunicam, perpe-
tuam-se, desenvolvem seu conhecimento sobre a vida e definem 
sua atitude em relação a ela (KUPER, 2002, p. 132).
A partir dos anos 1980, surge a antropologia crítica, ou 
pós-moderna, que critica os paradigmas da etnografia clássica, pon-
do em debate a suposta autoridade etnográfica do antropólogo e os 
recursos retórico-textuais das etnografias clássicas, e mesmo das con-
temporâneas. Essa tendência problematiza e politiza a relação entre 
observador e observado na pesquisa antropológica, e seu interesse te-
mático recai sobre a cultura enquanto processo polissêmico, que tem 
hermenêutica filosófica: 
abordagem interpretativa 
da filosofia aplicável tanto 
à compreensão de textos 
quanto ao universo práti-
co do mundo, das ações 
e da existência humana. 
A hermenêutica cultural, 
desenvolvida na antro-
pologia, tem origem na 
hermenêutica filosófica.
Glossário
 O antropólogo francês Claude 
Lévi-Strauss em evento da 
Organização Mundial das 
Nações Unidas (ONU), 
em 2005.
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Antropologia, educação e sociedade 35
na etnografia a possibilidade de representar de modo multifacetado e 
plural tal multiplicidade de significados culturais. São expoentes dessa 
vertente antropólogos como James Clifford (1945-), James Boon (1946-) 
e Paul Rabinow (1944-2021).
No contexto da antropologia contemporânea, os debates sobre cul-
tura, identidades e suas dinâmicas têm se ampliado e incorporado diá-
logos mediados pelas novas formas culturais tecidas entre os âmbitos 
global e local. Edward Hall (1914-2009) já afirmava há alguns anos que:
a identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente 
é uma fantasia. Ao invés disso, na medida em que os sistemas de 
significação e representação cultural se multiplicam, somos con-
frontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante 
de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos 
nos identificar – ao menos temporariamente. (HALL, 2006, p. 13)
Recentemente, no cenário das discussões sobre identidades, conso-
lidam-se os estudos sobre identidades étnico-raciais, que estão no bojo 
dos estudos sobre africanidades e sobre legado africano, sob o olhar 
da população negra e influenciados por uma nova vertente teórica que 
perpassa as ciências humanas como um todo, os chamados estudos 
decoloniais 1 .
Os estudos decoloniais 
questionam as narrativas 
alinhadas à configuração 
eurocêntrica do mundo, 
que se fundamenta histo-
ricamente no processo de 
colonização da América. 
Produzem, assim, novas 
leituras de processos e 
problemáticas histórico-
-sociais, culturais, artísti-
cas etc., dando visibilidade 
a narrativas, práticas e 
autorias sob a perspectiva 
da América-Latina.
1
2.2 Socialização, cultura e educação 
Vídeo Ouvimos muito a palavra socialização no contexto escolar, sobre-
tudo em relação a processos educacionais na Educação Infantil e nas 
séries iniciais do Ensino Fundamental, mas, assim como os conceitos 
de indivíduo, de cultura e de sociedade, o conceito de socialização é 
bastante complexo e varia conforme as perspectivas de cada área do 
conhecimento, tendências teóricas que tomamos como referência, o 
tempo histórico e espaço considerados.
A antropologia, a sociologia, a psicologia e a pedagogia são algumas 
das áreas que tratam do conceito de socialização, cada qual com sua 
abordagem. Em cada uma delas, esse termo é tomado de um modo, 
conforme cada autor ou movimento teórico. Veremos, nesta seção, o 
conceito de socialização sob várias perspectivas para compreendê-lo e 
para identificar suas aplicações no contexto educacional.
Compreender as relações 
entre processos de 
socialização, cultura e pro-
cessos educativos.
Objetivo de aprendizagem
36 Antropologia e Sociologia da Educação
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Você já sabe, por exemplo, que a aquisição da cultura do grupo 
social ao qual uma criança pertence é realizada por meio das re-
lações que a criança tem, desde o seu nascimento, com os outros 
seres humanos com os quais convive. Se a criança for isolada da 
sociedade durante toda a infância e não mantiver contato com seres 
humanos, ela não adquirirá elementos culturais essenciais, como a 
linguagem, e não aprenderá com os familiares e outros adultos pró-
ximos os costumes, os valores, as regras e as crenças específicos da 
comunidade. Para além desses casos excepcionais, todos nós nas-
cemos em uma determinada estrutura social, que existe objetiva-
mente antes de nascermos, e passamos a conviver com indivíduos 
que já vivem nela. São eles os responsáveis por nossa socialização, 
começando pelos familiares e, depois, pelos educadores.
No momento em que a família introduz a criança ao ambiente em 
que vive, ela faz isso de acordo com determinadas “lentes” ou “fil-
tros”, tais como a classe social à qual pertence ou seus hábitos pró-
prios enquanto família. Com essas lentes, a criança começa a ver o 
mundo e a si mesma nesse mundo social, isto é, esses aspectos irão 
condicionar e modelar as experiências sociais da criança. Perceba 
que esseprocesso não se refere apenas à educação intelectual ou 
cognitiva, mas também a uma educação cultural, social e emocional 
da criança. É nesse cenário que a criança constitui sua personalida-
de e sua identidade, assimilando condutas e adotando determina-
dos papéis sociais.
A socialização, no entanto, não ocorre apenas durante a infância, 
mas por meio de processos ao longo de toda a vida dos indivíduos, 
constituindo-os como seres sociais. Ela pode apresentar as seguin-
tes visões, de acordo com a área de estudo:
A palavra socialização faz 
parte do universo docente, 
principalmente entre 
educadores da Educação 
Infantil e das Séries Iniciais do 
Ensino Fundamental.
Antropologia, educação e sociedade 37
Áreas de estudo
Antropologia
Sociologia
Pedagogia
Psicologia
Processos de socialização
São vistos frequentemente sob a perspectiva da oposição entre natureza e cultura.
Se detém nas perspectivas sociais, de aquisição e adaptação aos padrões sociais de 
cada grupo.
Privilegia os aspectos educacionais da socialização, sobretudo os processos formais 
desenvolvidos pela escola.
Busca entender as relações entre a socialização e a construção da personalidade e 
dos comportamentos individuais.
De outro modo, se analisarmos sob o viés das tendências 
teórico-metodológicas, a socialização pode ser concebida com base 
em teorias mais deterministas, como o funcionalismo, o behavioris-
mo, o estruturalismo, a sociologia de Durkheim e as teorias psicana-
líticas de Sigmund Freud (1856-1939); ou sob pontos de vista mais 
dialéticos e flexíveis, como o interacionismo simbólico, o interacio-
nismo social de Lev Vygotsky (1896-1934) e o construtivismo de Jean 
Piaget (1896-1980); e com base em conceitos como o de habitus, pro-
posto pelo sociólogo contemporâneo Pierre Bourdieu (1930-2002), e 
o de ação comunicativa, elaborado pelo sociólogo Jürgen Habermas, 
ligado à Escola de Frankfurt.
Basicamente, tais teorias encaram a socialização de dois modos: 
como a imposição de normas e valores sociais ao indivíduo (visão 
determinista) ou como processo de construção da identidade indivi-
dual e coletiva por meio de múltiplas e plurais “negociações” com o 
meio social (visão dialética). Sob a visão dialética considera-se, além 
de outros aspectos, que a socialização integra duas dinâmicas si-
multâneas: a ação da sociedade sobre os indivíduos e a apropriação 
38 Antropologia e Sociologia da Educação
ou internalização do universo social por parte dos indivíduos. Sob 
a perspectiva da socialização na infância, esse processo dialético é 
reconhecível tanto na família quanto na escola.
A socialização é um 
processo de coerção 
da sociedade sobre o 
indivíduo para modelá-lo 
conforme os valores e 
costumes sociais.
A socialização é um 
processo dinâmico de 
“mão dupla”, em que a 
sociedade age sobre o 
indivíduo e este também 
se apropria do universo 
social, produzindo assim 
a sociedade.
aS
ha
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ov
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hu
tte
rs
to
ckTeorias Teorias 
deterministasdeterministas
Teorias Teorias 
dialéticasdialéticas
Para analisar as diferenças entre o prisma das teorias clássicas 
(mais deterministas) sobre a socialização e as teorias mais dialéticas 
sobre o conceito, devemos considerar que, com as transformações 
nas sociedades, transformam-se também o conceito de socialização 
e as instâncias ou instituições socializadoras. As transformações na 
instituição da família, por exemplo, são bastante marcantes nesse 
contexto, assim como as mudanças em relação à posição social da 
mulher e o reconhecimento da criança e do adolescente como ca-
tegorias sociais específicas, além das transformações na educação.
Tais mudanças, aliadas ao cenário mais amplo das transforma-
ções trazidas pela consolidação do capitalismo, resultaram em no-
vas interpretações do que sejam os processos de socialização e de 
como, quando e por meio de quais instâncias ocorrem. Os processos 
de socialização ocorrem em todas as sociedades, mas o modo pelo 
qual as instâncias ocorrem varia histórica e culturalmente.
Uma das perspectivas clássicas da socialização, sob uma con-
cepção determinista, vem da sociologia e foi proposta por um dos 
fundadores dessa área do conhecimento, Émile Durkheim. Para o 
sociólogo, o indivíduo é socializado por meio de múltiplas influên-
cias da sociedade, a qual pretende, com tal processo, manter o con-
senso, a coesão social 2 , que tornaria viável a vida em sociedade.
Coesão social, segundo 
Durkheim, é o conjunto 
de noções, crenças, tradi-
ções, opiniões coletivas, 
normas e regras aceitas 
por todos os membros da 
sociedade.
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Durkheim afirmava que a educação é a ação exercida pelas gera-
ções adultas sobre as gerações que ainda não estão amadurecidas 
para a vida social, ou seja, a educação seria uma socialização metó-
dica das novas gerações, no sentido de preservar e fortalecer a inte-
gração social por meio da construção do “ser social”, um sistema de 
ideias, sentimentos e hábitos que expressam nos indivíduos a cons-
ciência coletiva do(s) grupo(s) a que pertence(m) (DURKHEIM, 1958).
Essa visão, no entanto, está longe de ser a única nas ciências so-
ciais, como a antropologia e a sociologia, ou mesmo na educação. 
Para vários autores, como Max Weber e Clifford Geertz, a sociedade 
não é apenas algo exterior, como propõe Durkheim, mas está tam-
bém no interior dos indivíduos, fazendo parte deles.
2.2.1 Socialização e interacionismo simbólico
Há várias pesquisas antropológicas sobre a perspectiva cultu-
ral da socialização, como as da antropóloga cultural estadunidense 
Margaret Mead sobre os ritos de iniciação e as diferenças de gênero 
em tribos de Samoa, na Oceania, representando um dos estudos de 
caso clássicos da antropologia cultural.
As pesquisas de Mead, discípula de Franz Boas, foram desenvol-
vidas nos anos 1930 e revelaram, com base na investigação da cul-
tura samoana, bastante diferente da ocidental, que não existiriam 
personalidades femininas e masculinas naturais, como se concebia 
na época.
Margaret Mead em pesquisa 
de campo em Samoa.
Antropologia, educação e sociedadeAntropologia, educação e sociedade 3939
40 Antropologia e Sociologia da Educação
Mead identificou, durante sua pesquisa em várias tribos de Samoa, que as 
atitudes afetuosas em relação às crianças, típicas dos Arapesh, são nor-
mas válidas tanto para os homens quanto para as mulheres dessa tribo, 
e que os homens assumem comportamentos que seriam caracterizados 
como femininos nas sociedades ocidentais. De maneira análoga, na tribo 
Mundugumor, a agressividade é a regra para homens e mulheres, e as mu-
lheres incorporam comportamentos que chamaríamos de “masculinos” nas 
sociedades ocidentais.
Ela concluiu então que a socialização resulta em tipos sociais adaptados 
a um contexto social determinado, o que define as estruturas mentais que 
caracterizam a personalidade e o comportamento dos indivíduos naquela 
sociedade (MEAD, 2004). Sob essa visão, os comportamentos, tais como os 
ligados à maternidade e à criação e à educação das crianças, por exemplo, 
não são resultantes de disposições inatas, ou seja, não nascem com as pes-
soas, mas são determinados pela ação da sociedade sobre os indivíduos.
Estudo de caso
Os estudos de Mead revelaram que os diferentes comporta-
mentos de gênero fazem parte dos quadros culturais estabeleci-
dos na sociedade e que estes são os definidores dos papéis e dos 
modelos de comportamentos de homens e mulheres. Esses com-
portamentos são ensinados por meio de processos de socialização. 
Como os quadros culturais variam de sociedade para sociedade, 
variam também os comportamentos considerados “femininos” ou 
“masculinos”, o que foi uma grande novidade para o pensamento 
ocidental, tão marcado pelo etnocentrismo.
É preciso considerar, no entanto, que os estudos de caso clás-
sicos da antropologia cultural, tais como o de Mead, foram reali-
zados em sociedades simples, ou seja, pouco diferenciadas. Nas 
sociedades

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