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Direito Constitucional ORGANIZAÇÃO DO ESTADO (PARTE GERAL) 1. FEDERAÇÃO A Federação é uma forma de Estado, é dizer, um dos modelos de organização territorial do poder adotados por países do mundo. Embora haja uma multiplicidade de formas intermediárias, a maioria das nações adota ou um modelo de poder politicamente centralizado (Estado Unitário) ou a descentralização do poder político, com a existência de vários níveis de governo (Estado Federal, ou Federação – que vem do latim, foedere, fundir). Como exemplos de países que adotam a forma federativa de Estado, podemos citar Estados Unidos da América, México, Argentina, Brasil, Austrália, Canadá, Bélgica, Holanda, Alemanha, Suíça, Índia, Rússia... Na realidade, o que caracteriza uma federação é a existência de vários níveis ou degraus de governo, sem hierarquia uns em relação aos outros, todos eles dotados de um poder de autodeterminação limitada, chamado de autonomia política. Em termos simples, pode-se considerar que o Estado Unitário pode ser representado por uma casa “sozinha no lote” (1 terreno = 1 casa); ao contrário, a Federação pode ser comparada a um condomínio, em que dentro de um mesmo terreno há várias casas ou unidades habitacionais. Claro que nenhuma dessas casas é soberana, nenhuma dessas casas tem poder absoluto de se autodeterminar; mas, dentro das regras básicas da convenção de condomínio, cada casa decide seu próprio rumo (autonomia política). Na Federação brasileira (condomínio), teríamos a União (“síndica” do condomínio, tanto que fala em nome dele, embora com ele não se confunda), os Estados (blocos) e os Municípios (apartamentos). A “convenção de condomínio” é a Constituição Federal, mas cada “bloco” elabora sua convenção específica (constituições estaduais), e cada apartamento também deve elaborar suas regras de convivência (lei orgânica). Aprofundamento: outros tipos de organização de estados A doutrina registra ainda formas “intermediárias” de organização de estados, tais como o Estado Regional. Esse modelo, adotado, por exemplo, na França e na Espanha, reconhece alguma esfera de poder político às entidades regionais, embora não chegem a constituir um Estado-membro politicamente autônomo. Têm elas alguns dos poderes de autonomia (especialmente em relação à autoadministração e, eventualmente, autolegislação), mas não todos (não possuem, por vezes, o poder de eleger os próprios governantes, isto é, o autogoverno). Há também quem cite como outra forma de Estado a Confederação. Tecnicamente, porém, a Confederação é uma União de Estados, e não uma forma de estado: não existe um país que seja uma confederação (a Suíça, apesar de se autodenominar uma “Confederação”, na realidade tem todas as características de uma Federação): a Confederação é, por definição, uma união de países soberanos, ligados entre si mediante um tratado internacional, e que, portanto, admite a retirada (secessão). Um exemplo seria a União Europeia, conjunto de países vinculados entre si pelos Tratados de Maastrich I e II, e que tanto admite a retirada, que tal fato se verificou recentemente, com a aprovação da saída do Reino Unido (o chamado “brexit”). Aprofundamento: a relação entre Federação, pluralismo e democracia Konrad Hesse (em sua famosa obra, Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha) comenta sobre a conexão íntima entre federalismo e democracia. Segundo ele, a descentralização do poder político (federalismo) tende a aproximar o poder dos cidadãos, fortalecendo, assim, o princípio democrático. Em outras palavras, a questão é: é mais fácil para o cidadão cobrar algo do Prefeito do que do Presidente da República; ao menos em tese, a federação tende a fortalecer a participação social e, assim, a democracia. Especificamente em relação à Alemanha, registra- se que O Federalismo alemão, como atualmente estabelecido, remonta à elaboração da Grundgesetz (Lei Fundamental) de 1949, que reintroduziu o princípio no ordenamento daquele país. Segundo Ute Koczy, “ao lado da tradicional separação entre legislativo, executivo e judiciário (‘separação horizontal de poderes’), a divisão de funções entre a federação e os Länder (‘separação vertical de poderes’) foi intentada como uma efetiva salvaguarda contra o abuso de poder e foi ainda conveniente aos interesses dos três ex-inimigos de guerra da Alemanha [Inglaterra, EUA e França]”. KOCZY, Ute. Federalism in Germany. In: The constitutional status of the regions in the Russian Federation and in other European Countries. Conseil de l’Europe: Strasbourg, 2003, p. 83. A segunda mais antiga Federação do Mundo (embora se auto intitule “Confederação”), a Suíça teve a Constituição promulgada em 1847, e reformada em 1999. O art. 1 da Constituição Federal dispõe que a Confederação Suíça é formada pelos cidadãos suíços e pelos Cantões (verdadeiros estados-membros), que são “soberanos”, à exceção dos poderes expressamente atribuídos à Confederação. Por outro lado, os arts. 51 e 52 asseguram aos cantões o direito a estatuírem uma constituição democrática. De qualquer forma, a adoção da forma federativa de estado muitas vezes atende a questões históricas, como a existência de vários países ou reinos independentes que, para aceitarem se unir como um país só, não abrem mão de manterem alguns poderes (caso dos Estados Unidos e da Alemanha). Por outro lado, é bastante frequente que a Federação seja uma técnica usada para equilibrar tensões étnicas, geográficas, culturais Direito Constitucional e até linguísticas, por meio da possibilidade de a divisão geográfica do poder facilitar a convivência (é o caso da Bélgica, da Suíça, da Holanda e especialmente da Índia e da ultracomplexa Federação Russa). Com efeito, a Constituição da Federação Russa, de 12 de dezembro de 1993, estabeleceu uma federação de estrutura extremamente complexa, composta pela União, Repúblicas, Territórios, Regiões, Cidades de Importância Federal, Regiões Autônomas e Áreas Autônomas – sete espécies de entidades federativas “igualmente sujeitas à Federação Russa” (art. 5, 1, parte final). Dentre as entidades regionais, apenas as Repúblicas – equivalentes aos estados-membros – possuem constituição própria (art. 5, 2). A questão se torna ainda mais complicada em virtude dos conflitos étnicos e políticos que permeiam toda a região. Assim, por exemplo, as Constituições do Tartaristão e da Chechênia declaram a absoluta soberania dessas Repúblicas, sem qualquer subordinação à Federação Russa (cf. LESAGE, Michel. Constitution of the Russian Federation os the Status of Regions: problems of the common legal area – diversity in unity of the regional structures in the Russian Federation. In: The constitutional status of the regions in the Russian Federation and in other European Countries. Conseil de l’Europe: Starsbourg, 2003, pp. 27-28). Já a Constituição Indiana estabelece uma Federação também extremamente complexa em termos estruturais, em que diversos níveis federativos convivem com entidades territoriais destituídas de autonomia política, paralelamente a divisões étnicas regionais. 1.1. Origens A forma federativa de Estado tal como hoje a entendemos surgiu nos Estados Unidos da América, em 1787, como um meio-termo à adoção de um Estado Unitário ou de uma mera confederação. Na verdade, o que hoje são os Estados Unidos da América eram, na origem, 13 colônias inglesas. Após a Declaração de Independência, de 4 de julho de 1776, cada uma das 13 colônias passou a constituir um país soberano (inclusive com a edição de várias constituições). Uniram-se, em primeiro lugar, formando uma Confederação (união de países soberanos), com a finalidade de enfrentar a guerra contra a Inglaterra. Percebeu-se, porém, a fragilidade desse primeiroarranjo, pois a possibilidade de secessão tornava muito tênue o vínculo entre os países. Começaram, então, a ser publicados artigos em jornais, defendendo, sob o pseudônimo Publius, que os Estados abrissem mão de sua soberania para formarem um país só (os chamados “artigos federalistas”, ou federalist papers). Não se desejava, contudo, formar um Estado centralizado, com poder absoluto, como acontecia na Inglaterra. O meio- termo encontrado foi a adoção de uma Federação, por meio da qual os Estados abriam mão de sua soberania, mas resguardavam para si um “pedaço” de poder, a autonomia política. Nasciam, então, os Estados Unidos da América (vários Estados que se uniram para formarem um país só). Uma tabela pode ajudar a compreender as principais diferenças e semelhanças entre o Estado Unitário, o Estado Federal e a Confederação: Estado Unitário Estado Federal Confederação Um só país Um só país Vários países unidos Entes regionais possuem apenas autonomia Entes regionais possuem autonomia política Entes regionais possuem soberania (países independentes) Indissolúvel Indissolúvel Dissolúvel União de Direito Constitucional (interno) União de Direito Constitucional (interno) União de Direito Internacional Exemplo atual: Portugal Exemplo atual: Brasil Exemplo atual: Mercosul e União Europeia 1.2. Modelos 1.2.1. Federalismo centrípeto (por agregação): EUA No caso dos EUA, como vimos, o federalismo se formou por centralização ou por agregação (federalismo centrípeto). Esse é o modelo clássico, no qual vários Estados independentes se reúnem para dar origem a um Estado Federal. Em tal situação, é comum que os Estados- membros resguardem para si uma grande parcela de competências e atribuições, se comparadas ao plexo de matérias atribuídas à União. 1.2.2. Federalismo centrífugo (por desagregação): Brasil Já no caso do Brasil, o federalismo se formou de maneira diametralmente oposta. Havia, aqui, um só Estado unitário (Império, Constituição de 1824), que, por força de movimentos autonomistas internos (tais como a Revolução Farroupilha e a Revolução Praieira), terminou subdividindo-se, transformando-se em um Estado Federal. Veja-se que, com a Proclamação da República (1889) e a posterior promulgação da Constituição Republicana de 1891, as antigas províncias do Império (cujos governadores eram de livre nomeação e exoneração do Rei) fizeram por assim dizer o “upgrade”, transformando-se em Estados-membros, com autonomia política (inclusive o autogoverno, isto é, o poder de elegerem os próprios governantes). Esse é o movimento conhecido como federalismo por desagregação, ou centrífugo, no qual é comum que a União tenha mais competências do que os Estados-membros. Questão de Concurso (Cespe/Câmara dos Deputados/Consultor Legislativo – Área de Direito Constitucional, Eleitoral e Municipal/2014) O federalismo no Brasil é caracterizado como federalismo por agregação, tendo surgido a partir da proclamação da República e se consolidado por meio da Constituição de 1891. Direito Constitucional Gabarito: errado. O modelo brasileiro é o federalismo por desagregação. O restante da afirmativa está certo. (Cespe/TRT8/Analista Judiciário – área judiciária/2016) A forma de federalismo adotada no Brasil é conhecida como federalismo de segregação e centrífugo, sendo os estados-membros dotados de autogoverno. Gabarito: correto. 1.3. Características de qualquer Federação Existem algumas características que são comuns (constantes) em todos os países que adotam a forma federativa de estado. Pode-se mesmo dizer que seria possível fazer uma espécie de “check list”: um país que preencher todas as condições listadas a seguir poderá ser qualificado como uma federação. 1.3.1. Autonomia política Em primeiro lugar, tem-se o reconhecimento da autonomia política dos entes federativos. Essa característica, aliás, é específica da Federação, já que os Estados Unitários asseguram apenas a autonomia administrativa às regiões (autonomia semelhante àquela que é reconhecida às autarquias e fundações, por exemplo), ao passo que, nas Confederações, os países membros têm soberania (poder absolutamente livre, inclusive de se retirarem da federação), e não apenas a autonomia política. O poder da autonomia abrange quatro aspectos, todos eles cobrados insistentemente em provas de concursos públicos e OAB: 21 Algumas questões sobre a existência ou não de determinados órgãos serão abordadas na questão relativas à organização dos poderes, sendo aqui citadas apenas a título introdutório. a. autolegislação – é o poder de editar as próprias leis, dentro da sua esfera de competência. É por conta desse poder que existem, no Brasil, as leis federais, as leis estaduais, as leis distritais e as leis municipais. Esse poder é exercido pelo Legislativo de cada unidade da Federação. b. autogoverno – trata-se do poder de escolher (eleger) os próprios governantes, isto é, os governadores, deputados e senadores (Estados e DF) e os prefeitos e vereadores (Municípios). Note que, na época do Império, as províncias não tinham esse poder, justamente porque não lhes era reconhecida a autonomia política. c. auto-organização – é o poder de organizar os próprios poderes constituídos (Legislativo, Executivo e, se for o caso, Judiciário), por meio da edição de uma Constituição (no caso da União e dos Estados) ou de uma Lei Orgânica (caso do DF e dos Municípios). Trata-se não do exercício de um poder de legislação “comum”, mas de uma verdadeira função constituinte (o poder constituinte derivado decorrente), embora juridicamente limitada pela Constituição Federal (e embora também exista controvérsia doutrinária sobre a qualificação do poder de auto-organização do DF e dos Municípios como um verdadeiro poder constituinte). d. autoadministração – é o poder de cada ente federativo de manter sua própria estruturas administrativa, inclusive mediante a instituição e arrecadação de seus tributos, a elaboração do próprio orçamento, a contratação dos seus servidores e a criação e manutenção dos seus próprios órgãos e entidades administrativas (autarquias, fundações, etc.). Uma tabela pode resumir especialmente a questão da auto-organização dos entes federativos21: Nível federativo Lei fundamental Legislativo Executivo Judiciário Ministério Público Defensoria Pública Tribunal de Contas União Constituição Federal Congresso Nacional = Câmara dos Deputados + Senado Federal Presidente da República + Vice-Presidente + Ministros de Estado Tribunais (STF, STJ, STM, TST, TRTs, TSE, TREs, TRFs, TJDFT) e juízes da União Ministério Público da União = Ministério Público Federal + Ministério Público do Trabalho + Ministério Público Militar + Ministério Público do Distrito Federal e Territórios Defensoria Pública da União Tribunal de Contas da União Estados Constituição Estadual Assembleia Legislativa Governador de Estado + Vice- Governador + Secretários de Estado Tribunais (TJ e eventualmente TJMilitar) e juízes estaduais Ministério Público Estadual Defensoria Pública Estadual Tribunal de Contas Estadual Direito Constitucional Nível federativo Lei fundamental Legislativo Executivo Judiciário Ministério Público Defensoria Pública Tribunal de Contas DF Lei Orgânica do Distrito Federal Câmara Legislativa do Distrito Federal Governador do DF + Vice- Governador + Secretários de Estado do DF Não há (a Justiça no DF, inclusive o TJDFT, é organizada, custeada e mantida pela União) Não há (O MPDFT integra o MPU) Defensoria Pública do Distrito Federal (organizada, custeada e mantida pelo DFdesde a EC nº 69/12) Tribunal de Contas do Distrito Federal Municípios Lei Orgânica Câmara Municipal Prefeito + Vice-Prefeito + Secretários Municipais Não há (o Judiciário no Município é exercido pela Justiça Estadual) Não há (o Ministério Público no Município é exercido pelo Ministério Público Estadual) Não há (a Defensoria Pública no Município é exercida pela Defensoria Pública Estadual) Só há Tribunal de Contas Municipal nos municípios que os haviam criado antes da CF de 1988 (São Paulo e Rio de Janeiro) 1.3.2. Inexistência de direito de secessão O direito de secessão (direito de se retirar do grupo) não é reconhecido nas federações (só nas confederações). Em outras palavras: a federação é indissolúvel, ao passo que a confederação é dissolúvel. Isso acontece porque, na federação, a soberania (poder ilimitado) só é assegurado ao todo, ao conjunto, e não a qualquer de suas partes. Na verdade, a maioria das federações – assim como é o caso também do Brasil – preveem que, caso algum Estado- membro tente a secessão, poderá até mesmo sofrer a providência grave da intervenção federal. 1.3.3. Possibilidade de intervenção federal Como os entes federativos têm atunomia política, mas não soberania, seus poderes têm que ser submetidos a um limite. Esse limite é justamente não poder colocar em risco a própria existência da Federação. Por isso, todos os países que adotam a forma federativa preveem, de alguma maneira, a possibilidade de a União intervir nos Estados- membros. Trata-se, logicamente, de um procedimento excepcionalíssimo, manejado apenas nos casos previstos expressamente no ordenamento – e, ainda assim, por prazo determinado. No Brasil, não é diferente, tanto que os arts. 34 e 35 dispõem, respectivamente, sobre a intervenção da União nos Estados e no DF, e sobre a intervenção nos Municípios. 1.3.4. Existência de uma Constituição Federal Nas confederações, o documento jurídico que une os Estados-membros é um tratado (por definição, um documento entre sujeitos de direito internacional e que pode ser denunciado, “rompido”). Ao contrário, nas federações os Estados se unem entre si por um documento de direito interno, de direito constitucional, e nascido para vigorar por prazo indeterminado, sem possibilidade de ser superado, a não ser por meios revolucionários: a Constituição. É necessário, ademais, que essa Constituição traga uma repartição de competências (divisão de tarefas) entre os entes da Federação. Aliás, é por isso que alguns autores classificam as Uniões de Estados em uniões de direito constitucional (federação) e uniões de direito internacional (confederação). ATENÇÃO!!! Para alguns autores, nas federações não basta o fato de haver uma constituição; é preciso que se trate de uma constituição rígida (mais difícil de alterar do que a legislação ordinária), embora nem todos os países adotem a técnica de considerar a federação uma cláusula pétrea, como acontece no Brasil (CF, art. 60, § 4º, I). 1.3.5. Existência de um órgão legislativo representativo dos Estados Todas as federações do mundo possuem, no âmbito do Poder Legislativo, um órgão que represente os Estados- Membros, atuando como uma espécie de “assembleia condominial” da Federação. O nome desse órgão naturalmente varia (a nomenclatura mais comum é “Senado”). O importante é que a função dos seus membros seja representar os membros da Federação, inclusive no âmbito do processo legislativo (embora, em alguns países, nem todos os projetos de lei passem pelo crivo do órgão representativo dos Estados, como é o caso da Alemanha). Nesse sentido, pode-se dizer que o bicameralismo (existência de duas casas no âmbito do Poder Legislativo Federal) é uma consequência natural da adoção da forma federativa de Estado. A recíproca, porém, não é verdadeira: nem todos os países que adotam o bicameralismo são federações (um caso notável de estado unitário que adota o bicameralismo é a Inglaterra). No Brasil, o órgão que exerce esse papel de representar os Estados e o Distrito Federal é o Senado Federal (CF, art. 46). Tanto assim que os Territórios Federais – que, conforme veremos, não são entes federativos – não têm poder de eleger Senadores. 1.3.6. Existência de um Tribunal Federativo Em toda e qualquer federação, é necessário que exista um Tribunal incumbido de resolver os conflitos entre os entes da federação, um tribunal federativo, com uma espécie de “função arbitral”. No caso brasileiro, esse órgão é o Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, f), a quem cabe resolver originariamente (ações que já nascem direto na Corte) as causas e os conflitos entre: a) a União e um Direito Constitucional Estado (exemplo: Pet 3388/RR, conhecida como o “Caso Raposa/Serra-do-sol”, que envolvia conflito entre a União e o Estado de Roraima, acerca do critério de demarcação de terras indígenas); b) a União e o DF; c) um Estado e outro Estado (por exemplo, no caso de disputas territoriais); ou d) um Estado e o DF. Cuidado!!! Embora os Municípios sejam entes federativos, um conflito envolvendo-os não atrai a competência originária do STF, já que não é um caso que possa colocar em risco a existência da federação. Um conflito entre a União e um Município serpa resolvido na primeira instância da Justiça Federal (CF, art. 109, I), ao passo que um conflito entre um Estado e um Município será de competência originária da Justiça Estadual comum (CF, art. 125). Atenção!!! Essa competência originária do STF aplica-se não apenas aos casos de conflito entre a Administração Pública direta de qualquer dos entes listados acima, mas também no caso de disputa entre entidades da Administração Indireta, tais como autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista. Assim, por exemplo, serão de competência originária do STF as causas e os conflitos entre: a) sociedade de economia mista federal e autarquia estadual; b) autarquia federal e autarquia estadual; c) empresa pública de um Estado e empresa pública de outro Estado, etc. Veja bem!!! Essa competência originária do STF é definida pelo critério da pessoa (competência ratione personae), e não da matéria. Logo, a causa será decidida originariamente pelo Supremo ainda que o caso não envolva diretamente matéria constitucional. 1.3.7. Nacionalidade única Não é tolerável que, numa federação, existam várias nacionalidades distintas. Isso é possível apenas numa confederação (veja-se o caso da União Europeia, em que há livre tráfego de pessoas e até passaporte comum, mas a nacionalidade é a de cada País-membro). Já na Federação, é necessário assegurar o mesmos status de nacional a qualquer pessoa que tenha nascido no território de qualquer dos Estados-membros. Não à toa, o art. 12, I, a, da Constituição Federal declara serem brasileiros natos os nascidos na República Federativa do Brasil (isto é, independentemente do Estado-membro), e o inciso III do art. 19 proíbe qualquer ente federativo de criar distinções entre brasileiros (veja subitem abaixo). 1.3.8. Vedações federativas Em toda e qualquer federação, existem algumas práticas que os entes federativos não podem adotar, sob pena de que isso cause o desequilíbrio do próprio conjunto do Estado Soberano. No Brasil, essas vedações federativas estão previstas no art. 19 da CF (e são insistentemente cobradas em prova!!!): I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, embaraçar- lhes o funcionamento, ou subvencioná-los, ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou de aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público Trata-se do princípio do Estado laico, ou leigo, segundo o qual não cabe ao Poder Público adotar esta ou aquela religião, pois essaquestão é de foro íntimo do indivíduo. Além dessa questão de direitos fundamentais, há também uma inspiração federativa nessa regra: evitar conflitos entre entes da Federação, por terem adotado religiões distintas. Perceba-se, contudo, que a norma é de eficácia contida (produz todos os seus efeitos imediatamente de regulamentação, mas admite que a lei crie exceções), já que a lei pode prever situações excepcionais em que o Poder Público pode colaborar com entidades religiosas, a fim de promover o interesse público (ex: colaboração com uma Santa Casa de Misericórdia, para fazer atendimento aos enfermos). II – recusar fé a documentos públicos Isso significa que o documento expedido por um ente da federação é válido para ser utilizado perante os demais, pois nenhuma entidade integrante da federação pode recursar-se a reconhecer a validade de um documento expedido em outro local do país. Um exemplo claro dessa questão diz respeito à identificação civil (RG), que é documento expedido pelos Estados e pelo DF, mas é válido para a utilização na esfera federal, municipal, ou de outros Estados. III – criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si Uma regra que decorre do fato de que a nacionalidade é única: logo, não pode um brasileiro ser tratado de forma diferenciada de acordo com o local de nascimento. Por conta disso, são inconstitucionais regras que reservam cotas em vestibulares de universidades estaduais para pessoas nascidas no Estado; ou que exigem, em concurso público, que o candidato tenha nascido neste ou naquele Estado. Essa questão – que deriva até mesmo do próprio princípio da isonomia – também se aplica às pessoas jurídicas (ex: não se pode exigir, numa licitação para aquisição de bens, que a empresa seja situada num determinado Estado). Da mesma maneira, os entes da federação não podem trata-se uns aos outros de forma desigual. Por exemplo: a União pode delegar competências privativas a Estados (CF, art. 22, parágrafo único), mas tem que fazê-lo de forma igualitária (não pode delegar uma competência apenas para alguns Estados, por exemplo); a alíquota do ICMS (imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços) é definida pelo próprio Estado, segundo aliquotas máximas e Direito Constitucional mínimas fixadas pelo Senado Federal – casa da Federação, lembra-se? –, mas o Estado não pode prever alíquotas diferenciadas pela origem do produto (queijo vindo de Goiás, alíquota “x”, vindo de Minas Gerais, alíquota “2x”). Quadro-resumo das principais características de uma Federação: Característica Significado Caso brasileiro Autonomia política dos entes federativos – Autolegislação (poder de editar suas próprias leis) – Autogoverno (poder de eleger os próprios governantes) – Auto-organização (poder de elaborar a própria Constituição estadual ou lei orgânica municipal) – Autoadministração (poder de gerenciar os próprios recursos e elaborar o próprio orçamento) União, Estados, DF e Municípios possuem todas essas quatro prerrogativas Indissolubilidade do vínculo Não há direito de secessão A Federação é cláusula pétrea. Se qualquer ente tentar retirar-se, deverá sofrer intervenção Existência de um órgão legislativo representativo da vontade dos Estados-- membros Por isso, o Poder Legislativo Federal deve ser bicameral O Senado Federal é a Casa da Federação, formada por representantes dos Estados e do DF Existência de um Tribunal Federativo Tribunal para resolver conflitos da Federação Cabe ao STF processar e julgar “as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da Administração indireta” (art. 102, I, f) Nacionalidade única A nacionalidade é uma só, independentemente do lugar dentro do país em que a pessoa nasceu Nacionalidade brasileira: art. 12 Questão de Concurso (Cespe/ MPU/ Analista Processual/ 2010) As capacidades de auto-organização, autogoverno, autoadministração e autolegislação reconhecidas aos estados federados exemplificam a autonomia que lhes é conferida pela Carta Constitucional. Gabarito: certo. (Cespe/Câmara dos Deputados/Consultor Legislativo – Área de Direito Constitucional, Eleitoral e Municipal/2014) Entre as características comuns do Estado Federal incluem-se a representação das unidades federativas no Poder Legislativo central, a existência de um tribunal constitucional e a intervenção para a manutenção da Federação. Gabarito: certo. 2. ENTES FEDERATIVOS São as pessoas políticas, isto é, os entes que compõem a Federação. Distinguem-se das pessoas administrativas (autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista) porque possuem autonomia política (autogoverno, autolegislação, auto-organização e autoadministração), e não apenas administrativa. São entes federativos: a União, os Estados, o DF e os Municípios. Lembre-se!!! Não há hierarquia entre os entes da Federação! CUIDADO! Adota-se, no Brasil, o federalismo de terceiro grau, pois DF e Municípios também são reconhecidos como entes federativos. A Federação brasileira era de segundo grau, até a promulgação da CF/1988, quando o DF e os Municípios ganharam autonomia política, e a nossa Federação passou a adotar o federalismo de terceiro grau. Existe divergência doutrinária sobre considerar os Municípios como entidades federativas (José Afonso da Silva, por exemplo, não os considera assim, apesar da expressa referência a eles na Constituição, inclusive no caput do art. 1º). De qualquer forma, a doutrina amplamente majoritária entende que, ao menos a partir da CF de 1988, os Municípios ganharam autonomia política, tendo sido alçados à categoria de entes federativos autônomos. Para fins de provas de concursos e OAB, se a questão perguntar se os Muncípios são entes federativos, a resposta será que sim; se, porém, afirmar que a doutrina é pacífica nesse sentido, estará incorreta. Aprofundamento: o DF e os Municípios antes da CF de 1988 Costuma-se considerar que o DF e os Municípios só ganharam autonomia política com a promulgação da CF de 1988. Com efeito, no ordenamento jurídico anterior, o DF não tinha lei orgânica, nem Câmara Legislativa (as leis para o DF eram elaboradas pelo Senado Federal), nem elegia os próprios governantes (época em que o chefe do Executivo distrital era chamado de “Prefeito do DF” e nomeado diretamente pelo Presidente da República). De forma semelhante, os Municípios antes de 1988 não Direito Constitucional elegiam os próprios prefeitos (ou, pelo menos, nem todos os Municípios o faziam) e a Lei Orgânica não era elaborada pelas Câmaras Municipais, mas sim votada pela Assembleia Legislativa estadual, para aplicar-se a todos os Municípios daquele Estado. Por isso, diz- se que o Brasil adotava um federalismo de segundo grau (União e Estados) até a promulgação da CF/1988, e só após ela que passou a adotar um federalismo de terceiro grau (União, Estados, DF e Municípios). Questão de Concurso (Cespe/MPE-RN/Promotor/2009) Existia no Brasil um federalismo de segundo grau até a promulgação da CF, após a qual o país passou a ter um federalismo de terceiro grau. Gabarito: certo. ATENÇÃO! Os territórios federais – que atualmente não existem, mas podem vir a ser criados por lei complementar (art. 33) – não são entes federativos; não possuem autonomia política, mas meramente administrativa; são meras autarquias da União. Questão de Concurso (Esaf/MPOG/Especialista/2008) Assinale a opção que contempla todos os entes da organização político- administrativa da República Federativa do Brasil, nos termos da Constituição. a. União, Estados, DistritoFederal e Municípios, todos soberanos. b. União, Estados, Distrito Federal, Territórios Federais e Municípios, todos soberanos. c. União, Estados, Distrito Federal, Territórios Federais e Municípios, todos independentes. d. União, Estados, Distrito Federal, Territórios Federais e Municípios, todos autônomos. e. União, Estados, Distrito Federal e Municípios, todos autônomos. Gabarito: e. Nenhum ente federativo é soberano (são apenas autônomos). E os territórios não são entes federativos. Temos, então, os seguintes níveis federativos: • União – ente de 1º grau (mais extenso em termos territoriais, nível nacional) • Estados – entes de 2º grau (nível regional) • Municípios – entes de 3º grau (nível local) • DF – ente sui generis, uma espécie de grau “2,5”, pois mistura características de Estados com características de Municípios, inclusive acumulando as competências de ambos os níveis. • A União pode, mediante lei complementar, criar territórios federais (art. 33) – entes meramente administrativos (autarquias territoriais), sem autonomia política (os governadores de território, por exemplo, são nomeados pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal (CF, art. 84, XIV, e art. 52, III, c), governados como se fossem um “braço” da União. Atualmente, não existem territórios federais, porque os que havia em 1988 ou ganharam autonomia e foram transformados em Estados (Amapá e Roraima: art. 14 do ADCT) ou reincoporados a Estado (Fernando de Noronha: art. 15 do ADCT); mas nada impede que venham a ser criados, desde que o sejam mediante lei complementar federal. Da mesma forma que a União pode criar territórios federais, os Estados podem criar (mediante lei complementar estadual) regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões (CF, art. 25, § 3º), formadas pelo agrupamento de municípios limítrofes, com a finalidade realizar o planejamento e a execução integradas de serviços públicos. Imagine-se, por exemplo, como fazer coleta de lixo ou transporte coletivo em Municípios conurbados (em que não há mais fronteira natural, pois já há a interligação da malha urbana): é mais racional que as licitações e contratos sejam feitos em nome de uma região metropolitana (que não é ente federativo, mas ente meramente administrativo; não tem autonomia política, mas apenas autonomia administrativa). Finalmente, os Municípios podem criar distritos (mediante lei ordinária municipal, observados os critérios previstos em lei estadual: CF, art. 30, IV), uma espécie de “subprefeitura”, para aproximar a gestão municipal de povoados ou localidades distantes da sede da prefeitura. Assim como os territórios federais e as regiões metropolitanas, os distritos não são entes federativos, não têm autonomia política; mas, diferentemente dos dois primeiros, são criados por lei ordinária, e não complementar. Pessoa Natureza Autonomia Competência para criar Instrumento de criação Previsão Território federal Ente administrativo (não é ente federativo) Administrativa (não possui autonomia política) União Lei complementar federal Art. 18, § 2º, e art. 33 Região metropolitana Ente administrativo (não é ente federativo) Administrativa (não possui autonomia política) Estados Lei complementar estadual Art. 25, § 3º Distrito Ente administrativo (não é ente federativo) Administrativa (não possui autonomia política) Municípios Lei (ordinária) estadual Art. 30, IV Direito Constitucional Aprofundamento: os Municípios situados em território federal Embora os territórios federais não sejam entes federativos, a CF prevê expressamente a possibilidade de que dentro dos territórios haja Municípios – esses, sim, Municípios como outros quaisquer, inclusive dotados dos quatro poderes decorrentes da autonomia política (autolegislação, autogoverno, auto- organização e autoadministração). É o que dispõe o art. 33, §1º, da CF. Eventual intervenção nesses Municípios será feita diretamente pela própria União (é a única hipótese em que a União pode intervir diretamente em Município: art. 35, caput). Aprofundamento: regiões envolvendo mais de um Estado O art. 43 da CF ainda prevê um outro tipo de entidade administrativa: são as regiões criadas pela União, envolvendo Municípios de mais de um Estado. Sua criação se dá mediante lei complementar federal (ao contrário das regiões metropolitanas, que são criadas por lei complementar estadual e envolvem Municípios de um mesmo Estado). Um exemplo de região criada pela União, na forma do art. 43 da CF é a Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e do Entorno – RIDE (criada pela Lei Complementar nº 94, de 1998, envolvendo o DF e Municípios dos Estados de Goiás e Minas Gerais). 3. ALTERAÇÕES NA ESTRUTURA DA FEDERAÇÃO Embora a Federação seja indissolúvel, pode haver alterações na sua estrutura interna. Imagine que a Federação é um “quebra-cabeça”: nenhuma peça pode ser retirada do jogo, mas pode uma peça ser quebrada em outras três, ou duas peças serem “coladas” para virarem uma só, etc.). Essas alterações – tanto em nível estadual quanto em nível municipal – são regidas pelo art. 18 da CF. 3.1. Alteração na estrutura dos Estados (art. 18, § 3º) Pode haver a fusão (dois Estados se fundem para dar origem a um terceiro ente), a incorporação (um Estado engole o outro), a subdivisão (um Estado desaparece, dando origem a dois novos Estados) ou o desmembramento (um Estado perde um pedaço, que passa a constituir novo ente federativo). Fusão A + B = C (novo Estado) Incorporação A + B = B (Estado A desaparece) Subdivisão A = B + C (o Estado original desaparece) Desmembramento A = A + B (o Estado A continua a existir) Questão de Concurso (Cespe/AGU/Advogado/2009) No tocante às hipóteses de alteração da divisão interna do território brasileiro, é correto afirmar que, na subdivisão, há a manutenção da identidade do ente federativo primitivo, enquanto, no desmembramento, tem-se o desaparecimento da personalidade jurídica do Estado originário. Gabarito: errado. Na subdivisão, o Estado original desaparece, enquanto no desmembramento, há a manutenção da personalidade jurídica original. Requisitos para alteração nos Estados: • Aprovação da proposta pelas populações diretamente interessadas, em plebiscito convocado pelo Congresso Nacional. • Criação do Estado pelo Congresso Nacional, por meio de lei complementar federal. CUIDADO! Segundo o STF, devem ser ouvidas todas as populações envolvidas: tanto a que quer se separar quanto a que sofrerá a separação. Isso ficou claro no caso do plebiscito que decidiu a proposta de desmembramento do Estado do Pará (previa-se a criação de dois novos Estados, Carajás e Tapajós), mas, como tinha que ser ouvido todo o Estado, e a proposta contava com oposição da maior cidade (a capital Belém), a proposta terminou por ser rejeitada. ATENÇÃO! Mesmo que a proposta seja aprovada em plebiscito, o Congresso não é obrigado a aprovar a lei complementar. Questão de Concurso (Cespe/CPRM/Analista Jurídico/2013) Um dos requisitos constitucionais exigidos do estado da Federação que pretenda se subdividir é a realização de consulta direta à população interessada, por meio de referendo. Gabarito: errado. A manifestação do povo se dá mediante plebiscito, não referendo. Cuidado!!! Essa competência dos Estados para criarem Municípios (art. 18, § 4º) não se estende ao DF, uma vez que esta unidade da Federação é expressamente proibida de se dividir em Municípios. Direito Constitucional 3.2. Municípios (art. 18, § 4º) Em relação aos Municípios, podem ser realizadas as mesmas alterações previstas na esfera estadual (fusão, incorporação, subdivisão ou desmembramento). O que vai mudar é o procedimento, que é quadrifásico.Requisitos para a alteração na estrutura dos Municípios: • Edição de lei complementar estipulando o período em que poderá ser feita a criação dos Municípios. CUIDADO! O STF já decidiu que o § 4º do art. 18 é norma constitucional de eficácia limitada (só produzirá todos os efeitos quando for regulamentado: ADI nº 2240/BA). Como tal lei complementar não foi criada ainda, atualmente não pode haver a criação de novos municípios. • Realização de Estudo de Viabilidade Municipal (EVM) atestando que o município é viável. • Aprovação da proposta pelas populações diretamente envolvidas, por meio de plebiscito. • Criação do município pela Assembleia Legislativa Estadual, por meio de lei ordinária estadual. Questão de Concurso (Esaf/Receita Federal/Analista Tributário/2012) A fusão de municípios far-se-á por lei estadual, dentro do período determinado por lei complementar federal, e dependerá de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos municípios envolvidos, sendo prescindível a realização de Estudo de Viabilidade Municipal. Gabarito: errado. A realização de Estudo de Viabilidade Municipal é indispensável, imprescindível. Aprofundamento: o caso dos “Municípios putativos” Na redação original da CF, a criação de Municípios era bastante fácil, pois era feita por lei complementar estadual, mediante critérios previstos em lei do próprio Estado (e não em lei complementar federal, como ocorre hoje). Além disso, não havia qualquer exigência de que fossem realizados Estudos de Viabilidade Municipal. Por conta disso, entre 1988 e 1996, o Brasil presenciou um verdadeiro boom de Municípios – muitos deles, inclusive, criados sem qualquer viabilidade, especialmente econômica. Para fazer frente a essa situação, o Congresso Nacional aprovou a EC nº 15, de 1996, que passou a prever a realização de Estudos de Viabilidade Municipal, além de atribuir à lei complementar federal a tarefa de definir o período e os critérios para a alteração na esfera municipal. Porém, só em 2006 o STF pacificou o entendimento de que o § 4º do art. 18 é norma constitucional de eficácia limitada (só aplicável após a regulamentação). Restou a dúvida, então, sobre o que fazer com os diversos Municípios que haviam sido criados entre 1996 e 2006? Desfazê-los era impossível, mas também não se poderia simplesmente convalidar a criação de forma inconstitucional. Isso levou o STF a utilizar-se da técnica da declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade (como foi no caso da ADI 2240/BA, em que se analisou a criação, em 2000, do Município de Luís Eduardo Magalhães-BA, por desmembramento do Município de Barreiras-BA). Por meio dessa técnica de controle de constitucionalidade, o Tribunal reconhece o vício da norma (declaração de inconstitucionalidade), mas não a anula, não a retira do mundo jurídico (não pronuncia a nulidade). Ao final, em 2008, o Congresso Nacional editou a EC nº 57, de 2008, que convalidou as alterações em nível municipal realizadas entre 1996 e 2006 (art. 96 do ADCT: “Ficam convalidados os atos de criação, fusão, incorporação e desmembramento de Municípios, cuja lei tenha sido publicada até 31 de dezembro de 2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legislação do respectivo Estado à época de sua criação”). Em resumo, podemos fazer uma linha do tempo sobre esse caso dos Municípios: 1988-1996 1996-2006 2006-presente Válidos Convalidados Inconstitucional (só será possível quando editada a lei complementar) 4. BENS DA UNIÃO E DOS ESTADOS (ARTS. 20 E 26) A Constituição Federal cuidou não apenas de repartir as competências federativas, mas também de promover a distribuição dos bens públicos. Por isso, os arts. 20 e 26 tratam, respectivamente, de enumerar (em rol meramente exemplificativo) os bens que pertencem à União e os bens que pertencem aos Estados. Logicamente, os bens dos Municípios serão elencados nas suas próprias leis orgâncias. Esse assunto não cai sempre em provas de concursos e OAB. Mas, quando aparece, as questões são geralmente das que fazem a diferença. Aqui comentaremos os principais dispositivos dos arts. 20 e 26, em conjunto. Direito Constitucional Bens da União (art. 20) Explicação Os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos O rol de bens da União não é taxativo: é meramente exemplificativo As terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei Terras devolutas: não estão registradas em nome de nenhum particular, logo são públicas – Só são da União as terras devolutas indispensáveis a uma dessas quatro finalidades: as demais pertencem aos Estados- membros (art. 26, IV) – Toda terra devoluta é pública, mas nem toda terra devoluta é da União Os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais Regra: só pertencem aos Estados-membros os rios que nascem e morrem dentro do mesmo Estado; os demais pertencem à União As ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II – Ilhas oceânicas: longe da costa – Ilhas costeiras: perto da costa – Ilhas oceânicas e costeiras pertencem à União, mas, nas costeiras, pode haver a sede de Municípios (esses terrenos serão, então, bens municipais) O mar territorial Faixa de 12 milhas náuticas ao longo da costa que é considerada território brasileiro Os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva ZEE: faixa que vai das 12 até as 200 milhas náuticas e, embora não seja território nacional, só a União pode explorar Terrenos de marinha e seus acrescidos Faixa de 33 metros ao longo das praias marítimas e aterros que pertencem à União Os potenciais de energia hidráulica Mesmo que a corrente de água seja estadual ou particular, a energia dela gerada pertence à União Os recursos minerais, inclusive os do subsolo O proprietário do solo tem direito à participação no produto da lavra, ou compensação financeira (royalties) As cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos Grutas, cavernas, sítios com pinturas rupestres etc. As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios As terras indígenas não pertencem aos índios: pertencem à União. As comunidades indígenas têm apenas o usufruto desses bens (art. 232) Questão de Concurso (Cespe/MS/Agente/2008) Na definição dos bens da União, o rol enumerado na CF é exemplificativo, podendo outros lhes serem atribuídos. Gabarito: certo. Art. 20, I. (Cespe/TJ-AL/Juiz Substituto/2009) São bens da União as terras devolutas. Gabarito: errado. Não necessariamente: as terras devolutas podem pertencer à União ou aos Estados. (Esaf/ Receita Federal/ Analista Tributário/ 2012) Os recursos minerais do subsolo são bens dos municípios. Gabarito: errado. Os recursos minerais pertencem à União (art. 20, IX). (Esaf/ Receita Federal/ Auditor Fiscal/ 2014) Em razão de sua localização, as ilhas oceânicas e costeiras são de propriedade da União, sem exceção. Gabarito: errado. Em relação às ilhas costeiras, há exceções. QUADRO-RESUMO: ORGANIZAÇÃO DO ESTADO 1. FEDERAÇÃO 1.1 Modelos: – centrípeto (agregação) – modelo americano; – centrífugo (desagregação) – modelo brasileiro. 1.2Características: – Autonomia política dos entes federativos – Indissolubilidade do vínculo – Existência de um órgão legislativo representativo da vontade dos Estados-membros – Existência de um Tribunal Federativo – Nacionalidade única 2. ENTES FEDERATIVOS – União, Estados, DF e Municípios (federalismo de terceiro grau). – União pode criar territórios federais, mediante lei complementar federal. – Estados podem criar regiões metropolitanas, mediante lei complementar estadual. – Municípios podem criar distritos, mediante lei (ordinária) municipal. – DF não pode ser dividido em Municípios. 3. ALTERAÇÕES NA ESTRUTURA Estados Municípios Procedimento bifásico Procedimento quadrifásico Plebiscito + criação pelo Congresso Lei complementar federal (prevendo o período) + EVM + plebiscito + criação pela Assembleia Atualmente já é possível a alteração Só será possível alteração quando for feita a lei complementar federal Criação se dá por lei complementar federal Criação se dá por lei ordinária estadual 4. BENS DA UNIÃO Principais tópicos: – Rol exemplificativo – Rios: só são dos Estados se nascerem e morrerem no território do Estado – Terras devolutas: podem ser da União ou dos Estados – Terras indígenas: pertencem à União – Recursos minerais, inclusive do subsolo: pertencem à União
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