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214814022620_OAB_1_FASE_DIR_CIV_AULA_01 (1)

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REITO CIVIL 
 
 
 
 
 
 
 
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A POSSE E O DIREITO POSSESSÓRIO (ARTIGOS 1.196 A 1.225 DO CÓDIGO CIVIL) 
 
Conceito e natureza jurídica 
 
A posse é um direito autônomo e especial. É um estado de fato e de poder socioeconômico sobre uma coisa. 
 
A posse não se confunde com a propriedade. 
 
“Considera-se possuidor toda aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à 
propriedade” (art. 1.196, CC). 
 
E quais são os poderes inerentes à propriedade? 
 
Gozar Reaver Usar Dispor 
 
“O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer 
que injustamente a possua ou detenha”. (Art. 1.228 do Código Civil). 
 
Atenção! 
 
O CC reconhece direito autônomo sobre a posse, independentemente do titular da mesma ser ou não o proprietá-
rio do bem. Um belo exemplo, é o art. 1.210 do CC ao afirmar que o possuidor tem direito a ser reintegrado na 
posse, no caso de esbulho, mantido em caso de turbação, ou mesmo segurado nas situações de ameaça. 
 
Este direito autônomo sobre a posse é disciplinado entre os arts. 1.196 e 1.224 do CC. 
 
Principais teorias explicativas da posse: breves notas. 
 
a) Teoria subjetiva (Friedrich Carl Von Savigny) 
 
 
 
 
a) Teoria subjetiva (Friedrich Carl Von Savigny) 
 
Savigny, no festejado “Tratado da Posse” (1.824), tentou explicar a posse no direito alemão com base em ensi-
namentos provenientes do Direito Romano. Sustentava que a posse traduziria um poder material sobre a coisa – 
domínio físico (corpus) – com a intenção de tê-la para si (animus). Portanto, o aspecto subjetivo seria imprescindí-
vel à configuração da mesma. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Em suma: posse = corpus + animus. 
 
A crítica à teoria subjetiva reside na dificuldade de comprovação da intenção, do animus em possuir, daí a teoria 
objetiva, em contraponto. 
 
b) Teoria objetiva (Rudolf Von Ihering) 
 
 
 
Para Ihering o possuidor é a pessoa que se comporta como se fosse proprietária da coisa, imprimindo destinação 
econômica à mesma, independentemente da demonstração do animus (o comportamento objetivo é que importa). 
A posse seria a exteriorização da propriedade. 
 
Em suma: posse = corpus. 
 
O Código Civil parece adotar, preponderantemente, a teoria objetiva da posse (art. 1.196). Porém, em algumas 
situações, há indícios da presença da teoria subjetiva (especialmente na disciplina da usucapião e do fâmulo da 
posse). 
 
Atenção! 
Na atualidade, é possível também reconhecer o surgimento da teoria sociológica da posse nitidamente atrelada 
com o tema da função social. Contudo, não sendo objetivo desta obra divagar para além da proposta do livro 
(exame da OAB), resta apenas a breve referência teórica sobre o assunto. 
Posse x detenção: o fâmulo da posse 
 
O Código Civil, em seu artigo 1.198, considera detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para 
com o outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens e instruções suas, instituindo a figura 
do fâmulo da posse. É o caso, por exemplo, de um motorista, de uma empregada doméstica, de um caseiro que, 
de rigor, não são titulares de posse alguma: atuam apenas como longa manus, prepostos, do verdadeiro possui-
dor (empregador). 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Contudo, na melhor orientação do Enunciado 301 da III Jornada de Direito Civil “É possível a conversão da deten-
ção em posse, desde que rompida a subordinação, na hipótese de exercício em nome próprio dos atos possessó-
rios”. 
 
Atenção! 
 
Enunciado 493 – V Jornada de Direito Civil – CJF: O detentor (art. 1.198 do Código Civil) pode, no interesse do 
possuidor, exercer a autodefesa do bem sob seu poder. 
 
Digno de nota a propósito disto é a disciplina do artigo 1.208 do Código Civil segundo o qual atos de mera deten-
ção, permitidos e tolerados, não são capazes de gerar a posse. 
 
De fato, a permissão (autorização prévia, induvidosa e expressa) e a tolerância (autorização posterior e tácita) não 
retiram daquele que autoriza, ou permite, o estado de poder socioeconômico sobre o bem, razão pela qual não 
induzem a posse. 
 
Posse de direitos (existe posse de direitos?) 
 
Também se deve recordar que o Código Civil Brasileiro, influenciado no particular pela legislação cível da Alema-
nha e da Grécia, segue a orientação segundo a qual apenas coisas (corpóreas) são objetos de posse. 
 
Talvez por isto o Superior Tribunal de Justiça tenha afirmado ser “inadmissível o interdito proibitório para proteção 
de direito autoral” (súmula 228, STJ). Mas em provas abertas, a fim de ilustrar esta orientação excepcional, é pos-
sível citar o exemplo da súmula 193 do Superior Tribunal de Justiça que admite a posse de linha telefônica ape-
nas para efeito da usucapião: “O direito de uso de linha telefônica pode ser adquirido por usucapião”. 
 
Classificação da posse 
 
a) Direta x Indireta. 
 
A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, 
não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indire-
to (art.1.197, CC). 
 
Posse direta é aquela em que o possuidor tem o contato material e imediato com a coisa. Ex.: inquilino (locatário). 
Posse indireta é aquela de onde a posse direta surgiu, na qual o possuidor está afastado da coisa, mas aufere 
vantagens desta, como proprietário no contrato de locação. 
 
A este propósito, o entendimento doutrinário é manso e pacífico no sentido de que “O possuidor direto tem direito 
de defender a sua posse contra o indireto, e este, contra aquele”, como se cristalizou no Enunciado 76 da I Jorna-
da de Direito Civil (CJF/STJ). 
 
b) Composse. Quando duas ou mais pessoas exercem a posse de maneira simultânea sobre coisa indivisível a 
isto se denomina COMPOSSE (art. 1.199, CC), sendo possível a todas estas exercer sobre o bem os atos pos-
sessórios, desde que não excluam os outros direitos reais. 
 
Justa x Injusta. Para o artigo 1.200 do Código Civil é justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária. 
Injusta é a posse violenta, clandestina ou precária. Enquanto não cessar a injusta posse não se pode falar em 
início de prazo para usucapião, afinal de contas a ninguém é dado se beneficiar da própria torpeza. 
 
O Código Civil apresenta importantes mecanismos de defesa àquele que estaria na posse justa diante de situa-
ções como estas: o possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e 
segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado. (art. 1.210). 
 
Importantes considerações podem ser elaboradas a respeito do artigo 1.210 do Código Civil. A partir deste precei-
to surge o fundamento jurídico para ajuizamento dos Chamados interditos possessórios (ações possessórias), 
vale dizer, ação de reintegração (caso de perda da posse, ou seja, de esbulho), ação de manutenção (caso de 
 
 
 
 
 
 
 
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5 
turbação) e, finalmente, ação de interdito proibitório (tutela preventiva da posse para situações de ameaça de es-
bulho, ou ameaça de turbação). 
 
O possuidor também poderá ajuizar a ação de esbulho ou de indenização contra o terceiro que recebeu a coisa 
esbulhada sabendo que o era (art. 1.212, CC), ante o visível dolo no caso concreto. 
 
Atenção! 
 
A contrario sensu será “Inadmissível o direcionamento de demanda possessória ou ressarcitória contra terceiro 
possuidor de boa-fé, por ser parte passiva ilegítima diante do disposto no artigo 1.212 do novo Código Civil. 
 
Contra o terceiro de boa-fé, cabe tão-somente a propositura de demanda de natureza real” (Enunciado 80, 
CJF/STJ).Também se extrai do artigo 1.210 acima a noção do desforço incontinente, ou seja, da possibilidade do possuidor 
manso e pacífico que está a sofrer dano possessório agir imediatamente, desde que de forma proporcional e sem 
necessitar da atuação Judicial, para retirar o invasor de seu imóvel, bem como a legítima defesa da posse, quan-
do o possuidor utiliza da sua força para impedir a própria invasão (§ 1º). 
 
O preceito legislativo também faz distinção entre o denominado juízo possessório (quero a posse porque tenho a 
melhor posse), típico das ações possessórias, do juízo petitório (quero a posse porque sou dono), que se refere 
às reivindicatórias e decorrem do direito real de sequela (buscar e apreender o bem onde quer que este esteja e 
contra qualquer um). 
 
Resta claro, pelo dispositivo legal que a posse não é apêndice da propriedade (mas sim direito autônomo), de 
modo que não se discute propriedade em questões possessórias, ou melhor, o título de propriedade não obstrui o 
debate possessório (§ 2º). 
 
Atenção! 
 
A única hipótese na qual se defere a posse àquele que comprovar o domínio, ocorrerá se a aludida posse estiver 
sendo disputada com base no domínio, como já esclareceu a súmula 487 do Supremo Tribunal Federal: “Será 
deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio se com base neste for ela disputada”. 
 
Exatamente por isto a doutrina consolidou dois importantes Enunciados na I Jornada de Direito Civil. O Enunciado 
78: “Tendo em vista a não-recepção pelo novo Código Civil da exceptio proprietatis (art. 1.210, § 2º) em caso de 
ausência de prova suficiente para embasar decisão liminar ou sentença final ancorada exclusivamente no ius pos-
sessionis, deverá o pedido ser indeferido e julgado improcedente, não obstante eventual alegação e demonstra-
ção de direito real sobre o bem litigioso”. E o Enunciado 79: “A exceptio proprietatis, como defesa oponível às 
ações possessórias típicas, foi abolida pelo Código Civil de 2002, que estabeleceu a absoluta separação entre os 
juízos possessório e petitório”. 
 
d) De Boa fé x de Má fé. Reza o Código Civil, em seu artigo 1.201, que “É de boa-fé a posse, se o possuidor igno-
ra o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa”, advertindo ainda o parágrafo único – do mesmo pre-
ceito - que “O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a 
lei expressamente não admite esta presunção”. 
 
Trata-se, como se vê, da boa-fé subjetiva que “só perde este caráter no caso e desde o momento em que as cir-
cunstâncias façam presumir que o possuidor não ignora que possui indevidamente”, a teor do artigo 1.202 do Có-
digo Civil, estando diretamente relacionada com o fato de o possuidor ignorar o vício. Tão só. 
Observação. Nada disto se confunde com o justo título, nem ainda com o título legítimo, isto por que: justo título é 
a justa causa, o justo motivo, independentemente de documento específico comprobatório da posse, enquanto 
que título legítimo é o documento hábil a demonstrar, por escrito, a posse. documento específico comprobatório 
da posse, enquanto que título legítimo é o documento hábil a demonstrar, por escrito, a posse. 
 
A este respeito existem dois importantes Enunciados em Jornada de Direito Civil. O Enunciado 302: “Pode ser 
considerado justo título para a posse de boa-fé o ato jurídico capaz de transmitir a posse ad usucapionem, obser-
vado o disposto no art. 113 do Código Civil”. 
 
 
 
 
 
 
 
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E o Enunciado 303, assim redigido: “Considera-se justo título para presunção relativa da boa-fé do possuidor o 
justo motivo que lhe autoriza a aquisição derivada da posse, esteja ou não materializado em instrumento público 
ou particular. Compreensão na perspectiva da função social da posse” 
 
Constituto possessório x tradition breve manu 
 
Imagine a hipótese na qual alguém vende um imóvel a outrem, mas continua a habitar naquele bem, que antes lhe 
pertencia (agora mediante o pagamento de aluguel). Nesta situação, este alienante possuía, originariamente, em 
nome próprio. 
 
Contudo, agora, passa a possuir em nome alheio. A isto se denomina constituto possessório ou cláusula constituti. 
 
Atenção! 
 
O Enunciado 77 da I Jornada de Direito Civil (CJF/STJ) esclareceu, mediante doutrina firme e consolidada, que “A 
posse das coisas móveis e imóveis pode ser transmitida pelo constituto possessório”, tratando-se de importante 
questão em concursos públicos. 
 
E se o inverso ocorresse? 
 
A tradittio breve manu é o inverso. Ocorre quando alguém possuía originariamente algo em nome alheio e, agora, 
passa a possuir em nome próprio. 
 
Aquisição e Perda da Posse 
 
A aquisição da posse acontece desde o momento em que se torna possível o seu exercício, ou seja, a partir do 
momento em que o sujeito passa a exercer os poderes inerentes a propriedade (art. 1.204, CC). 
 
Esta posse faz presumir a dos bens móveis, os quais acompanham o principal (art. 1.209, CC), afinal de contas “A 
posse do imóvel faz presumir, até prova em contrário, a das coisas móveis que nele estiverem”. 
 
A posse pode ser adquirida pela própria pessoa, seu representante ou terceiro, desde que haja ratificação, na 
forma do artigo 1.205 do Código Civil. Esta posse se transmite aos herdeiros ou legatários do possuidor com os 
mesmos caracteres (art. 1.206, CC), sendo que o sucessor universal continua de direito a posse do seu anteces-
sor; 
 
e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para efeitos legais (art. 1.207, CC), como no 
caso da soma das posses para fim da usucapião. 
 
Efeitos da Posse 
 
Quanto à percepção dos frutos (art. 1.214 a 1.216, CC) 
 
A percepção dos frutos em sede possessória estará diretamente relacionada à boa ou à má-fé do possuidor. 
 
Nesta senda, privilegia-se o possuidor de boa-fé, por razões intuitivas. Os frutos percebidos pelo possuidor de 
boa-fé a este pertenceram (art. 1.214, CC). Os pendentes e antecipadamente colhidos ao tempo em que cessar a 
boa-fé serão devolvidos após o abatimento das despesas eventualmente ocorridas (p.u, art. 1.214, CC). 
 
Detalhe importante a este respeito é que os frutos naturais e industriais se reputam colhidos e percebidos, logo 
que são separados. Já os civis, percebidos dia por dia (art. 1.215, CC). 
 
Nada disto ocorrera na hipótese de má-fé. Este possuidor malicioso responde por todos os frutos colhidos e per-
cebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber (fruto percipiendo), desde o momento em que se 
constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio (art. 1.216, CC). 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Todos os frutos colhidos pelo possuidor de má-fé não lhe pertencem. Há responsabilidade civil direta por tais fru-
tos, como ainda pelos que deixou de perceber. Apenas para evitar o enriquecimento sem causa é que a legislação 
admite o reembolso pelas despesas de produção e custeio. Nada mais. 
 
Responsabilidade pela perda ou deterioração da coisa (arts. 1.217 e 1.218, CC). 
 
Utilizando-se do raciocínio anterior, é possível afirmar que o possuidor de boa-fé só responde se der causa a per-
da ou deterioração da coisa, incorrendo em dolo ou culpa. O possuidor de má-fé responderá até mesmo pelos 
danos acidentais ocorridos. 
 
Quanto às benfeitorias realizadas na coisa (arts. 1.219 e 1.220, CC) 
 
Se a lei protege o possuidor de boa-fé, este terá direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, poden-
do reter a coisa até que estas sejam pagas. Quanto às voluptuárias, poderá apenas levantá-las, quando possível 
(sem prejuízo da coisa). Já o possuidor de má fé, somente será ressarcido nas benfeitorias necessárias, sem di-
reito à retenção. 
 
Direitos de Vizinhança 
 
 
 
Trata-se do conjunto de regras previstas no Código Civil e que disciplinama convivência pacífica entre vizinhos. 
Curioso perceber que no Estatuto das Cidades (Lei Federal 10.257/01) já existe previsão expressa (art. 36) a res-
peito do estudo de impacto de vizinhança, o que evidencia o caráter autônomo desta disciplina e justifica o surgi-
mento de legítimas restrições à utilidade de certos imóveis. 
 
Atenção! 
 
É bom que se recorde, a teor do Enunciado 319 do CJF/STJ que a condução e a solução das causas envolvendo 
conflitos de vizinhança devem guardar estreita sintonia com os princípios constitucionais da intimidade, da invio-
labilidade da vida privada e da proteção ao meio ambiente. 
 
a) Uso normal da propriedade e deveres de abstenção (arts. 1277 e ss.) 
 
A noção primeira que se deve considerar reside no denominado dever de uso racional do prédio a gerar em face 
do proprietário ou possuidor o direito de fazer cessar, mediante tutela inibitória (obrigações de fazer) as interferên-
cias prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde provocadas pela abusiva utilização da propriedade vizinha 
(art. 1.277, CC). 
 
Se o prédio estiver prestes a cair pode ser ajuizada ação visando caução pelos danos iminentes, ou a demolição, 
ou a reparação do dano deste prédio, tecnicamente denominada de AÇÃO DE DANO INFECTO que, se coletivo, 
legitima a atuação do próprio Ministério Público, afinal de contas o proprietário ou o possuidor tem direito a exigir 
do dono do prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste, quando ameace ruína, bem como que lhe preste 
caução pelo dano iminente (art. 1.280, CC). 
 
c) Passagem forçada (arts. 1.285 e ss.) 
 
 
 
 
 
 
 
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É o direito potestativo que assiste ao dono do chamado imóvel encravado (sem saída para a via pública, nascente 
ou porto) de reclamar do vizinho que lhe deixe passagem, mediante indenização, afinal de contas se exerce um 
ato lícito, mas haverá dever de indenizar tendo em vista a desvalorização econômica que o proprietário do prévio 
serviente experimentará com a passagem forçada. 
 
Sofrerá com a passagem forçada o vizinho cujo imóvel, naturalmente e de forma mais fácil, possibilite a aludida 
passagem (§ 1º, art. 1.285, CC). Na hipótese de alienação parcial de um bem da qual resulte encravação, o antigo 
proprietário deverá garantir a passagem. 
 
Aplica-se tal dispositivo ainda que haja passagem anterior fornecida por outro vizinho. A doutrina consagrada no 
Enunciado 88 do CJF/STJ, ao apreciar o conteúdo do artigo epigrafado, entendeu ainda que o direito de passa-
gem forçada, previsto no art. 1.285 do CC, também é garantido nos casos em que o acesso à via pública for insu-
ficiente ou inadequado, consideradas, inclusive, as necessidades de exploração econômica. 
 
Também se deve considerar encravado o imóvel quando a passagem for insegura ou impraticável, não se confun-
dindo o instituto tratado neste capítulo com a servidão, isto porque: 
 
• Passagem forçada (decorre de sentença judicial, mediante indenização, e é um direito de vizinhança) 
• Servidão (direito real na coisa alheia – constitui em cartório, por declaração ou testamento, de forma gratuita ou 
onerosa). 
 
d) Passagem de cabos e tubulações (arts. 1.286 e ss.) 
 
De acordo com o artigo 1.286 do Código Civil, mediante recebimento de indenização que atenda, também, à des-
valorização da área remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem, através de seu imóvel, de ca-
bos, tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade pública, em proveito de proprietários vizi-
nhos, quando de outro modo for impossível ou excessivamente onerosa. 
 
Com efeito, a propriedade não deve ser utilizada de modo egoístico, ou mesmo a obstruir o interesse comum e 
social, nada obstante ser possível ao proprietário prejudicado exigir que a instalação seja feita de modo menos 
gravoso ao prédio onerado, bem como, depois, seja removida, à sua custa, para outro local do imóvel. 
 
O direito de vizinhança viabiliza a utilização destes prédios de maneira otimizada e de modo que uns se tornem 
benéficos aos outros, potencializando-os. 
 
e) Das águas (arts. 1.288 e ss.) 
 
Importante disciplina do direito de vizinhança diz respeito ao curso das águas, bem jurídico de relevância ímpar, 
devidamente disciplinada no artigo 1.288. O dono ou o possuidor do prédio inferior é obrigado a receber as águas 
que correm naturalmente do superior, não podendo realizar obras que embaracem o seu fluxo; 
 
Porém a condição natural e anterior do prédio inferior não pode ser agravada por obras feitas pelo dono ou pos-
suidor do prédio superior. 
 
Não tutela o direito de vizinhança apenas o curso das águas que correm naturalmente do superior ao inferior. 
 
Preocupa-se, de igual sorte, com o fluxo das artificialmente levadas ao prédio superior ou ali colhidas, ao garantir 
ao dono o direito de reclamar que se desviem, ou se lhe indenize o prejuízo que sofrer (art. 1.289, CC), deduzin-
do-se o valor do benefício obtido. 
 
Quanto às nascentes, também há regra específica assim disciplinada: o proprietário de nascente, ou do solo onde 
caem águas pluviais, satisfeitas as necessidades de seu consumo, não pode impedir, ou desviar o curso natural 
das águas remanescentes pelos prédios inferiores (art. 1.290, CC). 
 
O dever de não poluir, intuitivamente relacionado à função socioambiental da propriedade, está consagrado a 
partir do artigo 1.291 do Código Civil. Desta forma, possuidor do imóvel superior não poderá poluir as águas indis-
pensáveis às primeiras necessidades da vida dos possuidores dos imóveis inferiores; 
 
 
 
 
 
 
 
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As demais, que poluir, deverá recuperar, ressarcindo os danos que estes sofrerem, se não for possível a recupe-
ração ou o desvio do curso artificial das águas. 
 
Mas, teria o proprietário direito subjetivo de construir barragens, açudes ou obras de represamento de água em 
seu prédio? 
A resposta está no artigo 1.292 do Código Civil para quem o proprietário tem direito de construir barragens, açu-
des, ou outras obras para represamento de água em seu prédio; se as águas represadas invadirem prédio alheio, 
será o seu proprietário indenizado pelo dano sofrido, deduzido o valor do benefício obtido. 
 
Também é permitido (art. 1.293) a quem quer que seja, mediante prévia indenização aos proprietários prejudica-
dos, construir canais, através de prédios alheios, para receber as águas a que tenha direito, indispensáveis às 
primeiras necessidades da vida, e, desde que não cause prejuízo considerável à agricultura e à indústria, bem 
como para o escoamento de águas supérfluas ou acumuladas, ou a drenagem de terrenos. 
 
Nesta hipótese (§ 1º) ao proprietário prejudicado, em tal caso, também assiste direito a ressarcimento pelos danos 
que de futuro lhe advenham da infiltração ou irrupção das águas, bem como da deterioração das obras destinadas 
a canalizá-las”, sendo que (§ 2º) o proprietário prejudicado poderá exigir que seja subterrânea a canalização que 
atravessa áreas edificadas, pátios, hortas, jardins ou quintais. 
 
Trata-se do denominado aqueduto, que será construído de maneira que cause o menor prejuízo aos proprietários 
dos imóveis vizinhos e a expensas do seu dono, a quem incumbem também às despesas de conservação: 
 
O aqueduto não impedirá que os proprietários cerquem os imóveis e construam sobre ele, sem prejuízo para a 
sua segurança e conservação; os proprietários dos imóveis poderão usar das águas do aqueduto para as primei-
ras necessidades da vida (art. 1.295, CC). 
 
f) Limites e direito de tapagem (arts. 1.297 e ss.) 
 
Consequência natural do direito de vizinhança é aquele conferido ao proprietário (art. 1.297, CC) para cercar, mu-
rar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, como ainda constranger o seu confinante a 
proceder com ele à demarcação entre os dois prédios,a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos 
ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas despesas. 
 
Estes limites e cercados se presumem, até prova em contrário, pertencerem a ambos os proprietários confinantes 
razão pela qual somente poderão ser cortadas de comum acordo, devendo haver contribuição conjunta para aqui-
sição e conservação de tais bens: 
 
Sendo confusos, os limites, em falta de outro meio, se determinarão de conformidade com a posse justa; e, não se 
achando ela provada, o terreno contestado se dividirá por partes iguais entre os prédios, ou, não sendo possível a 
divisão cômoda, se adjudicará a um deles, mediante indenização ao outro (art. 1.298, CC). 
 
g) Direito de construir (arts. 1.299 e ss.) 
 
Também por decorrência natural do direito de vizinhança está o direito do proprietário de construir da maneira que 
lhe aprouver e de acordo, evidentemente, com os regulamentos administrativos (art. 1.299, CC). 
 
Também é certo afirmar que da divisa entre as duas casas não se poderá construir janelas, eirado, terraços ou 
varandas a menos de metro e meio do terreno do vizinho, nos termos do artigo 1.301 do Código Civil. 
 
Para a jurisprudência, admite-se, todavia, a abertura de janela a menos de metro e meio desde que esta tenha 
vidro opaco ou translúcido (Súmula 120, STF): “Parede de tijolos de vidro translúcido pode ser levantada a menos 
de metro e meio do prédio vizinho, não importando servidão sobre ele”. 
 
Do mesmo modo, é possível a construção a menos de metro e meio de abertura para ventilação nas medidas 
determinadas no §2º: as disposições deste artigo não abrangem as aberturas para luz ou ventilação, não maiores 
de dez centímetros de largura sobre vinte de comprimento e construídas a mais de dois metros de altura de cada 
piso. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Na zona rural a distancia é maior, de no mínimo três metros, conforme artigo 1.303 do CC. 
 
Em arremate, polêmica questão envolvendo a súmula 414 do STF, segundo a qual não se distingue a visão direita 
ou oblíqua na proibição de abrir janela, ou fazer terraço, eirado, ou varanda, a menos de metro e meio do prédio 
de outrem e o artigo 1.301, § 1º, do Código Civil, para quem as janelas cuja visão não incida sobre a linha divisó-
ria, bem como as perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de setenta e cinco centímetros. 
 
De qualquer modo, a ação judicial para embargar à obra que esta sendo realizada com desrespeito a essas re-
gras é a denominada AÇÃO DE NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA (para embargar a obra). Caso a obra já esteja 
concluída, deve-se ajuizar AÇÃO DEMOLITÓRIA, na forma do artigo 1.302, o qual trás o prazo de ano e dia para 
o referido ajuizamento. 
 
 
 
Por força da Lei Federal 13.465/17 foram introduzidos os arts. 1.510-A à 1.510-E à codificação, que passou a 
tratar do denominado direito de sobrelevação, também chamado direito de laje. 
 
É permitido ao proprietário de uma construção-base ceder a superfície superior ou inferior de sua construção a fim 
de que o titular da laje mantenha unidade autônoma e distinta daquela originariamente construída sobre o solo. 
 
Portanto, este direito real de laje contemplará o espaço aéreo ou o subsolo de terrenos públicos, ou privados, 
tomados em projeção vertical, como unidade autônoma. 
 
Para tanto, é imprescindível seja aberta uma matrícula própria no cartório de registro de imóveis, a partir de quan-
do o titular do direito real de laje passará a responder pelos encargos e tributos da mesma, além de adquirir o 
direito de usar, fruir e dispor da laje. 
 
Atenção! 
 
A instituição do direito real de laje não implica a atribuição de fração ideal de terreno ao titular da laje ou a partici-
pação proporcional em áreas edificadas. 
 
Importante saber também que o direito real de laje é passível de usucapião, como entende a doutrina no Enuncia-
do 627 da VIII Jornada em Direito Civil do CJF. 
 
O titular do direito real de laje está autorizado a ceder a superfície da sua construção para a instituição de um 
sucessivo direito real de laje (laje sobre a laje, também denominadas de lajes sucessivas). Para tanto, é necessá-
ria a autorização expressa dos titulares da construção-base e das demais lajes. 
 
É dever do titular da laje não prejudicar com obras, ou falta de reparação a segurança, a linha arquitetônica, ou 
mesmo o arranjo estético do edifício, respeitando, inclusive, a disciplina normativa municipal eventualmente exis-
tente. 
 
O CC autoriza aplicar ao direito de laje, supletivamente, as regras do condomínio edilício, notadamente quanto 
aos temas envolvendo despesas necessárias de conservação e fruição das partes que sirvam a todo o edifício e 
ao pagamento de serviços de interesse comum, que haverão de ser partilhadas entre o proprietário da constru-
ção-base e o titular da laje, na proporção estipulada no contrato. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Também restou consagrado o direito de preferência em caso de alienação, tanto em relação ao dono da constru-
ção-base, quanto em relação do dono da laje, prevendo a norma necessidade de notificação no prazo de 30 dias, 
salvo se o contrato dispuser de maneira diversa. 
 
Atenção! 
 
A ruína da construção-base implica extinção do direito real de laje, salvo se estiver a mesma construída em subso-
lo, ou se a construção-base for refeita dentro de 5 anos. 
 
Independentemente disto, o eventual direito à reparação civil contra o culpado da ruína existirá. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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