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e-Book - Hermenêutica

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Professora Conteudista
Carlos Eduardo Queiroz Pessoa
Revisão de Linguagem
Jonas Magno Lopes Amorim
Designer de Linguagem
Clecia Assunção Silva
Designer Pedagógico 
Paulo Henrique Cunha
Projeto Gráfico e Diagramação
Luis Macartney Serejo dos Santos
Designer Gráfico
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Reitor 
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Vice-Reitor
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Pró-Reitora de Graduação
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Núcleo de Tecnologias para Educação
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Sistema Universidade Aberta do Brasil
Ilka Marcia R. S. Serra - Coord. Geral
Lourdes Maria P. Mota - Coord. Adjunta | 
Coord. de Curso
Coordenação Designer Educacional
Cristiane Peixoto - Coord. Administrativa
Maria das Graças Neri Ferreira - Coord. 
Pedagógica
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO
Pessoa, Carlos Eduardo Queiroz
 Hermenêutica [ebook]. / Carlos Eduardo Queiroz Pessoa. – 
São Luís: UEMA; UEMAnet, 2018.
 77 f.
 ISBN:
 1. Hermenêutica como arte. 2. Hermenêutica Filosófica. 3. 
Hermenêutica Contemporânea. I. Título. 
 CDU: 165.1
Os matérias produzidos para os cursos ofertados pelo UEMAnet/UEMA para o Sistema 
Universidade Aberta do Brasil - UAB são licenciadas nos termos da Licença Creative 
Commons – Atribuição – Não Comercial – Compartilhada, podendo a obra ser remixada, 
adaptada e servir para criação de obras derivadas, desde que com fins não comerciais, que 
seja atribuído crédito ao autor e que as obras derivadas sejam licenciadas sob a mesma 
licença.
SUMÁRIO
Hermenêutica como arte de Interpretar
1.1 Hermenêutica tradicional: etimologia da palavra hermenêutica 10
1.2 A Hermenêutica no contexto da reforma protestante 12
1.3 Hermenêutica Romântica 15
1.4 A hermenêutica de Friedrich Schleiermacher 17
1.5 Wilhelm Dilthey e a busca pela objetividade histórica 22
Hermenêutica Filosófica
2.1 Hermenêutica e linguagem 30
2.2 O sentido do ser como questão fundamental 32
2.3 O sentido do ser em geral: Dasein (ser-aí) e ser-no-mundo 35
2.4 Estrutura hermenêutica do existir 38
2.5 Linguagem como discurso 40
Hermenêutica Contemporânea a partir de Gadamer
3.1 A obra de arte na perspectiva hermenêutica 45
3.2 Compreensão hermenêutica da história 48
3.3 A linguagem como experiência de mundo 50
3.4 A universalidade da Hermenêutica 53
Hermenêutica em Paul Ricoeur
4.1 Filosofia e linguagem 58
4.2 Influência da fenomenologia 63
4.3 A virada hermenêutica de Ricoeur 65
4.4 Mundo do texto: a linguagem como discurso 68
4.5 A relação da fala com o texto 71
Atenção - destaca informações imprescindíveis 
no texto, indica pontos de maior relevância no 
texto;
Referências - estão relacionadas no final de 
cada aula/Unidade, de acordo com as normas 
da ABNT;
Sugestão de áudios ou músicas - músicas 
com temas relacionados ao conteúdo do texto.
Avaliação de atividades - atividades em diferentes 
níveis de aprendizagem para que o aluno possa 
conferir seu aproveitamento e domínio do tema 
estudado;
www Sugestão de sites - para obter mais informações 
sobre o assunto abordado na aula ou Unidade;
ÍCONES
6
APRESENTAÇÃO
Caro (a) estudante,
Este e-Book, tem por objetivo disponibilizar um referencial bibliográfico amparado 
nas melhores autoridades científicas consagradas academicamente, para fornecer 
aos acadêmicos de Filosofia, arcabouço teórico como recurso didático de apoio 
para os estudos referentes ao tema da Hermenêutica Filosófica. 
Cumpre dizer que este e-Book foi elaborado com a preocupação de não perder o 
respaldo técnico-científico, ao contrário, o material se dedica a desenvolver desde a 
concepção clássica até os principais hermeneutas contemporâneos, apresentando 
os fundamentos epistemológicos e metodológicos desse caráter fundamental da 
filosofia compreensiva, que é o círculo hermenêutico, considerado, para muitos 
filósofos, como uma expressão da estrutura fundamental dos seres humanos. 
Então, compreender é essencialmente um processo humano. Não conseguimos 
viver sem dar sentido ao existir como ser no mundo. Por isso, é necessário se 
dedicar a conhecer a trajetória de formação da Hermenêutica Filosófica como ramo 
do conhecimento humano dedicado, sobretudo, tendo como finalidade principal 
desvelar o acontecer próprio da compreensão, que pode ser sempre considerado 
como o resultado do esforço do intérprete, enquanto processo de formação de um 
novo projeto de sentido a partir do próprio ser no mundo. 
Bons estudos!
7
INTRODUÇÃO
A História da Filosofia quase sempre foi construída em busca de compreender a 
realidade, a partir de pressupostos teóricos que fundamentassem o conhecimento, 
sob o domínio de bases metodológicas capazes de tornar possível a revelação 
da verdade. Deste modo, o conhecimento integra-se ao processo de reflexão 
da Filosofia, à medida que ela tenta compreender o processo de conhecimento 
enquanto problema filosófico. 
Por essa razão, é preciso caracterizar a Hermenêutica enquanto campo do 
conhecimento filosófico, a partir de uma perspectiva crítica do processo de 
desenvolvimento de suas concepções epistemológicas e metodológicas. Esta 
empreitada tem por finalidade compreender a trajetória de formação das ideias 
que forjaram a reflexão da interpretação hermenêutica, inicialmente, considerada 
mera ferramenta metodológica de interpretação filosófica. Portanto, neste e-Book 
apresentaremos o significado específico de uma interpretação filosófica, seu sentido 
histórico, sua possibilidade e sua relevância metódica.
Dessa forma, a Hermenêutica rompe com o paradigma técnico, enquanto arte 
de interpretação clássica, para irromper-se como reflexão filosófica, a partir 
da compreensão do discurso como horizonte de interpretação da linguagem 
cifrada, baseada sobretudo em textos. Assim, Schleiermacher é considerado 
uma figura marcante de contribuição indispensável neste processo de construção 
da Hermenêutica, sendo, a partir dele, possível uma mudança significativa no 
procedimento interpretativo: do âmbito técnico científico para o filosófico. Por isso 
mesmo, ele é considerado como o criador de uma “doutrina da arte”, ou seja, a arte 
da interpretação.
A Hermenêutica, então, considera como fundamental objeto de interpretação a 
própria linguagem, que é o horizonte que permite o acesso ao mundo de sentido 
para uma compreensão filosófica, na medida em que permite a interação entre o 
8
leitor e o texto. Mas nada pode ser interpretado estando desvinculado da perspectiva 
histórica, visto que a linguagem expressa justamente as condições culturais de 
sua época, exigindo sempreuma interpretação atualizada. Nesse sentido, a 
compreensão torna-se o fundamento do processo filosófico que se estabelece 
e une historiador e hermeneuta para construirem um conhecimento que institua 
algum sentido ao mundo histórico. 
Nesse sentido, Schleiermacher integra-se a um grupo seleto de hermeneutas 
protestantes que procuram superar as vastas distâncias temporais apresentadas 
nos livros das Sagradas Escrituras, a fim de superar os sistemas alegóricos para 
interpretação da bíblia pela escola medieval. Wilhelm Dilthey, principalmente, 
procura fundamentar uma base epistemológica para a consolidação das ciências do 
espírito (Geisteswissenschaften), cuja finalidade era principalmente tentar contrapor 
o método hermenêutico ao modo de proceder das ciências naturais, convertendo 
a história em objeto ao inaugurar como procedimento a compreensão enquanto 
método próprio das ciências do espírito.
Entretanto, pode-se dizer que somente Martin Heidegger, influenciado pela 
fenomenologia transcendental de Edmund Husserl, foi quem possibilitou 
compreender o mundo por meio da perspectiva histórica, como condição 
fundamental de filosoficamente refletir-se sobre o sentido do ser, a partir do próprio 
homem no mundo. A compreensão, portanto, para o filósofo alemão, tratava-se de 
uma filosofia que se elaborou como uma fenomenologia hermenêutica. 
Gadamer, nesse contexto, partiu dos pressupostos teóricos e metodológicos 
heideggerianos, sobretudo acerca da questão da compreensão, para, enfim, assumir 
como tarefa hermenêutica: o postulado, segundo o qual, a consciência histórica é o 
princípio norteador para a compreensão de uma ontologia hermenêutica. Por isso, 
somente é possível criar significados a serem compreendidos porque, para Gadamer, 
ocorre o que se denomina de fusão de horizontes (Horizontverschmelzung), ou seja, 
um acontecimento de linguagem necessário, mediando constantemente a tradição e 
9
o presente. Assim, Gadamer considera a Hermenêutica, a partir do conceito de pré-
compreensão enquanto fundamento histórico no campo das Ciências do Espírito, 
possível somente no horizonte da compreensão e da linguagem.
Finalmente, Paul Ricoeur, apresenta o ser humano compreendido como um ser de 
linguagem, que por sua condição existencial busca o tempo todo interpretar-se e 
também compreender o mundo. As intepretações que o ser humano realiza tornam 
então a Hermenêutica, em sua dimensão textual, um processo de compreensão de 
si mediado pela Hermenêutica, estabelecido sobre a relação dialogal entre autor 
e leitor, a partir do mergulho sobre o “Mundo do Texto”. Assim, a Hermenêutica se 
destinará, principalmente, a explicitar o ser-no-mundo revelado propriamente pelo 
texto. Neste mundo, revela-se a possibilidade de o intérprete poder ingressar e, 
sobretudo, apropriar-se das possibilidades que ele propicia enquanto horizonte de 
sentido instituído pela linguagem, que é também um mundo proposto pelo texto no 
qual o leitor pode habitar. 
10
UNIDADE
1
Hermenêutica como arte de Interpretar
Objetivos
• Apresentar a Hermenêutica como ramo do conhecimento filosófico;
• Compreender a perspectiva filosófica de uma hermenêutica universal em 
Schleiermacher;
• Analisar a experiência existencial como horizonte para a compreensão histórica 
a partir da hermenêutica de Dilthey.
1.1 Hermenêutica tradicional: etimologia da palavra hermenêutica
A perspectiva histórica, revela seguramente que a origem da palavra hermenêutica 
reside no verbo grego hermeneueuein. Etimologicamente, o verbo pode ser traduzido 
por interpretar, mas que seu substantivo hermeneia indica interpretação. Por essa 
11
____________________________________________________
1 Glossário - Hermes Trimegisto, deus grego mensageiro-alado-hermes, filho de Zeus e de Maia, 
portava atributos invejáveis aos homens como astúcia e inventividade, domínio sobre as trevas, 
interesse deliberado pela atividade humana, além psicopompia. Esta é uma característica daquele 
capaz de saber transmitir toda ciência considerada secreta. A partir disso, foi confundido por Paulo, 
depois que em Listra realizou um milagre, visto que Hermes é aquele que lhe dirigia a palavra. 
(CAMARGO, 1994).
razão, tradicionalmente existe uma referência com Hermes1, considerado na 
mitologia grega o mensageiro mediador entre os deuses e os mortais. (CAMARGO, 
1994).
As mensagens, portanto, não se caracterizavam como meras comunicações 
de informações, mas sobretudo explicações das ordens diretas dos deuses, 
que deveriam necessariamente ser traduzidas para língua humana, exigindo 
do mensageiro a capacidade interpretativa da palavra, a fim de decodificar as 
informações dos deuses em condições de torná-las compreensíveis aos mortais. 
Então, enquanto mediador entre os deuses e os homens, Hermes torna-se o 
mensageiro da palavra e intérprete da linguagem e da escrita, que, por via de 
consequência, inaugura uma nova possibilidade de entender a Hermenêutica como 
processo de compreensão através da linguagem. (GRONDIN, 1999).
Apesar de haver controvérsias acerca da relação entre o surgimento da palavra 
hermenêutica com o mito de Hermes (CAMARGO, 1994), estabelecem-se três 
posições filosóficas clássicas importantes para se compreender o vocábulo 
hermenêutica: expressar no sentido de dizer ou falar; expor com intensão de 
interpretar e traduzir; além de traduzir, ou seja, ser intérprete. São categorias 
que se assemelham e que, por isso, podemos concluir que, etimologicamente, a 
Hermenêutica se caracteriza como um processo interpretativo pela busca do sentido 
“verdadeiro” como paradigma filosófico indispensável para a reflexão acerca do 
problema da compreensão.
12
O termo Hermenêutica foi cunhado primeiramente pelo filósofo Johann Conrad 
Dannhauer entre 1603-1666. Termo concebido em sua obra Hermeneutica sacra 
sive methodus exponendarum sacrum litterarum de 1654, dando ênfase à lógica 
aristotélica como técnica de interpretação e pressuposto para se identificar discursos 
lógicos e ilógicos, a partir de uma inovação fundamental durante o século XVII. 
(FALCÃO, 2000). 
Ainda no contexto da Reforma Protestante, que afirmou o princípio interpretativo 
da liberdade da consciência crítica e a liberdade como critério para a compreensão 
bíblica, Dannhauer, inova em revelar que a verdade hermenêutica é universal, ou 
seja, esta universalização como pressuposto filosófico de aplicação, compreensão 
e interpretação de textos, sendo a Hermenêutica Filosófica propedêutica de todas 
as ciências. (GRONDIN, 1999).
1.2 A Hermenêutica no contexto da reforma protestante 
As hermenêuticas sacras tornaram-se, historicamente, por necessidade eclesial de 
afirmação hegemônica do religioso, o centro da interpretação teológica dos textos 
bíblicos, a partir de uma compreensão exegética. Nesse sentido, a intepretação 
bíblica foi reconstruída por meio das investigações de Martinho Lutero2 (1483-1546) 
como ruptura substancial com o paradigma profundamente dogmático enquanto 
____________________________________________________
2 Saiba mais - Nascido em Eisleben, na Saxônia (1483), ingressou na ordem dos agostinianos, 
após concluir seus estudos teológicos, ordenou-se padre e em 1517 publica noventa e cinco 
teses em contraposição ao poder eclesial diante das contradições morais da igreja e contra o 
posicionamento da pregação das indulgências. Após excomunhão da Igreja Católica, na Dieta de 
Worms (1521), rompe radical e definitivamente com a Igreja de Roma, apoiado inclusive por muitos 
príncipes, bispos, padres e leigos alemães. Na sua imensa produção teológica o destaque é para 
os comentários bíblicos, sendo célebres três breves ensaios: À nobreza cristã da nação alemã; O 
cativeiro babilônico da Igreja e a Liberdade Cristã.
13
____________________________________________________
3 Glossário- Etimologicamente, surge do termo grego allegoría e significa “dizer o outro”, “dizer 
alguma coisa diferente do sentido determinado de modo literal”. Em substituição à perspectiva 
estabelecida por Plutarco (c.46-120 d.C.), apoiado em um termo mais antigo hypónia que tinha 
sentido preponderantemente “significação oculta”, termo utilizado para interpretar. A análise de uma 
alegoria depende de uma leitura intertextual, que possibilite compreender num sentido abstrato um 
sentido mais profundo, quase sempre de caráter moral. Ainda na Idade Média, inclusive, a alegoria 
tornou-se instrumento de defesa de teólogos, que adotaram como método interpretativo alegórico 
da Bíblia para superarem todas as dúvidas heréticas.
principal método de alegoria3 hermenêutico do período medieval.
Figura 1 – Martinho Lutero
Fonte: https://www.google.com.br/
search?q=MARTINHO+LUTERO&rlz=1C1RLNS_
pt-BRBR757BR757&tbm=isch&source=iu&i
ctx=1&fir=sLgpYyUYb8bSBM%253A%252C
UvrZvI9dNLgxoM%252C_&usg=AFrqEzfShn
Hj-6FZod2JGew31Aj5SZSLwQ&sa=X&ved=
2ahUKEwjEtceloffcAhVChJAKHUFGCpAQ_
h0wEnoECAoQDQ#imgrc=sLgpYyUYb8bSBM
O cristianismo primitivo encontrava-se marcado com uma tensão inerente ao 
processo de revelação bíblica entre a história especial do povo hebreu, caracterizada 
pelo processo de salvação teologicamente anunciada no Antigo Testamento, e pela 
encarnação de Jesus com sua revelação universal do Reino de Deus no mundo, 
como profecia de uma nova história para a humanidade, baseada nos escritos do 
Novo Testamento. 
O processo de interpretação exegético, então, apresentava dois caminhos de 
compreensão teológica dos escritos: interpreta de modo literal o conjunto dos 
livros antigos, e passa a compreender a história de salvação a partir de uma nova 
perspectiva espiritual de renovação do anúncio profético do cânon bíblico. Deste 
14
modo, a alegoria torna-se o instrumento técnico para equacionar essa tensão de 
opostas interpretações, que no âmbito do cristianismo foi assumido pela escola de 
Alexandria, entre os séculos II e III. Orígenes assume o protagonismo de afirmar 
categoricamente que existe uma radical oposição entre o sentido literal ou histórico 
e o sentido espiritual. (FALCÃO, 2000). 
Em face desse posicionamento, adota-se o critério de leitura baseada na interpretação 
acerca da verdade, produzida a partir da negação teologicamente absoluta da 
letra do texto sagrado, elevando-o a um patamar além das experiências do mundo 
vivido. A tradição hermenêutica do período medieval, portanto, ocasionou por meio 
do domínio do método alegórico, o surgimento de duas correntes teológicas de 
interpretação bíblica: o conteúdo histórico foi negado como fonte de compreensão 
das sagradas escrituras, sendo toda bíblia apenas simbólica; além disso, existia o 
posicionamento de quem radicalmente entendia que a escritura deveria ser tomada 
somente a partir de sua compreensão literal do texto escrito. (GRONDIN, 1999). 
Lutero, nesse contexto empreende uma interpretação literal da bíblia, utilizando 
metodologicamente do princípio Sola Scriptura, com pressuposto da Reforma 
Protestante para adotar, de modo secundário, o pressuposto retórico do todo e da 
parte. Diante desse processo, verificou-se que o problema da interpretação não se 
resolveria apenas com a leitura do texto pelo texto, mas era preciso intentar-se uma 
abordagem histórico-crítica de restauração do contexto de vida a que se integrava 
os documentos, ampliando significativamente o conceito de Hermenêutica por meio 
da ideia de circularidade do todo e da parte, a partir de sua situação histórica. Assim, 
cada texto particular pertencia à totalidade do processo de formação social de sua 
época. Gadamer (1999, p. 274), filósofo alemão, ao aludir sobre este método, tece 
sua crítica:
[...] esta relação circular do todo e das partes não é, em si, 
nenhuma novidade. A retórica antiga já sabia disso, ela que 
compara o discurso perfeito com o corpo orgânico com a 
relação entre a cabeça e os membros, por isso é contundente 
ao dizer que o que da hermenêutica bíblica interessa enquanto 
pré-história da hermenêutica moderna das ciências do espírito 
é o princípio escriturístico da Reforma, radicado no princípio da 
retórica clássica, trazida por Lutero e seus seguidores para o 
campo da compreensão.
15
Essa transformação teórica e metodológica de perspectiva hermenêutica e 
o inevitável desenvolvimento de uma consciência histórica, possibilitaram o 
surgimento das concepções subjetivistas-objetivistas de Schleiermacher e Dilthey 
sobre o problema da interpretação, partindo do ideal iluminista mediante uma 
análise gramatical, filosófica e sobretudo histórica.
1.3 Hermenêutica Romântica
Historicamente, o Romantismo surgiu como movimento filosófico nos últimos anos 
do século XVII, inserido no contexto das transformações políticas, econômicas 
e sociais, integrando as tendências do pré-romantismo e do classicismo, a partir 
da perspectiva do idealismo filosófico. A sociedade moderno-industrial torna-se 
a esteira de mobilizações sociais que ensejam contradições culturais inerentes 
ao processo de desenvolvimento capitalista e suas consequências dramáticas 
para toda humanidade, após graves episódios de conflitos bélicos e destruição 
socioambiental. 
Nesse sentido, Schmidt (2012) esclarece que o Romantismo surgiu como 
movimento articulado a partir da Alemanha, por volta de 1800, e se ampliou após 
conquistar a Inglaterra, além de encantar a França. Por via de consequência, 
irradiou-se, substancialmente, para a cultura literária e científico-filosófica europeia 
e americana, declinando profundamente depois das consequências nefastas das 
revoluções de 18484. 
____________________________________________________
4 SAIBA MAIS - O período de grandes revoluções populares ficou marcado a partir de 1848 como 
“Primavera dos Povos”, sobretudo na Europa, nas cidades da França, do Império Austro-Húngaro, 
dos estados alemães. A população empobrecida, entre desempregados e trabalhadores, forjou um 
levante popular de proporções inimagináveis no contexto da exploração do sistema capitalista, após 
o advento da Revolução Industrial. O mundo se dividia entre as ideias político-econômicas liberais 
para preservar as monarquias absolutistas europeias e as concepções político-ideológicas dos 
trabalhadores e camponeses organizados como movimento contestatório, amparados pelos ideais 
socialistas de Karl Max e Fredrich Engels quando lançaram o Manifesto Comunista. 
16
O Romantismo, portanto, tem como panorama histórico propulsor de seu surgimento, 
principalmente, o período denominado de Séculos das Luzes, fundamento ideológico 
de ruptura entre a visão teocêntrica e teológica judaico-cristã. Como processo 
considerado revolucionário, o Iluminismo, caracteriza-se pela aposta desmesurada 
na razão humana como fonte inesgotável de compreender o mundo e os mistérios 
da natureza, tendo como pressuposto de seu desenvolvimento a ciência como 
instrumento de dominação do conhecimento comprovado e o Liberalismo como 
sistema econômico. 
Figura 2 - A Liberdade sobre as Barricadas. (Eugene Delacroix)
O pressuposto de emancipar o ser humano por meio do progresso técnico-científico, 
estimulado pelo crescimento econômico em escala global e baseado nos princípios 
da liberdade, igualdade e fraternidade, segundo os interesses da nova classe social 
ascendente, a burguesia, transformou o mundo em catástrofe: forjou uma civilização 
inflexivelmente racionalista e materialista, conforme preconiza (FALCÃO, 2000). 
Deste modo, considerada como uma escola de pensamento, o Romantismo tem 
influências decisivas para a gênese do Nazismo, Marxismo e também do movimento 
modernista. 
Fonte:https://www.google.com.br/search?
q=revolu%C3%A7%C3%A3o+de+1848+primavera+
dos+povos&rlz=1C1RLNS_pt-BRBR757BR757&
source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwiZrKulgPjcAhVDG5AKHW1IDbsQ_
AUICygC&biw=1517&bih=735#imgrc=2cuxl
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17
A partir das experiências traumáticas da sociedade capitalista sob a hegemonia 
burguesa como projeto de dominação econômica internacional, a produção 
romântica na Alemanha é divulgada pelos irmãos Shlegel na revista Athenãum, por 
volta de 1880. A “Escola Romântica” é caracterizada por um desejo de unidade ou 
reconciliação do homem entre a dimensão interna e a realidade externa, tentando 
reconhecer todas as potencialidades do ser, por meio, sobretudo, da possibilidade 
de compreender efetivamente a interioridade humana em sua singularidade. 
(SAFRANSKI, 2010). 
Este retorno às experiências subjetivas do próprio eu e ao cultivo das emoções, 
intuitivamente foi preconizado pelo Romantismo. Falcão (2000), destaca que 
Schleiermacher tornou possível integrar ao processo de compreensão das vivências 
existenciais humanas a fé e a ciência. Assim, estabeleceu que a comunicação é 
uma condição necessária para expressar a manifestação da divindade interior de 
qualquer indivíduo. Por isso, despertou interesse pela interpretação do singular e 
do todo que se revela por meio da experiência e se compreende pela linguagem, 
transcendendo o conhecimento meramente sistemático, por constituir sua teoria 
hermenêutica no âmbito do conhecimento teológico e a partir da escola do 
pensamento romântico. 
1.4 A hermenêutica de Friedrich Schleiermacher
Friedrich Schleiermacher (1768-1834) foi considerado um dos principais expoentes 
que contribuiu especialmente para as principais reflexões hermenêuticas a partir do 
início do século XIX, inclusive consagrado ainda como o fundador da Hermenêutica 
contemporânea. Importa dizer que com Schleiermacher, a Hermenêutica torna-se 
autônoma, como disciplina dedicada à “arte de compreender” adequadamente o 
pensamento que se encontra na base do discurso.
18
Figura 3 - Friedrich Schleiermacher
Fonte: https://www.google.com.br/
search?q=Friedrich+Schleiermacher&rlz=1C1RLNS_pt-
BRBR757BR757&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ve
d=0ahUKEwiAxcOzmM3cAhVMHJAKHdGIAMMQ_
AUICigB&biw=1514&bih=713#imgrc=naYLCaSxleSm-M.
No âmbito da reflexão racional e inspirado pela tradição retórica, o teólogo, filólogo 
e filósofo contribuiu para a superação do paradigma de múltiplas hermenêuticas. 
Por considerar, meramente, um conhecimento instrumental do teólogo, do jurista 
ou do filólogo, o pensador polonês idealizou um projeto para fundar uma teoria 
geral da Hermenêutica. Metodologia inovadora fundada na descrição unificada dos 
processos de compreensão, a partir da interpretação de todos os textos, escritos ou 
orais, religiosos ou mundanos, antigos ou modernos. 
A Hermenêutica foi deslocada para o campo filosófico, visto que os problemas 
fundamentais de interpretação estão fundados nos desafios do processo de 
compreensão. Isso porque a interpretação busca revelar também o caráter 
intencional do ser histórico, que forja seu discurso falado ou escrito situado em um 
horizonte histórico-linguístico específico, marcado pela inevitável inseparabilidade 
de pensamento e linguagem. Diante disso, a função primordial da Hermenêutica 
é superar a diferença ou a distância entre leitor e autor para tentar compreender 
corretamente a ideia do texto. (GRONDIN, 1999). 
19
A Hermenêutica visa pensar o universal e o particular, o ideal e o histórico a partir da 
perspectiva dialética. Assim, o processo de conhecimento é uma possibilidade de 
pensar o concreto como etapa de mobilizar a capacidade racional, para compreender 
intelectualmente a realidade como reconstrução histórica e divinatória, considerando 
os elementos objetivos ou subjetivos de um determinado discurso oral ou escrito. 
Deste modo, busca-se captar o pensamento do autor, efetuando uma análise de 
sua linguagem, que concomitantemente torna necessário reconhecer o contexto de 
sua produção através de um retorno ao momento de seu surgimento ou gênese. 
(SCHLEIERMACHER, 2006). 
O termo divinação de Schleiermacher (2006), significa tentar compreender 
adequadamente em seu contexto de origem, o contexto de elaboração do projeto de 
publicação da obra do autor. Em outras palavras, captar a singularidade estilística 
do autor, que é singular e único. Mesmo sabendo que, assim como existe uma 
distinção entre os indivíduos, não se alcançará uma identificação perfeita entre 
a peculiaridade estilística de determinado texto e sua compreensão pelo leitor ou 
intérprete. (SCHMIDT, 2012). O que de fato se pretende hermeneuticamente é 
realizar uma compreensão por aproximação, que sempre poderá ser aprimorada, 
constituindo-se como um fator relevante de norteamento e motivação para se buscar 
o aperfeiçoamento da compreensão. Ademais, a perspectiva da hermenêutica revela 
que o processo de interpretação nunca ocorre de uma vez, mas é um processo ou 
uma busca interminável, construído pelo recurso da linguagem e pela faculdade da 
imaginação. (SCHLEIERMACHER, 2006).
A interpretação é arte então, por se constituir como um processo baseado em 
um permanente ir e vir entre o universal e o particular. Por isso, cada discurso é, 
principalmente, a elaboração de um determinado finito que se constrói a partir de 
um indeterminado infinito, que é a linguagem. Já a linguagem deve ser considerada 
infinita, no sentido de que os signos linguísticos podem ser determinados de 
uma maneira particular pelos demais. Por outro lado, o mesmo também se torna 
possível afirmar sobre o aspecto psicológico, uma vez que cada intuição de alguém 
especificamente é infinita. 
20
Nesse sentido, a relação de interdependência entre o todo e as partes diz respeito 
especificamente à possibilidade de se compreender o todo, ou seja, o sentido 
conjuntural das condições de produção de um texto somente é efetivamente 
compreendido a partir do domínio de interpretação das partes, pois a linguagem 
como discurso torna-se mediadora entre a produção do autor e a interpretação que 
se pode realizar de seu texto pelo leitor. Então, expressa em determinado contexto 
situado cultural e historicamente, com uma linguagem específica, a linguagem como 
discurso revela-se, para Schleiermacher, o objeto, o instrumento e o resultado da 
hermenêutica, conforme estabelecido. (SCHMIDT, 2012). 
Schleiermacher (2006) utiliza dois métodos indissociáveis para empreender a correta 
compreensão da linguagem: um gramatical (comparativo) e o outro psicológico 
(divinatório). A partir disso, ele defende que a Hermenêutica tem como objetivo 
fundamental não somente compreender o texto escrito, mas sobretudo revelar o 
seu sentido expresso na linguagem como horizonte possível para se interpretar 
adequadamente a individualidade criadora, ou seja, a todo texto interpretado há 
seu contexto como pressuposto para entender cada momento de produção livre do 
autor. 
Diante disso, é importante entender que toda produção de expressão humana 
faz parte de um processo criador que envolve compreender o comportamento do 
autor. Por isso, caracteriza-se como um processo que causa estranheza. Para 
Schleiermacher (2006), portanto, a função de sua hermenêutica é dedicar-se a 
compreender o sentido do texto, porém sem que se perca de vista a leitura que 
inter-relaciona o sujeito (autor) e o objeto (geralmente o texto). Por esse motivo, 
a interpretação literal dos signos deve pressupor metodologicamente a busca 
constante pela compreensão da individualidade do seu autor. Assim, a compreensão 
somente se torna possível de ocorrer quando há algo em comum entre o autor e o 
intérprete.
21
Nisto reside o que se denomina chamar de círculo hermenêutico5, já que do ponto de 
vista metodológico, a interpretação deve ocorrer a partir da união de dois métodos: 
o gramatical, centrado no texto, e o psicológico (técnico), centrado no autor, a fim 
de superar-se a superficialidadeda interpretação meramente gramatical. Por esse 
motivo, Schleiermacher estabelece sua perspectiva de compreensão hermenêutica 
a partir de duas condições fundamentais inovadoras: a consciência livre e criadora 
do sujeito e a linguagem. Com efeito, tornam-se as possibilidades do processo de 
compreensão e da interpretação porque também constituem a base do discurso 
que instaura o sentido. (GRONDIN, 1999).
A compreensão de qualquer gênero literário de determinado texto, portanto, exige 
fundamentalmente que se compreenda o sentido dos termos utilizados a partir de 
seu contexto histórico, para que seja possível conhecer o repertório linguístico 
utilizado pelo autor conforme sua época. Nisto consiste o processo hermenêutico de 
interpretação gramatical, visando a compreensão do discurso, enquanto articulação 
da estrutura de uma língua. Além disso, uma interpretação especificamente 
psicológica inclui, imprescindivelmente, como objeto de interpretação a própria 
vida do autor, em busca de se perscrutar o sentido dos possíveis “motivos” que o 
levaram a escrever. Significar dizer que é preciso compreender as circunstâncias 
históricas que conduziram o autor para escrever, considerando-o não como uma 
figura abstrata, mas situado em um contexto, que socialmente o constitui como 
pessoa humana. 
____________________________________________________
5 SAIBA MAIS - Para Friedrich Schleiermacher, em cada processo de interpretação desenvolve-se 
o que se denomina de círculo hermenêutico. Deste modo, a compreensão de um texto completo 
somente é possível a partir das partes que o integram, além de ser necessário, principalmente, 
conhecer a vida do próprio autor da obra. Este enquanto sujeito histórico também está submetido 
à cultura de sua época, fazendo com que haja o conhecimento e o reconhecimento das condições 
sócio-históricas que marcam sua vida. Assim, somente se torna possível conhecer o texto completo 
à medida que se conhece a cultura que propiciou o projeto original de seu autor.
22
Nesse sentido, cumpre interpretar o “projeto originário” do autor como processo de 
interpretação situado na tensão entre a vontade ou intenção de comunicação do 
autor, sobretudo a partir da compreensão das formas possíveis do uso da linguagem 
de que ele dispõe para a sua manifestação textual. Assim, apesar de as categorias 
da linguagem consideradas tradicionais, bem como suas convenções artísticas 
poderem limitá-lo, a construção linguística expressa em seu discurso pode superar 
as condições históricas de seu tempo, através da imaginação como processo de 
construção criativo de novas formas de produção estilística do autor. (FALCÃO, 
2000). 
Deste modo, o vínculo estabelecido entre estilo ou tendência do texto, remete-
se a um permanente processo de imaginação, que anuncia previamente toda a 
construção da obra de seu autor, que consegue elaborar projetos, deixando neles 
sua marca pela sua peculiaridade de pensamento, estilo de escrita e objeto da 
interpretação técnica.
Por isso, segundo Grondin (1999), a Hermenêutica empreendida por Schleiermacher 
era uma metafísica estética da individualidade, pois procurava instaurar um 
fundamento para viabilizar a compreensão de todo tipo de texto, sempre na 
perspectiva de entender cada momento de produção livre, a partir da reflexão 
sobre a individualidade criadora do autor, a fim de, sobretudo, tentar captar um 
modo de comportamento do sujeito. Schleiermacher buscou tornar possível uma 
equiparação da nossa interpretação com as intenções do autor.
1.5 Wilhelm Dilthey e a busca pela objetividade histórica
A visão hermenêutica tradicionalista foi rompida historicamente a partir da 
perspectiva crítico-teórica, deixando seu caráter estritamente técnico, por meio 
do romantismo de Schleiermacher. Deste modo, a Hermenêutica Romântica 
é superada por meio de uma peculiaridade reflexivamente inovadora, enquanto 
elemento fundamental para a compreensão dos fatos históricos, passando de uma 
metodologia meramente de interpretação dos sentidos imanentes dos textos, para 
23
uma metodologia que buscava uma adequada identificação dos sentidos imanentes 
dos processos históricos. 
Fonte: https://www.google.com.br/
search?q=Wilhelm+Dilthey&rlz=1C1RLNS_pt-BRBR757BR757
&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwig2PSbteLcAh
WSPpAKHQWFCpAQ_AUICigB&biw=1514&bih=713#imgrc=y-
PXV1eqhlLMTM. 
Figura 4 - Wilhelm Dilthey
Foi justamente Wilhelm Dilthey (1833-1911), nascido na Alemanha, cidade 
de Biebrich, que se dedicou profundamente a tentar explicar o processo de 
compreensão a partir de uma Crítica da Razão Histórica, fundamentando as 
ciências do entendimento sobre categorias próprias, ou seja, Dilthey (2010) tentou 
fixar a Hermenêutica como uma metodologia para as ciências do espírito. Assim, 
ele acreditava que no âmbito dos estudos humanísticos era preciso se dedicar 
a compreender as manifestações da vida, distintamente do modelo científico 
estabelecido às ciências da natureza e às normas de causalidade e rigidez de um 
pensamento mecanicista e basicamente quantitativo. 
Essa posição elevou Dilthey como expoente crítico ao paradigma positivista baseado 
em Comte e John Stuart Mill, que acreditavam, essencialmente, na impossibilidade 
de fundar-se uma metodologia específica aplicada às ciências humanas, pois 
deveriam adotar igualmente o método consagrado nas ciências da natureza. Diante 
disso, Dilthey (2010) defende que o método adequado para a compreensão das 
questões humanísticas deve fundamentar-se epistemologicamente no âmbito das 
ciências do espírito, pois é a história que deve ser o objeto de análise hermenêutica, 
uma vez que não terá qualquer efeito tentar captar as intenções psicológicas que 
motivaram a produção de um texto. 
24
Na concepção hermenêutica histórica de Dilthey (2010), torna-se imperioso dizer 
que compreender é compreender uma expressão, relação considerada como 
processo de vivências histórias individuais, uma unificação do interno e do externo, 
que se tornou vida. Por este motivo, a fundamentação do conhecimento histórico 
deveria ser encontrada nos fatos da consciência. Deste modo, o que Dilthey (2010) 
descobre é que a própria “vida humana” deve ser considerada objeto de análise 
do conhecimento, ou seja, as ciências do espírito propostas exclusivamente pelo 
filósofo alemão investigam as manifestações da vida humana que ele denomina 
realidade histórico-social.
Nesse contexto, Dilthey estabelece metodologicamente dois tipos de etapa 
procedimentais que devem ser empregados pelas ciências do espírito. A explicação 
(Eklarüng) relaciona-se com a atividade construtiva das ciências, e a compreensão 
(Vehstehen) torna-se a base do processo de construção das condições de 
possibilidade das ciências analíticas. 
A explicação consiste na atribuição de uma causa eficiente a um determinado evento, 
e é o mecanismo básico de constituição da ciência moderna, pois todo o progresso 
das ciências empíricas se baseou na eficácia da explicação dos fenômenos. 
A explicação lógica dos fenômenos representa a superação dos fundamentos 
metafísicos do conhecimento pré-moderno, e, ao mesmo tempo, Dilthey (2010) 
restaura filosoficamente os pressupostos epistemológicos, almejando de modo 
particular, a partir da descoberta da “vida humana” como centro da realidade 
cognoscível, repensar a ciência. Não obstante, há que se ter clareza sobre os 
limites de toda ciência, visto que a historicidade da vida humana torna possível a 
construção do conhecimento científico do mundo histórico, pois o conhecimento 
desenvolvido no âmbito das ciências naturais deve ser perfeitamente integrado ao 
conhecimento produzido pelas ciências do espírito. (FALCÃO, 2000). 
Assim, a pressuposição cientificista de Dilthey pressupõe que o domínio do mundo 
físico descoberto pelas práticas desenvolvidas pelas ciências da naturezapoderá, 
principalmente, contribuir para a construção de uma compreensão científica das 
25
leis do mundo do espírito, aumentando as possibilidades de reconstruir, através 
de métodos próprios instrumentalizados pelas ciências humanas, efetivamente 
as condições de intervenção sobre a realidade histórico-social, a fim de 
descrever regularidades e estabelecer normas a partir de relações já constituídas 
humanamente, para tornarem-se compreendidas cientificamente por construções 
teóricas fundamentadas em uma multiplicidade de princípios explicativos. (PALMER, 
1986). 
Portanto, o método das ciências do espírito destina-se a descobrir, no processo de 
formação histórica, fatos concretos que permitam a ação científica sobre a própria 
realidade humana, para fundamentar explicativamente os fenômenos de seu campo 
de investigação e de compreensão. Deste modo, o procedimento da explicação faz 
parte da construção do conhecimento científico, mas, por outro lado, toda ciência 
deve ter fundamento no ato de compreender. Por isso, o cientista do espírito deve 
atribuir-se técnico e cientificamente de todos os meios teóricos e metodológicos 
possíveis a fim de construir o aparato explicativo de sua ciência. 
Nesse contexto, Dilthey utiliza-se metodologicamente de dois tipos consagrados 
de procedimentos adotados pelas ciências do espírito: primeiramente, a explicação 
(Eklarüng) que estrutura a base epistemológica de construção de qualquer atividade 
das ciências, além da compreensão (Vehstehen) que fornece as condições de 
possibilidade das ciências analíticas.
A base das explicações das ciências modernas, foi forjada na atribuição de uma 
causa eficiente relacionada diretamente a um evento determinado, pressuposto 
indispensável para a explicação eficiente dos fenômenos, medida adotada em 
contraposição aos fundamentos metafísicos do conhecimento pré-moderno. Diante 
disso, todo o progresso das ciências empíricas se baseou fundamentalmente na 
explicação lógica dos fenômenos, ou seja, a lógica torna viável explicar determinada 
realidade a partir de uma articulação entre os fatos de uma teoria e pela mobilização 
das diversas teorias existentes entre si, porém consagram-se no âmbito científico 
somente pela explicitação também do contexto em que a teoria foi construída, 
26
principalmente, por sua relação com a totalidade da realidade sócio-histórica. 
(PALMER, 1986). 
Por essa razão, a perspectiva explicativa dos fenômenos é uma condição necessária 
para o conhecimento científico, de modo que se apresenta como etapa necessária, 
uma vez que toda ciência do espírito é uma atividade reflexiva. Para Dilthey, então, 
os conceitos explicativos somente se tornam efetivos no plano científico porque 
derivam das circunstâncias históricas da experiência ao mesmo tempo em que 
refletem igualmente os limites sócio-históricos. 
Desse modo, o conhecimento explicativo, durante o processo de apreender as 
determinações gerais dos fenômenos, estabelece procedimentos que definem 
os meios através dos quais se intervém nas situações concretas e particulares. A 
explicação no âmbito científico torna-se resultado da produção de tecnologia de 
conhecimento. Assim, explicar é estabelecer um fundamento para as coisas, porém 
abstratamente em relação ao conhecimento efetivo da realidade considerada 
histórico-social. (FALCÃO, 2000). 
Além disso, a concepção diltheyneana de ciência moderna, dedica-se a fundamentar 
filosoficamente a necessidade de fazer com que cada ramo do conhecimento 
científico se dedique a compreender sua historicidade, a partir de suas condições 
baseadas na experiência da ‘vida humana’, em busca de construir uma articulação 
com as demais ciências, apontando especialmente para o fato de que existem limites 
para a possibilidade científica do conhecimento, visto que este se elabora como 
realidade histórico-social. Em resumo, a compreensão é o pressuposto filosófico 
básico sobre o qual se fundamentam as ciências do espírito.
A compreensão é intrínseca à explicação pressuposta, conquanto, presente em toda 
ação humana. Dilthey apresenta sua fundamentação das ciências do espírito em 
referência ao fenômeno da compreensão, a partir de uma perspectiva tridimensional: 
27
inicialmente, o homem compreende as situações historicamente, situado em seu 
contexto próprio em circunstâncias específicas de vida; por conseguinte, enquanto 
ser histórico, a realidade é percebida como fato histórico, ou seja, o homem se 
mobiliza na história. A compreensão possibilita ao homem se situar historicamente 
no mundo, avaliando circunstâncias de vida sempre a partir de certas crenças, 
que estão implicadas na própria estrutura histórica da compreensão. Por último, a 
compreensão enseja um posicionamento consciente para a tomada de decisões, 
baseadas no julgamento interpretado com fundamento em juízos de valores 
historicamente elaborados.
Neste sentido, a compreensão é o que permite a fundamentação enquanto fato 
de toda possibilidade de construção do conhecimento científico, posto que para 
Dilthey o objeto mais amplo da epistemologia das ciências do espírito é justamente 
a análise do fenômeno da compreensão. 
SUGESTÃO DE LEITURA
O artigo A Hermenêutica e o Romantismo Alemão discute a proposta 
hermenêutica de Schleiermacher a partir de uma revisão da literatura que analisa 
a interpretação técnica e psicológica. Disponível em:<http://e-revista.unioeste.br/
index.php/diaphonia/article/view/17209/11439>.
O artigo O círculo hermenêutico: Que problema é este? discute o método 
conhecido como Círculo Hermenêutico, apontando para um possível problema no 
âmbito ontológico ou metodológico para as ciências sociais e humanas. Disponível 
em: <http://www.scielo.br/pdf/ts/v26n2/v26n2a04.pdf>.
O artigo A Hermenêutica de Wilheim Dilthey e a Reflexão Epistemológica 
nas Ciências Humanas Contemporâneas apresenta as contribuições de 
Wilheim Dilthey como proposta teórica e metodológica dentro do movimento da 
“hermenêutica romântica” alemã para as ciências humanas contemporâneas. 
Disponível em:<http://www.scielo.br/pdf/se/v17n2/v17n2a03.pdf>.
28
ATIVIDADES
Como caracterizar o círculo hermenêutico preconizado por Schleiermacher para se 
compreender o sentido de um texto completo, considerando que o todo não poder 
ser inteligível sem compreensão das partes?
A Hermenêutica, enquanto método de interpretação, torna possível a compreensão 
do sentido de um determinado texto situado em seu contexto histórico?
A linguagem pode ser considerada produto histórico? Com base nesta informação, 
é imprescindível interpretar o sentido do texto historicamente?
RESUMO
Nesta Unidade, apresentamos analiticamente a Hermenêutica como processo 
de interpretação filosófica, tendo na figura de Schleiermacher o fundador de 
um novo paradigma metodológico, evitando a fragmentação da Hermenêutica, 
e propondo que a operação hermenêutica dedique-se a uma superação da 
distância estabelecida entre leitor e autor, pois compreender um texto é sobretudo 
compreender fundamentalmente uma individualidade, o comportamento do sujeito 
que deu origem ao texto e que é parte integrante indissociável da história. Em 
busca de fundamentar uma razão histórica, nesse sentido, Dilthey se apropria 
da realidade humana, tomando-a como objeto do conhecimento científico. Deste 
modo, o mundo da vida humana é construção histórica, o mundo do espírito. Assim, 
a função específica de uma ciência do espírito é dedicar-se a conhecer em sua 
própria estrutura o mundo histórico.
29
 REFERÊNCIAS
BLEICHER, J. Hermenêutica Contemporânea. Lisboa: Edições 70, 1992. 
CAMARGO, N. M. de; AMARAL, P. Período clássico da hermenêutica filosófica 
na Alemanha. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1994. 
DILTHEY, W. A construção do mundo histórico nas ciências humanas.São 
Paulo: UNESP, 2010.
FALCÃO, R. B. Hermenêutica. São Paulo: Malheiros Editores, 2000.
GRONDIN, J. Introdução à hermenêutica filosófica. São Leopoldo: Unisinos, 
1999.
PALMER, R. Hermenêutica. Lisboa: Edições 70, 1986.
ROHDEN, L. Hermenêutica filosófica: Entre a linguagem da experiência e a 
experiência da linguagem. São Leopoldo: Editora UNISINOS, 2002.
SCHLEIERMACHER, F. D. E. Hermenêutica: arte e técnica da interpretação. 
Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2006.
SCHMIDT, K. L. Hermenêutica. Petrópolis: Vozes, 2012.
30
UNIDADE
2
Hermenêutica Filosófica
Objetivos
• Compreender a Hermenêutica como campo de reflexão filosófica;
• Analisar a existência como sentido de compreensão do ser;
• Caracterizar a hermenêutica como conhecimento do existir humano.
2.1 Hermenêutica e linguagem
Para Heidegger, importa considerar que a perspectiva hermenêutica como filosofia, 
se constitui como um processo de busca através da interpretação do sentido das 
condições de possibilidade da própria compreensão, ou seja, intenta-se, portanto, 
filosoficamente refletir sobre o sentido do próprio compreender. Por isso, a intenção 
do autor se dedica a abordar o sentido da estrutura humana de conhecer, que é 
fundamentalmente linguística. Assim, o conhecimento como produto da condição 
31
existencial humana somente é possível no homem enquanto ser que se conhece 
por meio da linguagem. (PAISANA, 1992).
Fonte: https://www.google.com.br/
search?q=heidegger&rlz=1C1RLNS_pt-BRBR7
57BR757&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=
0ahUKEwjt-5rqzLndAhXGEZAKHWQsCwEQ_
AUICygC&biw=1517&bih=735#imgrc=ZwcSNdwSNqaehM
Figura 5 - Heidegger
Na perspectiva heideggeriana, então, trata-se de reconhecer o problema do 
conhecimento por meio de conhecer a estrutura do conhecimento, ou seja, o “como” 
da compreensão. Poderemos deste modo afirmar, em suma, que este “como” 
integra analiticamente determinados elementos, tais como: a implicação do humano 
(humano “como” humano) como um interesse, uma fonte de questionamento situada; 
uma maneira de constituir sentido (expresso na filosofia através de argumentos 
e conceitos); a linguagem, considerada principalmente em seu aspecto filosófico 
mais próximo ao logos, como condição de inteligibilidade e interpretabilidade, além 
de reconhecer a necessidade intrínseca de que este sentido seja compartilhado 
num diálogo. (MAC DOWELL, 1993).
Por isso mesmo, cabe compreender a maneira como o ser humano pode, sendo 
o ser que tem linguagem, conhecer o mundo em que se apresenta, como vir a ser 
conhecido também, bem como a própria linguagem. Por outro lado, neste intento 
está pressuposto que conhecer é compreender o que se “dá” enquanto “constituído 
para”, relação sempre estabelecida com alguma outra coisa, pressupondo-
32
se no desenvolvimento da analítica existencial, captar o sentido da linguagem 
como discurso, remontando o pensamento filosófico à tradição grega, sobretudo 
posicionando-se em oposição à interpretação redutora da tradição filosófica que o 
tomou como razão, fundamento e juízo.
2.2 O sentido do ser como questão fundamental 
O filósofo alemão Heidegger, certamente, figura entre os mais proeminentes 
pensadores do mundo moderno, sobretudo a partir de sua publicação mais 
expressiva academicamente, Ser e Tempo (ST), uma das obras mais citadas no 
século XX. As contribuições do pensador da Floresta Negra se desenvolvem, tendo 
como pressuposto epistemológico e metodológico, os estudos sistemáticos das 
distintas épocas do saber filosófico, especialmente, retomando os grandes temas da 
filosofia grega, com destaque entre: o período pré e pós-socrático, da Escolástica, 
da filosofia moderna, de Kant e dos idealistas, além dos sistemas analíticos dos 
filósofos contemporâneos ao seu contexto histórico marcante de vida.
Apesar da complexidade que envolve o pensamento filosófico heideggeriano, pode-
se dizer que o substrato teórico que norteia todo o seu empreendimento teórico 
dedica-se a compreender qual o sentido do ser? A partir de qual horizonte filosófico 
se configura a determinação simples e unitária do ser, mesmo prevalecendo 
entre as múltiplas significações do ente? Diante disso, instaura-se o problema 
fundamental da filosofia de Heidegger que deve buscar então se dedicar à questão 
em torno do ser, discussão a qual ele vai tentar responder durante toda a sua vida, 
no desenvolvimento de sua filosofia. (PAISANA, 1992). 
Heidegger inicia Ser e Tempo convicto de que se torna necessário revisitar a 
tradição filosófica fundada em Platão e Aristóteles, acerca do conceito do ser para 
aprofundar suas bases de definição, ou seja, a necessidade de se reconstruir 
a pergunta pelo sentido do ser em vista de aprofundar os pressupostos que 
possibilitaram sua formulação. Por isso, para Heidegger a preocupação da filosofia 
33
não é trazer necessariamente algo novo para o horizonte de compreensão, mas 
o que interessa é compreender de maneira radical e profunda a própria estrutura 
do compreender histórico existencial. Deste modo, o projeto original da obra Ser e 
Tempo formula um conceito inovador da própria filosofia: “a filosofia é uma ontologia 
fenomenológica e universal que parte da hermenêutica do ser-aí, a qual, enquanto 
analítica da existência, amarra o fio condutor de todo questionamento filosófico no 
lugar de onde ele brota e para onde retorna”. (MAC DOWELL, 1993). 
Nesta perspectiva, o método hermenêutico é caracterizado de uma maneira 
modificada em relação à tradição, rompendo inclusive com o binômio todo-parte, 
pois para Heidegger a estrutura circular da compreensão do filosofar constitui a 
partir da colocação da questão para o sentido do ser. Assim, a estrutura circular da 
compreensão se vinculará à própria atitude interrogativa fundamental do filosofar e, 
por conseguinte, se relacionará à repercussão que esta atitude enseja ao colocar 
em movimento o caráter existencial e histórico da questão como tal. (STEIN, 2005).
A dimensão hermenêutica deve ser entendida também no plano fático da vida 
(mundana), visto que as experiências não se instauram exclusivamente em uma 
dimensão puramente formal, mas se instituem no mundo, sobretudo a partir de uma 
concepção de campo de manifestação dos entes em geral e dos comportamentos 
dos homens. A dimensão hermenêutica, portanto, considerada histórica, afirma 
que todas as possibilidades de comportamento humano (prático ou teórico) são 
estabelecidas pelas estruturas prévias insculpidas historicamente no interior desse 
horizonte fático. 
34
Desse modo, cabe entender que as condições fundamentais que integram a estrutura 
formal da questão do sentido do ser: o questionado, o interrogado e o perguntado, 
estão relacionadas às atitudes constitutivas e necessárias de uma reflexão possível 
filosoficamente e de caráter hermenêutico no âmbito do questionamento, como 
modos de ser do ente que nós mesmos somos. O ser questionado é compreendido a 
partir do modo de ser do ente, que de fato “é”, enquanto questiona. Neste processo, 
encontra-se uma determinada situação ôntico-existenciária, ou seja, o interrogado 
na questão do ser é o próprio ente que formula a questão, porque em sua condição 
existencial por ser, em seu ser, fundamentalmente compreensão de ser, o ser-aí6 
existe sempre como possibilidade em condições de levantar a questão do ser. 
(CAPUTO, 1998). 
____________________________________________________
ABC ou Glossário
6 Ser-aí – Pode-se afirmar que o ser-aí é o ente único capaz de questionar seu próprio ser e que, 
por isso, possui um primado ontológico, ou melhor, pré-ontológico, visto que sendo, ele compreende 
ser. Assim, é importante dizer que o ser-aí está sempre de algum modo se relacionando com seu 
ser, colocando seu ser em jogo. A partir disso, o ser-aí somente se descobre em seu serna medida 
em que, existencialmente, assume um modo possível de ser. A existência, por isso mesmo, torna-se 
uma determinação exclusiva do ser-aí, pois enseja relação entre ser e ser-aí, que estabelece uma 
dinâmica a partir da compreensão fundada, em que existindo o ser-aí é seu modo de ser, e assim 
ele se determina, mas nunca se conclui. O ser-ontológico do homem é ser a abertura (o aí) onde os 
entes se mostram e ele – homem – se mostra para si mesmo.
35
Para Heidegger, a situação hermenêutica estabelecida na analítica do ser-aí, 
integrada a um círculo hermenêutico que constitui a natureza da repercussão do 
questionado (o ser) no próprio questionar (modo de ser do ente), auxilia a própria 
compreensão pré-ontológica do ser, que sendo tem a possibilidade de formular 
a questão, pois na perspectiva do seu ser, o ser-aí é originariamente o ente que 
existe. 
2.3 O sentido do ser em geral: Dasein (ser-aí) e ser-no-mundo7 
Em Ser e Tempo, Heidegger, estabelece as bases de uma fenomenologia 
hermenêutica, a partir da vivência do próprio homem que se compreende como 
ente, que é o que pode compreender-se como ser. Deste modo, o Dasein8 é 
analisado a partir de sua existência fática e, por meio da fenomenologia, torna-se 
possível o acesso à questão filosófico-hermenêutica fundamental, o sentido do ser. 
Pelo método fenomenológico, o sentido verdadeiro do ente que se compreende 
ser é desvelado, se encontra velado ou permanece dissimulado, não é um simples 
ente, mas sim o ‘ser do ente’. Assim, a fenomenologia procurará transformar 
em fenômeno aquilo que se oculta como busca pela compreensão de como se 
manifesta, tornando o ser interpretado como fenômeno. (STEIN, 2005). 
____________________________________________________
ABC ou Glossário
 7 Ser-no-mundo – Para Heidegger, é preciso entender que o homem é um ente que se diferencia 
dos demais, principalmente por compreender e dar significado ao mundo. Assim, a expressão ser-
no-mundo remete-se ao ente que nós somos e indica que, sendo, estamos sempre juntos ao mundo 
e existimos sempre em um mundo. Deste modo, significa dizer que o homem é ser-em e ser-junto ao 
mundo. Esse conceito de ser-no-mundo pretende, então, caracterizar a simultaneidade de mundo 
e homem, pois revela que a existência do homem somente tem sentido a partir da sua relação 
com o mundo, uma vez que este ganha sua significação por meio do homem. Nessa relação de 
simultaneidade, ser-no-mundo diz sempre ‘já-ser-junto-ao-mundo’, ocupar-se com as coisas do 
mundo, “deter-se” ou demorar-se junto ao mundo. Enquanto ocupação, o ser-no-mundo é tomado 
pelo mundo de que se ocupa.
8 Dasein - O ente adotado por Heidegger, para fundamentar o questionamento filosófico acerca do 
sentido do ser, é o Dasein. O Dasein, portanto, é o ente cuja essência (ser) coincide necessariamente 
com a existência, visto que é a partir desta que seu ser se realiza como ser no mundo. Assim, é 
próprio do Dasein ter de ser. (ABBAGNANO, 2007).
36
A categoria Dasein historicamente foi utilizada, mas Heidegger incluiu uma nova 
definição no âmbito filosófico. Para Heidegger, o substantivo Dasein é utilizado 
de maneira restrita aos seres humanos, no sentido de ‘ser-aí’: ‘Da’ como ‘aí’ e 
‘sein’ como ‘ser’, portanto, Da-sein. Então a compreensão de mundo deve integrar 
também a compreensão deste ente (não como uma totalidade de entes, mas 
relativa ao ser humano), de modo que Heidegger não se utiliza da terminologia 
consagrada se remetendo a homens ou pessoas, mas sempre se remete como 
Dasein. O homem é o seu ‘Da’, significando também o ‘Da’ como fundamentalmente 
‘abertura’ (Erschlossenheit) deste ente. Para Stein (2005), a concepção inovadora 
de ‘abertura’ tratou de romper com a categoria de ‘consciência’ de Husserl, a fim 
de substituir a ideia de consciência intencional para estabelecer um conceito e uma 
terminologia mais ampla (CAPUTO, 1998). 
A existência própria do Dasein é um projeto de abertura ao ser, no sentido de “ter-
que-ser”, determinando seu modo de viver que se constitui a partir de um tempo 
de duração da existência, estabelecido entre um começo e um fim. Portanto, viver 
torna-se uma condição estruturada como um modo de ser especial de existir, pois 
como possibilidade torna-se um processo para manter-se na existência, ou seja, 
“um processo de autoconservação”. A existência, por isso, é compreendida a partir 
do Dasein que, por sua vez, sempre se encontra determinado por sua facticidade 
como possibilidade ao existir enquanto um poder-ser, ou seja, o ser-aí é um ente 
que só pertence a si mesmo, a partir de suas múltiplas possibilidades de ser. Não 
obstante, a existência ou ek-sistência remete-se ao ser como possibilidade, ao 
existir enquanto ser-para-fora, significa dizer, então, que o ser-aí é um ente que 
determina a sua essência a partir de seu existir.
A partir disso, a compreensão fenomenológica, como via de acesso à intepretação 
do sentido do ser, se torna tarefa principal da ontologia. A pergunta pelo sentido 
do ser deverá reconstruir-se pela analítica existencial de um ente que deve ser 
questionado propriamente, visto que a fenomenologia como ontologia dedica-se 
à compreensão do ser e ao sentido do ser, processo de reflexão hermenêutica de 
37
interpretação tanto ôntico como ontologicamente, sobre o ‘ser-aí’, o Dasein. Por 
essa razão, a analítica das estruturas fundamentais do Dasein deve ser analisada 
filosoficamente, a partir do método fenomenológico que assume uma perspectiva 
hermenêutica, de interpretação e explicitação. 
Heidegger procura estabelecer um projeto hermenêutico fenomenológico fundado 
numa analítica existencial, a partir de uma investigação filosófica de caráter 
existencial, porém não preocupa-se só em buscar tematizar a existência como 
interpretação do ser lançado como ente dentro do mundo, nem meramente dedica-
se a compreender a existência sob um viés de caráter ontológico. É preciso 
entender que a existência, enquanto ser-no-mundo, é ser-em-um-mundo disposto 
facticamente enquanto um estar-lançado aí, aberto e desnudo no que é e tem de 
ser, tratando-se de uma condição essencial à compreensão existencial, fazendo 
com que através do método hermenêutico fenomenológico procure despertar a 
nossa existência histórica para o sentido dessa questão. 
O ser-no-mundo do Dasein, entretanto, não se constitui com uma condição espacial 
diretamente relacionada às coisas concretas, mas principalmente deve ser entendido 
como um modo de residir, habitar e permanecer, estar familiarizado com ou estar 
acostumado. Assim, não se caracteriza como uma perspectiva de justaposição do 
ente Dasein com o ente mundo, pois conforme Azúa (1997, p. 49), para Heidegger 
“o mundo não é configurado como a totalidade das coisas concretas conhecidas 
de uma maneira indeterminada, mas como condição ontológica para que os entes 
intramundanos nos ‘venham-ao-encontro’”. Nesse sentido, o Dasein somente é 
enquanto pode ser-no-mundo, pois esta condição é um elemento transcendental 
da estrutura do Dasein.
Existencialmente, como ser-no-mudo o Dasein é poder-ser, enquanto possibilidade 
entregue a si mesmo, como projeto lançado ao existir, sendo e tornando-se 
responsável por seu ser, por sua existência. É, portanto, a possibilidade de ser livre 
para o poder-ser mais próprio, que existindo compreende-se como ente que gesta 
o mundo e sempre se assume como tal. 
38
2.4 Estrutura hermenêutica do existir
A condição do ser-aí, como possibilidade de ser-no-mundo e como projeto aberto 
ao existir, é compreendida a partir dos caracteres hermenêuticos da disposição, 
compreensão, interpretação e discurso interpretados por Heidegger como os 
existenciais9 que caracterizam a estrutura do ser-aí em seu estar-aberto. 
A disposição (Befindlichkeit) caracteriza o modo do ser-aí no mundo, que exprime 
os distintos modos de sentir-secomo alguém está e se torna em cada possibilidade 
existencial, seja em relação ao ente e ao ser, ou seja, revela com quem convive, 
de que modo se encontra com os outros, em razão de algum afazer ou tarefa 
específicos na cotidianidade. Deste modo, a disposição possibilita ao ser-aí, 
estabelecer relação com os outros e ser tocado enquanto se apresenta como 
uma possibilidade, uma condição existencial que pode analisar-se a partir de uma 
compreensão dos modos de sentir-se e estar do ser-aí em seu mundo, e ainda com 
o que lhe vem ao encontro. 
Na atitude interpretativa da atividade hermenêutica como tal, o mundo está presente 
como aquilo que, em função do qual o ser-aí é enquanto possibilidade de projetar 
seu ser em direção ao existir, se pretende ser-no-mundo, como poder ser-no-mundo 
do ser-aí. Por isso, compreender permite construir-se uma visão cuja finalidade é 
captar compreensivamente toda a abertura do ser-no-mundo, por meio através dos 
modos de ser essenciais de sua constituição, que são a circunvisão na ocupação 
e a consideração na preocupação (Besorge e Fürsorge). Existencialmente, é 
necessário dizer que o caráter projetivo da compreensão constitui, então, uma 
condição fundamental do Dasein que se denomina visão (Sicht). (CAPUTO, 1998). 
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ABC ou Glossário
9 Existencial - Na analítica existencial heideggeriana, ao considerar a existência do ser-aí a partir 
de seus modos fundamentais de ser, a existência torna-se a “essência” do ser-aí. Por isso, o filósofo 
alemão chama de existenciais as estruturas ontológicas constitutivas do ser-aí. No entanto, não 
são “estruturas” através das quais, analiticamente, se compõe “todo o ser”, ou seja, a “essência” do 
ser-aí. Existenciais são, então, os elementos, as modalidades de ser do ente chamado ser-aí, cuja 
constituição fundamental é ser-no-mundo. (ABBAGNANO, 2007).
39
Para Caputo (1998), a transparência do Dasein em relação ao seu próprio existir 
aponta para a integridade de como se compreende como projeto aberto ao ser-no-
mundo, através do autoconhecimento de suas estruturas essenciais, que pode ser 
um compreender próprio como ser autêntico ou inautêntico, pois o compreender 
enquanto poder-ser torna-se um projeto de ser sempre antecipado na vida fática 
cotidiana do ser-aí. O Dasein enquanto compreende, encontra-se aberto como 
projeto para possibilidades de desenvolvimento de seu próprio ser, que Heidegger 
denomina como interpretação (Auslegung). Assim, “a interpretação se funda na 
compreensão e não vice-versa [...] A interpretação consiste na elaboração das 
possibilidades projetadas no compreender”. (HEIDEGGER, 1998, p. 172).
A interpretação então, se funde a partir de uma posição prévia, estabelecida pelo 
referencial da vida cotidiana do ser-no-mundo, tendo como pressuposto uma 
totalidade de significados previamente compreendidos, articulados sempre a partir 
da palavra e da linguagem. As palavras, que neste concreto solo significativo 
estão enraizadas e mostram propriamente, por assim dizer, o seu sentido, vêm a 
determinar e exprimir significado, e isto num contexto preciso de referencialidade já 
articulado dentro da significância conjuntural da compreensão. 
O discurso, como articulação das possibilidades do processo de compreender 
através da palavra, abre-se no horizonte existencial do Dasein, que se projeta 
aberto ao sentido de uma determinada conjuntura de significância articulada no 
estar lançado no mundo, forjando duas atitudes fundamentais possíveis do ser-aí: 
o silêncio e a escuta. Deste modo, para Heidegger (1998, p. 163):
Escutar é fundamentalmente estar aberto enquanto condição 
existencial do ser-aí como ser-com os outros. Enquanto escuta 
da voz do amigo que todo ser-aí traz consigo, o escutar constitui 
até mesmo a abertura primordial e própria do ser-aí para o seu 
poder-ser mais próprio. O ser-aí escuta porque compreende. 
Como ser-no-mundo estruturado em compreensões com 
os outros, o ser-aí obedece na escuta à co-existência e a si 
próprio, ‘pertencente’ a essa obediência. O escutar recíproco 
de um outro, onde se forma e elabora o ser-com, possui os 
modos possíveis de seguir, acompanhar e os modos privativos 
de não ouvir, resistir, defender-se e fazer frente a.
40
Nesse sentido, a exteriorização do discurso é principalmente a linguagem. Trata-
se de uma interpretação hermenêutica do próprio mundo, enquanto representa 
sempre um universo possível de significações. O discurso viabiliza a relação 
compreensiva do estar-no-mundo como um momento estrutural e constitutivo da 
abertura do Dasein, visto que é a condição de possibilidade – existencial - (plano 
ontológico) para que se viabilize a linguagem (plano ôntico). Assim, a compreensão 
do sentido de algo existente sempre se articula ao discurso, antes mesmo que 
possa surgir alguma interpretação que o tente explicitar, que se empreende a partir 
de um mundo de significações hermenêuticas que se conforma através do discurso. 
Somente pelo discurso ocorre a compreensão, de maneira que a linguagem, como 
uma totalidade de línguas, trata-se de uma condição ôntica do discurso, ou seja, 
uma efetivação histórica e cultural do existencial discurso. (MICHELAZZO, 1999). 
2.5 Linguagem como discurso
É relevante destacar que, a partir da constituição existencial da abertura do Dasein 
na perspectiva de Heidegger, se antecipa a possibilidade da linguagem como 
discurso à disposição (Befindlichkeit). A disposição, por isso, está relacionada à 
condição existencial compreendida como afetos em contraposição à concepção 
racional, uma vez que na sua cotidianidade o Dasein experimenta como disposição 
os humores. Assim, a disposição torna-se o caráter ontológico desta possibilidade 
de afetação do Dasein em seu sentido ôntico, surgindo da facticidade do Dasein, 
enquanto ser-lançado10 (geworfen). (MICHELAZZO, 1999). 
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ABC ou Glossário
10 Ser-lançado - O sentido de “ser”, ou “estar-lançado” indica que o Dasein não se “projeta” a 
si mesmo, ele já se encontra vinculado às condições fatuais e históricas do mundo. É o que faz 
o Dasein “ter de ser” (ST1, 189), enquanto ser-no-mundo, o dasein tem de ser e é sua abertura 
(ABBAGNANO, 2007).
41
Nesse sentido, derivando-se igualmente da constituição como também da abertura 
do Dasein, surge da condição de possibilidade de afetação por parte da disposição, 
a compreensão. Por isso, para Heidegger (1998, p. 198), “toda disposição sempre 
possui a sua compreensão, mesmo quando a reprime. Toda compreensão está 
sempre sintonizada com o humor”. Deste modo, ser, como possibilidade de existir, 
está sempre dirigido pela compreensão do próprio Dasein, ou seja, “a pre-sença 
é de tal maneira que ela sempre compreendeu ou não compreendeu ser dessa 
ou daquela maneira” (1998, p. 199). Por essa razão, torna-se fundamental a 
compreensão como horizonte de abertura do ser do Dasein, constituída a partir de 
uma dupla possibilidade hermenêutica: compreensão do ser e de si mesmo. 
Assim, a disposição e a compreensão são características existenciais do Dasein que 
possibilitam a linguagem. A compreensão torna-se fundamental como possibilidade 
de manifestação discursiva daquilo que o Dasein, enquanto abertura para o mundo, 
enquanto totalidade significativa, possibilita e condiciona para a interpretação do 
todo conjuntural aberto pela compreensão do Dasein enquanto ser-no-mundo. O 
discurso é, por conseguinte, a possibilidade de o Dasein expor o que interpreta, 
integrando sentido e usando as palavras como manuais. 
Segundo Heidegger, a própria escuta torna-se um momento constitutivo fundamental 
do discurso. No mundo circundante, o Dasein sempre se move a partir de um 
horizonte de interpretação, pois “a escuta é constitutiva do discurso [...] escutar é o 
estar abertoexistencial da pre-sença enquanto ser-com os outros”. (HEIDEGGER, 
1988, p. 222). Assim, a própria escuta é parte constitutiva do discurso, uma vez 
que a possibilidade de interpretação, a partir do mundo circundante, revela que 
escuta e silêncio têm o mesmo fundamento existencial, sendo o ouvir uma escuta 
compreensiva. A palavra torna-se algo então que apenas se pode ser integrado a 
partir do sentido empregado no “uso” que o Dasein, ao dizer do mundo, faz dela, 
interpretando e se apropriando da compreensão. Deste modo, em Ser e Tempo, 
discorrer é discorrer “sobre” algo.
42
Assim, concluimos que como o homem nem sempre é capaz de compreender o ser, 
e por conseguinte o ente, enquanto coisa a ser compreendida, ele não se encontra 
sempre na condição de abertura e desvelamento (alétheia). Dito de outro modo: 
o ente encontra-se também velado em sua essência. Portanto, para Heidegger, 
a característica principal da liberdade como essência da verdade é o deixar-ser. 
Deixando ser o ente, o homem abandona a si mesmo e pode compreendê-lo. Isso 
somente é possível porque a relação que autoriza o ente a se manifestar enquanto 
tal, é estabelecida por uma relação de liberdade. Por meio dela, o ente manifesta-
se, posta-se na sua modalidade de descoberta. E também, o homem é livre dentro 
dessa possibilidade aberta à compreensão. (MICHELAZZO, 1999).
RESUMO
Nesta Unidade, estudamos que a investigação heideggeriana apresentada, 
sobretudo em sua obra Ser e Tempo dedica-se também a compreender pelo método 
hermenêutico, a partir da fenomenologia, o sentido do ser como possibilidade 
filosófica de explicitar, em termos existenciais, a estrutura ontológica do ser do 
homem como ser no mundo, com os outros, enquanto horizonte fundamental de 
exercer uma tarefa histórico-hermenêutica e como atitude questionadora do ser-aí 
fáctico. 
SUGESTÃO DE LEITURA
Para saber mais sobre a analítica existencial de Martin Heidegger, leia o texto 
que está disponível no link a seguir. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/
pdf/rnufen/v8n2/a09.pdf>.
Para saber mais sobre a ontologia fundamental do projeto de Ser e Tempo, leia 
o texto que está disponível no link a seguir. Disponível em: <http://www.uel.br/
eventos/sepech/arqtxt/PDF/marceloasilva.pdf>.
Para saber mais sobre a hermenêutica filosófica de Heidegger, leia o texto que 
está disponível no link a seguir. Disponível em: <http://www.ufjf.br/eticaefilosofia/
files/2009/08/17_2_mello.pdf>.
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 REFERÊNCIAS
AZÚA, J. B. R. De Heidegger a Habermas: Hermenéutica y fundamentación última 
en la filosofía contemporánea. Barcelona: Herder, 1997. p. 49.
CAPUTO, John D. Desmistificando Heidegger. Tradução portuguesa de Leonor 
Aguiar. Lisboa: Instituto Piaget, 1998.
HEIDEGGER, M. Ser y Tiempo. 2. ed. Santiago do Chile: Editorial Universitaria, 
1998. p. 172.
INWOOD, Michael. Dicionário Heidegger. Trad. L. Holanda. Rio de janeiro: Zahar, 
2002.
MAC DOWELL, João A. A Gênese da Ontologia Fundamental de Martin 
Heidegger: Ensaio de caracterização do modo de pensar de Sein und Zeit. São 
Paulo: Loyola, 1993.
MICHELAZZO, José Carlos. Do Um como princípio ao Dois como unidade: 
Heidegger e a reconstrução ontológica do real. São Paulo: FAPESP, 1999.
PAISANA, João. Fenomenologia e Hermenêutica: a relação entre as filosofias de 
Husserl e Heidegger. Lisboa: Presença, 1992. 
PALMER, Richard E. Hermenêutica. Tradução de Maria Luisa Ribeiro. Lisboa: 
Edições 70, 1986.
STEIN, Ernildo. Seis estudos sobre “Ser e tempo”. Petrópolis: Vozes, 2005. 
VATTIMO, Gianni. Introdução a Heidegger. Trad. João Gama. Lisboa: Edições 70, 
1989.
44
UNIDADE
3
Hermenêutica Contemporânea a partir de 
Gadamer
Objetivos
• Compreender a hermenêutica filosófica de Gadamer;
• Revelar a importância do contexto histórico para o processo de compreensão;
• Analisar a consciência histórica como acesso à interpretação do mundo.
Fonte: https://www.google.com.br/
search?q=gadamer&rlz=1C1RLNS_pt-BRBR7
57BR757&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved
=0ahUKEwjtre6zmNDdAhXLjJAKHeW-CcYQ_
AUIDygA&biw=1517&bih=730#imgrc=TOvbc3t0Ad7sMM:
Figura 6 - Hans-Georg Gadamer
45
3.1 A obra de arte na perspectiva hermenêutica 
Gadamer sistematiza seu arcabouço filosófico no campo hermenêutico a partir da 
exposição de três estruturas fundamentais: a experiência da arte, a historicidade 
da compreensão e a linguagem. Elencadas na sua obra Verdade e Método e 
publicada na sua primeira edição, em 1960. Ocasião histórica relevante em que 
o filósofo pensa a Hermenêutica como a possibilidade do compreender filosófico 
não mais como uma postura do sujeito, mas como o modo de ser da existência 
enquanto tal, segundo Heidegger. 
A obra de arte, para Gadamer, torna-se um horizonte de reflexão filosófica necessária 
à compreensão acerca da experiência sobre a ontologia da obra de arte, que se 
pressupõe algo no mundo insistentemente convidativo, atrativo para um mundo 
diferente dela, alheio, mas que se encontra sempre aberto a um posicionamento, 
ou seja, aberto a uma forma questionadora, diferente, consciente de ver as coisas. 
Nesse sentido, o homem diante de uma obra de arte, independente de sua relação 
ou mesmo a dimensão de conhecimento referente à obra, encontra-se em uma 
situação hermenêutica, que busca fundamentalmente um significado, a partir de um 
jogo, a saber: o de compreensão estabelecida, sobretudo, a partir da obra de arte e 
em relação à sua própria existência e seu próprio ser. (LAWN, 2007). 
Por isso, o compreender significa, principalmente, sentir-se entendido na coisa, e 
diante desta relação posteriormente é possível também compreender a opinião do 
outro como tal. Esta é a razão de a pré-compreensão ser a primeira de todas as 
condições hermenêuticas, ou seja, a Hermenêutica deve partir do fato de que quem 
quer compreender. (GADAMER, 1999, p. 79): 
[...] está ligado à coisa que vem à fala na tradição, mantendo 
ou adquirindo um vínculo com a tradição a partir de onde fala o 
texto transmitido. Por outro lado, a consciência Hermenêutica 
sabe que não pode estar ligada a esta coisa nos moldes de 
uma unanimidade inquestionável e óbvia, como no caso 
da continuidade ininterrupta de uma tradição. Dá-se uma 
polaridade entre familiaridade e estranheza, sobre a qual se 
baseia a tarefa da Hermenêutica.
46
Assim, diante de toda realidade em sentido de busca pela compreensão de sua 
própria existência, o homem transforma em arte todas as emoções e experiências 
significativas engendradas neste contato transcendental reflexivo. Diante disso, 
Lawn (2007, p. 165) redireciona a intepretação acerca do círculo hermenêutico 
de Gadamer, quando discorre sobre a presença dos pré-conceitos (coisas) na 
interpretação “que se inicia com pré-conceitos, estes são substituídos por conceitos 
mais adequados”. Este processo interpretativo viabiliza a compreensão de novos 
espaços de modo que nos leva a perceber nossa realidade anterior, pois revela 
historicamente nosso constante vir a ser como estrutura fundamentalmente 
necessária para nos firmarmos enquanto ser.
Apesar disso, a linguagem da arte não revela uma reflexão cujo conteúdo se 
pressupõe refletido nos domínios da razão, visto que se torna um processo que se 
deve realizar à medida que temos contato com a obra de arte, ou seja, o contato 
nos modifica e temos que exercê-lo para que a arte não se constitua como um 
objeto qualquer, sem as condições de favorecer um modo reflexivo baseado no 
confronto de nós mesmos com o diferente. Assim, Gadamer, redefine a importância 
do campo aberto pelo próprio espaço da linguagem, a partir da experiência da arte 
como o lugar onde a verdade se expõe.
Neste sentido, o pensamento hermenêutico se constrói e se torna possível a 
partir da relação estabelecida pela provocação vinda da obra de arte, a fim de

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