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técnica de reportagem

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"Técnica de reportagem
Notas sobre a narrativa jornalística"
(trechos selecionados) 
Muniz Sodré e Maria Helena Ferrari
São Paulo, Summus, 1986
Introdução
Uma reportagem - a entrevista de José Américo a Carlos Lacerda - precipitou a queda do regime ditatorial de Vargas, em 45. Uma série de reportagens do Washington Post sobre a invasão da sede do Partido Democrata norte-americano provocou a derrubada do presidente Nixon, nos idos de 70. Algo distantes no tempo, próximos em seus efeitos, os dois exemplos valem para ilustrar a vitalidade do poder denunciantes do jornalismo na sociedade contemporânea. Mas a exemplificação poderia recuar ainda mais no passado, com o mesmo vigor nos resultados.
É preciso acentuar, no entanto, que a conquista do jornalismo moderno é usar essa sua força de maneira sedutora: nenhum rebuscamento estéril, nenhuma forma monótona deve colocar-se entre o olhar do leitor e o fato restituído em sua veracidade. É na reportagem - mais do que na notícia, no editorial ou no artigo - que se cumpre esse mandamento.
Por isso, é a reportagem - onde se contam, se narram as peripécias da atualidade - um gênero jornalístico privilegiado. Seja no jornal nosso de cada dia, na imprensa não-cotidiana ou na televisão, ela se afirma como o lugar por excelência da narração jornalística. E é mesmo, a justo título, uma narrativa - com personagens, ação dramática e descrições de ambiente - separada entretanto da literatura por seu compromisso com a objetividade informativa.
Esse laço obrigatório com a informação objetiva vem dizer que, qualquer que seja o tipo de reportagem (interpretativa, especial etc.), impõe-se ao redator o "estilo direto puro", isto é, a narração sem comentários, sem subjetivizações.
Houve, é verdade, um período "épico", em que o herói era o próprio repórter (a revista O Cruzeiro é o grande exemplo brasileiro), com sua coragem e suas opiniões. Hoje, porém, a reportagem - mesmo com eventuais rasgos de heroísmo do repórter em sua atividade investigativa - é um gênero pautado por regras objetivas. Os tópicos a seguir pretendem dar conta de algumas dessas regras.
A narrativa jornalística
Narrativa, sabe-se, é todo e qualquer discurso capaz de evocar um mundo concebido como real, material e espiritual, situado em um espaço determinado. Os fatos atribuídos a, por exemplo, Riobaldo e Diadorim (Grande Sertão, Veredas], no texto de Guimarães Rosa, pressupõem a aceitação do mundo imaginado pelo escritor como algo suscetível de evocar um espaço humano real. O romance, o conto, o poema, constituem formas diferentes de narrativa.
Mas a narrativa não é privilégio da arte ficcional. Quando o jornal diário noticia um fato qualquer, como um atropelamento, já traz aí, em germe, uma narrativa. O desdobramento das clássicas perguntas a que a notícia pretende responder (que, o que, como, quando, onde, por quê) constituirá de pleno direito uma narrativa, não mais regida pelo imaginário, como na literatura de ficção, mas pela realidade factual do dia-a-dia, pêlos pontos rítmicos do cotidiano que, discursivamente trabalhados, tornam-se reportagem. Esta é uma extensão da notícia e, por excelência, a forma-narrativa do veículo impresso (embora a entrevista, sobretudo o perfil, possa também, às vezes, assumir uma forma narrativa). A reportagem constitui, assim, basicamente, um dos gêneros jornalísticos.
Como esse gênero ganhou impulso moderno nos Estados Unidos, vamos buscar ali um exemplo clássico da transformação da simples notícia em reportagem. Trata-se de um episódio ocorrido em 1925, no estado de Kentucky, que comoveu a nação americana (retratado em A montanha dos sete abutres, de Billy Wilder, 1951).
Trata-se da história de Floyd Collins, um camponês que entra em uma gruta repleta de pedras instáveis e fica imobilizado pelo deslizamento de uma pedra. Collins é encontrado vivo, mas nenhuma tentativa de resgate consegue livrá-lo da pedra; depois de dezoito dias de busca, seu corpo é encontrado morto. O fato ganhou ampla repercussão nos jornais, graças à iniciativa de um jovem jornalista, Skeets Miller, que foi tocado peia imensa solidão do homem preso nas rochas, e empenhou-se inclusive em seu salvamento, gerando uma narrativa de ampla dimensão humana a partir de alguns aspectos sociais específicos (concorrência, região em que ocorre o crime, questões de identidade do indivíduo moderno, emergente ideologia organizacional do jornalismo da época).
Todos esses aspectos contribuíram para a transformação do assunto numa grande reportagem, mas poderiam igualmente ter gerado notícia, crônica, artigo, editorial. O tratamento narrativo, isto é, a reportagem, impôs-se no instante em que Miller sentiu-se "tocado pela extrema solidão ded Floyd. Sem um "quem" e um "o que", não se pode narrar. Na reportagem, estes dois elementos têm de existir, mas têm, sobretudo, de despertar interesse humano - ou não serão suficientes para sustentar a problemática narrativa. Tanto assim que, naquele mesmo ano da tragédia de Collins, duas outras catástrofes subterrâneas foram tratadas como notícias, em páginas internas dos grandes jornais.
Assim, a tragédia solitária de um homem (Floyd) e a tenacidade de um repórter franzino (Miller) constituíram a protagonização dramática para a grande reportagem. Tratava-se, na verdade, de dois personagens capazes de responder à demanda social de heróis: milhões de norte-americanos identificavam-se com o homem enterrado vivo, mas também com o repórter que, solitário, como um herói de Dashiell Hammett, enfrentava com teimosia as adversidades.
Nas condições de sofrimento de um indivíduo, filtradas pelas impressões de um outro indivíduo, projetavam-se as dificuldades de uma nação. A humanização do relato, pois, é tanto maior quanto mais passa pelo caráter impressionista do narrador.
Diretamente ligada à emotividade, a humanização se acentuará na medida em que o relato for feito por alguém que não só testemunha a ação, mas também participa dos fatos. O repórter é aquele "que está presente", servindo de ponte (e, portanto, diminuindo a distância) entre o leitor e o acontecimento. Mesmo não sendo feita em primeira pessoa, a narrativa deverá carregar em seu discurso um tom impressionista que favoreça essa aproximação. Ao lado disso, os fatos - e as referências a que estão ligados - serão relatados com precisão, garantindo, mais ainda, a verossimilhança.
Do que foi exposto, depreendem-se as principais características de uma reportagem: a) predominância da forma narrativa; b) humanização do relato; c) texto de natureza impressionista; d) objetividade dos fatos narrados.
Conforme o assunto ou o objeto em torno do qual gira a reportagem, algumas dessas características poderão aparecer com maior destaque. Mas será sempre necessário que a narrativa (ainda que de forma variada) esteja presente numa reportagem. Ou não será reportagem.
Anunciar, enunciar, pronunciar, denunciar
Dissemos que a notícia carrega a potencialidade de uma narrativa. Isso não significa que a notícia e a reportagem se distinguiriam apenas pela extensão e abrangência: há outras diferenças que precisam ser assinaladas, sobretudo as relativas às peculiaridades de discurso e a modos de enunciação.
Não se pode esquecer que o discurso de comunicação de massa está subordinado a seu objetivo primordial - a informação - e que, embora possa haver variedade nos enunciados, os dados referenciais ligados a fatos e pessoas assumem proeminência. Isso, tanto no que se refere à notícia como à reportagem.
Só que, à notícia, cabe a função essencial de assinalar os acontecimentos, ou seja, tornar público um fato (que implica em algum gênero de ação), através de uma informação (onde se relata a ação em termos compreensíveis).
Esses três elementos (fato, informação, público) estão presentes na definição de notícia de Charnley: "É a informação corrente dos acontecimentos do dia posta ao alcance do público". E esclarece: "Notícia não é a morte do ditador, mas o relato que é feito dessa morte". Nessa concepção, os elementos
público e informação ganham um peso considerável em relação ao fato.
Noticiar, portanto, seria o ato de anunciar determinado fato e, independente do número de acontecimentos que possam ocorrer, só serão notícia aqueles que forem "anunciados".
A circulação da notícia, isto é, a veiculação através da qual se faz o "anúncio" de um fato, depende de uma reação subjetiva e não objetiva: os critérios que norteiam esse "anunciar" são determinados pelo interesse do médium ou pelo suposto interesse do público. Logo, o anúncio de um fato está ligado ao interesse que ele possa vir a despertar. Na opinião de Herraiz, "notícia é o que os jornalistas acreditam que interessa aos leitores". Mas acrescenta, irônico: "Portanto, notícia é o que interessa aos jornalistas".
Outro fator determinante para a circulação de uma notícia é o tempo: q fato deve ser recente, e o anúncio do fato, imediato. Este é um dos principais elementos de distinção entre a notícia e outras modalidades de informações. Aqui, talvez, um aspecto importante a diferenciar notícia de reportagem: a questão da atualidade.
Embora a reportagem não prescinda de atualidade, esta não terá o mesmo caráter imediato que determina a notícia, na medida em que a função do texto é diversa: a reportagem oferece detalhamento e contextualização àquilo que já foi anunciado, mesmo que seu teor seja predominantemente informativo.
Anunciar/enunciar
Consideremos a observação de Lipman: "As notícias costumam limitar-se a descrever sinais, mais do que analisar seus significados". Isso tem procedência em dois casos: na notícia que "anuncia" o fato e na que o "enuncia" (O conceito de enunciação pode ser definido como "ato de atualizar, de usar a língua num discurso determinado". Nesse sentido lato, abrange qualquer tipo de enunciado formalizado - inclusive o da notícia-anúncio - diferenciando-se da simples competência linguística. Aqui, no entanto, estamos utilizando o termo em sentido específico, conotando-o significativamente em relação ao modo de articulação do discurso, que enuncia, ou seja, põe à mostra, ex-põe, ex-pressa, manifesta os fatos). Expliquemos: o anúncio de um fato é o simples divulgar dos acontecimentos e o registro sumário de suas circunstâncias - um relato de ações acabadas no tempo. Nesse caso, o discurso mantém distanciamento em relação ao leitor; é absolutamente descritivo, documental - só há referências ao que pode ser visto ou constatado.
O procedimento do discurso pode ser outro: narrativo, reconstituindo as ações e as presentificando, como se estivessem ocorrendo. A aproximação com o leitor é maior, na medida em que se pode acompanhar o desenrolar dos acontecimentos quase como testemunha. Esse tipo de relato se apoia na ação e no detalhamento. Tenta reproduzir os fatos, realizando-os para o leitor.
O primeiro tipo de texto "anuncia" a ocorrência dos fatos, o segundo traz os fatos para um "enunciado", isto é, exprime a manifestação desses fatos através de um discurso que se oculta como discurso: não se percebe que há alguém narrando; mais parece que os acontecimentos têm vida própria e se exibem diante do leitor, enunciando-se de forma autônoma. 
Esse tipo de discurso, narrativo, detalhado - e que sobretudo parece reger-se por leis próprias - está muito próximo do da reportagem de ação, em que à maneira de uma história de aventuras, os fatos se sucedem à vista do leitor.
Pronunciar/denunciar
A notícia-anúncio limita-se às evidencias; a notícia-enunciado dramatiza, sem interferência do narrador, os fatos narrados. Mas uma outra forma pode ser descrita. Muito sutilmente, manipulando aqui e ali algumas palavras, uma notícia pode vir a se pronunciar a respeito de um fato ou tema, imprimindo ao texto um caráter de julgamento preestabelecido, de avaliação do caso relatado, conduzindo o leitor na direção de uma pronunciamento.
A notícia-pronúncia pode ter caráter irônico e detrator, mas também pode ser construtiva, falando em favor de um movimento social ou comunitário. Nesse caso, a linguagem torna-se explicitamente opinativa, adquirindo muitas vezes caráter de denúncia.
Mais do que o anúncio ou o simples enunciar dos fatos, as notícias-pronúncia e denúncia informam sobre um tema, numa abstração que visa formar um conceito de natureza ideológica. Ò jornal incorpora, assim, o tom do jornalismo de revista, que fala ao leitor como se esse já tivesse algum conhecimento do tema tratado: seja através do rádio, da tevê, de jornais ou de livros.
Portanto, conforme o teor da informação, as características dos discursos das notícias e o próprio encadeamento delas, são produzidos conhecimento de dois tipos: a) o que traz familiaridade com um tema - e nesse caso o discurso é concreto e descritivo, apenas assinalando os acontecimentos; b) o que produz conceitos sobre um tema - com um discurso mais abstraio e analítico, oferecendo informação contextualizada.
O jornalismo tem-se encaminhado no sentido de informar sobre o tema, principalmente nos veículos que pretendem, mais que o registro dos fatos, formar o leitor/espectador.
Notícia/reportagem
Os mesmos conceitos de anunciar, enunciar, pronunciar e denunciar podem ser estabelecidos para as reportagens. Às vezes, as fronteiras entre os gêneros se tornam tênues, principalmente quando as notícias trazem a informação contextualizada.
Mas como diferenciar notícia de reportagem? Mais que obter uma definição, talvez importe, sobretudo, perceber as diferenças entre os tipos de discursos, de acordo com a finalidade que propõem. Registrar, historiar, opinar e reclamar são funções diferentes que produzem efeitos também diferentes, conforme o objetivo do emissor-narrador.
Um fato pode ser tão importante que sua simples notícia ou uma enorme reportagem a respeito dele vão sempre procurar documentar seus aspectos referenciais, porque aí está a expectativa do leitor. Já um episódio de restrito interesse só ultrapassará o mero registro se envolto em circunstancias que conduzirão o leitor a um posicionamento crítico, revelando-lhe ângulos insuspeitados, salientando outros apenas entrevistos - enfim, iluminando e ampliando a visão sobre determinado assunto. Essa, talvez, a função distintiva entre o noticiar e o reportar.
Modelos
A prática contemporânea do jornalismo comporta uma variedade muito grande de tipos ou modelos de reportagem. Pode-se apontar, entretanto, três modelos fundamentais.
Reportagem de fatos (fact-story) 
Trata-se do relato objetivo de acontecimentos, que obedece na redação à forma da pirâmide invertida. Como na notícia, os fatos são narrados em sucessão, por ordem de importância ou cronologicamente. Em reportagens televisivas, quando se cobrem grandes acontecimentos, a edição parte do anúncio do fato mas pode fazer de cada parte seguinte uma pequena notícia independente. Embora se caracterize pela objetividade, é possível encontrar exemplos em que o distanciamento seja menor.
2. Reportagem de ação (action-story)
É o relato mais ou menos movimentado, que começa sempre pelo fato mais atraente, para ir descendo aos poucos na exposição dos detalhes. O importante, nessas reportagens, é o desenrolar dos acontecimentos de maneira enunciante, próximo ao leitor, que fica envolvido com a visualização das cenas, como num filme.
Na tevê, o repórter participa da ação e deixa de ser um mero observador, para tornar-se parte da narrativa. É o caso de certas reportagens que podem até incorrer em riscos, como filmar e entrevistas pessoas durante um assalto, fazer-se passar por cliente para investigar um negócio ilícito etc. O repórter está no meio dos acontecimentos; o testemunho, portanto, é importante em relatos desse tipo, pois confere maior realismo e credibilidade à ação.
Evidentemente os modelos não são rígidos: é possível haver cominações. Para quebrar a frieza de uma reportagem documental, por exemplo, e captar o interesse do leitor para o assunto, muitas vezes usam-se recursos da reportagem de ação ou de fatos. Pode ocorrer também o contrário: uma reportagem de ação ou de
fatos que contém, aqui e ali, referências documentais (depoimentos ilustres, dados numéricos e estatísticas ou informações sobre procedimentos técnicos). Nesse caso, quase sempre a reportagem deriva de uma notícia e pretende, além da informação pormenorizada do fato, uma contextualização desse fato. Amplia o campo da abordagem e passa a informar sobre o tema.
Independente do modelo básico de relato (fatos, ação, documental), a reportagem pode variar os seus esquemas ou planos de texto, isto é, os modos como são hierarquizados os acontecimentos e as informações. Escolher bem um plano e realizá-lo a contento vale como demonstração de que a reportagem não é dissertação nem tese, mas uma mensagem de natureza narrativo-expositiva, voltada pura e simplesmente para a comunicação.
Tipos mais comuns de esquemas:
1) Cronológico: é o contrário do esquema da "pirâmide invertida", em que os fatos se hierarquizam por ordem de importância. Nesse esquema, o texto pode começar pelo fato mais remoto, e não pelo fato mais importante.
2) Dialético: é um esquema comum na reportagem documental. Esse plano, em que o texto se põe a serviço da demonstração de uma ideia, é também habitual quando se trata de questões controvertidas.
3. Reportagem documental (quote-story)
É o relato documentado, que apresenta os elementos de maneira objetiva, acompanhados de citações que complementam e esclarecem o assunto tratado. Comum no jornalismo escrito, esse modelo é mais habitual nos documentários de televisão ou do cinema. A reportagem documental é expositiva e aproxima-se da pesquisa. Às vezes, tem caráter denunciante. Mas, na maioria dos casos, apoiada em dados que lhe conferem fundamentação, adquire cunho pedagógico e se pronuncia a respeito do tema em questão.
Outras formas de reportagem: a reportagem-conto (particulariza a ação, escolhendo um personagem para ilustrar o tema que pretende desenvolver); a reportagem-crônica (se detém mais em situações fortuitas e flagrantes do cotidiano, conduzindo a narrativa de forma impressionista, por meio de um narrador colocado em posição observadora ou reflexiva; de caráter mais circunstancial e ambiental); o livro-reportagem (compilação de textos já publicados em jornais ou trabalho feito para livro mas concebido a partir de textos jornalísticos).
Tchekhov, contista e jornalista russo, dizia que um bom conto deveria ter: força, clareza, condensação e novidade. Edgar Allan Põe exigia que a história curta tivesse uma "unidade de efeito", que consiste na dosagem de tensão em relação ao tamanho do conto.
Um texto tem força quando arrebata o leitor e faz com que ele chegue no fim da narrativa. Os pressupostos para tal resultado estão ligados à seleção de elementos que, combinados em seqüência, produzem um efeito. Esse efeito pode ser de ordem emotiva ou racional. A clareza é um atributo indispensável ao jornalismo e diz respeito à objetividade narrativa, com vistas à compreensão imediata. A condensação refere-se à compactação de elementos; diz respeito não apenas ao acúmulo, mas à concentração e síntese com que se manipulam os recursos narrativos e descritivos. Está ligada à dosagem com que os elementos são dispostos em seqüência (levando em conta a condensação), mas fazendo com que essa dosagem vá em direção a um ponto máximo dentro da história. É um retardamento proposital da narrativa, que cria o "suspense" necessário à manutenção da curiosidade do leitor; podem ser alternados momentos de tensão e expansão. A novidade pode estar ligada ao acontecimento inédito (uma história surpreendente), mas também diz respeito a uma observação diferente de qualquer assunto, ao ângulo insuspeitado na percepção de um fato, pessoa ou tema. Não significa forçosamente rompimento com as estruturas formais, mas sobretudo uma abordagem original, ao caráter de imprevisibilidade que um texto possa conter, tanto ao nível do conteúdo quanto da forma.
Reportagem e verdade
Não é bastante ser verdadeira; reportagem tem que parecer verdadeira - ser verossímil. Isso exige certa técnica na dosagem da seleção e combinação de elementos. Os dados utilizados para compor a reportagem devem conferir verossimilhança à narrativa dos fatos. Em suma: o redator controla a verossimilhança, mas não deve perder de vista o leitor e seu possível cansaço diante de, por exemplo, termos técnicos excessivos. Com isso, o texto conserva suas qualidades de tensão e condensação.
A inovação pode estar no comportamento do narrador: dialogar com o leitor e com o "repórter de campo", como um locutor; estar presente a cena, e registrar tudo como uma câmara cinematográfica, que ora se aproxima em dose, ora se afasta para uma panorâmica; ser onisciente, com informações de arquivo, recortes de jornal etc. Tudo isso ultrapassa o simples recurso cinematográfico (já incorporado à moderna narrativa jornalística); o que se tem é a assimilação da técnica documental de tevê, além da possibilidade de trazer um final surpreendente.
Na reportagem, podemos indagar sobre as relações do texto com a realidade. É verdadeiro ou inventado? Talvez reduzir a questão a esses dois aspectos não seja suficiente. De fato, verificamos que a reportagem pode omitir um elemento que, como nas histórias policiais, só seja revelado no final. Nesses casos, o real é engendrado para produzir determinado efeito, mas a partir de dados fornecidos pelo próprio real; essa forma ficcional atende ao tema e sua problemática. Ainda assim, uma diferença se impõe entre literatura e jornalismo: na primeira, predomina o imaginário; no segundo, deve predominar a realidade dos fatos narrados. Além da verossimilhança, portanto, a reportagem não pode esquecer seu compromisso com a verdade - que poderíamos chamar de autenticidade dos fatos.
Perfil: o personagem em destaque
Há muitas maneiras de narrar uma história, mas nenhuma pode prescindir de personagens. Também são inúmeras as formas de apresentá-los, caracterizá-los ou fazer com que atuem. De qualquer modo, existe sempre um momento da narrativa em que a ação se interrompe para dar lugar à descrição (interior ou exterior) de um personagem. É quando o narrador faz o que, em jornalismo, convencionou-se chamar de perfil,
Em jornalismo, perfil significa enfoque na pessoa - seja uma celebridade, seja um tipo popular, mas sempre o focalizado é protagonista de uma história: sua própria vida. Diante desse herói (ou anti-herói) o repórter tem, geralmente, dois tipos de comportamento: ou mantém-se distante, deixando que o focalizado se pronuncie, ou compartilha com ele um determinado momento e passa ao leitor essa experiência.
No primeiro caso, temos a entrevista clássica, que não exige necessariamente o contato pessoal (pode ser feita por telefone ou por escrito). O texto consiste numa apresentação sumaria, feita de dados referenciais, seguida de perguntas e respostas. Na maioria dos casos, termina com a palavra do entrevistado. Às vezes, porém há um pequeno fecho, ligeiramente pronunciante, mas de modo geral distanciado.

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